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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE

CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE

(1902-1987)

 

 

Carlos Drummond de Andrade (Itabira do Mato Dentro [Itabira] MG, 1902 - Rio de Janeiro RJ, 1987) formou-se em Farmácia, em 1925; no mesmo ano, fundava, com Emílio Moura e outros escritores mineiros, o periódico modernista A Revista. Em 1934 mudou-se para o Rio de Janeiro, onde assumiu o cargo de chefe de gabinete de Gustavo Capanema, Ministro da Educação e Saúde, que ocuparia até 1945. Durante esse período, colaborou, como jornalista literário, para vários periódicos, principalmente o Correio da Manhã. Nos anos de 1950, passaria a dedicar-se cada vez mais integralmente à produção literária, publicando poesia, contos, crônicas, literatura infantil e traduções. Entre suas principais obras poéticas estão os livros Alguma Poesia (1930), Sentimento do Mundo (1940), A Rosa do Povo (1945), Claro Enigma (1951), Poemas (1959), Lição de Coisas (1962), Boitempo (1968), Corpo (1984), além dos póstumos Poesia Errante (1988), Poesia e Prosa (1992) e Farewell (1996). Drummond produziu uma das obras mais significativas da poesia brasileira do século XX. Forte criador de imagens, sua obra tematiza a vida e os acontecimentos do mundo a partir dos problemas pessoais, em versos que ora focalizam o indivíduo, a terra natal, a família e os amigos, ora os embates sociais, o questionamento da existência, e a própria poesia.

Fonte da minibiografia: www.astormentas.com/

 

E de fato Drummond é um grande poeta da sintaxe; não apenas pela habilidade inventiva que demonstra no tratamento e na combinatória interna das palavras da frase. Sabe criar com pouco um ritmo próprio, engendrando admiráveis sequencias verbais.  É senhor absoluto do instrumento do ofício. Na verdade, por associações inesperadas (num sentido amplo, mais maleável do que o da sintaxe da gramática tradicional), ele gera e organiza as relações entre verso e universo, por tudo o que é capaz de trazer de fora, o mundo e da linguagem, e coadunar, ritmicamente, no interior do poema.” DAVID ARRIGUCCI JR. (São Paulo: Cosac & Naif, 2002. p. 31)

 

 

Veja também CARLOS DUMMOND DE ANDRADE  em

FRANCÊS – FRANÇAIS >
http://www.antoniomiranda.com.br/poesie_bresilienne/carlos_drummond_de_andrade.html

INGLÊS – ENGLISH >
http://www.antoniomiranda.com.br/poesia_ingles/carlos_drummond_de_andrade.html
ITALIANO >
http://www.antoniomiranda.com.br/poesia_italiano/carlos_drummond_de_andrade.html

 

 

Ver também>>>DE ANIMAIS, SANTO E GENTE por CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE - ENSAIOS

 

 

Extraído de

 

VERDE. Revista Mensal de Arte e Cultura.   São Paulo: 1978.  Caixa de papelão contendo           7 (sete) exemplares (fac-similares) da revista VERDE, de Cataguases Minas Gerais, dirigida por Martins Mendes e Rosario Fusco.        Supervisão gráfica: Diana Mindlin. Patrocínio: Metal Leve S.A.  Ex. bibl. Antonio Miranda

               Vários poemas de Carlos Drummond de Andrade foram publicados nas edições da revista VERDE, em 1927. Escolhemos este “Convite ao Suicídio” dirigida ao modernista Mario de Andrade... Prosaico, contundente, irônico, genial...               ANTONIO MIRANDA

 

                  

 

CONVITE AO SUICÍDIO

A MÁRIO DE ANDRADE                   

  

Vamos dar o tiro no ouvido, Vamos ?

Largar essa vida largar esse mundo comprar o ultimo bilhete

e desembarcar na estação central do Infinito pe­rante a commissão importante de archan-jos bem-aventurados prophetas—vivôôôô !

Vamos acabar com isso, dar o fóra nas aporrinhações. Adeus contrariedades. Nunca mais desastres nem callos nem desejos

nem percevejos nem nada.

Só um gesto PUM PUM Acabou-se.

Já estou cansado da Metro, da Paramount, de todas as marcas inclusive a barbante. O fita pau.

Repetir é casar dobrado. Me dá o braço, vamos s'embora.

A vida foi feita pros trouxas

que esperdiçam as riquezas do coração

nessa lenga lenga infindável

e depois vão dormir o somno abençoado dos burros

justos pra recomeçar no dia seguinte cedinho.

Vida que não é vida...

(Suspirei

foi pra abrir o peito, soltar o ultimo desgosto.)

Estou prompto pra sahir. Vamos sahir juntos ? E' mais divertido

e enche mais os jornaes: um suicídio duplo, hein ?

que mina pros repórteres e pros cidadãos que gostam de misturar o café matinal com historias de Smith and Wess.

 

A noite está fria.

Noite indifferente.

Vamos morrer daqui a um minuto

(si você não roer a corda)

e no entanto o Cruzeiro do Sul parece
dizer: que m'importa,

E astros   aguas e terras  repetem
machinalmente: que m'importa.

 

Elles têm razão.

Nós também temos.

Dois contribuintes de menos,

que perderá o Brasil com isso.

No frio da noite os amorosos multiplicam a espécie.

O Brasil é tão grande.

Mais grande que o mundo inteiro.

Estamos caceteados, vamos s'embora

 

Adeus minha terra
terra bonita
pintada de verde

com bichos exquesitos e moleques
treteiros,

abençoada pelo Deus brasileiro das
felicidades e descarrilamentos. Meu povo
amigos inimigos
canalha miúda

me despéço de todos sem excepção.

Apezar de ser inútil,

se lembrem de mim nas suas orações.

 

Está na hora.
Agora vamos.

Me acompanhe nesse passo
tão complicado.
Me ajude a morrer,
morre com a gente, irmãosinho.

 

Vamos fazer a grande besteira: rebentar os miolos

e ir receber no céo o castigo de nossos
amores
e o premio de nossas
devassidões.

 

                   Carlos Drummond de Andrade

 

(poema publicado originalmente na edição da revista
VERDE, Número 4, Anno 1, Dezembro 1927, Cataguases, MG)

 

 

 

 

 

POETAS QUE PENSARAM O MUNDO.  Ciclo de Conferências 14 de out a 8  de nov  2003.  Rio de Janeiro: Centro Cultura Banco do Brasil, 2003.  56 p.  16x26 cm. Catálogo de exposição com poemas de e textos sobre  Drummond, Lucrécio, Homero, Dante, Shakespeare, Baudelaire, Camões, Hölderlin, Valéry, Rimabud, Eliot, Goethe, Ponge, Pessoa e Ibn´Arabi.  “ Carlos Drummond de Andrade” Ex. bibl. Antonio Miranda

 

HUMOR. Caulos ,Carlos Drummond de Andrade, Claudius, Ferreira Gullar, Fortuna,
Henfil, Jaguar, Juarez, Miguel, Millôr Fernandes, Paulo Mendes Campos, Redi,
Rubem Braga, Vinicius de Moraes, Zélio, Ziraldo. /Poetas e humoristas/      Apresentados por Mario Pedrosa. Coordenação editorial e planejamento gráficoClaudius S. P. Ceccon.   S.l. Raizes Artes Gráficas, 1979. 33x51 cm.  Folhas soltas.   Tiragem: 1000 exs.  Patrocínio Banco do Brasil. Ex. bibl. Antonio Miranda

 

 

Relógio

 

– Vô,
engoli um relógio sem sentir,.
Minha barriga tá fazendo um tique-taque
que é um horror.


— Deixa de besteira, vai dormir.


— É, sim, vô. Encosta o ouvido nela.
Encosta, por favor.

 

Atendo, e o canalha solta um traque,
e um segundo traque-traque

 

 

 Veja também >>>COSACNAIF LANÇA OBRA INÉDITA DE DRUMMOND: OS 25 POEMAS DA TRISTE ALEGRIA, obra organizada por Antonio Carlos Secchin em edição especial

.  

 Vejam:  MODERNISMO : TRADIÇÃO E RUPTURA, por IVAN JUNQUEIRA, ensaio extraordinário (!!!) publicado originariamente na revista POESIA SEMPRE, da Fundação Biblioteca Nacional, em 1993. IMPERDÍVEL. Inclui texto sobre o poeta DRUMMOND DE ANDRADE:    http://www.antoniomiranda.com.br/ensaios/modernismo_tradicao_e_ruptura.html

 


Leia a Resenha do Livro: UMA EDIÇÃO DEFINITIVA DE "ALGUMA POESIA", DO DRUMMOND...  Por Antonio Miranda

 

 

 

  em Português   y   Español

 
Veja também>>> POÈMES EN FRANÇAIS

Veja também: TEXTS IN ENGLISH

 

TEXTOS EM ITALIANO

POESIA INFANTIL de C.D.A.

 

 

De
D. QUIXOTE
CERVANTES   PORTINARI   DRUMMOND
Rio de Janeiro: Fundação Ottoni de Castro Maya, 1973.
Livro com capa dura, revestida de tecido, com reproduções de
Cândido Portinari, textos de Carlos Drummond de Andrade a
partir de leituras da obra Don Quijote de la Mancha, de Cervantes.
Exemplar da Col. Antonio Miranda

 


SAGRAÇÃO

Rocinante
pasta a erva do sossego.

A Mancha inteira é calma.
A chama oculta arde
nesta fremente Espanha interior.

De giolhos e olhos visionários
me sagro cavaleiro
andante, amante
de amor cortês a minha dama,
cristal de perfeição entre perfeitas.

Daqui por diante
é girar, girovagar, a combater
o erro, o falso, o mal de mil semblantes
e recolher, no peito em sangue,
a palma esquiva e rara
que há de cingir-me a fronte
por mão de Amor-amante.

A fama, no capim
que Rocinante pasta,
se guarda para mim, em tudo a sinto,
sede que bebo, vento que me arrasta.

 

 

 

 O MACACO BEM INFORMADO

Indaga a este macaco teu passado
e ele dirá o certo e o imaginado.

O que te aconteceu na estranha lura
jamais vista de humana criatura

foi delírio ou concreta realidade,
visão inteira ou só pela metade?

Como aferir, em cada ser, a parte
que tem raiz numa insondável arte

(de Deus ou do Tinhoso) que transforma
o banal em sublime, o sonho em norma?

Tudo isto e muito mais, por um pataco
saberás, consultando este macaco.

 

===============================================

REGISTRO CIVIL

 

Ela colhia margaridas

quando eu passei. As margaridas eram

os corações de seus namorados,

que depois se transformaram em ostras

e ela engolia em grupos de dez.

 

Os telefones gritavam Dulce,

Rosa, Leonora, Carmen, Beatriz.

Porém Dulce havia morrido

e as demais banhavam-se em Ostende

sob um sol neutro.

 

As cidades perdiam os nomes

que o funcionário com um pássaro no ombro

ia guardando no livro de versos.

Na última delas, Sodoma,

restava uma luz acesa

que o anjo soprou.

E na terra

eu só ouvia o rumor

brando, de ostras que deslizavam,

pela garganta implacável.

 

Brejo das Almas  (1934)

 

 

 POEMA DE SETE FACES

 

Quando nasci, um anjo torto

desses que vivem na sombra

disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida.

 

As casas espiam os homens

que correm atrás de mulheres.

A tarde talvez fosse azul,

não houvesse tantos desejos.

 

O bonde passa cheio de pernas:

pernas brancas pretas amarelas.

Para que tanta perna, meu Deus, pergunta meu coração.

Porém meus olhos

não perguntam nada.

 

O homem atrás do bigode

é sério, simples e forte.

Quase não conversa.

Tem poucos, raros amigos

o homem atrás dos óculos e do bigode.

 

Meu Deus, por que me abandonaste

se sabias que eu não era Deus,

se sabias que eu era fraco.

 

Mundo mundo vasto mundo

se eu me chamasse Raimundo

seria uma rima, não seria uma solução.

Mundo mundo vasto mundo,

mais vasto é meu coração.

 

Eu não devia te dizer

mas essa lua

mas esse conhaque

botam a gente comovido como o diabo.

 

 

JOSÉ

E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, Você?
Você que é sem nome,
que zomba dos outros,
Você que faz versos,
que ama, protesta?
e agora, José?

Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio,
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José?

E agora, José?
sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio, - e agora?

Com a chave na mão 
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
José, e agora?

Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse,
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você cansasse,
se você morresse....
Mas você não morre,
você é duro, José!

Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja do galope,
você marcha, José!
José, para onde?

 

PROCURA DA POESIA

 

Não faças versos sobre acontecimentos.

Não há criação nem morte perante a poesia.

Diante dela, a vida é um sol estático,

não aquece nem ilumina.

As afinidades, os aniversários, os incidentes pessoais não contam.

Não faças poesia com o corpo,

esse excelente, completo e confortável corpo, tão infenso à efusão lírica.

 

Tua gota de bile, tua careta de gozo ou de dor no escuro

são indiferentes.

Nem me reveles teus sentimentos,

que se prevalecem do equívoco e tentam a longa viagem.

O que pensas e sentes, isso ainda não é poesia.

 

Não cantes tua cidade, deixa-a em paz.

O canto não é o movimento das máquinas nem o segredo das casas.

Não é música ouvida de passagem, rumor do mar nas ruas junto à linha de espuma.

 

O canto não é a natureza

nem os homens em sociedade.

Para ele, chuva e noite, fadiga e esperança nada significam.

A poesia (não tires poesia das coisas)

elide sujeito e objeto.

 

Não dramatizes, não invoques,

não indagues. Não percas tempo em mentir.

Não te aborreças.

Teu iate de marfim, teu sapato de diamante,

vossas mazurcas e abusões, vossos esqueletos de família

desaparecem na curva do tempo, é algo imprestável.

 

Não recomponhas

tua sepultada e merencória infância.

Não osciles entre o espelho e a

memória em dissipação.

Que se dissipou, não era poesia.

Que se partiu, cristal não era.

 

Penetra surdamente no reino das palavras.

Lá estão os poemas que esperam ser escritos.

Estão paralisados, mas não há desespero,

há calma e frescura na superfície intata.

Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário.

Convive com teus poemas, antes de escrevê-los.

Tem paciência se obscuros. Calma, se te provocam.

Espera que cada um se realize e consume

com seu poder de palavra

e seu poder de silêncio.

Não forces o poema a desprender-se do limbo.

Não colhas no chão o poema que se perdeu.

Não adules o poema. Aceita-o

como ele aceitará sua forma definitiva e concentrada

no espaço.

 

Chega mais perto e contempla as palavras.

Cada uma

tem mil faces secretas sob a face neutra

e te pergunta, sem interesse pela resposta,

pobre ou terrível, que lhe deres:

Trouxeste a chave?

 

Repara:

ermas de melodia e conceito

elas se refugiaram na noite, as palavras.

Ainda úmidas e impregnadas de sono,

rolam num rio difícil e se transformam em desprezo.

   

MÃOS DADAS

   

Não serei o poeta de um mundo caduco.

Também não cantarei o mundo futuro.

Estou preso à vida e olho meus companheiros.

Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças.

Entre eles, considero a enorme realidade.

O presente é tão grande, não nos afastemos,

Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas.

 

Não serei o cantor de uma mulher, de uma história,

não direi os suspiros ao anoitecer, a paisagem vista da janela,

não distribuirei entorpecentes ou cartas de suicida,

não fugirei para as ilhas nem serei raptado por serafins.

O tempo é a minha matéria, o tempo presente, os homens presentes,

a vida presente.

 

( Sentimento do Mundo)

 

CONGRESSO INTERNACIONAL DO MEDO

Provisoriamente não cantaremos o amor,
que se refugiou mais abaixo dos subterrâneos.
Cantaremos o medo, que esteriliza os abraços,
não cantaremos o ódio porque esse não existe,
existe apenas o medo, nosso pai e nosso companheiro,
o medo grande dos sertões, dos mares, dos desertos,
o medo dos soldados, o medo das mães, o medo das igrejas,
cantaremos o medo dos ditadores, o medo dos democratas,
cantaremos o medo da morte e o medo de depois da morte,
depois morreremos de medo
e sobre nossos túmulos nascerão flores amarelas e medrosas.

                            ( De Sentimento do Mundo)

OS MORTOS

Na ambígua intimidade
que nos concedem
podemos andar nus
diante de seus retratos.
Não reprovam nem sorriem
como se neles a nudez fosse maior.

                   (De Lição de Coisas)

 

         

 

 

De

O AMOR NATURAL,

1992

 

SUGAR E SER SUGADO PELO AMOR

 

Sugar e ser sugado pelo amor

no mesmo instante     boca milvalente

o corpo dois em um    o gozo pleno

que não pertence a mim nem te pertence

um gozo de fusão difusa transfusão

o lamber o chupar o ser chupado

         no mesmo espasmo

é tudo boca boca boca boca

sessenta e nove vezes boquilíngua.

 

 

             DE ARREDIO MOTEL EM COLCHA DE DAMASCO

 

De arredio motel em colcha de damasco

viste em mim teu pai morto, e brincamos de incesto.

A morte, entre nós dois, tinha parte no coito.

O brinco era violento, misto de gozo e asco,

e nunca mais, depois, nos fitamos no rosto. 

 

 

O QUE SE PASSA NA CAMA

 

(O que se passa na cama

é segredo de quem ama.)

 

É segredo de quem ama

não conhecer pela rama

gozo que seja profundo,

elaborado na terra

e tão fora deste mundo

que o corpo, encontrando o corpo

e por ele navegando,

atinge a paz de outro horto,

noutro mundo: paz de morto,

nirvana, sono de pênis.

 

Ai, cama, canção de cuna,

dorme, menina, nanana,

dorme a onça suçuarana,

dorme a cândida vagina,

dorme a última sirena

ou a penúltima... O pênis

dorme, puma, americana

fera exausta. Dorme, fulva

grinalda de tua vulva.

E silenciam os que amam,

entre lençol e cortina

ainda úmidos de sêmen,

estes segredos de cama.

 

 

PARA O SEXO A EXPIRAR

 

Para o sexo a expirar, eu me volto, expirante.

Raiz de minha vida, em ti me enredo e afundo.

Amor, amor, amor — o braseiro radiante

que me dá, pelo orgasmo, a explicação do mundo.

 

Pobre carne senil, vibrando insatisfeita,

a minha se rebela ante a morte anunciada.

Quero sempre invadir essa vereda estreita

onde o gozo maior me propicia a amada.

 

Amanhã, nunca mais. Hoje mesmo, quem sabe?

enregela-se o nervo, esvai-se-me o prazer

antes que, deliciosa, a exploração acabe.

 

Pois que o espasmo coroe o instante do meu termo,

e assim possa eu partir, em plenitude o ser,

de sêmen aljofrando o irreparável ermo.

 

  

(Extraído de  O AMOR NATURAL.  Rio de Janeiro: Record, 1992)

Poesia erótica. Poesia sensual.

 


OUTROS POEMAS


CONFIDÊNCIA DE ITABIRANO

Alguns anos vivi em Itabira.
Principalmente nasci em Itabira.
Por isso sou triste, orgulhoso: de ferro.
Noventa por cento de ferro nas almas.
E esse alheamento do que na vida é porosidade e comunicação.

A vontade de amar, que me paralisa o trabalho,
vem de Itabira, de suas noites brancas, sem mulheres e sem horizontes.

E o hábito de sofrer, que tanto me diverte,
é doce herança itabirana.

De Itabira trouxe prendas diversas que ora te ofereço:
este São Benedito do velho santeiro Alfredo Duval;
esta pedra de ferro, futuro aço do Brasil;
este couro de anta, estendido no sofá da sala de visitas;
este orgulho, esta cabeça baixa...

Tive ouro, tive gado, tive fazendas.
Hoje sou funcionário público.
Itabira é apenas uma fotografia na parede.
Mas como dói!

                   (Sentimento do Mundo, 1940)

 

CONVERSA

 

Há sempre uma fazenda na conversa
bois pastando na sala de visitas
divisas disputadas, cercas a fazer
porcos a cevar
a bateção dos pastos
a pisadura da égua
de testa — e vejo o céu — testa estrelada.

Há sempre
uma família na conversa.
A família é toda a história: pri8mos
desde os primeiros degredados
filhos de Eva
até Quinquim Sô Lu Janjão Tatau
Nonô Tavinho Ziza Zito
e tios, tios-avósm de tão barbado-brancos
tão seculares, que são árvores.
Seus passos arrastam folhas. Ninhos
na moita do bigode. Aqui presentes
avós há muito falecidos. Mas falecem
deveras os avós?
Alguém desta clã é bobo de morrer?
A conversa o restaura e faz eterno.

Há sempre uma fazenda, uma família
entreliçadas na conversa:
a mula & o muladeiro
o casamento, o cocho, a herança, o dote, a aguada
o poder, o brasão, o vasto isolamento
da terra, dos parentes sobre a terra.

                            (Boitempo, 1968)

 

PARA SEMPRE

Por que Deus permite
que as mães vão-se embora?
Mão não tem limite,
È tempo sem hora,
luz que se apaga
quando sopra o vento
e chuva desaba,
veludo escondido
na pele enrugada,
água pura, ar puro,
puro pensamento.

Morrer acontece
com o que é breve e passa
sem deixar vestígio.

Mãe, na sua graça,
é eternidade.
Por que Deus se lembra
— mistério profundo —
de tirá-la um dia?
Fosse eu Rei do Mundo,
baixava uma lei:
Mãe não morre nunca,
mãe ficará sempre
junto do filho
e ele, velho embora,
será pequenino
feito grão de milho.

                   (Lição de Coisas, 1962)

 

AINDA QUE MAL

Ainda que mal pergunte,
ainda que mal respondas;
ainda que mal te entenda,
ainda que mal repitas;
ainda que mal insista,
ainda que mal desculpes;
ainda que mal me exprima,
ainda que mal me julgues;
ainda mal me mostre,
ainda que mal me vejas;
ainda que mal te encare,
ainda que mal te furtes;
ainda que mal te siga,
ainda que mal te voltes;
ainda que mal te ame,
ainda que mal o saibas;
ainda que mal te agarre,
ainda que mal te mates;
ainda assim te pergunto
e me queimando em teu seio,
me salvo e me dano: amor.

         (As impurezas do branco, 1973)

 

 

 

ANDRADE, Carlos Drummond deDeclaração de amor: canção de namorados.  Ilustrações de Nik Neves. São Paulo, SP: Companhia das Letras, 2015.  63 p.  125x18 cm.  Projeto gráfico: Marco Valadares. ISBN  978-85-359-2591-3  “ Carlos  Drummond de Andrade “  Ex. Bibl. Antonio Miranda

 

 

Destruição

 

Os amantes se amam cruelmente

e com se amarem tanto não se vêem.

Um se beija no outro, refletido.

Dois amantes que são? Dois inimigos.

 

Amantes são meninos estragados

pelo mimo de amar: e não percebem

quanto se pulverizam no enlaçar-se,

e como o que era mundo volve a nada.

 

Nada, ninguém. Amor, puro fantasma

que os passeia de leve, assim a cobra

se imprime na lembrança de seu trilho.

 

E eles quedam mordidos para sempre.

Deixaram de existir, mas o existido

continua a doer eternamente.

 

 

 

ANDRADE, Carlos Drummond deCantar de amigos – poemas de Carlos Drummond de Andrade.  Rio de Janeiro: Edições Alumbramento, 1989.  48 p. 16x26 cm.   Faz parte de uma caixa em que contém o livro “ Álbum para Maria Julieta”, uma coletânea de dedicatórias que a filha de Drummond desenvolveu com amigos do poeta que o visitavam, nesta edição em forma fac-similar, acondicionamento em caixa de papelão. Criação editorial, seleção de textos, diagramação e direção gráfica: Tiragem: 2000 exs. Ex. bibl. Antonio Miranda

 

A seguir, um dos poemas do livreto:

 

 

CONSIDERAÇÃO DO POEMA


NÃO RIMAREI a palavra sono
com a incorrespondente palavra outono.
Rimarei com a palavra carne
ou qualquer outra, que todas me convêm.
As palavras não nascem amarradas,
elas saltam, se beijam, se dissolvem,
no céu livre por vezes um desenho,
são puras, largas, autênticas, indevassáveis.

Uma pedra no meio do caminho
ou apenas um rastro, não importa.
Estes poemas são meus. De todo o orgulho,
de toda a precisão se incorporaram
ao fatal meu lado esquerdo. Furto a  Vinícius
sua límpida elegia. Bebo em Murilo.
Que Neruda me dê sua gravata
chamejante. Me perco em Apollinaire. Adeus, Maiakoviski.
São todos meus irmãos, não são jornais
nem deslizar de lancha entre camélias:
é toda a minha vida que joguei.

Estes poemas são meus. É minha terra
e é ainda mais do que ela. É qualquer homem
ao meio-dia em qualquer praça. É a lanterna
em qualquer estalagem, se ainda as há.
— Há mortos? há mercados? há doenças?
É tudo meu. Ser explosivo, sem fronteiras,
por que falsa mesquinhez me rasgaria?
Que se depositem os beijos na face branca,
                    nas principiantes rugas.
O beijo é ainda um sinal, perdido embora,
da ausência de comércio,
boiando em tempos sujos.

Poeta do finito e da matéria,
cantor sem piedade, sim, sem frágeis lágrimas,
boca tão seca, mas ardor tão casto.
Dar tudo pela presença dos longínquos,
sentir que há ecos, poucos, mas cristal.
Não rocha apenas, peixes circulando
sob o navio que leva esta mensagem,
e aves de bico longo conferindo
sua derrota, e dois ou três faróis,
os últimos! esperança  domar negro.
Essa viagem é mortal, e começá-la.
Saber que há tudo. E mover-se em meio
a milhões e milhões de formas raras,
secretas, duras. Es aí meu canto.

Ele é tão baixo que sequer o escuta
ouvido rente ao chão. Mas é tão alto
que as pedras o absorvem. Está na mesa
aberta em livros, cartas e remédios.
Na parede infiltrou-se. O bonde, a rua,
o uniforme de colégio se transformam,
são ondas de carinho te envolvendo.

Como fugir ao mínimo objeto
ou recusar-se ao grande? Os temas passam,
eu sei que passarão, mas tu resistes,
e cresces como fogo, como casa,
como orvalho entre dedos,
na grama, que repousam.

Já agora te sigo a toda parte,
e te desejo e te perco, estou completo,
me destino, me faço tão sublime,
tão natural e cheio de segredos,
tão firme, tão fiel..  Tal uma lâmina,
o povo, meu poema, te atravessa.
 

 

 

 

 

 

10 POEMAS EM MANUSCRITO.  Organizador: João Condé Filho. Rio de Janeiro: Edições Condé, 1945.  Folhas soltas, dobradas.  29x39 cm. Prefácio de Álvaro Lins.  Capa de Santa Rosa. 

Inclui poemas manuscritos de Abgar Renault, Cecília Meireles, Murilo Mendes e Augusto Meyer ilustrados por Tomas Santa Rosa; poemas de Jorge de Lima, Mário de Andrade e Vinicius de Moraes ilustrados por Percy Deane; poemas de Augusto Frederico Schmidt, Carlos Drummond de Andrade  e Manoel Bandeira ilustrados por Cândido Portinari. A clicheria foi executada por Latt & Cia Ltda e a impressão esteve a cargo do mestre  João Luis dos Santos, nas oficinas gráficas dos Irmãos Pongetti.  “Desta  edição foram tirados 15 exemplares F.C., numerados de I a XV e destinados ao prefaciador, aos poetas e aos ilustradores e 150 exemplares numerados de 1 a 150, compostos em papel Goatskin Parchment e com a rubrica do organizador. Exemplar n. 132. Col. bibl. Antonio Miranda. 

 

 

Poema de Carlos Drummond de Andrade, ilustrado por Portinari.   

 

  

 

         FRAGILIDADE                                           

                      

Este verso, apenas um arabesco

em torno do elemento essencial - inatingível.

Fogem nuvens de verão, passam ares, navios, ondas,

e teu rosto é quase um espelho onde brinca o incerto movimento,

ai! já brincou, e tudo se fez imóvel, quantidades e quantidades

de sono se depositam sobre a terra esfacelada.

 

Não mais o desejo de explicar, e múltiplas palavras em feixe

subindo, e o espírito que escolhe, o olho que visita, a música

feita de depurações e depurações, a delicada modelagem

de um cristal de mil suspiros límpidos e frígidos: não mais

que um arabesco, apenas um arabesco

abraça as coisas, sem reduzi-las.

 

 

 

 

Imagem extraída  de

DIAS-PINO, Wlademir.  A lisa escolha do carinho (Rio de Janeiro: Edição Europa, s.d.  
20,5x20,5 cm.  33 f. ilustradas  (Coleção Enciclopédia Visual).   Inclui versos de 
poetas brasileiros

 

ANDRADE, Carlos Drummond de.  Canto Mineral. Ilustrado por Carlos Bracher.  Organizadores Joziane Perdigão Vieira & Pedro Augusto Graña Drummond, Joziane Perdigão Vieira. Rio de Janeiro (RJ): Bazar do Tempo, 2018. 148 p. ilus  20 x 25 cm.  ISBN 978-8s5-69924-37-1   Ex. bibl. Antonio Miranda

 

Existem muitas edições de obras de C. D. A. no mercado, livrarias e em sebos físicos e virtuais. Esta é especial. Com ilustrações vívidas, refletindo os poemas. Vale a pena conferir!!!

 

 

Um mineiro se confessa
neste livro por inteiro.
Jeitão mineiro não cessa
nem no Rio de Janeiro.

Carlos Drummond de Andrade in Viola de bolso

 

Pedra natal

ita              bira
pedra luzente          candeia seca
pedra empinada               sonso em decúbito
pedra pontuda                tempo e desgaste
pedra falante               sem confidência
pedra pesante           paina de ferro
por toda a vida    viva vivia

pedra
mais nada

 

 

Ruas

Por que ruas tão largas?
Por que ruas tão retas?
Meu passo torto
foi regulado pelo becos tortos
de onde venho.
Não sei andar na vastidão simétrica
implacável.
Cidade grande é isso?
Cidades são passagens sinuosas
de esconde-esconde
em que as casas aparecem-desaparecem
quando bem entendem

e todo mundo acha normal.
Aqui tudo é exposto
evidente
cintilante. Aqui
obrigam-me a nascer de novo, desarmado.

 

DUAS PALAVRAS:  Uma publicação da Biblioteca Pública Estadual Luis de Bessa. Belo
Horizonte, MG; 1983-   
v. 1- No. 0-Out. 1983-  Ex. bibl. Antonio Miranda

 

Poemas perdidos” de CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE” publicados originalmen da Revista Acadêmica, de maio de 1922, escritos na fase inicial do poeta mineiro, bem diferente de sua poética conhecida...

 

 

 

 

TEXTOS EN ESPAÑOL

 

 

Retrato a óleo por Cândido Portinari,

1936, 72x58cm.

 

CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE


BÚSQUEDA DE LA POESÍA

 

Trad. de Jaime Tello

 

No hagas versos sobre acontecimientos.

No hay creación ni muerte ante la poesía.

Ante ella, la vida es un sol extático,

ni calienta ni ilumina.

Las afinidades, los aniversarios, los incidentes personales no cuentan.

No hagas poesía con el cuerpo.

ese excelente, completo y confortable cuerpo, tan indefenso a la efusión lírica.

Tu gota de bilis, tu careta de gozo o del dolor en la sombra

son indiferentes.

Ni me reveles tus sentimientos,

que se prevalecen del equívoco e intentan el largo viaje.

Lo que piensas y sientes, tampoco eso es poesía.

 

No cantes a tu ciudad, déjala en paz.

El canto no es el movimiento de las máquinas ni el secreto de las casas.

No es música de paso; rumor del mar en las calles junto a la línea de espuma.

El canto no es la naturaleza

ni los hombre en sociedad.

Para él, lluvia y noche, fatiga y esperanza nada significan.

La poesía (no saques la poesía de las cosas) elide sujeto y objeto.

 

No dramatices, no invoques,

no indagues. No pierdas tiempo em mentir.

No te aborrezcas.

Tu yate de marfil, tu zapatilla de diamante,

vuestras mazurcas y errores, vuestros esqueletos de familia

desaparecen en la curva del tiempo, son algo imprestable.

 

No recompongas

tu sepultada y melancólica infancia.

No osciles entre el espejo y la

memoria en disipación.

Lo que se disipó no era poesía.

Lo que se quebró cristal no era.

 

Penetra sordamente en el reino de las palabras.

Allí están los poemas que esperan ser escritos.

Están paralizados, mas no hay que desesperar,

hay calma y frescura en la superficie intacta.

Helos allí solos y mudos, en estado de diccionario.

Convive con tus poemas, antes de escribirlos.

Ten paciencia, si son oscuros. Calma, si te provocan.

Espera que cada uno se realice y consuma

con su poder de palabra

y su poder de silencio.

No fuerces el poema a desprenderse del limbo.

No recojas del suelo el poema que se perdió.

No adules el poema. Acéptalo

como él aceptará su forma definitiva y concentrada

en el espacio.

Acércate y contempla las palabras.

Cada una

tiene mil rostros secretos sobre el rostro neutro

y te pregunta, sin interés por la respuesta,

pobre o terrible, que le dieres:

¿Trajiste la llave?

 

Fíjate:

yermas de melodía y concepto,

las palabras se refugian en la noche.

Aún húmedas e impregnadas de sueño,

ruedan en un río difícil y se transforman en desprecio.

 

 

Extraído de CUATRO SIGLOS DE POESÍA BRASILEÑA. Introducción, traducción y notas de Jaime Tello.  Caracas: Centro Abreu e Lima de Estudios Brasileños; Instituto de Altos Estudios de América Latina, Universidad Simón Bolívar, 1983.  254 p.

 


ANDRADE, Carlos Drummond de. Dos poemas. Traducidos por Manuel Graña Etcheverry.  Buenos Aires: Ediciones Botella al mar, 1953.  47 p.  12,5x18,5 cm.Portada/capa de Luís Seoane.   “ Carlos Drummond de Andrade “  Ex. bibl. Antonio Miranda.

  

 

MANOS DADAS

 

Trad. de Manuel Graña Etcheverry

 

 

No seré el poeta de um mundo caduco.

Tampoco cantaré el mundo futuro.

Estoy preso a la vida y miro a mis compañeros.

Están taciturnos, pero nutren grandes esperanzas.

Entre ellos, considero la enorme realidad.

El presente es tan grande, no nos alejemos.

No nos alejemos mucho, vayamos de manos dadas.

 

No seré el cantor de una mujer, de una historia,

no diré los suspiros al anochecer, el paisaje visto desde la ventana,

no distribuiré alcaloides o cartas de suicida,

no huiré a las islas ni seré raptado por serafines.

El tiempo es mi materia, el tiempo presente, los hombres presentes,

la vida presente.

 

 

Extraído de Poetas portugueses y brasileños de los simbolistas a los modernistas. Organización y estudio introductorio: José Augusto Seabra. Buenos Aires: Instituto Camões; Brasilia: Thesaurus, 2002. 472 p.



CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE

De
AMAR-AMARGO y otros poemas
Traducción de Estela dos Santos
Buenos Aires: Calicanto, 1978

JOSÉ
(fragmento)
        
¿Y ahora José?
tu dulce decir
tu instante afiebrado,
tu gula y tu ayuno,
tu biblioteca,
tu alfiler de oro,
tu par de anteojos,
tu incoherencia,
tu odio ¿y ahora?

Con la llave en la mano
quieres abrir la puerta,
no hay puerta;
quieres morir en el mar
pero el mar se seco;
quires ir a Minas,
no existe Minas.
José ¿y ahora?

Si  gritaras,
si  gimieras,
si  tocaras
un vals vienés,
si  durmieras,
si  te cansaras,
si  te murieras...
¡Pero no te mueres,
eres duro, José

Solo en la oscuridad
como un animal del monte,
sin teogonía,
sin pared libre
donde apoyarte,
sin caballo negro
que huye al galope,
¡caminas, José!
José ¿hacia dónde? 


CONGRESO INTERNACIONAL DEL MIEDO

Provisoriamente no cantaremos el amor,
que se refugió debajo de los subterráneos.
Cantaremos el miedo que esteriliza los abrazos,
no cantaremos el odio porque no existe,
sólo existe el  miedo,  nuestro padre y compañero,
el miedo grande de las llanuras, de los mares, de los desiertos,
el miedo de los soldados, el miedo de las madres,
                   el miedo de las Iglesias,
cantaremos el miedo de los dictadores, el miedo de los demócratas,
cantaremos el miedo a la muerte  y el miedo de después de la muerte,
después moriremos de miedo
y sobre nuestras tumbas nacerán flores amarillas y temerosas.

 

LOS MUERTOS

En la ambigua intimidad
que nos conceden
podemos andar desnudos
delante de sus retratos.
No reprueban ni sonríen
como si en ellos la desnudez fuera mayor.

 

Extraído de:
24 POETAS LATINOAMERICANOS. Antología de poesía para nuevos lectores.
Selección y prólogo: Francisco Serrano. 
Caracas: CERLALC, 2004.  254 p   15,5x21,5 cm.  Inclui poemas de Carlos Drummond de Andrade e João Cabral de Melo Neto.  Col. Bibl. Antonio Miranda

 

 

 

Himno Nacional

 

¡Necesitamos descubrir el Brasil!

Escondido atrás de las selvas.

Como el agua a la mitad de los ríos,

el Brasil está dormido, pobre.

Necesitamos colonizar el Brasil.

 

Lo que haremos importando francesas

muy rubias, de pelo suave,

alemanas gordas, rusas nostálgicas para

Gorgonnettes de los restaurantes nocturnos.

Y vendrán sirias fidelísimas.

No conviene despreciar las japonesas...

 

Necesitamos educar al Brasil.

Compraremos profesores y libros,

asimilaremos refinadas culturas,

abriremos dancings y subvencionaremos élites.

 

Cada brasileño tendrá su casa

con buzón y calentador eléctricos, piscina,

salón para conferencias científicas.

Y cuidaremos del Estado Técnico.

Necesitamos alabar al Brasil.

No sólo es un país sin igual.

Nuestras revoluciones son aún mayores

que otras cualesquiera; nuestros errores también.

 

¿Y nuestras virtudes? La tierra de las pasiones sublimes...

las Amazonas inenarrables... los increíbles Joao-Pessoas...

 

¡Necesitamos adorar al Brasil!

Bien que sea difícil que quepa tanto, océano y tanta soledad

en el pobre corazón lleno ya de compromisos...

bien que sea difícil comprender lo que quieren esos hombres,

por qué motivo ellos se reunieron y

cuál es la razón de sus sufrimientos.

 

¡Necesitamos, necesitamos olvidar al Brasil!

Tan majestuoso, tan sin límites,, tan sin propósitos,

él quiere descansar de nuestro terrible cariño.

¡El Brasil no nos quiere! ¡Está harto de nosotros!

Nuestro Brasil está en otro mundo. Este no es nuestro Brasil.

No existe Brasil alguno. ¿Existirán acaso los brasileños?

 

ANDRADE, Carlos Drummond dePoemas. Introducción de Francisco Bendezú. Traducción de Leonidas Cevallos Mesones.  Lima, Perú: Centro de Estudos Brasileiros, 1978.   81 p.    10,5x20,5 cm.   “ Carlos Drummond de Andrade “  Ex. bibl. Antonio Miranda

 

 

O enterrado vivo

 

É sempre no passado aquele orgasmo,

é sempre no presente aquele duplo,

é sempre no futuro aquele pânico.

 

É sempre no meu peito aquela garra.

É sempre no meu tédio aquele aceno.

É sempre no meu sono aquela guerra.

 

É sempre no meu trato o amplo distrato.

Sempre na minha firma a antiga fúria.

Sempre no mesmo engano outro retraio.

 

É sempre nos meus pulos o limite.

É sempre nos meus lábios a estampilha.

É sempre no meu não aquele trauma.

 

Sempre no meu amor a noite rompe.

Sempre dentro de mim meu inimigo.

É sempre no meu sempre a mesma ausência.

 

 

El enterrado vivo

 

Está siempre en el pasado el mismo orgasmo,

y siempre en el presente el mismo doble,

y siempre en el futuro el mismo pánico.

 

Esta siempre en mi pecho la misma garra.

Y siempre en mi tedio la misma llamada.

Y siempre en mi sueño la misma guerra.

 

Está siempre en mi acuerdo el gran desacuerdo.

Siempre en mi firma la antigua furia.

Siempre en el mismo engaño otro retrato.

 

Está siempre en mis saltos el límite.

Y siempre en mis labios la estampilla.

Y siempre en mi no el mismo trauma.

 

Y siempre en mi amor la noche rompe.

Y siempre dentro de mí mi enemigo.

Y en mi siempre la misma ausencia siempre.

 

De Fazendeiro do ar (19S2-19S3)

 

 

 Metadados: Mãe (poesia); Itabira (Minas Gerais); Metapoesia; Metapoema; Poesia erótica. Modernismo.

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UN MINUTO DESPUÉS

 

          Desnudez, último velo del alma,
          que aun así prosigue oculta.
          El fértil linguaje del cuerpo
          no la detecta ni la descifra.
          Pero más allá de la piel, de los músculos,
          de los nervios, de la sangre, de los huesos,
          rechaza el intimo contacto,
          el casamento floral, el abrazo
          divinizante de la materia
          embriagada para siempre
          por la sublime conjunción.
          Ay de nosotros, mendigos hambrientos:
          Presentimos sólo las migajas
          de ese banquete más allá de las nubes
          contingentes de nuestra carne.
          Y por eso el deleite es triste
          un minuto después del éxtasis.

 

 

(Corpo, 1984)  Traductor: ÓSCAR LIMACHE.

 

Extraído de DIENTE DE LEÓN  - cipselas de difusión poética. N. 6, agosto de 2012. 

Director: Óscar Limache.

 

 

 

ANDRADE, Carlos Drummond de.  Poemas. Selección, versión y prólogo de Rafael Santos Torroella. Madrid: Ediciones Rialp, 1951.  75+11p.   11,x14,5 cm.  “Esta primera edición , VOLUMEN XXII de la Coleción Adonais...) Exemplar n. 35.  Ex. bibl. Antonio Miranda

 

 

Traducciones de Rafael Santos Torroella

 

 

         INFANCIA

                            A Abgar Renault

 
Mi padre montaba el caballo; se iba al campo.
Mi madre se quedaba sentada cosiendo.
Mi Hermano pequeno dormía.
Yo niño solito entre mangles
leia la historia de Robinson Crusoé,
larga historia que no se acababa nunca.

         En el mediodía blanco de luz una voz que aprendió
a brizar al fondo de la senzala* — y nunca se olvidó —
llamaba para el café.
Café más negro que una vieja negra,
café gustoso,
buen café.  

         Mi madre se quejaba sentada cosiendo
mirando para mí:
—Psiu... No despierte al niño.
Detiene la cuna donde se posó un mosquito.
Y daba un suspiro...
¡ Cuán hondo!

         Allá lejos mi padre cabalgaba
por la selva sin fin de la hacienda.

         Y yo no sabía que mi historia
era más bonita que la de Robinson Crusoé.

 

                                      (De Alguna Poesía, 1925-30.)

 

*Dependencia para la servidumbre negra en las casas de los hacendados.

 

 

 

         RESIDUO

 

         De todo quedó un poco.
De mi miedo.  De tu asco.
De los gritos entrecortados.  De la rosa
quedó um poco.

         Quedó un poco de luz
aderida al sombrero.
En los ojos de rufián
quedó uns poco de ternura
(muy poco).

         Poco quedó de este polvo
con que tu blanco zapato
se cubrió.  Quedaron pocas
ropas, pocos velos rotos,
poco, poco, muy poco.

         Mas de todo queda un poco.
Del puente bombardeado,
de las hojas de hierba,
del paquete
— vacío — de cigarros quedó un poco.

         Pues de todo queda un poco.
Queda un poco de tu quijada
en la quijada de tu hija.
De tu áspero silencio
un poco quedó, un poco
en los muros aborrecidos,
en las hojas, mudas, que suben.

         Quedó un poco de todo
en el platillo de porcelana,
dragón partido, flor blanca,
quedó un poco
de arruga en tu cabeza,
retrato.

         Si de todo queda un poco,
¿por qué no quedaría
un poco de mí? ¿En el tren
que lleva al norte, en el barco,
en los anuncios de periódico,
un poco de mí en Londres,
un poco de mí en algún sitio?
¿en la consonante?.

¿en el pozo?

 

Un poco queda oscilando

en las bocas de los ríos

y los peces no lo evitan,

un poco: no está en los libros.

 

De todo queda un poco.

No mucho. De una espita

cae esta gota absurda

medio sal y medio alcohol,

salta esta pata de rana,

este cristal de reloj,

partido en mil esperanzas,

este cuello de cisne,

este secreto infantil...

De todo quedó un poco:

de mí; de ti; de Abelardo.

Cabello en mi manga,

de todo quedó un poco;

viento en mis oídos,

torpe eructo, gemido

de víscera informe,

y minúsculos artefactos:

campanilla, alvéolo, cápsula

de revólver... de aspirina...

De todo quedó un poco.

 

Y de todo queda un poco.

Oh, abaré los frascos de loción

y ahoga

el hedor insoportable de la memoria.

 

Mas de todo, terrible, queda un poco,

y bajo las olas del mar,

y bajo la nubes y los vientos,

y bajos los puente y bajo los túneles,

y bajo la llamas y bajo el sarcasmo,

y bajo la baba y bajo el vómito,

y bajo el sollozo, la cárcel, lo olvidado,

y bajo los espectáculos y bajo la muerte de escarlata,

y bajo la bibliotecas, los asilos, las iglesias triunfantes.

y bajo tú mismo, y bajo tus pies ya endurecidos,

y bajo los goznes de la familia y de la clase,

queda siempre un poco de todo.

A veces un botón. A veces una rata.

 

(De A Rosa do Povo, 1943-45.)

 

 

 

VERSOS A PLENA NOCHE

 

 

Noto que el tiempo abate sobre mí

su mano pesad. Arrugas, dientes, calva....

Una mayor aceptación de todo

y el temor a nuevos descubrimientos.

 

¿Escribiré sonetos de madurez?

¿Le daré a los otros la ilusión de la calma?

¿Seré un loco siempre? ¿Siempre mentiroso?

¿Creeré en mitos? ¿Me reiré del mundo?

 

Hace mucho que sospeché el viejo en mí.

Un niño todavía y ya me atormentaba.

Hoy estoy solo. No surge ningún niño

de mi vida, para restaurarla.

 

¡Pero si pudiese volver a empezar el día!

Emplear de nuevo mi adoración,

mi grito, mi hambre... Lo veo todo

imposible y nítido, en el espacio.

 

Allí hasta donde no llegó mi ironia,

entre ídolos de rostro cargado,

quedaste, explicación de mi vida,

como los objetos perdidos en la calle.

 

Se multiplicaron experiencias:

viajes, hurtos, altas soledades,

la desesperación, hoy cristal frío,

la melancolía, amada y repelida,

 

y la indecisión entre dos mares,

entre dos mujeres, dos trajes.

Toda esta mano para hacer un ademán

que, sin embargo, no se modela nunca,

 

que queda inerte, zona de deseo

selada por arbustos agresivos.

(Un hombre se contempla sin amor,

se desnuda sin ninguna curiosidad.)

 

Pero llega el tiempo y la idea del pasado

a visitarte en la curva de un jardín.

Lega el recuerdo, y te introduce

dentro de un cine, subitamente.

 

Y los recuerdos resbalan de cuello,

de la chaqueta, de la guerra, del arco iris:

invaden tu sueño, te persiguen,

en busca de la pupila que los refleja.

 

Y tras los recuerdos viene el tiempo

a traer nuevas provisiones de recuerdos,

hasta que, fatigado, te resistas

y no sepas si la vida es o no fué.

 

Esta casa, que miras al pasar,

¿está en el Acre, ¿en la Argentina? ¿en ti?

¿Qué palabra oíste, donde, cuándo,

era indiferente o compañera?

 

Un pedazo de ti rasga la neblina,

vuela tal vez hacia Bahia y deja

otros pedazos, repartidos por el atlas,

en el Reino de las Hadas o en tu ama negra.

 

¡Qué confusión de cosas en el crepúsculo!

¡Qué riqueza! Sin provecho, ciertamente.

Fuera bueno recogerlas y componerlas

en un todo sabio, ya que sensible:

 

un orden, una luz, una alegría

cayendo sobre el hombre despojado.

Ya no era el furor de los veinte años,

ni la renuncia a las cosas que eligió,

 

sino la penetración en una madera dócil,

un zambullirse en la piscina, sin esfuerzo,

un hallazgo sin dolor, una fusión,

una inteligência del universo

 

comprada con sal, con arrugas y con cabellos.

 

(De A Rosa do Povo, 1943-45.)

 


 


 

Destrucción

 

Los amantes se aman cruelmente
y con amarse tanto no se ven.
Uno se besa con otro, reflejado.
Dos amantes ¿qué son? Dos enemigos.

Los amantes son niños corrompidos
por el mimo de amar: y no perciben
cuánto se pulverizan si se abrazan,
y cuál lo que era mundo vuelve a nada.

Nada, nadie. Amor, puro fantasma
que los pasea suave, así la cobra
se imprime en el recuerdo del camino.

Y ellos quedan mordidos para siempre.
Dejaron de existir, mas lo existido
continua doli
endo eternamente.

 

 

Cuadrilla

 

Juan amaba a Teresa que amaba a Raimundo
que amaba a Mana que amaba a Joaquin
que amaba a Lili
que no amaba a nadie.
Juan se fue a Estados Unidos, Teresa al convento,
Raimundo se mató en un accidente,
Maria se quedó para vestir santos,
Joaquin se suicidó y Lilí se casó con
J. Pinto Fernandes que nada tenía que ver
con esta historia.

 

 

 

VITUREIRA, Cipriano S.  Manuel Bandeira, Cecília Meireles, Carlos Drummond de Andrade - Tres edades en la Poesía Brasileña actual. Estudio y antología.  Dibujos de  Adolfo Pastor.  Montevideo: Ediciones A.C.E.B.U. , 1952.    Exemplar n. 16,  assinada pelo Autor, de uma  tiragem especial de 60 exs. Ex. bibl. Antonio Miranda

 

                   

 

CONSIDERACIÓN DEL POEMA

 

   No rimaré con la palabra sueño
su no correspondiente palabra dueno. (*)

La rimaré con la palabra carne
o con cualquicra otra; todas me convienen.
Las  palabras  no  nacen amarradas,
ellas saltan, se besan, se disuelven,
son en el cielo libre a veres un dibujo,
son puras, anchas, auténticas, incorruptibles.

 

   Una piedra en  el médio  dei camino
o sólo un rastro, nada de eso importa.
Estos poetes son míos. Ellos con todo orgullo
con toda precisión se incorporaron
a mi fatal lado izquierdo. Robo a Vinícius
su más límpida elegia. Bebo en Murilo.
Que Neruda me alcance su corbata

Hameante. Me hundo en Apollinaire. Adiós, mi Maiacovski.

 

    Son todos mis hermanos, no son periódicos
ni un deslizar de lancha entre camélias:
es la vida total que me he jugado.

 

          Estos poemas son míos. Es mi tierra
y más que ella. Es cualquier hombre
de mediodía en cualquier plaza. Es la linterna
en alguna posada, si alguna queda todavia.
—¿Hay muertos? ¿hay mercados?
¿hay dolencias?
Todo eso es mío. Ser explosivo, sin fronteras
¿por qué falsa mezquindad me desharía?

¡Que se depositen los besos en el rostro Manco, en las
                                                           primeras arrugas!

 

   El beso todavia es una señal, aunque se pierda,
de la ausencia del comercio,
flotando en tiempos sucios.

 

   Poeta de lo finito y de la materia
cantor ya sin piedad, si, sin fáciles lágrimas
boca tan seca, per o ardor tan casto!
Dar todo por la presencia de las lejanías,
sentir que hay ecos, poços, pero cristal
no roca solamente; y peces circulando
bafo el navío que lleva este mensaje,
y aves de pico largo constatando
su derrota; y dos o tres fanales
¡los últimos! esperanza dei mar negro.
Ese viaje es mortal... pues comenzarlo.
Saber que todo existe. Y moverse en el medio
de mães de millones de formas raras,
secretas, duras. Ese mi canto.

 

   El es tan bajo que se escucha apenas
con el oído contra el suelo. Pero es tan alto
que las piedras lo absorben. Está en la mesa
abierta en libros, cartas y remedios.
En el muro infiltróse. Y el tranvía, la calle,
el uniforme del colégio se transforman,
son ondas de

   ¿Cómo escapar al más mínimo objeto
o rehusarse al grande? Los temas pasan
yo sé que pasarán, más tú resistes,
y creces como fuego, como casa,
como rocío entre los dedos
en la grama, que reposan.

 

   Y ahora te sigo a todas partes,
te deseo y te pierdo, estoy completo,
me destino, me vuelvo tan sublime,
tan natural y lleno de secretos,
tan seguro, tan fiel... Como una lámina
el pueblo ¡oh mi poema!, te atraviesa.

 

 

(*)     El original dice "sono" y "outono" (sueño y otoño) al pie de los dos primeros versos. El traductor quiso mantener la unidad idiomática en su versión, para lo cual, debiendo mantener también la rima, —fundamental elemento de la ironía del autor— creyó oportuno cambiar otoño por dueño. Créase así semejante incompatibibdad de sentido entre los dos términos rimados, manteniéndose también la principal palabra "sueño" que pareceria relacionarse luego con carne, en cierto respeto materialista.

 

 

(De "Rosa de pueblo" 1945)

 

 

 

 

MILOSZ, Czeslaw.  Um libro de cosas luminosas. Antología de poesía internacionalSelección y edición de José Javier Villarreal. Traducción dee Martha Fabela y José Javier VillarrealMonterrey, México: Universidad Autónoma de Nuevo León, 2009.  93 p.   Ex. bibl. Antonio Miranda

 

 

         En medio del caminho

         En medio del camino había una piedra
había una piedra en medio del caminho
había una piedra
en medio del caminho había una piedra.

         Nunca olvidaré ese hecho
en la vida de mis retinas fatigadas.
Nunca olvidaré que en medio del camino
había una piedra
había una piedra en medio del camino
en medio del camino había una piedra.

 

 

ANDRADE, Carlos Drummond de Andrade.   Carlos Drummond de Andrade  1902-2002.  Brasília, DF: Banco Central do Brasil, Casa da Moeda do Brasil, 2002.  6 p.  12,5x18 cm.  O folheto cartonado inclui uma moeda de prata de 28 g com o valor facial de 2 reais incrustada, e o texto do poema “INFÂNCIA /CHAILHOOD” em versão bilíngue Português e Inglês. Na capa  e sobrecapa (funcionando como as edições bilíngues canadenses com duas faces)  com  ilustração / design de Luciano Dias de Araujo mostra o bico de uma caneta com o verso “ tinha uma pedra no meio do caminho”/ “there stood a stone um the nuddle of the road”  formando um ideograma. Apresentação, da capa protetora, de Affonso Romano de Sant´Anna, bilíngue.  Ex. col. Antonio Miranda

 



 

 

 

BACK, Sylvio.  Cinquenta anos. Díário do Paraná. Edição fac-similar.  Capa : Guilherme           Mansur.  Reprodução fotográfica: Cadi Busatto. Coordenação gráfica: Rita de Cássia Solieri Brandt.  Projeto gráfico: Adriana Salmazo Zavadniak.  Curitiba, Paraná:  Itaipu Binacional, 2011.  S. p.  Inclui 7 folhas dobradas  94 x  1,26  cm., com imagens de páginas do suplemento literários dos anos 1959 – 1960, acomodadas numa caixa de papelão 35x 48 cm.  Ex. bibl. Antonio Miranda. 

 

 

Necrológio dos desiludidos do amor

Os desiludidos do amor
estão desfechando tiros no peito.
Do meu quarto ouço a fuzilaria
As amadas torcem-se de gozo.
Oh quanta matéria para os jornais.

Desiludidos mas fotografados,
escrevem cartas explicativas,
tomaram todas as providências
para o remorso das amadas.

Pum, pum, pum, adeus, enjoada.
Eu vou, tu ficas, mas nos veremos
seja no claro céu ou turvo inferno.

Os médicos estão fazendo a autópsia
dos desiludidos que se mataram.
Que grandes corações eles possuem,
vísceras imensas, tripas sentimentais
e um estômago cheio de poesia...

 

Agora vamos para o cemitério
levar os corpos dos desiludidos
encaixotados competentemente
(paixões de primeira e de segunda classe)

Os desiludidos seguem iludidos,
sem coração, sem tripas, sem ar (...)*
Única fortuna, os seus dentes de (...)*
não servirão de lastro financeiro (...)*
cobertos de terra perderão o (...)*
enquanto as amadas dançarão um (...)*
bravo, violento, sobre a tumba (...)*

 

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Poema publicado no domingo, 23 de agosto de 1959
(***) Infelizmente a imagem do fac-símile não mostra a palavra
final do verso. Vamos pesquisa nos livros do autor e, se encontrarmos,
faremos a devida inclusão...  Antonio Miranda

 

 

canto do homem do povo
charles chaplin



Era preciso que um poeta brasileiro,
não dos maiores, porém dos mais expostos à galhofa,
girando um pouco em tua atmosfera ou nela aspirando a viver
como na poética e essencial atmosfera dos sonhos lúcidos,

era preciso que esse pequeno cantor teimoso,
de ritmos elementares, vindo da cidadezinha do interior
onde nem sempre se usa gravata mas todos são extremamente polidos                                                                               
e a opressão é detestada, se bem que o heroísmo se banhe em ironia,

era preciso que um antigo rapaz de vinte anos,
preso a tua pantomima por filamentos de ternura e riso, dispersos no
tempo,
viesse recompô-lo e, homem maduro, te visitasse
para dizer-te algumas coisas, subcolor de poema.

- - -
A noite banha tua roupa.
Mal a disfarças no colete mosqueado,
no gelado peitilho de baile,
de um impossível baile sem orquídeas.
És condenado ao negro. Tuas calças
confundem-se com a treva. Teus sapatos
inchados, no escuro do beco,
são cogumelos noturnos. A cartola,
sol negro, cobre tudo isto, sem raios.

 

- - -
E a lua pousa
em teu rosto. Branco, de morte caiado,
que sepulcros evoca, mas que hastes
submarinas e álgidas e espelhos
e lírios que o tirano decepou, e faces
amortalhadas em farinha. O bigode
negro em ti como um aviso
e logo se interrompe. É negro, curto,
espesso. Ó rosto branco, de lunar matéria,
face cortada em lençol, risco na parede,
caderno de infância, apenas imagem,
entretanto, os olhos são profundos e a boca vem de longe,
sozinha, experiente, calada vem a boca
sorrir, aurora, para todos.

E já não sentimos a noite,
e a morte nos evita, e diminuímos
como se ao contato de tua bengala mágica voltássemos
ao país secreto onde dormem meninos.
Já não é o escritório de mil fichas,
nem a garage, a universidade, o alarme,
é realmente a rua abolida, lojas repletas,
e vamos jogar o guarda no chão,
e na pessoa humana vamos redescobrir
aquele lugar — coitado! — que atraai os pontapés: sentença
de uma justiça não oficial.

 

-----------
Poema publicado domingo, 13 de setembro de 1959

 


canção de berço

O amor não tem importância.
No tempo de você, criança,
uma simples gota de óleo
povoará o mundo por inoculação,
e o espasmo
(longo demais para ser feliz)
não mais dissolverá as nossas carnes.

Mas também a carne não tem importância
E doer, gozar, o próprio cântico afina é indiferente.
Quinhentos mil chineses mortos,
trezentos corpos de namoradas sobre a linha férrea
e o trem que passa, como um discurso, irreparável:
tudo acontece, menina,
e não é importante, menina,
e nas fica nos teus olhos.

Também a vida é sem importância.
Os homens não me repetem
me prolongo até eles.
A vida é tênue, tênue.
O grito mais alto ainda é suspiro,
os oceanos calaram-se há muito.
Em tua boca, menina,
ficou o gosto de leite?
ficará o gosto de álcool?

Os beijos não são importantes.
No teu tempo nem haverá beijos.
Os lábios serão metálicos,
civil, e mais nada, será o amor
dos indivíduos perdidos na massa
e só uma estrela
guardará o reflexo
do mundo esvaído
(aliás sem importância.
 

----------------------------------
Poema publicado dia 11 de outubro de 1959.

 

HADAD, Jamil Almansur, org.   História poética do Brasil. Seleção e introdução de  Jamil Almansur Hadad.  Linóleos de Livrio Abramo, Manuel Martins e Claudio         Abramo.  São Paulo: Editorial Letras Brasileiras Ltda, 1943.  443 p. ilus. p&b  “História do Brasil narrada pelos poetas. 

HISTÓRIA DO BRASIL – POEMAS

A FORMAÇÃO DO BRASIL

 

 

 

          

Ilustração de Cláudio Abramo

 

SABARÁ 

 

                                                     Foto: Marc Ferrez

 

A dois passos da cidade importante,
A cidadezinha está calada e entravada,
(Atrás daquele morro com vergonha do trem.)

Só as igrejas,
Só as torres pontudas das igrejas
Não brincam de esconder.


O rio das Velhas lambe as casas velhas,
Casas encardidas onde há velhas nas janelas.
Ruas em pé,
Pé de moleque,
Penção de Juaquina Agulha.
Quem não subir direita toma vara.
Bem feito!

Mas tudo, tudo é inexoravelmente colonial:
Bancos janelas fechaduras lampiões.

O casario alastra na corcunda dos morros,
rebanho dócil pastoreado pelas igrejas;
A do Carmo — que é toda de pedra,
A da Matriz — que é toda de ouro.
Sabará veste com orgulho seus andrajos...
Faz muito bem! Cidade teimosa!

Nem Siderúrgica nem Central nem a roda manhosa da Ford,
Sacudem a modorra de Sabarabussu.

Pernas morenas de lavadeiras
Tão musculosas que parece foi Aleijadinho que as esculpiu,
Palpitam na água cansada.

O presente vem de mansinho,
De repente dá um salto;
Cartaz de cinema com fita americana.
ET o trem bufando na ponte preta,
É um bicho comendo as casas velhas.

 

         (ALGUMA POESIA — Edições Pindorama –Belo Horizonte – 1930)

 

 

VÔO SOBRE AS IGREJAS  

                Igreja Matriz de N. S. da Conceição

 

 

Vamos até a Matriz de Antônio Dias,
onde repousa, pó sem esperança, pó sem lembrança o Aleijadinho.
Vamos subindo em procissão a lenta ladeira.
Padres e anjos, santos e bispos nos acompanham
e tornam mais rica, tornam mais grave a procissão de assombração.

 

Mas já não há fantasmas no dia claro,
tudo é tão simples,
tudo tão nu,
as cores e cheiros do presente são tão fortes e tão urgentes
que nem se percebem catinga e rouges boduns e ouro do século
XVIII.

 

Vamos subindo, vamos deixando a terra, lá em baixo,
nesta subida só serafins, fogem conosco,

de róseas faces, de nádegas róseas e rechonchudas
empunham coroas, entoam cantos  desenham ornatos no azul  
autêntico.

Êsse mulato de gênio
lavou na pedra sabão
todos os nossos pecados,
as nossas luxúrias todas,
e êsse tropel de desejos,
essa ânsia de ir para o céu
e de pecar mais na terra;
esse mulato de gênio
subiu nas asas da fama,
teve dinheiro, mulher,
escravo, comida farta,
teve também escorbuto
e morreu sem consolação.

Vamos subindo nessa viagem, vamos deixando
na torre mais alta o sino que tange, o som que se perde,
devotas de preto que batem joelhos, o sacristão que limpa
os altares,
os mortos que pensam, sós, em silêncio, nas catacumbas e
sacristias,
São Jorge com seu ginete,
e deus coberto de chagas, a virgem cortada de espadas,
e os Passos da Paixão, que jazem inertes na solidão.

Era uma vez um Aleijadinho,
não tinha dedo, não tinha mão,
raiva e cinzel lá isso tinha,
era uma vez um Aleijadinho,
era uma vez muitas igrejas
com muitos paraísos e muitos infernos
era uma vez S. João, Ouro Preto, Sabará, Congonhas,
era uma vez muitas cidades
e um Aleijadinho era uma vez.

 

        (BREJO DAS ALMAS – Os amigos do Livro -
Belo Horizonte, 1934)

 

 

 

OUTUBRO DE 1930 

      

 

       Suores misturados
no silêncio noturno.
O companheiro ronca.
O ruído igual
dos tiros e o silêncio
na sala onde os corpos
são coisas escuras.
O soldado deitado
pensando na morte.

De 5 em 5 minutos um ciclista levava ao Estado-Maior um
feixe de telegramas contendo, comprimida, a trepidação dos
setores. O radiotelegrafista ora triste ora alegre trazia um papel
que era a vitória ou a derrota.  Nós descansávamos, jogados
sobre poltronas, e abríamos para as notícias olhos que não viam,
olhos que perguntavam.  Às ssss3 da madrugada, pontualmente o
tiroteio recomeçava.

 

O funcionário deitado
não pensa na morte.
Pensa no amor
tornado impossível
no minuto guerreiro.
E fecha os olhos
para ver bem
o amor com sua espada
de foto sobre a cabeça
de todos os homens,
legalistas, rebeldes.

 

   O inimigo resistia sempre foi preciso cortar a água do
quartel.  Como resistisse ainda, a água circulou de novo,
desta vez azul de metileno.  O canhão fabricado em Minas
— suave temperamento local — não disparou.

         Olha a negra, olha a negra,
a negra fugindo
com a trouxa de roupa,
olha a bala negra,
olha a negra no chão
e o cadáver com os seios expostos, enormes,
inúteis.

 

    O general, com os seus bigodes tumultuosos, era o mais doce
dos seres e destilava uma vaporosa ternura no seu hábito de usar
a “culote” sem perneiras.  A um canto do salão atulhado de mapas
e em que telefones esticados retiniam trazendo fato, levando
ordens, eu fazia, exercício fácil, a caricatura do seu imenso nariz.
Que todos acharam ótima e reprovaram com indignação cívica.

A  esta hora no Recife,
em Guaxupé, Turvo, Jaguara,
Itararé,
Bai Guandú,
Igarapava,
Chiador,
homens estão se matando
com as necessárias cautelas.
Pelo Brasil inteiro há tiros, granadas,
literatura explosiva de boletins,
mulheres carinhosas cosendo fardas,
com bolsos onde estudantes guardarão retratos
das respectivas, longínquas namoradas,
homens preparando discursos,
outros, solertes, captando rádios,
minando pontes,
outros (são governadores) dando o fora,
pedidos de comissionamento
por atos de bravura,
ordens do dia,
“o inimigo (?) retirou-se em fuga precipitada,
deixando abundante material bélico
cinco mortos e vinte feridos...”
Um novo, claro Brasil
surge, indeciso, da pólvora.
Meu Deus, tomai conta de nós.

Deus vela o sono dos brasileiros.
Anjos alvíssimos espreitam
a hora de apagar a luz de teu quarto
para abrirem sobre ti as asas
que afugentam os maus espíritos
e purificam os sonhos.
Deus vela o sono e o sonho dos brasileiros.
Mas eles acordam e brigam de novo.

 

             (POESIAS  - Livraria José Olímpio – 1942)

 


Gravura Cláudio Abramo os BANDEIRANTES

 


 

 

 

 

 

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