LÊDO IVO
(1924-2012)
Poeta, narrador y ensayista nacido en Maceió, Halagaos, Brasil, en 1924. Es una de las figuras más representativas de la literatura brasileña. Se le considera el más destacado de la Generación del 45, movimiento contra el clima demoledor y anarquista de la primera fase del modernismo, que pregonaba un regreso a la disciplina y al orden. Como otros poetas de esta generación, volvió a algunas formas poéticas fijas, como el soneto, pero conservando un estilo libre y marcadamente personal. De su obra, ampliamente premiada, destacan sus novelas As alianças (1947), y Ninho de cobras (1973), su libro de crónicas A cidade e os dias (1957), el poemario Finisterra (1973) y sus memorias Confissões de um poeta (1979). Es miembro de la Academia Brasileira de Letras [ www.academia.org.br ]
En poesía ha escrito, entre otros títulos: As imaginações (1994), Ode e elegia (1945), Ode ao crepúsculo (1948), Linguagem (l966), Estação Central (1968), Crepúsculo civil (1990), Curral de peixe (1995), O Rumor da noite (2000). Su más reciente libro es Plenilúnio (2004) y há participado de numerosas antologías.
Não quero a eternidade
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Quero ser o que passa
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Prefiro um voo de pássaro
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Recuso-me a durar
e a permanecer.
Nasci para não ser
e ser o que não é
(“O Desejo”)
Vejam agora o E-BOOK do último livro de Lêdo Ivo. Não são poemas inéditos. “Poesia Breve” é uma breve seleção de poemas breves feita pelo autor e publicados pela editora POEXÍLIO, de Antonio Miranda e Zenilton Gayoso, em 2012, pouco antes do falecimento do poeta.
https://issuu.com/antoniomiranda/docs/poesia_breve
SALDANHA, Wlademir. Mormaço. Último livro de Lêdo Ivo. Jaboatão, PE: Editora Guararapes EGM, 2015. 28 p. ilus. col. Editor: Edson Guedes de Moraes. Ex. bibl. Antonio Miranda. e-book: https://issuu.com/antoniomiranda/docs/wladimir_saldanha
TEXTOS EM PORTUGUÊS / TEXTOS EN ESPAÑOL
Veja também>>> POÈMES EN FRANÇAIS
POEMS IN ENGLISH
TEXTO EM ITALIANO
Veja também:
LêDO IVO, A POESIA E LITERATURA – ENTREVISTA FEITA POR FLORIANO MARTINS.
TRAÇOS DA POESIA DE LÊDO IVO, por Anderson Braga Horta
AVELAR, Romeu de. Coletânea de poetas alagoanos. Rio de Janeiro: Edições Minerva, 1959. 286 p. ilus. 15,5x23 cm. Exemplar encadernado. Bibl. Antonio Miranda
ESMERALDA
O internato em que estavas
voava, contigo, nas manhãs sem luz.
Ficavas acima do farol
azul e branco e saia de sino.
Dominavas um azul que não existirá
e estudavas química.
Esmeralda, tormento e magia,
naquele tempo teu corpo germinava com um campo
e tua carne inventava novas formas
que desfiguravam a ausência.
Eu desenhava na praia a curva do teu seio.
E continuavas voando, entre o farol e o mar,
ballet de minha adolescência.
O AVISO
Fecham a porta da biblioteca
ausentam-se em passeios matinais e necessários
acendam minhas lâmpadas por olvídio
rasguem os poemas onde cantei Adriana
queimem minha infância parada no álbum.
E agora você, minha morte,
venha devagar para mim
como uma noiva em camisa de dormir
para esta estranha noite de núpcias.
Nada receie. Fugirei com você
em carrossel, barca ou pauta de música.
Meu segredo é desnecessário:
Quero nascer na morte.
PRAIA DO SOBRAL
Esperava que ela afastasse de mim os seios puros
e passeava com ela pela praia e beijava
e enfeitava os seus cabelos com uma flor.
Permanecia tranquilo mesmo junto de sua carne,
pois no litoral Doralice era a flor esquiva
que restaurava em mim o obscuro desequilíbrio.
Misteriosamente claros seus seios tentavam
minha mão direita que a louvaria em verso
e minha mão esquerda frágil e inconsistente
inútil quando não a acariciava.
Praia debruçada sobre o seu corpo,
o amor era a gratidão marítima
e as ondas obedeciam ao fremir de suas coxas.
Doralice era a utilidade que sob o sol
ou sob a lua me afastava do céu.
Era o crepúsculo invasor de alguma manhã.
Sonhos caminhando, tardes náufragas, noites grandes,
Doralice era como a lagoa da terra em que nasci;
me apertava e me acendia.
Era a areia quente
Onde o sol de minha infância se nutria.
A noite vinha do sexo de Doralice
para o litoral que era
como o colchão macio onde se amava.
Depois Doralice vomitou a infância
e eu fiquei, menino, na praia sonhando.
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ALMANAQUE CALENDÁRIO 2020 AGENDA POÉTICA. Editor: Edson Guedes de Moraes. / Jaboatão, Pernambuco/: Editora Guararapes, 2020. 162 p. ilus. col.
Inclui o poema " SONETO DA PORTA" de Lêdo Ivo à página 29.
IVO, Lêdo. Aurora. Traducción de Martín López-Vega. Madrid: Editorial Prre-textos, 2013. 89 p. (Colección La Cruz del Sur) 14,3x22 cm. “Bajo el patrocionio de Sarah Girri y Jorge Gallardo, Buenos Aires”.
OS DOIS LADOS
No outro lado da noite alguém gritava.
No outro lado do muro eles se amavam
e espalhavam murmúrios e gemidos.
Todas as portas estavam fechadas.
A vida era um segredo, era um suspiro.
E o amor lavrava doido e revirado.
Amar de um lado só já não bastava?
Era cara e coroa, era em dois lados,
moeda que a si mesma se pagava.
LOS DOS LADOS
AL otro lado de la noche alguien gritaba.
Al otro lado del muro dos se amaban
y esparcían murmullos y gemidos.
Todas las puertas estaban cerradas.
La vida era un secreto, era un suspiro.
Y el amor labraba loco e imprevisible.
¿Amar sólo de un lado ya no bastaba?
Era cara y cruz, era en dos lados
moneda que a sí misma se pagaba.
IVO, Lêdo. Alagoa australis. São Paulo Edição Papel Assinado, 2011. Caixa de papelão revestida de tecido. 22x35 cm. “Foram editados 100 exemplares deste livro em ordem alfa-numérica (1/100A a 100/A) e 100 exemplares (1/100B a 100/B), papael rives linear bright White, 350 grs, e 30 exemplares numerados em algarismos romanos (I/XXX s XXX/XXX), papel fabriano 5L, 300 grs, 50% cotton, contendo 13 poemas de Lêdo Ivo, impressos em silk-screen e 1 gravura do artista plástico João Atanásio, editad nas técnicas meta e xilogravura, série “Microorganismo”, impressa em papel hannermueler 300 grs.” Editores Pedro Paulo Mendes e Teca Lacerda. Exemplar n. 63/100B. Col. A.M. (LA)
O BARULHO DO MAR
Na tarde de domingo, volto ao cemitério velho de Maceió
onde os meus mortos jamais terminam de morrer
de suas mortes tuberculosas e cancerosas
que atravessam a maresia e as constelações
om suas tosses e gemidos e imprecações
e escarros escuros
e em silêncio os intimo a voltar a esta vida
em que desde a infância eles viviam lentamente
com a amargura dos dias longos colada às existências monótonas
e o medo de morrer dos que assistem ao cair da tarde
quando, após a chuva, as tanajuras se espalham
no chão maternal de Alagoas e não podem mais voar.
Digo aos meus mortos: Levantai-vos, voltai a este dia inacabado
que precisa de vós, de vossa tosse persistente e de vossos gestos enfadados
e de vossos passos nas ruas tortas de Maceió. Retornai aos sonhos insípidos
e às janelas abertas sobre o mormaço.
Na tarde de domingo, entre os mausoléus
que parecem suspensos pelo vento
no ar azul
o silêncio dos mortos me diz que eles não voltarão.
Não adianta chamá-los. No lugar em que estão, não há retorno.
Apenas nomes em lápides. Apenas nomes. E o barulho do mar.
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De
Lêdo Ivo
POESIA COMPLETA 1940-2004
Estudo introdutório Ivan Junqueira
Rio de Janeiro: Topbokks, 2004. 1099 p.
ISBN 85-7475-086-1
"Um dos poucos que ficarão". Fausto Cunha.
PRIMEIRA LIÇÃO
Na escola primária
Ivo viu a uva
e aprendeu a ler.
Ao ficar rapaz
Ivo viu a Eva
e aprendeu a amar.
E sendo homem feito
Ivo viu o mundo
seus comes e bebes.
Um dia num muro
Ivo soletrou
a lição da plebe.
E aprendeu a ver.
Ivo viu a ave?
Ivo viu o ovo?
Na nova cartilha
Ivo viu a greve
Ivo viu o povo.
NA RUA DA CARIOCA
Transeunte ocioso
parei na mercearia
da rua da Carioca
e vi a realidade:
uma simples lingüiça
exposta na vitrina.
Ó glória de ser si mesma
na inexatidão do mundo!
Somente ela era real
entre os passantes fantásticos
e os rumores estridentes
da rua da Carioca.
No balcão de imaginário
em que se tornou a vida
uma simples lingüiça
toda enchida de si mesma
impunha a sua verdade
e modéstia perecíveis.
Jamais uma lingüiça
pode mudar-se em metáfora
antes de ser engolida.
Evidência consumível,
ela era apenas o que era:
a honra do mundo visível.
LARGO DA CARIOCA
Sobe a ladeira do convento
antes que a noite caia.
Pede um marido a Santo Antônio
que a tarde já vai bem alta.
Pede um amor a Santo Antônio
antes da noite fechada.
Suplica-lhe que ele te dê
uma aliança de casada.
Diante do santo, de joelhos,
antes que a noite desça,
fala da tua precisão,
antes que o sol desapareça.
Não tenhas medo nem pejo
nem fiques ruborizada.
Ele conhece os desejos
que queimam teu corpo e alma.
O santo das precisadas
sendo um homem não ignora
que a falta do acerbo espinho
dói na rosa abandonada.
Confessa-lhe toda a verdade.
Para dormir sossegada
precisas daquilo que pedes
de rojo, lavada em lágrimas.
Precisas de algo que te aqueça.
À noite morres de frio.
Implora ao santo, com fervor,
que te conceda um cobertor.
Antes que o sol desapareça
e a noite te deixe na mão
pede depressa a Santo Antônio
a graça de um maridão.
A CREPITAÇÃO
Qualquer vida é naufrágio e perdimento.
Quando chegamos ao fim da restinga
encontramos apenas mar e vento.
Onde estão nossos sonhos? Um errante
raio de sol sumiu entre a folhagem,
dentro de nós o dia fez-se pálido.
Cercado pela luz da madrugada
e de mim rodeado, estou sozinho
entre as grutas da terra e a ira do mar.
Última luz da derradeira festa,
crepita na manhã a eternidade.
E a eternidade é tudo o que me resta.
PARIPUEIRA
Nas casas brancas de Paripueira
as janelas estão escancaradas
à claridade que sucede aos sonhos
e às errantes estrelas desejadas.
Os cajueiros cantam na manhã de sol.
Cantam com suas belas vozes amarelas.
As velas das jangadas fremem quando
a vaga suga a música da terra.
No céu redondo de Paripueira
as nuvens são os brancos arquipélagos
dos países negados aos navios.
No mar azul os currais de peixe
protegem a fome infindável dos homens.
E a terra é tão bela que aboliu a morte.
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OS MORCEGOS
Os morcegos se escondem entre as cornijas
da alfândega. Mas onde se escondem os homens,
que contudo voam a vida inteiro no escuro,
chocando-se contra as paredes brancas do amor?
A casa de nosso pai era cheia de morcegos
pendentes, como luminárias, dos velhos caibros
que sustentavam o telhado ameaçado pelas chuvas.
"Estes filhos chupam o nosso sangue", suspirava meu pai.
Que homem jogará a primeira pedra nesse mamífero
que, como ele, se nutre do sangue dos outros bichos
(meu irmão! meu irmão!) e, comunitário, exige
o suor do semelhante mesmo na escuridão?
No halo de um seio jovem como a noite
esconde-se o homem; na paina de seu travesseiro, na luz
do farol
o homem guarda as moedas douradas de seu amor.
Mas o morcego, dormindo como um pêndulo, só guarda
o dia ofendido.
Ao morrer, nosso pai nos deixou (a mim e a meus oito irmãos)
a sua casa onde à noite chovia pelas telhas quebradas.
Levantamos a hipoteca e conservamos os morcegos.
E entre os nossas paredes eles se debatem: cegos como nós.
OS POBRES NA ESTAÇÃO RODOVIÁRIA
Os pobres viajam, Na estação rodoviária
eles alteiam os pescoços como gansos para olhar
os letreiros dos ônibus. E seus olhares
são de quem teme perder alguma coisa:
a mala que guarda um rádio de pilha e um casaco
que tem a cor do frio num dia sem sonhos,
o sanduíche de mortadela no fundo da sacola,
e o sol de subúrbio e poeira além dos viadutos.
Entre o rumor dos alto-falantes e o arquejo dos ônibus
eles temem perder a própria viagem
escondida no névoa dos horários.
Os que dormitam nos bancos acordam assustados,
embora os pesadelos sejam um privilégio
dos que abastecem os ouvidos e o tédio dos psicanalistas
em consultórios assépticos como o algodão que
tapa o nariz dos mortos.
Nas filas os pobres assumem um ar grave
que une temor, impaciência e submissão.
Como os pobres são grotescos! E como os seus odores
nos incomodam mesmo à distância!
E não têm a noção das conveniências, não sabem
portar-se em público.
O dedo sujo de nicotina esfrega o olho irritado
que do sonho reteve apenas a remela.
Do seio caído e túrgido um filete de leite
escorre para a pequena boca habituada ao choro.
Na plataforma eles vão o vêm, saltam e seguram
malas e embrulhos,
fazem perguntas descabidos nos guichês, sussurram
palavras misteriosas
e contemplam os capas das revistas com o ar espantado
de quem não sabe o caminho do salão da vida.
Por que esse ir e vir? E essas roupas espalhafatosas,
esses amarelos de azeite de dendê que doem
na vista delicada
do viajante obrigado a suportar tantos cheiros incômodos,
e esses vermelhos contundentes de feira e mafuá?
Os pobres não sabem viajar nem sabem vestir-se.
Tampouco sabem morar: não têm noção do conforto
embora alguns deles possuam até televisão.
Na verdade os pobres não sabem nem morrer.
(Têm quase sempre uma morte feia e deselegante.)
E em qualquer lugar do mundo eles incomodam,
viajantes importunos que ocupam os nossos
lugares mesmo quando estamos sentados e eles viajam de pé.
O PASSRINHO MORTO
A santidade do mundo me aparece
sob a forma assustada de um esquilo
que me contempla entre arbustos.
Devo esta aparição ao deus que me criou
e me faz notar o miúdo e o insólito.
A poeira na asa da borboleta
E a chuva radiosa.
Abaixo-me e agarro o passarinho morto
que nem a neve soube guardar.
Por que o mataste, ó deus do frio
que, na noite de Nova Iorque, une a homem e mulher.
Como uma formiga, espero que o comboio passe
para atravessar
os trilhos sangrados pela ferrugem.
E, cristaleiro, amo o que o tempo fez
sem que fosse preciso ferir ou insultar:
vaga na prancha podre de um navio
ou o fulgir de um diamante.
A essa forma de perfeição, luminosa e fria,
é que aspiro às vezes quando, no banco de um parque,
vejo o passarinho morto
ou, homem, sou o esquilo que os esquilos
vêm olhar com surpresa.
Aos céus que guardam o granizo e a saraiva,
peço isenção de selo funerário.
Mas como esse deus mouco me ouviria?
Com seus olhos vazados, de que modo
me enxergaria? E as folhas caem, desbotadas, e o outono
é vento e podridão.
ASILO SANTA LEOPOLDINA
Todos os dias volto a Maceió.
Chego nos navios desaparecidos, nos trens sedentos, nos aviões cegos/
Que só aterrizam ao anoitecer.
Nos coretos das praças brancas passeiam caranguejos.
Entre as pedras das ruas escorrem rios de açúcar
Fluindo docemente dos sacos armazenados nos trapiches
e clareiam o sangue velho dos assassinados.
Assim que desembarco tomo o caminho do hospício.
Na cidade em que meus ancestrais repousam em cemitérios marinhos
só os loucos de minha infância continuam vivos e à minha espera.
Todos me reconhecem e me saúdam com grunhidos
e gestos obscenos ou espalhafatosos.
Perto, no quartel, a corneta que chia
Separa o pôr-do-sol da noite estrelada.
Os loucos langorosos dançam e cantam entre as grades.
Aleluia! Aleluia! Além da piedade
a ordem do mundo fulge como uma espada.
E o vento do mar oceano enche os meus olhos de lágrimas.
SONETO À PÁTRIA
Nesta noite em Toronto junto ao lago gelado
que o grasnido dos gansos não ousa estremecer
minha pátria ofendida surge na escuridão
e vem ao meu encontro com o seu sol e andrajos.
Ao seu redor estão os goiamuns que moram
no chão mudo dos mangues, o sinal semafórico
que ao lado da guardamoria freme na maresia
e os mendigos que esperam a morte sob os viadutos.
Caminhando na neve nesta noite estrangeira,
entre as sílabas negras dos frígidos pinheiros,
murmuro no vento o teu nome desmatelado.
Ó pátria desamada, ó rameira insultada,
quanto mais longe estás, teu espinho distante
mais dói na minha mão inútil e gelada.
O PORTÃO
O portão fica aberto o dia inteiro
mas à noite eu mesmo vou fechá-lo.
Não espero nenhum visitante noturno
a não ser o ladrão que salta o muro dos sonhos.
A noite é tão silenciosa que me faz escutar
o nascimento dos mananciais nas florestas.
Minha cama branca como a via-láctea
é breve para mim na noite negra.
Ocupo todo o espaço da mundo. Minha mão
desatenta
derruba uma estrela e enxota um morcego.
O bater de meu coração intriga as corujas
que, nos ramos dos cedros, ruminam o enigma
do dia e da noite paridos pelas águas.
No meu sonho de pedra fico imóvel e viajo.
Sou o vento que apalpa as alcachofras
e enferruja os arreios pendurados no estábulo.
Sou a formiga que, guiada pelas constelações,
respira os perfumes da terra e do oceano.
Um homem que sonha é tudo o que não é:
o mar que os navios avariaram,
o silvo negro do trem entre fogueiras,
a mancha que escurece o tambor de querosene.
Se antes de dormir fecho o meu portão
no sonho ele se abre. E quem não veio de dia
pisando as folhas secas dos eucaliptos
vem de noite e conhece o caminho, igual aos mortos
que todavia jamais vieram, mas sabem onde estou
— coberto por uma mortalha, como todos os que
sonham
e se agitam na escuridão, e gritam as palavras
que fugiram do dicionário e foram respirar o ar da
noite que cheira a jasmim
e ao doce esterco fermentado.
os visitantes indesejáveis atravessam as portas
trancadas
e as persianas que filtram a passagem da brisa
e me rodeiam.
Ó mistério do mundo, nenhum cadeado fecha o
portão da noite.
Foi em vão que ao anoitecer pensei em dormir
sozinho
protegido pelo arame farpado que cerca as minhas
terras
e pelos meus cães que sonham de olhos abertos.
À noite, uma simples aragem destrói os muros dos
homens.
Embora o meu portão vá amanhecer fechado
sei que alguém o abriu, no silêncio da noite,
e assistiu no escuro ao meu sono inquieto.
A QUEIMADA
Queime tudo o que puder :
as cartas de amor
as contas telefônicas
o rol de roupas sujas
as escrituras e certidões
as inconfidências dos confrades ressentidos
a confissão interrompida
o poema erótico que ratifica a impotência
e anuncia a arteriosclerose
os recortes antigos e as fotografias amareladas.
Não deixe aos herdeiros esfaimados
nenhuma herança de papel.
Seja como os lobos : more num covil
e só mostre à canalha das ruas os seus dentes afiados.
Viva e morra fechado como um caracol.
Diga sempre não à escória eletrônica.
Destrua os poemas inacabados,os rascunhos,
as variantes e os fragmentos
que provocam o orgasmo tardio dos filólogos e escoliastas.
Não deixe aos catadores do lixo literário nenhuma migalha.
Não confie a ninguém o seu segredo.
A verdade não pode ser dita.
De
IVO, Lêdo.
Acontecimento do Soneto. Ode à noite.
Prefácio de Campos de Figueiredo. [Rio de Janeiro;: Orfeu, 1950? 50 p. Capade Artur Jorge. Formato 15x22 cm. Esta é a 2ª. ed. da obra. A primeira foi editada em Barcelona pela coleção “O Livro Inconsúltil”, de apenas 100 exemplares. Nesta nova edição, foi incluído o poema “Ode à Noite” quw “por sua estrutura formal, pela sua similaridade temática com os outros versos aqui enfeixados e por ter sido escrito no mesmo período que assinalou a criação das peças de ACONTECIMENTO DO SONÊTO, julga o autor poder enquadrar-se no mesmo espírito e atmosfera do livro de que João Cabral de Melo Neto foi o primeiro impressor.” Col. A. M. (EA)
SONETO DAS ALTURAS
As minhas esquivanças vão no vento
alto do céu, para um lugar sombrio
onde me punge o descontentamento
que no mar não deságua, nem no rio.
Às mudanças me fio, sempre atento
ao que muda e perece, e ardente e fio,
e novamente ardente é no momento
em que luz o desejo, poldro em cio.
Meu corpo anda quer, mas a minh´alma
em fogos de amplidão deseja tudo
o que ultrapassa o humano entendimento.
E embora nada atinja, não se acalma,
e sendo alma, transpõe meu corpo mudo,
e aos céus pede o inefável e não o vento.
IVO, Lêdo. Magias. Rio de Janeiro: Livraria Agir Editora, 1960. 83 p. 16x23 cm. Capa de Barboza Leite. Col. A.M.
SONETO DO EMPINADOR DE PAPAGAIO
A nada aceito, exceto a eternidade,
nesta viagem ambígua que me leva
ao altar absoluto que, na treva,
espera pela minha inanidade.
O que sonhei, menino, hoje é verdade
de alva estação que em meu silêncio neva
o inverno de uma fábula primeva
que foi sol, cego à própria claridade.
Na hora do fim de tudo, separados
fiquem os dois comparsas do destino
que sabe a cinza após o último alento.
E a morte guarde em cova os injuriados
despojos do homem feito; que o menino
empina o papagaio, vive ao vento.
IVO, Lêdo. Mormaço. Pinturas de Steven Alexander. Rio de Janeiro: Contra Capa, 2013. 224 p. 16,8x24,5 cm. ISBN 978-85-7740-147-5 Publicado originalmente sob o título Calima, por Vaso Roto Ediciones, em 2011, com tradução de Martín ópez-Vega. Imagem da capa: Gonçalo Ivo, tina sobre papel. Inclui imagens em cores de 42 pinturas acrílicas sobre papel de Steven Alexander. Col. A.M. (EE)
O DIA INACABADO
Como todos os homens, sou inacabado.
Jamais termino de ser.
Após a noite breve um longo amanhecer
me detén no umbral do dia.
Perco o que ganho no sonho e no desejo
quando a mim mesmo me acrescento.
Toda vez que me somo, subtraio-me,
uma porção levada pelo vento.
Incompleto no dia inacabado,
livre de ser ainda como e quando,
sigo a marcha das plantas e das estrelas.
E o que me falta e sobre é o meu contentamento.
De
RÉQUIEM
Traducción de Jorge Lobillo
México: Alforja, 2008
(edición bilíngüe)
O RAIO
O raio que caiu dividiu o verão.
A cisterna de luz escorrida na terra
sob a nuvem purpúrea e o vôo do gavião,
e me alcançou em cheio, no meio de mim,
como o aroma da flor que se ergue no jardim
para impor a quem passa o domínio do instante.
O sol desmoronado escondeu os seus raios
na doçura da palha espalhada no estábulo.
A serpente agoniza, mudada em coral.
A relva abre caminho ao silêncio dos homens
que escalam as montanhas douradas do outono.
Entre os que vão e vêm eu também venho e vou.
Nos tormentos do mundo fui multiplicado
e de tanto existir já não sei mais quem sou.
O DESCONFORTO
O dia está cheio de palavras.
Elas escorrem como a água das sarjetas ou a saliva da boca
dos demagogos.
Espalham-se no chão como as folhas de um outono
excessivo.
Transbordam das lixeiras junto com as latas de Coca-Cola
e restos de comida.
São piolhos que avançam na selva da tarde.
Ninguém pode viver sem as palavras.
Isto explica o desconforto dos passageiros do metrô.
Condenados a um silêncio temporário
eles se entreolham suspeitosamente na plataforma da
estação
e estremecem quando as portas do trem se fecham.
Embalados pêlos solavancos de uma viagem sem paisagem
ouvem os vagões rangerem nos trilhos taciturnos
na escuridão que sustenta o clamor da cidade.
É o que sobra do rumor do mundo. Mas eles querem o
instante
em que, devolvidos ao dia loquaz, voltarão a falar.
IVO, Lêdo. O aluno relapso. Ilustrações de Gonçalo Ivo. São Paulo: Nemar; Massao Ohno Editores, 1991. 100 p. 14X21 cm. “ Lêdo Ivo “ Ex. bibl. Antonio Miranda
A ILHA AMBULANTE
Todas as manhãs me levanto
e começo a dormir.
Só sei sonhar acordado,
ilha rodeada de homens
e do rumor do dia
por todos os lados.
O BOSQUE
A chuva cai sobre os montes simétricos
das madeiras cortadas.
E o cheiro do bosque mutilado
ocupa a escuridão.
CORRIMÃO
Passado e presente
são em nossa vidas
degraus sucessivos
de uma mesma escada.
Subimos? Descemos?
Enquanto subimos
e enquanto descemos
não sabemos nada.
De
Lêdo Ivo
UMA LIRA DOS VINTE ANOS
Rio de Janeiro: Livraria São José, 1962
O livro reúne os primeiros versos do autor escritos entre 1940 e 1946.
Edição planejada por seus amigos Antônio Houaiss e João Cabral de Melo Neto.
O BRANCO HOTEL
Em cada cidade um cemitério
um túmulo para cada residência
um morto exclusivamente para o pranto de dois olhos.
Hoje é o dia dos desacordados, dos sonâmbulos e dos fantásticos.
Tenho um irmão num cemitério.
São os hóspedes de um branco hotel
que perturba as floristas.
A MORTA
Um recado, um beijo e um epitáfio
me esperavam em teus olhos fechados
cisternas de minha infância.
Em teu corpo, ó Dama de Azul, última flor do Mangue
não havia nuvem ou música
apenas a tua de tua adolescência, que depois asfaltaram.
Porém nos trechos escuros de tua nudez
eu capinava onde o amor se iniciava.
Teu corpo agora era tua própria alma,
que não existira tranquila, mas selvagem
e áspera como a de uma loba.
Eras a areia da praia que desentranha a música
a note podre, o oeste das coisas,
presença esquiva que não se macula
nua sem ter sido donzela.
|
IVO, Lêdo. Um brasileiro em Paris e O Rei da Europa. Capa de Luis Jardim. Rio de Janeiro: Livraria José Olympio Editôra, 1955. “Deste livro foram tirados, fora de comércio, vinte exemplares em papel apergaminhado assinados pelo autor.” “ Lêdo Ivo “. Ex. Biblioteca Nacional de Brasília, oriunda da coleção Marly de Oliveira.
SONÊTO DE VERÃO
Tal pedra na savana, a paixão brilha
e ilumina o arrebol; fogo calcário
é o seu, viva raiz de maravilha
crispada no ar, no espaço planetário.
Nem de ouro nem de prata — como a quilha
do barco entre as espumas do mar vário,
minha paixão é vento e é flama e é trilha
que rasga o dia e torna o chão sumário.
Em nudez e canícula, cintila
a estrela que me segue, o sol distante
e cada vez mais próximo de Vega.
Razão de ser da vida, ele destila
as luzes da alvorada; e a mim, amante,
o amor faz com que eu veja e, sol, me cega.
MARÉ
Na praia de papel
respiro o ar do mundo.
Letras.
Na ortografia vive
todo o meu mistério.
Tinta.
O mar azul vomita
algas e medusas.
Signos.
A sujeira do mar
é meu patrimônio.
Canto.
AO LÊDO, EM SEU EPITÁFIO
Aqui repousa,
livre de todas as palavras,
LÊDO IVO,
poeta
na paz reencontrada
de antes de falar,
e em silêncio, o silêncio
de quando as hélices param
no ar.
JOÃO CABRAL DE MELO NETO
Junho de 1945
TEXTOS EN ESPAÑOL
IVO, Lêdo. Las islas inacabadas. Traducción Maricela Terán. México, DF: Dirección de Difusión Cultura, Departamento Editorial, Universidad Autónoma Metropolitana, 1985. 145 p. 11x18 cm. (Colección Molinos de Viento, Série Poesia, 40) Col. A.M.
La infancia redimida
Yo invento la alegría, ahora, en este poema.
Aunque sea trágica e íntima de la muerte
la vida es un reino: la vida es nuestro reino
no obstante el terror, el éxtasis y el milagro.
¡Cómo te soñé, poesía! no como te soñaron...
Me escondo en el bosque del lenguaje, corro
por las salas de espejos.
Estoy siempre al alcance de todo, lleno de orgullo
porque el Ángel me sigue a cualquier parte.
Tengo un ritmo más grande para alabarte, poesía.
Mayor, sin embargo, era la orilla de la playa de mi ciudad
donde, niño, inventé barcos antes de haberlos visto.
Mayor aún era el mar
ante el cual todas las tardes recitaba poemas,
festejándolo con los ojos húmedos y a veces
sonriendo de pasión,
porque gran cosa es descubrir el mar, verlo
existir en el mundo.
¡Oh mar de mi infancia, mayor que el mar de Homero!
Juego a esconderme de Dios, pacto con las hadas
y con este aire de juglar mantengo querelas con la muerte.
Después del otro lado, hay siempre un nuevo
otro lado por conquistar...
Por eso te amo, poesía, a ti que vienes a
llamarme para las californias de la vida.
No eres sino un sueño de infancia, un mar
visto en palabras.
(De Cántico.)
De
Ledo Ivo
PLENILUNIO
Traducción de Martín López-Vega
Barcelona: Vaso Roto Ediciones, 2010.
129 p. ISBN 978-84-936423-6-5
SONETO DA NEVE
Quando te amo, penso sempre na neve,
em uma neve branca como o esperma.
Penso sempre na neve quando te possuo,
ver a neve que cai entre as bétulas.
Em minha meninice sempre desejei
ver a neve cair, atravessar a branca
escuridão da neve que, entre o dia e a noite,
devolve ao mundo negro um branco seminal.
Eu sempre desejei que o mundo fosse a alvura
da neve, da brancura virginal
do alvo lençol imune a qualquer mácula.
E a neve cai em mim e cai na desolada
noite escura da alma, a neve do silencio,
a imaculada e frígida alvura do nada.
SONETO DE LA NIEVE
Cuando te amo, pienso siempre en la nieve,
en una nieve tan blanca como el esperma.
Pienso siempre en la nieve cuando te poseo,
en la nieve blanca que cae entre los abedules.
En mi infancia siempre deseé
ver la nieve caer, atravesar la blanca
oscuridad de la nieve que, entrre el día y la noche,
devuelve al mundo negro un blanco seminal.
Siempre deseé que el mundo fuera la blancura
perfecta de la nieve, la blancura virginal
de la blanca sábana inmune a cualquier mancha.
Y la nieve cae en mí y en la desolada
noche oscura del alma, nieve del silencio,
inmaculada y frígida albura de la nada.
A MUDANÇA
Mudo todas as horas.
E o tempo, sem demora,
muda mais do que fia.
Mudo mas permaneço
bem longe das mudanças.
Como uma flor, floresço.
Sou pétala e esperança.
Mudo e sou sempre o mesmo,
igual a um tiro a esmo.
Como um rio que corre.
Sem sair de onde estou,
de tanto mudar sou
o que vive e o que morre.
EL CAMBIO
Cambio cada día.
Cambio a cada hora.
Y el tiempo, sin demora,
cambia más de lo que fía.
Cambio pero permanezco
bien lejos de todo cambio.
Como una flor, florezco.
Soy pétalo y esperanza.
Cambio y soy simpre el mismo,
igual que un disparo al azar.
Como un río que corre.
Sin salir de donde estoy
de tanto cambiar soy
el que vive y el que morre.
De
Ledo Ivo
CALIMA
Traducción de Martín López-Veja
Barcelona: Vaso Roto Ediciones, 2011.
129 p. ISBN 978-84-15168-08-9
O DIA INACABADO
Como todos os homens, sou inacabado.
Jamais termino de ser.
Após a noite breve um longo amanhecer
me detém no umbral do dia.
Perco o que ganho no sonho e no desejo
quando a mim mesmo me acrescento.
Toda vez que me somo, subtraio-me,
uma porção levada pelo vento.
Incompleto no dia inacabado,
livre de ser ainda como e quando,
sigo a marcha das plantas e das estrelas.
E o que me falta e sobra é o meu contentamento.
EL DÍA INACABADO
Como todo hombre, estoy inacabado.
No acabo nunca de ser.
Tras la noche breve un largo amanecer
me detiene en el umbral del día.
Pierdo cuanto gano en el sueño y el deseo
cuando a mí mismo me añado.
Cada vez que me sumo, me resto:
fragmento soy llevado por el viento.
Incompleto en el día inacabado,
libre aún de ser cómo y cuándo,
sigo la marcha de las plantas y las estrellas.
Y cuanto me falta y sobra es mi satisfacción.
FIRMAMENTO
No dia cheio de estrelas
como a noite aguardo o vinto
que vai espalhar a minha alma
no firmamento.
Na noite da ventania
a morte será um frêmito,
o luzir de uma luz negra
no firmamento.
E tudo será silêncio
e será esquecimento
na eternidade da noite
e do vento.
FIRMAMENTO
En el día lleno de estrellas
como la noche espero el viento
que esparcirá mi alma
por el firmamento.
En la noche de galerna
la muerte será un estremecimiento,
el resplandor de una luz negra
en el firmamento.
Y todo será silencio,
y todo será olvido
en la eternidad de la noche
y del viento.
De
Ledo Ivo
RUMOR NOTURNO
Traducción de Martín López-Vega
Barcelona: Vaso Roto, 2009
228 p. ISBN 978-84-935842-7-6
O JOGO
No dia perdido, no dia estilhaçado,
tudo é dividido ou multiplicado.
O eu e eu duplo atravessam a praça
colados numa efígie de moeda ou selo.
O uno vira triplo no alto da escada
e se derrete ao sol como uma pedra de gelo.
O singular é plural. O vento varre
o tombadilho do navio ancorado
e um fanal de espuma aponta o momento
da última pá de cal. Então o todo e a parte
se fundem afinal em ninguém e em nada.
EL JUEGO
En el día perdido, en el día hecho astillas,
todo se divide o se multiplica.
El yo y su doble atraviesan la plaza
pegados en una efigie de moneda o sello.
Lo uno se vuelve triple al subir la escalera
y se derrite al sol como una piedra dy hielo.
Lo singular es plural. El viento barre
la cubierta del navío anclado
y un fanal de espuma señala el momento
de la última pala de cal. Entonces el todo y la parte
se funden por fin en nadie y en nada.
OS POEMAS
É meu corpo que escreve os meus poemas.
Minha alma é a sucursal da minha mão.
As palavras me buscam no silêncio.
Palavras são estrelas que reclamam
o papel branco: céu, constelação.
LOS POEMAS
Es mi cuerpo quien escribe mis poemas.
Mi alma es una sucursal de mi mano.
Las palabras me buscan en el silencio.
Las palabras son estrellas que reclaman
un papel en blanco: cielo, constelación.
De
Lêdo Ivo
LA ALDEA DE SAL
Selección y traducción de
Guadalupe Grande y Juan Carlos Mestre
Madrid: Calambur Poesía 95, 2009.
188 p. ISBN 978-84-8359-246-8
AS ILUMINAÇÕES
Desabo em ti como um bando de pássaros.
E tudo é amor, é magia, é cabala.
Teu corpo é belo como a luz da terra
na divisão perfeita do equinócio.
Soma de céu gasto entre dois hangares,
és a altura de tudo e serpenteias
no fabuloso chão esponsalício.
Muda-se a noite em dia porque existes,
feminina e total entre os meus braços,
como dois mundos gêmeos num só astro.
LAS ILUMINAÇÕES
Me derrumbo en ti como una bandada de pájaros.
Y todo es amor, es magia, es cábala.
Tu cuerpo es bello como la luz de la tierra
en la frontera perfecta del equinoccio.
Suma del cielo consumado entre dos hangares,
eres la altura de todo y serpenteas
en los fabulosos esponsales de la tierra.
Se transforma la noche en día porque existes,
femenina y total entre mis brazos,
como dos mundos gemelos en un solo astro.
PRIMEIRA LIÇÃO
Na escola primária
Ivo viu a uva
e aprendeu a ler.
Ao ficar rapaz
Ivo viu a Eva
e aprendeu a amar.
E sendo homem feito
Ivo viu o mundo
seus comes e bebes.
Um dia num. Muro
Ivo soletrou
a lição da plebe.
E aprendeu a ver.
Ivo viu a ave?_
Ivo viu o ovo?
Na nova cartilha
Ivo viu a greve
Ivo viu o povo.
PRIMERA LECCIÓN
En la escuela primaria
Ivo vio la uva
y aprendió a leer.
Al hacerse muchacho
Ivo vio a Eva
y aprendió a amar.
Y ya un hombre
Ivo vio el mundo
sus alimentos y bebidas.
Un día en un muro
Ivo deletreó
la lección de la plebe.
Y aprendió a ver.
¿Ivo vio el ave_
¿Ivo vio el huevo_
En la nueva cartilla
Ivo vio la huelga
Ivo vio el pueblo.
De
Lêdo Ivo
MÍA PATRIA HÚMEDA / MINHA PÁTRIA ÚMIDA
Veracruz, México: Cuadernos de Veracruz, 2006
107 p.
SONETO DO AMANHECER
O DIA
Sem mancha
Que tisne
Sua alvura
De cisne
Imaculado
Muro branco
Branco
De luz
E cal
Na pura
Brancura
Da manhã
De sal
SONETO DEL AMANECER
EL DÍA
Sin mancha
Que tizne
Su albura
De cisne
Inmaculado
Muro blanco
Blanco
De luz
Y cal
En la pura
Blancura
De la mañana
De sal
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O LADRÃO
QUANDO deixei Maceió, fechei a porta do mar
E enxotei os navios que insistiam em seguir-me.
Tive de aninhar o vento nos corredores
Das casas brancas que guardam lacraias.
Mas o mar me acompanhou até nos sonhos,
Igual ao sol azul que sustenta o mormaço.
O vento veio voando e era um bando de pássaros.
A chuva da minha infância continua caindo
Com o seu séquito de tanajuras e caranguejos.
Até as dunas caminham ao meu encontro
E me rodeiam, exigindo que eu devolva
A chave de areia e o oceano roubado.
EL LADRÓN
CUANDO dejé Maceió, cerre la puerta del mar
Y ahuyenté los navíos que insistían en seguirme.
Tuve que anidar el viento en los corredores
De las casas blancas que guardan alacranes.
Pero el mar me acompañó hasta en sueños
Igual al sol azul que sustenta el bochorno.
El viento vino volando y era un bando de pájaros.
La lluvia de mi infancia continúa cayendo
Con su séquito de hormigas voladoras y cangrejos.
Hasta las dunas caminan a mi encuentro
Y me rodean, exigiéndome que devuelva
La llave de arena y el océano robado.
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A CARGA
UMA rua me conduzia até o porto.
E eu era a aruá com as suas janelas dilaceradas
E o sol depositado na areia materna.
Eu levava para a beira do mar tudo o que surgia
À minha passagem: portas, rostos, vozes, colônias de cupim e
Réstias de cebola que amadureciam na sombra
Dos armazéns providos. E sacos de açúcar. E as chuvas
Que haviam enegrecido os telhados das casas.
Era um dia de dádivas. Nada estava perdido.
As ondas celebravam a beleza do mundo.
A terra ostentava a promessa de vida.
E eu depositava a minha leve carga
Nos porões dos navios enferrujados.
LA CARGA
UMA calle me conducía hasta el puerto.
Y yo era la calle con sus ventanas destrozadas
Y el sol depositado en la arena materna.
Llevaba hacia la orilla del mar todo lo que surgía
A mi paso: puertas, rostros, voces, colonias de termitas y
Ristras de cebolla que maduraban en la sombra
De próvidos almacenes. Y sacos de azúcar. Y las lluvias
Que habían ennegrecido los tejados de las casas.
Era día de dádivas. Nada estaba perdido.
Las olas celebraban la belleza del mundo.
La tierra ostentaba la promesa de la vida.
Y yo depositaba mi leve carga
En los sótanos de oxidados navíos.
LOS MURCIÉLAGOS
Versión de José Emilio Pacheco
En la cornisa de la aduana se ocultan los murciélagos.
Pero ¿dónde se esconden los hombres
que vuelan en tinieblas toda su vida y se estrellan
en la blancas paredes del amor?
La casa de nuestro padre estaba llena de murciélagos:
Candelabros pendientes de las vigas, sostén
del techo amenazado por la lluvias.
“Estos hijos nos sorben la sangre”, se quejaba mi padre.
¿Quién lanzará la primera piedra contra este mamífero
que, como el hombre, se alimenta de la sangre
(¡hermano! hermano!) y exige, comunitario,
aun en tinieblas el sudor de su prójimo?
En la aérola de un seno joven como la noche
se esconde el hombre, guarda su amor,
como si fuera oro, en su almohada
o a la luz de un farol.
El murciélago duerme como péndulo
y guarda nada más el día ofendido.
A mis ochos hermanos y a mí nos legó nuestro padre
su casa en la que por la noche
caía la lluvia entre las tejas rotas.
Pagamos la hipoteca y conservamos los murciélagos.
Ahora se debaten en nuestros muros,
ciegos como nosotros.
LOS POBRES EN LA CENTRAL DE AUTOBUSES
Versión: Margareth Cuellar
Los pobre viajan, en la central de autobuses
levantan los cuellos, como gansos para mirar
los letreros del autobús. Sus miradas
son de quien teme perder alguna cosa:
la valija que guarda un radio de pilas y una chaqueta
que tiene el color del frío en un día sin sueños,
el sándwich de mortadela en el fondo de la bolsa,
el sol del suburbio y polvo más allá de los viaductos.
Entre el rumor de los altoparlantes y el acelerar del autobús
temen perder su propio viaje
oculto en la niebla de los horarios.
Los que dormitan en los asientos despiertan asustados,
aunque las pesadillas sean privilegio
de los que abastecen los oídos y el tedio de los psicoanalistas
en consultorios asépticos como el algodón que tapa la nariz de los muertos.
En las filas los pobres asumen un aire grave
que une temor, impaciencia y sumisión.
¡Qué grotescos los pobres! ¡Y cómo sus olores
Incomodan la noción de la conveniencias, no saben comportarse.
El dedo sucio de nicotina restriega el ojo irritado
que del sueño retuvo apenas la legaña.
Del seno caído y dilatado escurre un hilillo de leche
hacia la pequeña boca habituada al llanto.
En la plataforma van y vienen, corren, aseguran maletas y paquetes,
hacen preguntas inconvenientes en las ventanillas, susurran palabras misteriosas
y contemplan las portadas de las revistas con el aire de espanto
de quien no sabe el camino del salón de la vida.
¿Por qué ese ir y venir? Y esas ropas extravagantes,
esos amarillos de aceite de palmera que duelen a la vista delicada
del viajante obligado a soportar tantos olores incómodos.
¿Y esos rojos contundentes de feria y parque de diversiones?
Los pobre no saben viajar ni vestirse.
Tampoco saben vivir: no tienen noción del bienestar
aunque algunos poseen hasta televisión.
La verdad es que los pobres no saben ni morir.
(Tienen casi siempre una muerte fea y poco elegante).
En cualquier lugar del mundo incomodan,
… viajeros inoportunos que ocupan nuestros lugares aunque viajemos
sentados y
… ellos de pie.
ASILO SANTA LEOPOLDINA
Traducción de Stefan Baciu y Jorge Lobillo
Todos los días vuelvo a Maceió.
Llego en navíos desaparecidos, en trenes sedientos.
En aviones ciegos que sólo aterrizan al anochecer.
En los estrados de las plazas blancas pasean cangrejos.
Entre las piedras de las calles escurren ríos de azúcar
fluyendo dulcemente de los sacos almacenados en los trapiches
y clarean la sangre vieja de los asesinados.
Luego que desembarco tomo el camino del hospicio.
En la ciudad donde mis ancestros reposan en cementerios marinos
sólo los locos de mi infancia continúan vivos a mi espera.
Todos me reconocen y me saludan con gruñidos
y gestos obscenos o ruidosos.
Cerca, en el cuartel, la corneta que chilla
separa la puesta de sol de la noche estrellada.
Los locos lánguidos bailan y cantan entre las gradas.
¡Aleluya! ¡Aleluya! Más allá de la piedad
el orden del mundo brilla como una espada.
Y el viento del mar océano inunda mis ojos de lágrimas.
EL PÁJARO MUERTO
Traducción: Francisco Cervantes
La santidad del mundo se me aparece
bajo la forma espantada de ardilla
que me contempla entre los arbustos.
Debo esta aparición al Dios que me creó
y me hace notar lo menudo y lo insólito.
El polvillo en el ala de la mariposa,
En la lluvia radiante.
Me agacho y agarro el pajarito muerto
que ni la nieve supo guardar.
¿Por qué lo has matado, dios del frío,
que, en la noche de Nueva York, unes a hombre y mujer?
Como una hormiga, espero a que pase el tren
para atravesar
las vías ensangrentadas del óxido
y, diamantero, amo lo que el tiempo hizo
sin que fuese necesario herir o insultar;
ola en la plancha putrefacta de un navío
o el fulgor de un diamante.
A esa forma de perfección, luminosa y fría
es a la que aspiro a veces cuando, en el banco de un parque,
veo a un pajarito muerto
u, hombre, soy una ardilla que las ardillas
vienen a mirar con sorpresa.
A los cielos, que guardan el granizo y la pedrisca,
pido la no implantación del sello funerario.
¿Pero cómo ese dios sordo me oiría?
¿Cómo sus ojos vacíos, de qué modo
m adivinaría? Y las hojas caen, deslavadas, y el otoño
es viento y putrefacción.
A LA PATRIA
Versión:Héctor Carreto
Esta noche, en Toronto, junto a un lago de hielo
que es inmune al graznido de los gansos,
una patria ofendida surge de lo oscuro
y sale a mi encuentro con su sol y andrajos.
A su alrededor están los habitantes
del suelo silencioso de los mangles, la señal del semáforo
que como un ave se estremece en la marejada
y los mendigos que esperan la muerte bajo el paso a desnivel.
Mientras camino bajo la nieve de esta noche extranjera,
entre la sílabas negras de los frígidos pinos,
murmuro al viento tu nombre devastado.
Oh patria desamada, oh ramera,
mientras más me distancio, tu espina
más punza en mi mano inútil y helada.
EL PORTÓN DE LA NOCHE
Versión: Rubén Mejía
El portón permanece abierto el día entero,
pero en la noche y o mismo lo cierro.
No espero a ningún visitante nocturno
a no ser el ladrón que salta el muro de los sueños.
La noche silenciosa que me hace escuchar
el nacimiento de los manantiales en los bosques.
Mi cama, blanca como la Vía Láctea,
es angosta para mí en la noche negra.
Ocupo todo el espacio del mundo: mi mano desatenta
Derriba una estrella y ahuyenta un murciélago.
El latir de mi corazón intriga a las lechuzas
que, en las ramas de los cedros, rumian el enigma
del día y de la noche paridos por las aguas.
En mi sueño de piedra quedo inmóvil y viajo:
soy el viento que palpa las alcachofas
y enmohece los arreos colgados en el establo,
soy la hormiga que, guiada por las constelaciones,
aspira los perfumes de la tierra y del océano.
Un hombre que sueña es todo lo que no es:
el mar dañado por los navíos,
el silbido negro del tren entre hogueras,
la mancha que ennegrece el tambor de querosén.
Cierro el portón antes de dormir,
mas en el sueño se abre. Quien no vino de día
pisando las hojas secas de los eucaliptos
viene de noche, pues conoce el camino, al igual que los muertos
que aún no han venido, pero saben dónde estoy,
—cubierto por una mortaja, como todos los que sueñan
y se agitan en la oscuridad, gritando las palabras
que huyeron del diccionario y fueron a respirar el aire de la noche que huele a jazmín
y al dulce estiércol fermentado.
Los visitante indeseables atraviesan las puertas atrancadas
y las persianas que filtran el paso de la brisa, rodeándome.
¡Oh misterio del mundo, ningún candado cierra el portón de la noche!
Fue vano pensar que el anochecer dormiría solo,
protegido por el alambrado de púas que cerca mis tierras
y por mis perros que sueñas con los ojos abiertos.
En la noche, una simple brisa destruye los muros levantados por los hombres.
Aunque mi portón va a amanecer cerrado,
sé que alguien lo abrió en el silencio de la noche
y participó en la oscuridad de mi sueño inquieto.
LA QUEMA
Versión: Rubén Mejía
Quema todo lo puedas:
las cartas de amor
las cuentas telefónicas
la lista de la ropa sucia
las escrituras y los certificados
las indiscreciones de los colegas resentidos
la confesión a medias
el poema erótico que ratifica la impotencia
y anuncia la arterioesclerosis
los recortes antiguos y las fotografías amarillentas.
No dejes a los herederos hambrientos
Ninguna herencia de papel.
Sé como los lobos: habita en una cueva
Y sólo muestra a la canalla de las calles tus dientes afilados.
Vive y muere encerrado como un caracol.
Di siempre no a la escoria electrónica.
Destruye los poemas inacabados, los esbozos,
las variantes y los fragmentos
que provocan el orgasmo tardío de los filólogos y académicos.
No dejes a los catadores de basura literaria ninguna migaja.
No confíes a nadie tu secreto.
La verdad no puede ser dicha.
Extraídos de: La Tierra Allende; antología poética 1944-2005. Edición bilingüe. México: Libros 1001 Lo Poesible, 2005, con la debida autorización del autor. |