|
FLORIANO MARTINS Poeta, editor, ensaísta e tradutor. Tem se dedicado, em particular, ao estudo da literatura hispano-americana, sobretudo no que diz respeito à poesia.. Foi editor do jornal Resto do Mundo (1988/89) e da revista Xilo (1999). Em janeiro de 2001, a convite de Soares Feitosa, criou o projeto Banda Hispânica , banco de dados permanente sobre poesia de língua espanhola, de circulação virtual, integrado ao Jornal de Poesia. (Currículo completo ao final, depois dos poemas).
Veja também: TEXTS IN ENGLISH
Veja também: FLORIANO MARTINS & MANUEL IRIS – parceria em livro
Veja também: FLORIANO MARTINS & VIVIANE DE SANTANA PAULO – parceria em livro.
MARTINS, Floriano. A Vida inesperada 1991-2015. Fortaleza, CE: ARC Edições; Agulha Revista de Cultura, 2015. 581 p. 13,5x21 cm. “ Floriano Martins “ Ex. bibl. Antonio Miranda
“Vejo o convulsivo na poesia de Floriano Martins dentro daquilo que no Surrealismo se define como belo, vejo o encontro de elementos, sensações e temas no ponto em que deixam de ser opostos. Isso é o que considero convulsivo nele. Vejo elementos do feminino que ele contempla se juntarem aos elementos do masculino que ele expressa. E juntarem-se ao ponto de ser um.” SUSANA WALD
l. SALAS DE RECONHECIMENTO
1. Sou eu: o nome, as letras em que te arrastas, as perguntas que iniciam a travessia de tua dor.
Noite inquieta sob escombros. Delicado tambor das tormentas. Tua sombra vem vindo ao ninho de minhas sílabas errantes.
Tua sombra erguida. Intimidade de cinzas onde a dor o lábio toca. Formas ressurgidas do caos. Prolongas teu ser em tudo o que me falta.
Noite submersa em tremores. Esplendor de infernos devassados. Pousa tua mão na esfera crepitante de meus sentidos.
Uma prova: o livro que conduz ao templo. Missal de cinzas. Teu corpo soprado mil vezes, a queimar mais e mais longe de ti.
2.
Sou eu: a morte, as ruínas de tua história, lugar onde ninguém mais te escuta, onde as pedras de fogo são polidas.
Tua sombra erguida, oculto fósforo no desmaio dos sentidos. Os delicados jogos da morte. Assim escavas sob os pilares do tempo.
A treva em ti atingirá a fonte de outra queda. Tumulto que eleva tua vida acima de toda ruína.
Noite cerimonial do abismo. Tuas ruínas respiram em meu canto. Mil nomes segreda
Aqui andei, entre as criaturas dementes do mundo. Peregrino dentro de um quadro. Escrituras folheando o vento.
3.
Sou eu: o livro, as vozes de tua memória agitando os segredos do silêncio, tuas carnes devoradas pelo tempo.
Ressurges em mim. Ávida sentença de meus dias nas trevas. Alma inacabada a sorrir das formas que engendro como portas ao absoluto.
Uma prova: as últimas chamas evocadas. Braseiro confirmando a pele de teus dias, a suportar as figuras do vazio.
Noite nascendo em outra noite. Por trás das colunas circulares, o fogo abriga o livro do invisível pranto de suas cinzas.
Aqui andei. Fomos um e todos. Mascar o tempo é rito de alucinados. Os episódios virão dar todos nesta escura sala.
MARTINS, Floriano. O Sol e as sombras. São Paulo, SP: Pantemporâneo, 2014. 71 p. Gravuras em metal: Valdir Rocha. 14X21 cm. “ Floriano Martins “ Ex. bibl. Antonio Miranda
AMBÍGUOS
O verbo é um cocar, um ídolo disfarçado, um medo de sangrar até o esquecimento. O verbo não quer ser investigado por ira, tramóia, farpas, milagres ou confidências. Não há verbo no céu ou deus na terra. Todas as formas são dissidentes, sombras que um dia planejam ser a mais soberana de todas as feridas, um cardume silenciado, o busto ambíguo de um deus finito, carranca com que me anuncias a partição do reino. Rebentamos a vida creditando valores ao horizonte e à geografia dos devaneios. Nada nos impede de consultar a dissidência. Por vezes o verbo não faz sentido algum.
ALICIADOR
Quatro vezes dei constância aos ofícios de que não teremos jamais que regressar. Os semelhantes não disseram quantos, simplesmente se foram, desapareceram. À míngua não morreremos, sem espelho ou cinzas que testemunhem nossa dinastia. Sobraram tribos por contar, e cultos que não sabemos se hostis ou vulgares. Os filhos estão em quartos propícios à redoma para que lhes suture os sofrimentos. Quantas vezes dei constância aos sacrifícios para que se dissipem antes de toda colheita? Não convém fazer cópias do mesmo templo. As formas devem desaparecer dentro de nós como o acidente imperativo da permanência.
MARTINS, Floriano. Lembrança de homens que não existiam. Fortaleza, CE: ARC Edições, 2013. 104 p. ilus. 14x21 cm. Desenhos: Valdir Rocha. Projeto gráfico Nelson Itiro Mitshashi. Tiragem: 300 exs. “ Floriano Martins “ Ex. bibl. Antonio Miranda
XXI
Este é o selo da jornada dos castigos descarnados. Esta é a rosa do infortúnio e sua estrada extinta. Este é o deserto de círculos incendiários. Esta é a nuvem que se esconde em um armário invisível.
Os meus assuntos são impiedosos e não sabes onde lhes As tuas quimeras são feras em cativeiro. Aprendeste a amar a tudo o que te confunde e emporcalha. Eu jamais te revelaria o peso de minhas palavras.
Esta é a mordida voraz que eu reservo a teu coração. Este é o ninho de tijolos de tua queda e o tumulto da dor. Esta é a ilha onde inutilmente aprendes a não falhar. Este é o ferro onde moldas o rosto das vítimas que encarnas.
Os teus segredos estropiados batem à porta de novas ruínas. As minhas fúrias espalham cidades por onde passam. Eu jamais pude esperar que o sol refizesse o atalho. Tanto moeste o teu espírito que as sombras te perderam.
Este que vês refletido em mim és tu. Esta que nos olha de soslaio é a ilusão. Não passou um só instante desde que chegamos aqui.
MARTINS, Floriano. Autobiografia de um truque. Florianópolis: Eddições Nephelibata, 2010. 112 p. Exemplar n. 19 de uma edição de 60 exs. . “ Floriano Martins “ Ex. bibl. Antonio Miranda
O ILUSIONISTA
Despeço-me da natureza humana. Confundem-se corpo e alma em seus últimos espasmos. Mesclam-se as raízes do que fomos e de todo um mundo impossível. Quando me tocas já não estou. Em um vislumbre, escapas de meu ser. Um jorro de abismos se expõe em minha nudez. Tenho a pele supliciada. Uma ribanceira de êxtase ampliada em sítios ermos. Para que me cobices onde nem mesmo a memória alcance. E para que argumentes que eu te moldei como uma vítima secreta. Agora já sabes como pude mover-me de um extremo a outro de tua ilusão. A paisagem pressentida sempre esteve ali, como uma visão despida de toda crença.
MARTINS, Floriano. Duas mentiras. São Paulo: Dulcinéia Catador, 2007. s.p. 16x22 cm. Capa de papelão pintada a mão. Contato:
l.
Minha nudez de bruços espalhada pelo sofá
2.
À noite eu lhe disse que seria sua menina,
MARTINS, Floriano. Tumultúmulos. Capa & vinhetas: collages de Floriano Martins. Rio de Janeiro: Mundo Manual, 1994. 50 p. Edição de 300 exs. rubricados. Diretor-editorial Sérgio Campos. Composição e impressão> ZAS Gráfica e Editora., em Juiz de Fora, MG.
De
I Salas de reconhecimento Sou eu o nome as letras
Sou eu morte as ruínas
Aqui andei Entre as criaturas
************
1. AULA PRÁTICA Escavar por toda a arte. Em busca das vítimas da prestidigitação e do acaso. Dilatar a paisagem dos corpos até que se tenha a medida mais imprópria dos desastres. Quantas são as mortes que se repetem em cada túmulo violado? Objetos devorados pela ausência de sombras, desfeitos em si mesmos sem reparo. Vozes encalhadas nas vísceras do tempo, sangrando sinais que lidos por engano resultam em uma retórica de dilemas. Se o mundo caminha a largos passos descuidados, cuidar então para que lhe falte terra sob os pés. Afrontar o orgulho tosco do vazio e dizer-lhe no olho o quanto a dispersão o está matando com apenas uma jarra de gritos mal escritos. Buscar um sentido no outro, nos demais. Planejes ou não, todo o teu ser se arrasta dentro de ti. Evoluímos por galicismo.
AULA PRÁCTICA
Excavar por todo el arte. En busca de las víctimas de la prestidigitación y del acaso. Dilatar el paisaje de los cuerpos hasta que se tenga la medida más impropia de los desastres. ¿Cuántas son las muertes que se repiten en cada túmulo violado? Objetos devorados por la ausencia de sombras, deshechos en sí mismos sin reparo. Voces encalladas en las vísceras del tiempo, sangrando señales que leídos por engaño se resuelven en una retórica de dilemas. Si el mundo camina a largos pasos descuidados, cuidar entonces para que le falte tierra bajo los pies. Afrontar el orgullo tosco del vacío y decirle en el ojo cuánto la dispersión lo está matando con apenas un jarrón de gritos mal escritos. Buscar un sentido en lo otro, en los demás. Lo planees o no, todo tu ser se arrastra dentro de ti. Evolucionamos por galicismo.
O crítico acena com sua vigilância embaraçosa. Abomina o que chama de pequenos ruídos da existência, mas se deixa embalar por um silêncio ensurdecedor. Considera impróprio o instinto e o adverte que não acatará suas impurezas. Não se fez crítico para proteger improvisos. Tudo nele está acima do instante, e movimenta-se garboso e único pelo curral de sua petrificada realidade. O crítico apascenta a rigidez de toda arte que a ele se submete. Rega o ossuário das vanguardas, lustrando seus feitos inesquecíveis, matraqueando entre comuns, enfeitiçado, acreditando-se igualmente irrepetível. Depois se desgarra de si e sai a dar cursos de leviandade, defendendo a arte ligeira que pode controlar com sua maçante vigilância.
CULTIVO DE FARSAS(Traducción por Benjamín Valdivia)
El crítico gesticula con su vigilancia embarazosa. Abomina lo que llama pequeños ruidos de la existencia, pero se deja arrullar por un silencio ensordecedor. Considera impropio el instinto y le advierte que no acatará sus impurezas. No se hace crítico para proteger improvisados. Todo en él está encima del instante, y se mueve garboso y único por el corral de su petrificada realidad. El crítico apacienta la rigidez de todo arte que a él se somete. Riega el osario de las vanguardias, lustrando sus hechos inolvidables, haciendo ruido entre los comunes, hechizado, creyéndose igualmente irrepetible. Luego se desgarra de sí y sale a dar cursos de liviandad, defendiendo el arte ligero que puede controlar con su tediosa vigilancia.
|
|||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||||
|