POESIA GOIANA
DARCY FRANÇA DENÓFRIO
Nasceu na fazenda Nova Aurora, hoje município de Itarumã-GO, a 21 de julho de 1936. Autora de mais de duas dezenas de livros, distribuídos nas áreas; didática, crítica e literária. Sua crítica tem-se voltado fundamentalmente para difusão da Literatura Goiana. Dedicou trinta anos de sua vida ao magistério, destacando-se como professora de Teoria literária nos cursos de graduação e pós-graduação da Universidade Federal de Goiás.
Seu nome integra algumas antologias, entre as quais A poesia goiana no Século XX, de Assis Brasil. Rio de Janeiro: Imago Ed.; Goiânia-GO: Fundação Cultural Pedro Ludovico Teixeira, 1997 (co-edição); Goiás, meio século de poesia, de Gabriel Nascente. Goiânia: Editora Kelps, 1997; Feitio de Goiás, de Stella Leonardos. Goiânia: Editora da UFG, Ed. da UCG, 1996. Em 2006, contou com uma seleção de poemas publicada na revista acadêmica Sirena (2006:1), traduzida ao espanhol pelo Prof. Jorge R. Sagastume e ao inglês pelo Prof. Alexis Levitin, ambos do Departamento de Espanhol e Português, de Dickinson College-PA, responsável pela revista, distribuída por The Johns Hopkins University Press. Em três oportunidades teve também poemas traduzidos, lidos e distribuídos em brochuras na Middle Tennessee State University: no Tenth, Eleventh e Fifteenth Annual Womens’s International Poetry Reading (20 de março de 2002; 26 de março de 2003 e 28 de março de 2007, respectivamente).
Obra Crítica
1) Cora Coralina: celebração da volta
Organização em parceria com Goiandira Ortiz de Camargo. Goiânia: Cânone Editorial, 2006.
2) Da Aurora de vidro ao sol noturno: estudo sobre a poesia de Fernando Py
Goiânia: Cânone Editorial, 2005.
3) O redemoinho do lírico: estudos sobre a poesia de Gilberto Mendonça teles Prêmio Geraldo de Menezes de Ensaio, História e Crítica literária - 2007, da UBE - RJ.
Petrópolis - RJ: Vozes, 2005.
4) Cora Coralina
Coordenação, apresentação crítica e biografia. São Paulo: Global, 2004. (Coleção Melhores poemas).
5) Lavra dos Goiases III - Leodegária de Jesus
Medalha Leodegária de Jesus, 2001, da UBE- RJ e Prêmio Colemar Natal e Silva de Crítica Literária, 2003, da Academia Goiana de Letras. Goiânia: Cânone Editorial, 2001.
6) Lavra dos Goiases II - Afonso Félix de Sousa
Goiânia, Cânone Editorial, 2000.
7) Léo Lynce: poesia quase completa
Coordenação editorial, prefácio e notas críticas. Goiânia: Editora da UFG, 1997.
8) Lavra dos Goiases: Gilberto e Miguel
Prêmio Bolsa de Publicações Cora Coralina, 1996, da Fundação Cultural Pedro Ludovico Goiânia: Fundação Cultural Pedro Ludovico, 1997.
9) Hidrografia Lírica de Goiás I
Medalha Conceição Fagundes - 1996, e Prêmio Alejandro José Cabassa 1997 – Hors Concours de Ensaio Crítico-Literário, ambos da UBE, Rio de Janeiro. Goiânia: Editora da UFG, 1996.
10) Antologia do conto goiano I - dos anos dez aos sessenta
Organização em parceria com Vera M. Tietzmann Silva. Goiânia: Editora da UFG, 1992.
11) A obra poética de Afonso Félix de Sousa: dois estudos
Goiânia: Cegraf / UFG, 1991.
12) Literatura contemporânea: o regresso às origens
Porto Alegre: Acadêmica, 1987.
13) O poema do poema em Gilberto Mendonça Teles
Rio de Janeiro: Presença, 1984.
Obra poética:
14) Ínvio lado
Prêmio Jorge de Lima, 2000, da Academia Carioca de Letras, Rio de Janeiro. Goiânia, Editora da UFG, 2000. (Coleção Vertentes).
15) Amaro mar
Prêmio Literário Nacional do Instituto Nacional do Livro - 1987 e Prêmio Especial para Autor Goiano, na I Bienal de Poesia Itanhangá. Belo Horizonte: Itatiaia, 1988.
16) O risco das palavras
Finalista da I Bienal Nestlé de Literatura Brasileira, 1982, inédito.
17) Vôo cego
Prêmio Estadual Cora Coralina, 1981, da União Brasileira de Escritores, Goiás. Goiânia: Editora da UFG, 1980.
18) Poemas de dor & ternura (Goiânia: Cânone Editorial, 2008)
Obra didática:
19) Composição programada (volumes 1, 2 e 3)
São Paulo: Editora do Brasil, 1970.
Comparece em obras de apreciação crítica, enciclopédia e dicionários, tais como:
Figurões, de Ada Curado. Goiânia: Gráfica de O Popular, 1985.
Análises e conclusões (v. 2), de Nelly Alves de Almeida. Goiânia: Editora São Paulo, 1988.
Dimensões da literatura goiana, de José Fernandes. Goiânia: Cerne, 1992.
Ensaístas brasileiras, de Heloísa Buarque de Hollanda e Lúcia Nascimento Araújo. Rio de Janeiro: Rocco, 1993.
A crítica e o princípio do prazer, de Gilberto Mendonça Teles. Goiânia: Editora da UFG, 1995.
Escritores de Goiás, de Mário Ribeiro Martins. Rio de Janeiro: Master, 1996.
O espaço da crítica: panorama atual, de Moema de Castro e Silva Olival. Goiânia: Editora da UFG, 1998.
Dicionário de mulheres, de Hilda Agnes Hübner Flores. Porto Alegre: Nova Dimensão, 1999.
Dicionário do escritor goiano, de José Mendonça Teles. Goiânia: Kelps, 2000.
Autorretratos de escritores goianos, de Giovanni Ricciardi. Goiânia: IGL; Agepel, 2001.
Dicionário crítico de escritoras brasileiras: 1711-2001, de Nelly Novaes Coelho. São Paulo: Escrituras Editora, 2002.
Enciclopédia brasileira de literatura, de Afrânio Coutinho e José Galante de Sousa. Coord. Graça Coutinho e Rita Moutinho.
São Paulo: Global; Fundação Biblioteca Nacional/DNL e Academia Brasileira de Letras, 2002.
Escritores goianos (1985-2005), de Fernando Py. Goiânia: Kelps, 2007.
Vozes em dissonância: mulheres, memória e nação, de Kátia da Costa Bezerra (Universidade do Arizona). Florianópolis: Editora Mulheres, 2007.
Biografia e criação literária: entrevista com escritores de Goiás, de Giovanni Ricciardi. Goiânia, Kelps, 2009.
Página preparada por Salomão Sousa.
TEXTOS EM PORTUGUÊS / TEXTOS EN ESPAÑOL
EN FRANÇAIS
Extraído de
POESIA SEMPRE. Número 31 – Ano 15 / 2009. Rio de Janeiro: Fundação Biblioteca Nacional, Ministério da Cultura. 2009. 217 p. ilus. col. Editor Marco Lucchesi. Ex. bibl. Antonio Miranda
Legado
Sou essa ostra
a secretar defesa
em torno dessa dor
que me punge o corpo frágil.
Agarro-me ao rochedo
dissimulo-me na areia
ou mergulho na fossa
de insondável mar.
Essa dor não será meu legado
quero apenas a pérola esférica
nacarada — mais que perfeita —
e mais nada.
Nosso jardim
Lanço o olhar pelo jardim
um reino vegetal criado
por nossas mãos, urdido
pelo desejo de um paraíso
perdido.
Entre neblinas seu vulto
e minhas mãos na lembrança
comandando canteiros
esparzindo flores-fragrâncias
erguendo caramanchões
e outras belezas — tão nossas.
Folhas secas estalam
sob meus pés concretos
e olho orquídeas a exalar
e ouço pássaros e pizzicatos
todos de agora-outrora.
Lição de Kant
Poeira de estrela
aqui estou exilada
e não sou nada.
Vejo o céu estrelado
— anos luz-pirilampos —
a cifrar a mensagem
que nos veio de Kant.
Recebo o mesmo impacto:
o espetáculo dessa noite
um céu repleto de estrelas
desaba sobre a humana vaidade.
Contemplo nos olhos do filósofo
essas mestras de humildade.
E também piso e esmago
o orgulho de criatura insignificante
— não sou nada.
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Pintura: Brenda Lee:
Poema publicado em:
BRITO, Elizabeth Caldeira, org. Sublimes linguagens. Goiânia, GO: Kelps, 2015. 244 p. 21,5x32 cm. Capa e sobrecapa. Projeto gráfico e capa: Victor Marques. ISBN 978-85-400-1248-6 (p. 38)
À SOMBRA DE EVA
I
Era um tempo de trevas
e de brumas sobre o meu corpo.
Um tempo de pesadas vestes:
uma única janela para o meu rosto.
Um cavalo avassalava
minhas planícies e vales,
me punha bridas e loros,
depois um cinto de castidade.
Eu não falava: minha língua
guardava-se em ostra
e o estro silenciava-se
numa lira que dormia.
Meu amo determinava:
eu só ouvia.
Meu amo vociferava:
eu encolhia.
II
Com a roca e o fuso
e um cesto da mais pura lã,
adestrava meus dedos
para tecer a manhã.
Sozinha no burgo,
(ah! bem longe era o meu Senhor)
embalava no berço
a balada que eu compus.
E meu canto se alçava
e com ele também eu,
enquanto durava a paz
que a guerra me podia dar.
Eu não lia nem soletrava
sobre uma távola redonda;
só adestrava meus dedos
para tecer a manhã.
E num bosque bem fundo,
numa grota dentro de mim,
meu estro se formava
numa lira eólia
que acordava.
E eu enredava no fuso
(horário) outra manhã.
III
Quantos séculos dormiu meu canto?
Quem estrangulou minha garganta
afiada para solar, meu canto?
Era um pássaro mudo
engolindo a cascata
aérea de seu canto.
Um pássaro na gaiola
ferindo as asas —
sonata a debater-se.
Um pássaro preso
a olhar o céu (arquiteto)
e seu aceno de poesia.
Procura-se
Quero um amigo verdadeiro
a quem possa vomitar
a alma e o coração inteiro.
Que me ouça sem interromper,
sem condenar nem defender,
que apenas me ouça o mais profundo.
E depois, sem nada cobrar,
seja terno, seja puro, só amigo,
bebendo comigo, sem dividir nem multiplicar,
a grande solidão de meus segredos.
O RISCO DAS PALAVRAS
(Para Moema de C. e Silva Olival)
Ah! a miséria da oficina das palavras!
Onde pescar a que melhor convém?
Maiakovski
Diante de você sempre emudeço.
Tenho as palavras batendo, ba-ten-do
ao peito mais que à garganta.
Mas é tão grande o risco das palavras
que, delas, finjo que me esqueço.
Ah, as palavras, se não houvesse o risco,
eu diria todas, tropeçando em pedras
como algumas cachoeiras, mas jorrando
sem parar a urgência de suas águas.
Mas as palavras acordam até mesmo
os deuses mais adormecidos
e é melhor não dizê-las, guardá-las
como pedras, mesmo ferindo o peito.
Se eu não as disse algum dia,
alguém lhe dirá sem medo do risco,
porque há os que abrem as comportas
e extravasem sem reservas suas águas.
Mas eu sou dessas barragens
que não se entregam nem extravasam,
mesmo com a maior das enchentes.
LIÇÃO
Embaixo, a rede.
Em cima, a lição
de um caramanchão.
Um trançado de cipós
camadas secas sobrepostas
nenhum sinal de vida
havida.
Sobre lianas mortas
outra explosão de verde
outra explosão em flor.
E um pássaro em concerto.
POEMA DA DOR SEM NOME
Essa mágoa
dói tão fundo
como se houvesse
perfurado o abismo
interior de meu mundo.
Dela, não serei vassala
só quero lançá-la
como um fio infinito
que se joga no abismo
até vomitar de vez
o início da ponta.
Depois, chegar
à íntima alegria
sem sentir a broca
perfurando a rocha
de meu poço artesiano.
À alegria de alcançar
as águas tranquilas
minhas mais profundas
reservas humanas.
E ouvir o íntimo silêncio
águas entre rochas calcárias
sem nenhuma pressa
águas que não estremecem
nem trincam
o espelho da alma.
DENÓFRIO, Darcy França. Ínvio Lado. Goiânia: Editora UFG, 2000. 178 p. 13,5x19,5 cm. 177 p. (Coleção Veertentes) 13,5x19,5 cm. Projeto gráfico e capa: Soraia Kalil Guimarães. Col. A.M. (EA)
ÍNVIO LADO
Tell all the truth but tell it slant -
Success in circuit lies.
Emily Dickinson
Há um lado da flor
que não penetramos:
talvez a reserva sitiada
onde guarda seu aroma.
Quase sempre esbarramos
em seus ferrões de defesa
e sangramos nossa dor
pela ponta dos espinhos.
E aí então paramos
e olhamos só por fora
a beleza que se entrega
com sua quota de reserva.
É do outro lado
(do mistério)
que não alcançamos
que a flor explode
em toda sua grandeza.
É lá que se contorceu
e guardou a sua história
e sangrou as suas gotas
e a solidão que (sobre)carrega.
Quem olha uma flor
ou um ser desabrochado
vê um prisma (feio ou lindo)
jamais o seu lado
inviolado.
Imagem extraída da exposição "VARAL POESIA GOIANA 1917-2016" exposta durante do I COLÓQUIO DO POESIA GOIANA, na Universidade Federal de Goiás, de 13-14 de junho de 2017.
ESCAPE
A raça humana
não pode suportar muita realidade.
T.S. ELIOT
Conheço a distância
que vai entre o sonho
e a dura realidade.
E conheço a fórmula
de amortecer o susto
e a queda do último piso.
Olhar sem crer lá fora
esse vidro que corta
e fechar, atrás de si, a porta.
Plantar, como sempre faço,
essas flores no paredão do muro
para deslumbrarem os meus olhos.
E, nessa lente distorcida,
em que capto a beleza,
mesmo aquela que não existe,
ficar musgo sobre a rocha
— véu veludoso verde veludo —,
cobrindo essa faca que cega o corte.
DENÓFRIO, Darcy França. Amaro Mar. 2ª. ed. Belo Horizonte: Editora Itatiaia; Brasília: INL, 1988. 138 p. (Coleção “Poetas de sempre”, vl. 7) 14x21 cm. Capa de Cláudio Martins. “Prêmio Literário Nacional 1987. Col. A.M. (EA)
OS PEIXES DE MEU RIO
Não, não é fácil escrever. É duro como
quebrar rochas.
Clarice Lispector
Eu me desnudo e me visto
neste duro ofício de entrega.
Se as vestes revelam o corpo,
há o pudor e a dissimulação
no trançado desse tecido
que é teia e tato antes de tudo.
Eu me desnudo e me visto.
e nem assim eu me preservo.
Sob o vestido há sempre a pele
que transpira e se revela;
há outra dimensão do signo
que corcoveia e se rebela.
Sob o tecido há sempre um corpo
que se amotina e se entrega.
POEMA
No reverso, a história de meus versos.
No avesso, a pura canção de gesso,
que se sustenta no azul da lenda,
no equilíbrio do fio que (entre)teço.
Na superfície, a frauta noturna
de sustenidos ais e bemóis.
Na superfície, a fraude fria
e a neblina sobre mil lençóis.
E no fundo d'água, nos peraus,
que moram os peixes de meu rio.
É no remanso que alguma iara
sempre se esquiva solitária.
De repente, o susto da cilada,
um anzol recurvo — aço e isca —
mas os meus peixes não se entregam,
apenas provam de leve, triscam.
DENÓFRIO, Darcy França. Poemas de dor e ternura. Goiânia: Cânone Editorial, 2008. 144 p. 14x21 cm. Projeto e arte final de capa: Luciana Oliveira e Paula. Col. A.M. (EA)
PONTO FINAL
Se não há mais nada a fazer
é isto mesmo - em frente.
Não importa a direção
a que se ande (já disseram)
desde que seja para frente.
Se a última palavra
já foi pronunciada
não cabe vírgula
nem outros sinais de pontuação
a não ser o ponto final
ENFRENTE!
FLOR DE CÁCTUS
Rara Celso Henrique,
que ama essa flor.
Já imaginou a sede, a dor,
a privação por que passou?
O sol escaldante a se derramar
sobre o tronco e os braços?
O cáctus - irmão do deserto -
sabe de cor uma lição
e passa aprendizagem:
vai retirando de cacimbas
(de onde só ele sabe)
a água da vida e forma
suas reservas interiores.
Um dia explode
entre agudos espinhos
e hastes grotescas
a suprema flor de seda
- a mais pura delicadeza.
Flor da paciência, espera,
da obstinação e abstinência.
Flor que aprendeu a liturgia
e o rito de florescer
até mesmo no deserto.
DENÓFRIO, Darcy França. 50 poemas escolhidos pelo autor. Rio de Janeiro: Edições Galo Branco, 2011. 96 p. 13x21 cm. (Coleção 50 poemas escolhidos pelo autor) Direção: Waldir Ribeiro do Val. ISBN 978-85-7749-098-1
A VERDADE DENTRO
Se não houvesse
esse pacto secreto
de silêncio de chumbo
ou essa oclusão completa
de um travo-de-ferro
na grota da garganta,
a verdade fluiria fluida
do flanco da montanha
ou do poço da garganta.
Mas esse silêncio
foi fabricado, dentro,
não por mim ou você,
mas por oceanos de mãos,
segurando bridas e freios,
esmagando goelas e anseios,
desde a mais remota manhã
em que o potro selvagem
ensaiou sua disparada na planície.
TEXTOS EN ESPAÑOL
Traducão de Jorge R. Sagastume
LECCIÓN
Debajo, la red.
Encima, la lección
de una casita.
Un trenzado de bejucos
camadas secas superpuestas
ninguna señal de vida
vivida.
Sobre lianas muertas
otra explosión de verde
otra explosión en flor.
Y un pájaro en concierto.
POEMA DE DOLOR SIN NOMBRE
Esa amargura,
herida tan profunda
como si hubiese
perforado el abismo
interior de mi mundo.
De ella no seré esclava
sólo quiero arrojarla
como a un hilo infinito
que rueda en el abismo
hasta vomitar
el origen de la punta.
Después, llegar
a la íntima alegría
sin sentir la broca
perforando la roca
de mi aljibe artesano.
La alegría de alcanzar
las aguas tranquilas
mis más profundas
reservas humanas.
Y oír el íntimo silencio,
aguas entre rocas calcáreas
sin ninguna prisa,
aguas que no estremecen,
tampoco astillan
el espejo del alma.
Os poetas Antonio Miranda, Darcy França Denófrio e José Fernandes encontram-se em Goiânia, no dia 4 de abril de 2012. Foto Nildo.
BRITO, Elizabeth Caldeira, org. Sublimes linguagens. Goiânia, GO: Kelps, 2015. 244 p. 21,5x32 cm. Capa e sobrecapa. Projeto gráfico e capa: Victor Marques. ISBN 978-85-400-1248-6 BRITO, Elizabeth Caldeira, org. Sublimes linguagens. Goiânia, GO: Kelps, 2015. 244 p. 21,5x32 cm. Capa e sobrecapa. Projeto gráfico e capa: Victor Marques. ISBN 978-85-400-1248-6
Ex. bibl. Antonio Miranda
A QUE NUNCA SUBTRAI
MÃE: aquela que se parte
e se re-par-te sempre
e sempre se multiplica
porque sempre soma.
POEMA
Eu me desnudo e me visto
neste duro ofício da entrega.
Se as vestes revelam o corpo,
há o pudor e dissimulação
no trançado desse tecido
que é a teia e tato antes de tudo.
Eu me desnudo e me visto
e nem assim eu me preservo.
Sob o vestido há sempre a pele
que transpira e se revela
há outra dimensão do signo
que corcoveia e se rebela.
Sob o tecido há sempre um corpo
que se amotina e se entrega.
OUTONO
É outono e um pássaro canta.
Trinco a fruta madura
e quero a definitiva posse.
Os arrozais já improvisam
seu canto de safra e ceifa
aos pássaros transitórios.
Adiando a próxima estação,
finco a bandeira neste solo
que arrendei provisório
sonhando usucapião.
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A POESIA GOIANA NO SÉCULO XX (Antologia) – Organização, introdução e notas de Assis Brasil. Rio de Janeiro: FBN / Imago / IMC, Fundação Biblioteca Nacional, 1998. 324 p. (Coleção Poesia brasileira) ISBN 85-312-0627- 3 Ex. bibl. Antonio Miranda
PRECE
Senhor, eu sou,
e graças Te dou
pela glória de ser.
Mas que eu seja
não um verme
ou menos ainda.
Que eu saiba domar
este cavalo selvagem
pulando desesperado
dentro do meu peito.
Que eu saiba acalmar
este pássaro assustado
tremendo nas minhas mãos.
Que eu saiba
visitar meu sótão
e estar em paz
com os meus guardados.
(Vôo cego/ 1980)
POESIA
A poesia tem poros
e transpira seu sangue.
A poesia tem pele
e prepara a carícia.
A poesia tem tato
e calcula o afago.
A poesia tem mãos
e molda o seu barro.
A poesia tem coração
em sístole e diástole.
A poesia tem cérebro
e processa seu dado.
A poesia tem busca
e festeja seu achado.
A poesia é um mito
e sustenta seu rito.
A poesia é um marulho de búzios
que rumoreja a maré do princípio.
A poesia são pássaros alados
e muito mais as suas migrações.
A poesia são seixos rolados
rolando a canção de seu ritmo.
A poesia é silêncio
e cala no seu tempo.
(Amaro mar/ 1988)
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Página ampliada e republicada em maio de 2022
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VEJA e LEIA outros poetas de GOIÁS em nosso Portal:
http://www.antoniomiranda.com.br/poesia_brasis/goias/goias.html
Página publicada em junho de 2021
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