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JOÃO CABRAL DE MELO NETO
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MELO NETO, João Cabral. Poesia completa. Organização, prefácio, fixação de textos e notas de Antonio Carlos Secchin. Lisboa: Glaciar; Rio de Janeiro: Academia Brasileira de Letras, 2014. 931+16 p. 17X24 com capa dura ISBN 978-869-8776-07-5 Inclui toda a poesia do autor, inclusive poema “Dispersos” e alguma prosa, além da Bibliografia. “ João Cabral de Melo Neto “ Ex. bibl. Antonio Miranda.
OS QUATRO ELEMENTOS
AR
Um pássaro
Um avião
Um bailarino
Estão perdidos
No ar que eu respiro.
Uma casa
Um árvore
Uma cidade
Se agitam
No ar que me banha.
No ar às vezes perturbado
Pela rápida passagem
Da poesia:
Numa flor que treme
Num homem que se esquece
Nos noturnos sonhos ainda próximos
Tirando a lucidez
Ao ar da manhã.
TERRA
À terra não é dado se evadir
(A terra diária: excesso talvez
De mãos necessárias como o ferro)
Como no céu foge uma nuvem
Como no ar erra a presença
Transparente — o mundo luminoso
Que a terra pode apenas ir sonhando.
ÁGUA
Água, água, água;
Água do mar e do copo;
Da sede e do navio;
Distância
Entre mim e o náufrago.
Presença futura na nuvem
Voando sobre Nova Iorque;
No inverno
Molhando nossas almas.
Água ausente da lua,
Das pedras, dos fantasmas
Que surpreendemos imitando
Nossos gestos aquáticos
Água sempre pronta
Para fugir, para partir:
(Fuga no ar como os sonhos)
Água do vapor de água.
FOGO
Fogo informe e obscuro
Que as palavras não atingem;
Fogo um só como o homem,
Fogo um só sobre a terra;
Acaso sempre renovado
Da luz elétrica que se acende,
De um sol que sempre nasce
Criando as profundezas
Debaixo do céu e dentro do meu quarto.
1932
IMITACIÓN DEL AGUA | IMITAÇÃO DA ÁGUA |
João Cabral de Melo Neto - Trad. Antonio Miranda | João Cabral de Melo Neto |
De flanco sobre la sábana, paisaje ya tan marino, a una ola acostada, en la playa, parecías. |
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Una ola que se paraba o mejor: se contenía; que sostuviese un momento su rumor de hojas líquidas. |
Uma onda que parava |
Una ola que se paraba en aquella hora precisa en que el párpado de la ola cae sobre la otra pupila. |
Uma onda que parava |
Una ola que se estancara al doblarse, interrumpida, que inmóvil se interrumpiese en el alto de su cresta |
Uma onda que parava |
y se hiciese montaña (por horizontal y fija) mas que al hacerse montaña fuese de agua todavía. |
e se fizesse montanha |
Una ola que guardase en la playa cama, finita, el modo de ser sin fin del mar de que participa, |
Uma onda que guardasse |
y en su inmovilidad, que precaria se adivina; el don de verterse que hace a las olas femininas, |
e em sua imobilidade, |
más el clima de aguas hondas, y la intimidad sombría y cierto abrazar completo que a los líquidos copias. |
mais o clima de águas fundas, |
MELO NETO, João Cabral. Engenheiro. Rio de Janeiro: Amigos da Poesia, 1945. 55 p. 14,5x19,5 cm. Dedicada a Carlos Drummond de Andrade. Exemplares relativamente escassos nos sebos, a preços elevados... Para colecionadores.
A MULHER SENTADA
Mulher. Mulher e pombos.
Mulher entre sonhos.
Nuvens nos seus olhos ?
Nuvens sobre seus cabelos.
(A visita espera na sala;
A notícia, no telefone;
A morte cresce na hora,
A primavera além da janela).
Mulher sentada. Tranquila
Na sala, como se voasse.
MELO NETO, João Cabral de. Poemas escolhidos. Lisboa: Portugália, 1963. (Colecção Poetas de Hoje, 9) 275 p. 14x20,5 cm. Seleção de poemas realizada por Alexandre O´Neill. Inclui uma Errata em papel solto. Na apresentação da obra, o texto “A Poesia de João Cabral de Melo Neto (apenas algumas indicações ao leitor comum)” por Alexandre Pinheiro Torres. “ João Cabral de Melo Neto “ Ex. na col. Antonio Miranda
VI.
Não a forma encontrada
como uma concha, perdida
nos frouxos areais como
cabelos;
não a forma obtida
em lance santo oii raro,
tiro nas lebres de vidro
do invisível;
mas a forma atingida
como a ponta do novelo
que a atenção, lenta,
desenrola,
aranha; como o mais extremo
desse fio frágil, que se rompe
ao peso, sempre, das mãos
enormes.
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De
PRIMEIROS POEMAS
Organização e introdução de Antonio Carlos Secchin.
Rio de Janeiro: Faculdade de Letras/ UFRJ, 1990.
Quando JCMN completou 70 anos, em 1990, a Universidade Federal do Rio de Janeiro outorgou ao poeta o título de Doutor Honoris Causa e publicou uma edição de 500 exemplares numerados do livro PRIMEIROS POEMAS, organizado por Antonio Carlos Secchin, com textos inéditos ou pouco difundidos do autor. Alguns poemas de juventude, iniciais, a partir dos dezessete anos, revelando influências mas já afirmando seu estilo futuro. Sua vertente modernista e seu substrato surrealista, sua vertente metapoética e sua visão de pintor e engenheiro na poesia. A seguir, alguns textos desta edição restrita a colecionadores. ANTONIO MIRANDA
“Alguns traços, todavia, já começavam a singularizar a produção de Cabral.” ANTONIO CARLOS SECCHIN
Pirandello II
Sei que há milhares de homens
se confundindo neste momento.
O diretor apoderou-se de todas as consciências
Num saco de víspora.
Fez depois uma multiplicação
que não era bem uma multiplicação de pães
de um por dez por quarenta mil.
Tinha um gesto de quem distribui flores.
A mim me coube um frade
um pianista e um carroceiro.
Eu era um artista fracassado
que correra todos os bastidores
vivia cansado como os cavalos dos que não são heróis
serei um frade
um carroceiro e um pianista
e terei de me enforcar três vezes.
(1937)
Introdução ao instante
Podiam-se notar uma ausência completa de transformações e um
monarca asiático em visita a Londres.
Crimes invisíveis sob a lua foram revelados e alguns dos movimentos
iniciais jamais pressentidos vieram à tona.
Para sempre permanecerão nos pólos mais afastados leões de pedra
Impenetráveis como esfinges.
(1938)
O regimento
O estudo, o trabalho, o relógio na torre.
—A noite explodiu em mim? Não creio necessário.
(Tais gritos ao telefone não perturbam o silêncio).
Podíamos verificar que chegávamos de sucessivas caminhadas.
Estaríamos cansados? Mas a um só gesto despíamos a farda.
Como estávamos longe, muito afastados, em cada extremo da cidade,
os poemas eram transcrito por toda a comunidade.
Ás refeições os soldados os tinham sob os pratos.
Muito interessante a guerra! O Sr. Poderia me dar uma explicação para
Todas essas laranjas?
(1942)
[Trouxe o sol à poesia]
Trouxe o sol à poesia
mas como trazê-lo ao dia?
No papel mineral
qualquer geometria
fecunda a pura flora
que o pensamento cria.
Ora, no rosto que, grave
riso súbito abria,
no andar decidido
que os longes media,
na calma segurança
de quem tudo sabia,
no contacto das coisas
que apenas coisas via,
nova espécie de sol
eu, sem contar, descobria:
não a claridade imóvel
da praia ao meio-dia,
de aérea arquitetura
ou de pura poesia:
mas o oculto calor
que as coisas todas cria.
(sem data; 1947?)
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ANTIODE
(contra a poesia dita profunda)
A
Poesia, te escrevia:
flor! conhecendo
que és fezes. Fezes
como qualquer,
gerando cogumelos
(raros, frágeis cogu-
melos) no úmido
calor de nossa boca.
Delicado, escrevia:
flor! (Cogumelos
serão flor? Espécie
estranha, espécie
extinga de flor, flor
não de todo flor,
mas flor, bolha
aberta no maduro).
Delicado, evitava
o estrume do poema,
seu caule, seu ovário,
suas intestinações.
Esperava as puras,
transparentes florações,
nascidas do ar, no ar,
como as brisas.
B
Depois, eu descobriria
que era lícito
te chamar: flor!
(Pelas vossas iguais
circunstâncias? Vossas
gentis substâncias? Vossas
doces carnações? Pelos
virtuosos vergeis
de vossas evocações?
Pelo pudor do verso
— pudor de flor —
por seu tão delicado
pudor de flor,
que só se abre
quando a aquece o
sono do jardineiro?)
Depois eu descobriria
que era lícito
te chamar: flor!
(flor, imagem de
duas pontas, como
uma corda). Depois
eu descobriria
as duas pontas
da flor, as duas
bocas da imagem
da flor: a boca
que como o defunto
e a boca que orna
o defunto como outro
defunto, com flores,
— cristais de vômito.
C
Como não invocar o
vício da poesia: o
corpo que entorpece
ao ar de versos?
(Ao ar de águas
mortas, injetando
na carne do dia
a infecção da noite).
Fome de vida? Fome
de morte, freqüentação
da morte. Como de
algum cinema.
O dia? Árido.
Venha, então a noite,
o sono. Venha,
por isso, a flor.
Venha, mais fácil e
portátil na memória,
o poema, flor no
colete da lembrança.
Como não invocar,
sobretudo, o exercício
do poema, sua prática,
sua lânguida horti-
cultura: Pois estações
há, do poema, como
da flor, ou como
no amor dos cães;
e mil mornos
enxertos, mil maneiras
de excitar negros
êxtases; e a morna
espera de que se
apodreça em poema,
prévia exalação
da alma defunta.
D
Poesia, não será esse
o sentido em que
ainda te escrevo:
flor! (Te escrevo:
flor! Não uma
flor, nem aquela
flor-virtude — em
disfarçados urinóis).
Flor é a lavra
flor; verso escrito
no verso, como as
manhãs no tempo.
Flor é o salto
da ave para o vôo:
o salto fora do sono
quando seu tecido
se rompe; é uma explosão
posta a funcionar,
como uma máquina,
uma jarra de flores.
E
Poesia, te escrevo
agora: fezes, as
fezes vivas que és.
Sei que outras
palavras és, palavras
impossíveis de poema.
Te escrevo, por isso,
fezes, palavra leve,
contando com sua
breve. Te escrevo
cuspe, cuspe, não
mais; ao cuspe
como a terceira
(como usá-la num
poema?) a terceira
das virtudes teologais.
Extraído de GONZALO ROJAS / JOÃO CABRAL DE MELO NETO. Santiago de Chile: Embajada de Brasil en Chile; Academia Brasileira de Letras, 2005. Cortesia do Centro de Estudios Brasileños.
MELO NETO, João Cabral de. Notas sobre uma possível A casa de Farinha. Organização de Inez Cabral. Rio de Janeiro: Objetiva, 2013. 145 p. 16x23 cm. Selo Alfaguara. ISBN 978-85-7962-252-6 Capa e projeto gráfiaco: Mariana Newlands. Imagens da capa: documentos do acervo da família.O livro inclui as anotações de um poema inacabado e publicadas pela primeira vez, com reproduções em fac-simile dos originais. Col. A.M.
Um fragmento :
Arauto:
Não sei não: tudo o que ouvi
Me faz uma tal confusão
Que não sei dizer se o que ouvi
Era um dizer sim ou não
As coisas todas se cruzavam
Como um madapolão
Os fios se cruzam e a gente
Não sabe se viu ou. não
As novidades são tantas
Se cruzam, tantas, e tão,
Que é difícil dizer nelas
Onde está o sim e o não.
Por isso, melhor calar
Se, no tecido o padrão
Não é possível distinguir
Melhor dizer que não tem não
— Mas afinal vocês de fora
[...] porque todos estão
nós e vocês, num só dia
como se fosse um mutirão,
a fazer esta farinha
que cada um, com sua mão,
antes vinha aqui fazer
afinal porque a intenção
de vir aqui todo mundo
no dia de hoje, a reunião
como se fazer farinha
fosse um S. Pedro ou São João.
Fonte da imagem: http://cdeassis.files.wordpress.com/
ELOGIOS DO OVO
I
Ao olho mostra a integridade
de uma coisa num bloco, um ovo.
Numa só matéria, unitária,
maciçamente ovo, num todo.
Sem possuir um dentro e um fora,
tal como as pedras, sem miolo:
é só miolo: o dentro e o fora
integralmente no contorno.
No entanto, se ao olho se mostra
unânime em si mesmo, um ovo,
a mão que o sopesa descobre
que nele há algo suspeitoso:
que seu peso não é o das pedras,
inanimado, frio, goro;
que o seu é um peso morno, túmido,
um peso que é vivo e não morto.
II
O ovo revela o acabamento
a toda mão que o acaricia,
daquelas coisas torneadas
num trabalho de toda a vida.
E que se encontra também noutras
que entretanto mão não fabrica:
nos corais, nos seixos rolados
e em tantas coisas esculpidas
cujas formas simples são obra
de mil inacabáveis lixas
usadas por mãos escultoras
escondidas na água, na brisa.
No entretanto, o ovo, e apesar
de pura forma concluída,
não se situa no final:
está no ponto de partida.
III
A presença de qualquer ovo,
até se a mão não lhe faz nada,
possui o dom de provocar
certa reserva em qualquer sala.
O que é difícil de entender
se se pensa na forma clara
que tem um ovo, e na franqueza
de sua parede caiada.
A reserva que um ovo inspira
é de espécie bastante rara:
é a que se sente ante um revólver
e não se sente ante uma bala.
É a que se sente ante essas coisas
que conservando outras guardadas
ameaçam mais com disparar
do que com a coisa que disparam.
IV
Na manipulação de um ovo
um ritual sempre se observa:
há um jeito recolhido e meio
religioso em quem o leva.
Se pode pretender que o jeito
de quem qualquer ovo carrega
vem da atenção normal de quem
conduz uma coisa repleta.
O ovo porém está fechado
em sua arquitetura hermética
e quem o carrega, sabendo-o,
prossegue na atitude regra:
procede ainda da maneira
entre medrosa e circunspeta,
quase beata, de quem tem
nas mãos a chama de uma vela.
MINDLIN, Vera Bocaiuva. Gravuras. Poema de João Cabral de Melo Neto. São Paulo: Julio Pacello, s.d. álbum de grandes dimensões, com capa de cartão duro revestido de tecido. Livro de arte com gravura. Ex. col. Zenilton Gayoso.
MORTE E VIDA SEVERINA
(animação baseada na obra de João Cabral de Melo Neto)
Morte e Vida Severina em desenho animado é uma versão audiovisual da obra prima de João Cabral de Melo Neto, adaptada para os quadrinhos pelo cartunista Miguel Falcão. Preservando o texto original, a animação 3D dá vida e movimento aos personagens deste auto de natal pernambucano, publicado originalmente em 1956.
Em preto e branco, fiel à aspereza do texto e aos traços dos quadrinhos, a animação narra a dura caminhada de Severino, um retirante nordestino, que migra do sertão para o litoral pernambucano em busca de uma vida melhor. Fonte: Youtube
https://www.youtube.com/watch?v=FWpFz0-jXlU
RECOMENDAMOS A OBRA MAIS COMPLETA E ESPECIALIZADA SOBRE JCMN:
SECCHIN, Antonio Carlos. João Cabral: uma fala só lâmina. São Paulo: Cosac Naif, 2014. 480 p. ilus. 14,5x23 cm. Projeto gráfico: Paulo André Chagas. ISBN 978-85-405-0764-7 Analisa, livro a livro, toda a obra de João Cabral de Melo Neto, incluindo os textos de seu livro João Cabral: a poesia do menos ( 1985 ) e os ensaios posteriores, revisados, que produziu sobre a poesia cabralina. Secchin é o mais destacado estudioso da obra do poeta pernambucano. “ Antonio Carlos Secchin “ Ex. bib. Antonio Miranda
MELO NETO, João Cabral de. A literatura como turismo. Seleção e texto de Inez Cabral. Rio de Janeiro: Alfaguara, 2015. 149 p. 15x23 cm. isbn 978-85-5652-021-0 Capa Gustavo Soares. Foto da capa: Ramón Courdec.
Edição realizada pelo filha do poeta com e sobre os textos que o poeta realizou em seus quase cinquenta anos de “turismo” diplomático em diversos países da Europa, África e América Latina. O título do presente livro é uma derivação do poema seguinte:
A LITERATURA COMO TURISMO
Certos autores são capazes
de criar o espaço onde se pode
habitar muitas horas boas:
um espaço-tempo, como o bosque.Onde se ir nos fins de semana,
de férias, até aposentar-se:
de tudo há nas casas de campo
de Camilo, Zé Lins, Proust, Hardy.A linha entre ler conviver
se dissolve como em milagre;
não nos dão seus municípios,
mas outra nacionalidade,
Até o ponto em que ler ser lido
é já impossível de mapear-se:
se lê ou se habita Alberti?
se habita ou soletras Cádis?
MELO NETO, João Cabral de. Aniki Bóbó, de João Cabral de Melo Neto e Aloisio Magalhães. Organização de Valéria Lamego. Rio de Janeiro: Verso Brasil Editora, 2016. 96 p. 15x17 cm. ilus. col. Capa e projeto gráfico de Beatriz Lamego. ISBN 978-85-62767-22-7 Inclui textos críticos de Valéria Lamego , Sérgio Alcides, Augusto Massi, Zoy Anastassakis e Elisa Kuschmir.Ex. bibl. Antonio Miranda
“Esse resgate editorial de Aniki Bóbó é muito importante. Entre outras coisas, porque nos permite repensar que motivos justificariam sua exclusão da Obra completa. Estaria relacionado com a feição mais abstrata do texto, em desacordo com o rigor construtivo que o poeta sempre planejou e desenvolveu em sua produção?“ (...) “Embora escrito em prosa, certas passagens de Aniki Bóbó têm acentos e andamentos métricos poéticos.” (AUGUSTO MASSI)
“Este texto foi uma brincadeira minha com Aloisio Magalhães. Ele fez os desenhos e eu escrevi as ilustrações, interpretando os desenhos (que são coloridos). Ele fez os desenhos e me pediu para ilustrar com o texto..” (JOÃO CABRAL DE MELO NETO)
Da edição de 1958, impressa na gráfica da editor O Gráfico Amador.
“É uma obra-poesia, um livro-arte, um poema-livro e uma demostração cabal de que é possível fundi poesia, técnicas experimentais de impressão e arte com blague, ironia e precisão em um mesmo espaço e para o mesmo fim, ou melhor, para fim algum além da urdidura autônoma de um livo.” (VALÉRIA LAMEGO)
“A ilustração transita para a coisa ilustrada, aonde vai acabar. Em Aniki Bóbó, o texto de Cabral não é um em si mesmo; está a serviço do traço de Aloisio: é a decoração do livro.” (...) “As gravuras de Aloisio seriam a circunstância do poema em prosa que Cabral lhes acrescentou. Nelas estaria escondido o sentido dele — ou pelo menos no trânsito que leva da palavra à imagem. / Onde as metades se encaixariam, então? Só poderia ser na constatação de que, desacompanhada das figuras gravadas por Aloisio, a historieta escrita por Cabral não faz sentido nenhum, embora o contrário não seja verdade.” (SÉRGIO ALCIDES)
“O argumento também é válido para entendermos a situação editorial de Aniki Bobó (1958), de João Cabral de Melo Neto e Aloisio Magalhães. O livrinho sequer é citado ou figura na Obra completa (Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994), organizada por Marly de Oliveira com a assistência do próprio poeta.”
1
Aniki tinha de seu duas cores, o azul e o encarnado, como outros têm na vida um burro e um cavalo. Não eram o mesmo as duas cores para Aniki des temido: eram na sua vida um amigo e um inimigo.
2
O azul era seu colchão de molas, líquidas como as do mar. Azul também eras as suas muitas lâminas de barbear. Era muito curiosa sua rara coleção, pois quando vistas de perto eram vermelhas por antecipação.
3
Do alto de seu azul Aniki via tudo encarnado. Por isso se mudou de seus pagos: não conseguiu desinfetá-los. Veio para o país dos sociólogos, trazendo suas giletes, cujo país é um esqueleto com nádegas obesas e verdes.
4
Quando Aniki viu o verde, disse que tinha grande prática, e pôs-se a desembrulhar sua linda coleção de lâminas. Limpou o país de todas as cores, senão do azul e do encarnado. Mas o vermelhão que vedes é a lâmina suja de seu trabalho.
MELO NETO, João Cabral. El perro sin plumas. Edición bilingüe. Tradución y prólogo Raúl Santana. Buenos Aires: Leviatan, 2008. 64 p 11,5X17,5 cm. Ex. bibl. Antonio Miranda
II
(Paisagem o Capibaribe)
Entre a paisagem
o rio fluía
como uma espada de líquido espesso.
Como um cão
humilde e espesso.
Entre a paisagem
(fluía)
de homens plantados na lama;
de casa de lama
plantadas em ilhas
coaguladas na lama;
paisagem de anfíbios
de lama e lama.
Como o rio
aqueles homens
são como cães sem plumas
é mais
que um cão saqueado;
é mais
que um cão assassinado.
Um cão sem plumas
é quando uma árvore sem voz.
É quando ded um pássaro
suas raízes no ar.
É quando a alguma coisa
roem tão fundo
até o que não tem).
O rio sabia
daqueles homens sem plumas.
Sabia
de suas barbas expostas,
de seu doloroso cabelo
de camarão e estopa.
Ele sabia também
dos grandes galpões da beira do cais
(onde tudo
é uma imensa porta
sem portas)
escancarados
aos horizontes que cheiram a gasolina.
E sabia
de magra cidade de rolha,
onde homens ossudos,
onde pontes, sobrados ossudos
(vão todos
vestidos de brim)
secan
até sua mais funda caliça.
Mas ele conhecia melhor
os homens sem pluma.
Estes
secam
ainda mais além
de sua palha;
mais além
da palha de seu chapéu;
mais além
até
da camisa que não tem;
muito além do nome
mesmo escrito na folha
do papel mais seco.
Porque é na agua do rio
que eles se perdem
(lentamente
e sem dente).
Ali se perdem
(como uma agulha não se perde).
Ali se perdem
(como um relógio não se quebra).
Ali se perdem
como um espelho não se quebra.
Ali se perdem
como se perde a agua derramada:
sem o dente seco
com que de repente
num homem se rompe
o fio de homem.
MELO NETO, João Cabral de. Morte e vida Severina: auto de Natal pernambucano (em quadrinhos). 2ª. ed. Recife: Fundação Joaquim Nabuco, Editora Massangana, 2010. 42 p. ilus. 21,5 x 31 cm.
ISBN 9S78-85-468-8 Edição em quadrinhos realizada por Miguel Falcão. Acompanha CD. Ex. bibl. Antonio MirandaApresentamos aqui apenas uma das 41 páginas do livro, apenas como registro da edição. Para jovens e amantes das edições de “quadrinhos”.
CÃO SEM PLUMAS
espetáculo de música, dança, cinema e poesia a partir da obra exponencial de
JOÃO CABRAL DE MELO NETO.
Imagem extraída de:
http://www.theatromunicipal.rj.gov.br/programacao/espetaculo-cao-sem-plumas/
O espetáculo Cão sem Plumas, da Cia. de Dança Deborah Colker, é fruto de um processo de criação que começou há quatro anos, a partir do encantamento sentido por sua coreógrafa, Deborah Colker, ao ler o poema homônimo do pernambucano João Cabral de Melo Neto. Para retribuir, foi em Pernambuco que ela decidiu estrear a montagem, com duas apresentações nos dias 3 e 4 de junho, no Teatro Guararapes. Ver o vídeo no Youtube, criado pelo DIÁRIO DE PERNAMBUCO, e publicado em 3 de jun de 2017.
https://www.youtube.com/watch?v=BrfsCak2mGIhttps://www.youtube.com/watch?v=BrfsCak2mGI
E MAIS ESTAS --- IMPERDÍVEIS!!! --- CENAS DO ESPETÁCULO, NO YOUTUBE:
https://www.youtube.com/watch?v=rTtTaNyR11k
E MAIS, E MAIS, E MAIS, AINDA MAIS:
https://www.youtube.com/watch?v=wuqz3gKUAqU
Espetáculo 'Cão Sem Plumas' é baseado na obra do poeta João Cabral de Melo Neto e ressalta a relação do homem com a água (Foto: Cia. de Dança Deborah Colker/Divulgação)
“Já é comum assistirmos espetáculos de dança com projeções de vídeos, numa combinação de elementos em movimento. No palco dos teatros e até em apresentações externas, com imagens contra as paredes de edifícios e os próprios bailarinos, às vezes com efeitos ornamentais, não raras vezes de forma sincrônica, complementar, muitas vezes acompanhando as luzes sobre o piso. Debora Colker foi mais longe. A coreógrafa pesquisou os texto telúrico de “O cão sem plumas” do poeta pernambucano João Cabral de Melo Neto — um vanguardista, em 1950! — e partiu para o habitat com os bailarinos e experimentou performances sobre a terra ressecada e sobre rios, pântanos e lama, em performances imersas nas águas, na lama, na poeira... Depois trouxe tudo para a montagem do espetáculo em que os bailarinos estão transfigurados, com a música e fragmentos de textos transformados pela virtuosidade de passes e acrobacias individuais e em conjunto, numa mise-en-scene em que os elementos físicos e os virtuais estão flagrantemente integrados: numa verdadeira amálgama entre o físico e o virtual, como no fenômeno do AV3: a animaverbivovisualidade.” ANTONIO MIRANDA
Deborah Colker vence o Benois de la Danse, importante prêmio russo de dança e é aclamada no Teatro Bolshoi, de Moscou, durante o Campeonato Mundial de Futebol 2018. Para desfrutar de cenas contínuas vale (mesmo!!!) ver a cerimônia de outorga do prêmio a Deborah Colker na Rússia:
(Foto: Cia. de Dança Deborah Colker/Divulgação)
IMPERDÍVEL
IMPERDÍVEL
IMPERDÍVEL
Imagem extraída de
DIAS-PINO, Wlademir. A lisa escolha do carinho (Rio de Janeiro: Edição Europa, s.d.
20,5x20,5 cm. 33 f. ilustradas (Coleção Enciclopédia Visual). Inclui versos de
poetas brasileiros
MELO NETO, João Cabral de. João Cabral de Melo Neto – Centenário – Seleção de poesias. Ilustrações de Maurício Arraes. Brasília: Confraria dos Bibliófilos do Brasil. 105 p. 23 x 51 cm. Edição de arte, numerada, em caixa de papelão.
Ex. bibl. Antonio Miranda
PEQUENA ODE MINERAL
Desordem na alma
que se atropela
sob esta carne
que transparece.
Desordem na alma
que de ti foge,
vaga fumaça
que se dispersa,
informe nuvem
que de ti cresce
e cuja face
nem reconheces.
Tua alma foge
como cabelos,
unhas, humores,
palavras ditas
que não se sabe
onde se perdem
e impregnam a terra
com sua morte.
Tua alma escapa
como este corpo
solto no tempo
que nada impede.
Procura a ordem
que vês na pedra:
nada se gasta
mas permanece.
Essa presença
que reconheces
não se devora
tudo em que cresce.
Nem mesmo cresce
pois permanece
fora do tempo
que não a mede,
pesado sólido
que ao fluido vence,
que sempre ao fundo
das coisas desce.
Procura a ordem
desse silêncio
que imóvel fala:
silêncio puro.
De pura espécie,
voz de silêncio,
mais do que a ausência
que as vozes ferem.
A VOZ DO CANAVIAL
Voz sem saliva da cigarra,
do papel seco que se amassa,
de quando se dobra o jornal:
assim canta o canavial,
ao vento que por suas folhas,
de navalha a navalha, soa,
vento que o dia e a noite toda
o folheia, e nele se esfola.
A VOZ DO COQUEIRAL
O coqueiral tem seu idioma:
não o de lâmina, é voz redonda:
é em curvas suas reza longa,
de cero aprendida as ondas,
cujo sotaque é oi da sua fala,
côncava, curva, abaulada:
dicção do mar com que convive
na vida alísia do Recife.
*
Página ampliada e republicada em maio de 2022
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TEXTOS EN ESPAÑOL
MELO NETO, João Cabral. El perro sin plumas. Edición bilingüe. Tradución y prólogo Raúl Santana. Buenos Aires: Leviatan, 2008. 64 p 11,5X17,5 cm. Ex. bibl. Antonio Miranda
(Paisaje de Capibaribe)
Entre el paisaje
el río fluía
como una espada de líquido espeso,
Como un perro
humilde y espeso.
Entre el paisaje
(fluía)
de hombres plantados en el lodo;
de casa de lodo
plantadas en islas
coaguladas en el lodo;
paisaje de anfibios
de lodo y lodo.
Como el río
aquellos hombres
son como perros sin plumas
(un perro sin plumas
es más
que un perro saqueado;
es más
que un perro asesinado.
Un perro sin plumas
es cuando un árbol queda sin voz.
Es cuando un pájaro
deja sus raíces en el aire.
Es cuando a alguna cosa
roen tan hondo
hasta lo que no tiene).
El río sabía
de aquellos hombres sin plumas.
Sabía
de sus barbas expuestas,
de su doloroso cabello
de camarón y estopa.
Sabía también
de los grandes galpones a orillas de los muelles
(donde todo
es una inmensa puerta
sin puertas)
de cara
a los horizontes que huelen a gasolina.
Y sabía
de la magra ciudad del corcho
donde hombres huesudos,
donde puentes, altrillos huesudos
(van todos
vestidos de brin)
secan
hasta su más honda caliza.
Pero él conocía mejor
a los hombres sin pluma.
Estos
secan
aún más allá
de su caliza extrema;
aún más allá
de su paja;
más allá
hasta
de la camisa que no tienen;
mucho más allá del nombre
aún escrito en la hoja
del papel más seco.
Porque es en el agua del río
que ellos se pierden
(lentamente
y si diente),
allí se pierden
(Como una aguja no se pierde)/
Allí se pierden
(como un reloj no se quiebra
Allí se pierden
como un espejo no se quiebra.
Allí se pierden
como se pierde el agua derramada:
sin el diente seco
con que de repente
en un hombre se rompe
el hilo del hombre.
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A CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE
No hay paraguas
contra el poema
subiendo de regiones donde todo es sorpresa
como una flor incluso en un cantero.
No hay paraguas
contra el amor
que masca y escupe como toda boca,
que tritura lo mismo que un desastre.
No hay paraguas
contra el tedio:
el tedio de las cuatro paredes, de las cuatro
estaciones, de los cuatro punto cardinales.
No hay paraguas
contra el mundo
devorado cada día en los periódicos
bajo las formas de papel y tinta.
No hay paraguas
contra el tempo,
río que fluye bajo la casa, corriente
que se lleva los días, los cabelos.
(De O engenheiro (1942s-1945). Traductor: ÓSCAR LIMACHE
Extraído de DIENTE DE LEÓN - cipselas de difusión poética. N. 6, agosto de 2012. Director: Óscar Limache.
De
LA EDUCACIÓN POR LA PIEDRA
Prólogo y traducción de Pablo del Barco
Madrid: Altazor, 1982
Tejiendo la mañana
Un gallo solitario no teje la mañana:
siempre necesitará de algunos otros gallos,
De uno que recoja ese grito que él
y lo lance a otro; de otro gallo
que recoja el grito que un gallo antes
y lo lance a otro; y de otros gallos
que con muchos otros gallos se crucen
los hilos de sol de sus gritos de gallo,
para que la mañana, desde una tela ténue,
se vaya tejiendo, entre todos los gallos.
2
Y haciéndose cuerpo en tela, entre todos,
levantándose en tienda donde entren todos,
entreteniéndose a todos, en el toldo
(la mañana) que planea libre de armazón.
La mañana, toldo de un tejido tan aereo
que, tejido, se eleva por si: luz globo.
Psicoanálisis del azúcar
El azúcar cristal, o azúcar de fábrica,
muestra la más inestable de las blancuras,
quien de Recife, sabe ciertamente el cuánto.
y el poco de ese cuánto, que ella dura.
Sabe lo mínimo de lo poco que el cristal
se estabiliza cristal sobre el azúcar,
por encima del fondo antiguo, de melaza
de la melaza barrosa que se incuba;
y sabe que todo podrá romper lo mínimo
en que el cristal es capaz de la censura:
pues el tal fondo melaza luego aflora
cuando invierno o verano melifique el azúcar.
Sólo los «bangués» que-aún purgan aún
el azúcar bruto con barro, de mistura;
la fábrica ya no lo purga: desde la infancia,
no después de adulto, ella lo educa;
en enfermerías, con vácuos* y turbinas,
en manos de metal de gente industria,
la fábrica lo lleva a sublimar en cristal
lo pardo del jarabe: no lo purga, cura.
Pero como la caña se cría hoy aún,
en manos de barro de gente agricultura,
lo barroso de la pre-infancla aflora
cuando invierno o verano melifique el azúcar.
*Vácuos: «vacíos», por sustanttvaclón del adjetivo
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Traducción de CARLOS GERMÁN BELLI
ANTIODA
(contra la poesía que pretende ser profunda)
A
Poesía, te escribía: ίflor!conociendo que eres heces. Heces como cualquier cosa
engendrando hongos (raros, frágiles hon gos) en el húmedo calor de nuestra boca.
Delicado escribía ίflor! (¿Hongos serán flor? Especie extraña espécie
extinta de flor, flor no del todo flor sino flor: burbuja abierta em lo maduro).
Delicado, evitaba el estiércol del poema, su tallo, su ovario, sus intestinos.
Esperaba las puras, transparentes floraciones, nacidas del aire, em el aire, como las brisas.
B
Después descubriría que era lícito llamarte: ίflor! (¿por vuestras iguales
circunstancias? ¿vuestras dulces carnaciones? ¿por los virtuosos vergeles
de vuestras evocaciones? ¿Por el pudor del verso —pudor de flor— por su tan delicado
pudor de flor, que solo se abre cuando la olvida el sueño del jardinero?)
Después descurbriría que er lícito llamarte: ίflor! (flor, imagen de
dos puntas como una cuerda). Después descubriría las dos puntas
de la flor; las dos bocas de la imagen de la flor: la boca que como el difunto
y la boca que orna el difunto, con outro difunto con flores, — cristales de vómito.
C ¿Cómo no invocar el vício de la poesia: el cuerpo que ntorpece al aire de versos?
(Al aire de aguas muertas, inyectando en la carne del día una infección de la noche).
¿Hambre de vida? Hambre de muerte, frecuentación de la muerte, como de algún cinema.
¿El día? Arido. Venga pues la noche, el sueño. Venga, por eso, la flor.
Venga, más fácil y portátil en la memoria., el poema, su práctica , su lánguida hori-
cultura? Pues estaciones hay, del poema, como de la flor, o como em el amor de los canes:
y mil monótonos injertos, mil maneras de excitar negros éxtasis: y la monótona
espera de que se pudra en poema, previa exhalación del alma difunta.
D
Poesía, no será ese el sentido em que aún te escribo: ίflor! (Te escribo:
ίflor! NO uma flor, ni aquella flor — virtud — en disfrazados orinales).
Flor es palabra flor, verso inscrito en el verso, como las mañanas en el tiempo.
Flor es el salto del ave para el vuelo: el salto fuera del sueño cuando su tejido
se rompe; es uma explosión puesta a funcionar, como una máquina, um jarrón de flores.
E
Poesía, e escribo ahora: heces, las heces vivas que eres. Sé que otras
palabras eres, palabras imposibles de poema. Te escribo, por eso, heces, palabra leve,
contando com su brevedad. Te escribo saliva, saliva, no más; tanta saliva
como la tercera (¿cómo usarla en un poema?) la tercera de las virtudes teologales. |
Extraído de:
24 POETAS LATINOAMERICANOS. Antología de poesía para nuevos lectores.
Selección y prólogo: Francisco Serrano. Caracas: CERLALC, 2004. 254 p 15,5x21,5 cm. Inclui poemas de Carlos Drummond de Andrade e João Cabral de Melo Neto. Col. Bibl. Antonio Miranda
Tejiendo la mañana
Un gallo solo no teje una mañana:
siempre necesitará de otros gallos.
De uno que reciba ese grito
y lo lance a otro; de otro gallo
que reciba el grito del anterior
y lo lance a otro; y de otros gallos
que con muchos otros crucen
los hilos de sol de sus gritos,
para que la mañana, desde una tela tenue,
se vaya tejiendo entre todos los gallos.
Traducción de Ángel Crespo
Del libro: La educación por la piedra. 1966
La lección de pintura
Ningún cuadro se termina,
dice cierto pintor;
se puede sin fin continuarlo,
primero, además de otro cuadro
que, creado a partir de tal forma,
tiene en la tela, oculta,
una puerta, que da a un corredor
que da a otra, a muchas otras.
Traducción de Francisco Serrano
De Museu de Tudo.
Las frutas de Pernambuco
Pernambuco, tan masculino,
que lo acometió todo, de niño,
es capaz de las frutas más hembras
y de la feminidad más sedienta.
Son ninfomaníacas, casi,
en el disolverse, el entregarse,
sin nada guardarse, de puta.
Hasta en las ácidas, el azúcar,
es tan carnal, denso, de cuerpo,
de cuerpo a cuerpo, el coito,
que más en la cama que en la mesa
seria cómodo quererlas.
(Traductor: desconocido)
MELO NETO, Jõao Cabral de. Vivir en los Andes. Poemas ecuatorianos. Organización: Renato Faria; Sonia Oliveira de Paredes. Versión al español de los poemas y Presentación: Iván Carvajal. Prefacio por Antonio Carlos Secchin. Traducción de textos: Alfonso Montúfar Estrella. Presentación João Almino. Ilustraciones por Araceli Gilbert. Quito, Ecuador: Embajada del Brasil en Quito, 2020. 84 p. ilus. col. Edición especial numerada Conmemorativa del Centenario de Nacimiento.”
1.000 ejemplares. Ex. bibl. Antonio MirandaSelecinamos quatro poemas do livro “Agrestes”, de 1985, traduzidos ao espanhol por Alfonso Montúfar Estrella e uma ilustração de Araceli Gilbert:
Estructura lineal, acrílico sobre liezo, Quito 1984.
No Páramo
No páramo, passada Riobamba,
a quatro mil metros de altura,
a geografia do Chimborazo
entra em coma: está surda e muda
A grama não é grama, é musgo;
e a luz é de lã, não de agulha:
é a luz pálida, sonolenta,
de um sol roncolho, quase lua.
En el páramo
En el páramo, tras passar Riobamba,
a cuatro mil metros de altura,
la geografia del Chimborazo
entra en coma: está sorda y muda.
La grama no es grama, es musgo,
y la luz es de lana, no de aguja:
es la luz pálida y sombolienta
de un sol castrado, casi luna.
O trono da ovelha
Nos altos pés do Chimborazo
vejo a descomunal ovelha
que ele é, imóvel e deitada,
da qual cortaram a cabeça.
O cadáver (será escultura)
daquela pacífica besta
preside, do alto pedestal,
o não da circunstância erma.
El trono de la oveja
Desde los altos pies del Chimborazo
veo la descomunal oveja
que él es, inmóvil y acostada,
a la que cortaron la cabeza.
El cadáver (¿será escultura?)
de aquella pacifica bestia
preside, desde el alto pedestal,
el no de la circunstancia yerma.
O Chimborazo como tribuna
É estranho como esta montanha
não deixe que nem mesmo o vento
possa cantar nos órgãos dela
ou fazer silvar seu silêncio.
Talvez seja mesmo a tribuna
que mandou reserva o tempo
para um Bolívar que condene
quem fecha a América ao fermento.
El Chimborazo como tribuna
Es extraño como esta montaña
no deja que ni siquiera el viento
pueda cantar en sus órganos
o poner a silbar el silencio.
Quizá se el efecto la tribuna
que mandó reservar el tempo
para un Bolívar que condene
a quien cierra América al fermento.
O ritmo do Chimborazo
A imensa espera da montanha
por que ver nela algum sentido?
É só espera: o viver suspenso
de que apodreça o prometido.
A imensa espera da montanha
tem a paciência da de bicho;
é como a do homem que se empoça
na espera, e dela faz seu vício.
El ritmo del Chimborazo
La inmensa esperade la montaña:
¿por qué ver en ella algún sentido?
Es solo espera: el vivir pendiente
de que se pudra lo prometido.
La inmensa espera de la montaña
tiene la paciencia del bicho,
es como la del hombre que se espoza
en la espera, y de ella hace su vicio.
MELO NETO, João Cabral de. Augeswählte gedichte. Nachwort von Curt Meyer-Clason. Frankfurt, Suhrkamp Verlag, 1969. 143 p. 11x18 cm. Ex. bibl. Antonio Miranda
Psychologie der Komposition
Ich trete aus meinem Gedicht
wie jemand der sich die Hände wäscht.
Manche Muscheln, kristallisiert
von der Sonne der Aufmerksamkeit,
verwirklichten sich, manches Wort
das ich lüftete wie einen Vogel.
Vielleicht erinnert eine jener Muscheln
(oder einer der Vögel) mit ihrer Wölbung
an den Leib der erloschenen
Geste welche die Luft schon füllte.
Vielleicht wie das leere
Hemd das ich auszog.
2
Dieses weiße Blatt
verwehrt mir den Traum,
treibt mich zum Vers
dem klaren, notwendigen.
Ich flüchte
auf diesen reinen Strand
wo es nichts gibt
worauf die Nacht ruhen könnte.
Da es keine Nacht gibt
endet jede Quelle,
da es keine Quelle gibt
endet jede Flucht;
da es keine Flucht gibt
erinnert nichts an das Fließen
meiner Zeit in dem Wind
den die Zeit auf jene weht.
3
Auf diesem Papier
kann dein Salz
zu Asche werden,
kann die Zitrone
Stein werden,
die Sonne der Haut
der Weizen des Leibes
Asche werden.
(Fürchte darum
den jungen Morgen
auf den Blumen
des Vorabends.)
Auf diesem Papier
sterben bald
die violetten lauen
alle flüssigen
Blumen der Eile,
alle feuchten
Blumen des Traums.
(Warte daher
bis der junge Morgen
kommt und dir offenbart
die Blumen des Vorabends.
4
Das Gedicht mit seinen Pferden
will deine helle Zeit
sprengen; zerreißen
ihren weißen Faden, ihren
stummen frischen Zement.
(Die Unachtsamkeit wird offenbar
sein, sperrangelweit;
ein Traum ging vorüber, hinterließ
Fädchen, kurz darauf augenblickliche
Bäume die die Trägheit zum Gerinnen brachten.)
5
Ich lebe mit bestimmten Wörtern,
häuslichen Bienen.
Dem entfalteten Tag
(weißem Sonnenschirm)
entziehen die hellsichtigen Spindeln
den Faden des Honigs
(dem Tag der sich auch
entfaltete wie eine Blume)
der in der Nacht
(Brunnen in den
die luftige Blume fiel)
andauert, Lorbeer—
geschmack und sauer
gegen den Zucker des Faulen.
6
Nicht die Form gefunden
wie eine Muschel, verloren
im schlaffen Sandboden
wie in Haaren,
nicht die Form erlangt
im heiligen oder seltenen Wurf
Schuß in die gläsernen Sternbilder
des Unsichtbaren,
sondern die Form erzielt
wie das Ende des Knäuels
den die Aufmerksamkeit
langsam entrollt,
Spinne; wie das äußerste Ende
dieses schwachen Fadens
der immer wieder reißt
vom Gewicht der riesigen Hände.
7
Mineral ist das Papier
auf dem man den Vers
schreibt, den Vers
den man womöglich nicht macht.
Minerale sind
die Blumen und die Pflanzen,
die Früchte, die Tiere
sofern im Stand des Worts.
Minerale sind
die Zeile des Horizonts,
unsere Namen, die aus
Wörtern geschaffenen Dinge.
Mineral endlich
ist jedes Buch:
denn Mineral ist das
geschriebene Wort, die kalte Natur
des geschriebenen Worts.
8
Die Wüste bebauen
wie die Kehrseite eines Obstgartens.
(Der Baum destilliert
die Erde, Tropfen für Tropfen.)
Die Erde fällt vollständig,
Frucht!
(Während in der Ordnung
eines anderen Obstgartens
die Aufmerksamkeit
reife Wörter destilliert.)
Die Wüste bebauen
wie die Kehrseite eines Obstgartens:
dann, destilliert
nichts mehr; verdampft;
wo ein Apfel war
bleibt nurmehr Hunger;
wo ein Wort war
(gezähmte Fohlen oder Stiere)
bleibt nurmehr die strenge
Form der Feere.
MELO NETO, João Cabral de. Der Weg des Mönchs. Mit einen Worwort von Curt Meyer-Clason und einem Nachwort von Hugo Loetscher. Köln: Edition diá, 1988. 117 p. 12,5x20,5 cm. Ex. bibl. Antonio Miranda0
DIE LEUTE AUF DER STRASSE:
- Man befahl uns, die Fassaden zu säubern
wie am Tage einer Prozession.
- Man befahl uns, die Straßen zu fegen,
wegzuräumen, was jeder Hund macht.
- Fast wie bei einer Bischofsbeerdigung,
und schöner noch, bei einer Weihe.
- Sogar unseren Himmel haben sie abgestaubt,
und nicht nur mit Brisen, nein.
- Als hätten sie den Himmel
mit Wasser und Seife gescheuert.
- Doch an all dem erkennen wir jetzt,
was die wahre Absicht ist.
- Sie wollen einen hängen, der dem Kaiser
ein hartes Nein entgegenwarf.
- (Hundert Jahre später wird ein anderer
auf eine gleiche Frage sagen: Ich weigere mich.)
(...)
OFFIZIER:
- Die ganze Truppe soll einen Kreis bilden,
als beschützte sie den Altar.
Niemand darf in diesen Kreis treten
noch sich ihm nähern.
Sonst wird er bestraft:
Als Aufrührer wird er angeklagt.
Wer diesen Kreis zu durchbrechen versucht,
wird sich als Rebell bekennen müssen.
(...)
DIE LEUTE IM VORHOF:
- Jetzt werden ihm die Paramente angelegt,
damit er die Messe zelebriere.
- Kein Sakristan in seinem Leben
hat ihm so feierlich beigestanden.
- Vielleicht, weil diese Messe
die letzte ist, die er zelebriert.
- Wieviele wird er segnen müssen
unter seinen hier versammelten Feinden!
(...)
EINE GRUPPE IM INNENHOF:
- Vor den Toren, im Allerheiligsten,
betete Becher den ganzen Tag.
- Allen Heiligen entzündete er Kerzen,
zündete allen danach neue an.
- Die Nachbarschaft hat ihn begleitet
in dem Haus, das zur Kapelle wurde.
- Er hat nicht mehr gedacht
an die Klempnerwerkstatt nebenan.
(...)
DIESELBE GRUPPE IM INNENHOF:
- Er wartete in allen Formen
des Zeitworts Warten bei dieser Warterei.
- Seine Augen sahen weiter
und schienen nicht mehr alt.
- Seine Augen erreichten den Strand von Piedade,
übersprangen den Fluß Pina und die Felsenbank.
- Vollkommen teilnahmslos warf das
Meer wüstenhafte Wellen an den Strand.
(...)
DIESELBE GRUPPE IM INNENHOF:
- Dies Meer, leer und unbehaust,
ist das einzige, was der Alte erblickt.
- Und wenn er nicht beim Beten war,
betrachtete er durchs Fenster das Meer.
- Er wanderte ans Meeresufer,
um besser zu sehen, was nahte.
- Vom Haus zum Strand, schweifend, wandelnd,
so segelt er den ganzen Tag umher.
MELO NETO, João Cabral de. Erziehung deurch den Stein. Gedicht Porguiesisch und deutsch Auswal, Übertagung und Nachwort von Curt Meyer-Clason. Frankfurt am Main: Suhrkamp Verlag, 1989. 297 p. capa dura, sobrecapa. 12x18 cm. Ex. bibl. Antonio Miranda
CEMITÉRIO PERNAMBUCANO (Toritama)
Para que todo este muro?
Por que isolar estas tumbas
do outro ossário mais geral
que é a paisagem defunta?
A morte nesta região
gera dos mesmos cadáveres?
Já não os gera de caliça?
Terão alguma umidade?
Para que a alta defesa,
alta quase para os pássaros,
e as grades de tanto ferro,
tanto ferro nos cadeados?
- Deve ser a sementeira
o defendido hectare,
onde se guardam as cinzas
para o tempo de semear.
PERNAMBUKANISCHER FRIEDHOF (Toritama)
Wozu die vielen Mauern?
Warum diese Gräber trennen
von dem allgemeinen Beinhaus
das die tote Landschaft ist?
Zeugt in dieser Gegend
der Tod die gleichen Leichen?
Zeugt er sie nicht mehr aus Kalk?
Enthalten sie noch Feuchtigkeit?
Wozu der hohe Schutzwall,
zu hoch fast für die Vögel,
und Gitter aus so viel Eisen,
so viel Eisen an den Schlössern?
- Der befestigte Hektar
wird wohl das Saatfeld sein,
in dem man die Asche verwahrt
für die Zeiten der Saat.
MELO NETO, João Cabral de. Tod und Leben des Sevérino. Pernambukanisches Weihnachtsspiel. Nachdichstung aus dem Portugiesischen un Nachwort von Curt Meyer-Clason. Vorwort von Dorothee Dölle. Wuppertal: Peter Hammer Verlag, 1975. 94 p. 12,5x20,5 cm.
Ex. bibl. Antonio Miranda
Der Zimmermann spricht zu dem Landflüchtling, der teilnahmslos abseits gestanden ist
- Severino, Landflüchtling,
erlaube, daß ich dir jetzt sage:
ich weiß keine Antwort auf deine Frage,
ob es besser ist,
den Sprung zu wagen
von der Brücke und vom Leben.
Ich könnte dir die Antwort auch nicht geben,
wenn du mich zwängest, sie dir zu sagen.
Das Leben nur mit Worten zu verteidigen
fällt mir um so schwerer,
als es das ist, was uns gegeben:
ein Severinoleben.
Aber wenn ich dir nicht
antworten konnte auf meine Art,
so hat das Leben selbst geantwortet
mit lebendiger Gegenwart.
Denn wir suchen ja vergebens
eine bessere Antwort als das Spektakel des Lebens:
wir sehen, wie es seinen Faden abspult,
den Lebensfaden, an dem sich jeder schult,
wir sehen die geduldige Fabrik,
die sich selber fabriziert,
sehen, wie sie geschickt
in einer neuen Blüte explodiert.
Selbst wenn die Explosion wie diese
nicht heftig ist und nicht hart.
Selbst wenn es eine Explosion ist
wie eben, schwach und zart.
Selbst wenn es eine Explosion ist
von severinischer Lebensart.
Página ampliada e repubicada em abril de 2008. Ampliada e republicada em maio de 2014. Ampliada em fevereiro de 2016. Ampliada em junho e em julho de 2018. Ampliada em fevereiro de 2019
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