BRAZILIAN POETRY IN ENGLISH
SYLVIO BACK
Escritor, roteirista, cineasta e poeta. Filho de inimigrantes húngaro e alemã, natural de Blumenau (Santa Catarina), nascido em 1937. É um cineasta premiadíssimo e admirado e um poeta “cinematográfico” de flashs, tomadas curtas e incisivas.
Livros de poesia: O Caderno Erótico de Sylvio Back", de 1988, Moedas de Luz, de 1994, A Vinha do desejo (1994), Yndio do Brasil" (Poemas de Filme, 1995), boudoir (1999) e Eurus (2004)
Veja também: SYLVIO BACK – POESIA FESCENINA - ERÓTICA
SYLVIO BACK INGRESSA NO PEN CLUB DO BRASIL
Autor de 38 filmes, entre curtas, médias e longas-metragens, e de 21 livros (poesia, roteiros e ensaios), sou o primeiro cineasta brasileiro, também poeta e escritor, a integrar o seleto quadro desse órgão famoso por defender os direitos humanos, a liberdade de expressão e de opinião,
e por solidarizar-se com todo e qualquer intelectual perseguido por suas ideias e obras. SYLVIO BACK ingressa, merecidamente, numa instituição líder da cultura brasileira.
TEXTOS EM PORTUGUÊS / TEXTS IN ENGLISH
velhera
tempo lavradio
à-toa
totêmico tempo
a toda
cavalarico do soçobro
à coda
entes da simetria perfeita
halos
carne ei-la arqui liqüescente
gesto ígneo a contrapelo
tudo só superfície do corpo
o insuficiente o infindável
à espreita silhueta derruída
demos gozosos imersão
símile de entreatos amaros
algo imemorial deve ficar
até o desejo azado é adiado
pouco ou nada tende a vir
por onde escorrer silêncio
trevas ardosas se m aviam
o que já foi inteiro vez a vez
não estilhaça assim de vez
alvíssaras
neste colo
pousa o poema
que nos fecundou
ícone ínfimo
só dorso de luz
nada que atordoe
o fio do fundo
nada que turve
a aura mínima
só pura abulia
nada que perturbe
o eco do fugaz
nada que urgente
o átimo imerso
só vôo mortiço
nada que perfure
a nódoa cerúlea
nada que arruíne
o ícone ínfimo
crípticos
feito um frio suicida
deixe sempre tudo atado
feito um pensamento fugidio
deixe sempre tudo a tento
feito um rio a montante
deixe sempre tudo de início
feito um mau pressentimento
deixe sempre tudo no ponto
feito uma saudade à-toa
deixe sempre tudo à vontade
feito uma treslouca aposta
deixe tudo sem resposta
todavia
uma sombra assenta
liquefaz o que estava
imperceptivelmente
borra o que perdura
agora sim o homem
é o seu perfeito sósia
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BACK, Sylvio. Moedas de Luz; Capa e ilustrações Mariza Dias Costa. São Paulo: Max Limonad, 1988. 181 p. 14 x 21 cm. Ex. bibl. Antonio Miranda
MINHA GRETA GARBO
Ela não queria que ninguém a visse com desvida.
Que fosse uma recordação em movimento.
Como no cinema.
DE QUATRO
mãos e coxas
(orvalhadas)
seios e boca
(vozes sem vezo)
Pálpebras
(inermes)
torpedeiam
os jardins
do desejo
a memória
(essa cafetã!)
esboça
um sorriso
amarelo
VISIBILIDADE
inda
guardo
tua aura
latejante
opíparo
retrato
falhado
DIÁRIO DE MARA (III)
“Estar vivo ainda é a maior vingança.”
DIÁRIO DE MARA (VI)
“Alguém que me acuda: estou de bem com morte.”
ENXOVAL
hoje desfiz-me
de você
pela
segunda vez
HISTRIÃO
chorando
escondido
de mim mesmo
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de olho no firmamento
dragamos
saliva
horas a fio
afundamos
no cio
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batiscafo
a duração do desejo
toda carne é erva
a duração do desejo
toda carne é excesso
a duração do desejo
toda carne é tirana
a duração do desejo
toda carne é escarcéu
a duração do desejo
toda carne é cantárida
a duração do desejo
toda carne é líquida
Kinopoems. O cinema vai ao poema. Florianópolis: Editora UFSC, 2014. ilus. col. 19 x 20cm. Prefácio por Péricles Prado. Projeto gráfico e capa: Pimenta Design & Comunicação Ltda. ISBN 978-85-328-0703-8 Ex. bibl. Antonio Miranda
O poeta Sylvio Back, integrante da luxuriosa linhagem retórica do renascentista Pietro Aretino, visceralmente é um criador, desde a adolescência, atraído pela irresistível vocação de cineasta. Afeiçoado a este motivo primordial, atendendo às exigências de um surto epifânico, escreveu, em épocas distintas, três textos de transparente literariedade, com alusões de abrangência intertextual, reunindo-os para a fruição dos leitores afinados à escritura de natureza pendular, mediante técnicas compreensivas dessas duas vertentes (poesia/ cinema), tanto que os batizou "feixe de poemas-roteiro".
Convicto da presença, neles, desses elementos agindo entre si, atento à linguagem de extração pós-moderna, utilizando-se de gramática estrutural em que emergem eventos verbovocovisuais, envolto numa teia de perceptível coesão, move seus Kinopoems (origem do título explicada no preâmbulo do livro) em várias direções, sem desequilibrar forma/conteúdo, para enriquecer o repertório léxico com figuras sonoras (ícones), cujas palavras/símbolos, trabalhadas como signos verbais, não se esgotam à leitura inicial deste instigante jogo sinestésico, combinatória fusão de obras de magníficos artistas falecidos
(...)
A terceira, cognominada "Leminskino", ostensivo tributo ao curitibano Paulo Leminski, ofertado no média-metragem Vida e sangue de polaco (1982), constitui, em Sequência "O" e Cena Alfa de filme para ser lido, insight também teatral, em algumas de suas passagens, de contida expressão no plano do Fantástico, ou do Maravilhoso, sob ângulo distinto.
Traz à ribalta, com rigor estético, o especular perfil multifacetado do poeta-samurai, servindo-se, mais uma vez, de remissão a filmes emblemáticos, como os de Sergei Eisenstein e Ryuchi Sakamoto, para entender sua vertical, generosa e inquieta compreensão do mundo.
. PÉRICLES PRADO
Leminskino
(um filme para ser lido)
SEQUÊNCIA O
INT/NOITE - Biblioteca. Casa em Curitiba. Anos 1980.
Cena alfa
De cócoras sobre roto tatame, um homem de seus 40 anos, vestido de judoca (quimono ornamentado com haikais de Issa, Bashô, Alice Ruiz), medita - olhos de peixe fisgado, tez e nez de polonais mestiço, juba africana.
Numa das mãos, copo de cerveja sem espuma; noutra, caixa de fósforos com mirra enfiada no miolo do tampo; de uma das extremidades às vezes ele aspira vapor como se de um narguilé rimbaudiano fora.
Articuladas à sua concentração outras figuras sorrateiramente intrometem-se na ação tentando protagonizá-la.
No chão espelhado de tagarelas tatuagens de antanho, ideogramas à Eisenstein esganando o diktat, iluminuras cristãs soturnas como sói - dedo em risco.
Do alto tenda de sangue pólvora suor essência de cona, cerca viva de esperma, e relva da juventude, se movem brilhosos - réptil de pesadelo.
Atados a prego máscaras de poetas zombeteiros impacientes com os deuses, epítetos enclausurados no mote, mulheres pudendas e os inimigos idos e vindos - além dos penetras de praxe augurando agouro.
No ambiente turbante zombies mal disfarçados e demos largados.
A fúria dos acordes zen-haitec de Ryuichi Sakamoto corroem a cerimônia-transe do magnífico samurai das araucárias.
Papiros vasculhados, suspense de fonemas, livros pirogravados de Mishima, Rosa, Propp, Malone, Beckett, Petrônio, Fante.
Na cabeceira do rio Liffey da linguagem, catatau de poemas rimagens do inédito, hieróglifos e gravetos semânticos inda sem pai nem mãe.
O rock de Cruz e Sousa: carma áureo.
Trotzky Borges Pound Cristo - cantos crípticos.
Lepnon e as chagas que exorcizam utopias baleadas pelas costas.
A Estrela-menina da terra sem males lê a estrofe dependurada no ilustre caraíba: uma biblioteca de Alexandria a salvo da fagueira Curifiba.
Tão rápido quanto as fugas ao léu para redecorar as narinas e ouvir o vento dos sonhos níveos, ele se posta hirsuto no centro da sala - azado para o combate invisível e inviável.
A mais terrena das solidões acode às suas pupilas mas finge êxtase mastigando a gelatina das bochechas.
Os lábios singram palavras mudas e amuadas - estridentes.
Suave e felino põe-se movies, la terra trema.
Sobre círculos mínimos, como uma cantárida mutilada, dá sobre-passos de goleiro, arca os braços do pênalti - sequer há flechas ou alvos.
Há golpes e goles, golfadas e estocadas.
O punho estala: aos poucos maré alta de músculos veias nervos em ponto de bala, nosso herói começa a levitar, os artelhos sujos da noite balouçam, mortalmente, nonados.
O aguerrido warrior de súbito aderna, cambaleia, a carcaça ameaça tombar.
E como que assoprado por algum duende impensado vê sua vontade aloprar - energia centrípeta, incoercível, incontornável, inimputável.
Galinha sem cabeça, pomba-asteróide.
O bigode-Rasputin perde o prumo - não o rumo.
No entanto, tudo é sonrisas.
Maior o redemoinho do corpanzil maior o rumor da carne e d'alma - uma alegria do primevo arreganho fetal.
Fora do self, prisioneiro de atávica lumière, ele agora é uma velocíssima e formidável adaga - multicolor multifacética multiprofética.
Existência e tenência - uma coisa só.
Urdiduras do verbo e os interstícios do signo.
Infância e maturidade desossadas.
Desejos e o que nem chegou a vingar.
Vícios e versos - meros anelos.
Numa fusão lenta misto de véu e céu um bem temperado feixe holográfico entumesce a tela.
Ectoplasmando recorrentes casulos de angústias medos dores fictícias, o nosso personagem emite um belo berro de puro gozo.
FIM
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TEXTS IN ENGLISH
Translation by
Theresa Christina Rocque da Motta
oldie
time cast
at ramdom
totem time
in a rush
slumber rider
at a coda
beings in perfect symmetry
halos
flesh arch liquefying
igneous counter gesture
only surfacing the skin
the insufficient the interminable
prying a sunk silhouette
lusty demons immersion
simile of bitter interacts
something immemorial lingering on
the proper desire is postponed
little or nothing should come
where silence coils
a burning darkness falls
what was once wholesome
cannot be shattered at once
welcome
on this bossom
pauses the põem
that conceived us
lesser icon
just a back of light
nothing to torment
the botton line
nothing to blur
the minimum aura
just the purest torpor
nothing to disturb
the ephemeral echo
nothing to urge
the immersed instant
just the dimming flight
nothing to pierce
the cereous node
nothing do ruin
the lesser icon
cryptic
as a cold suicidal
leave everything tied
as a fleeting thought
leave everything tidy
as a mounting river
leave everything on sight
as a bad presentiment
leave everything right
a a vain longing
leave everything light
as an insane bet
leave all unsaid
nevertheless
a shadow lingers
liquefies what was
imperceptibly
blots the lasting
now yes the man
is the perfect alike
Página ampliada e republicada em julho de 2008
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