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STELLA LEONARDOS


STELLA LEONARDOS

 

 

 

Stella Leonardos da Silva Lima Cabassa (Rio de Janeiro RJ, 1923). Publicou seu primeiro livro de poesia, Passos na Areia, em 1941. Entre 1942 e 1971 traduziu obras do catalão, espanhol, francês, inglês, italiano e provençal. Participou, entre 1943 e 1945, em um grupo de teatro amador, representando as peças Guisos e Clarins, Muiraquitã e Festa da Vitória nos Teatros Municipais do Rio de Janeiro RJ e de São Paulo SP. Sua peça Palmares foi encenada em 1945, pelo grupo "Teatro do Estudante", de Paschoal Carlos Magno, na inauguração do Teatro Experimental do Negro. No ano seguinte, concluiu o curso de Letras Neolatinas na Universidade Federal do Rio de Janeiro. Ainda em em 1946, fez curso de extensão universitária em Línguas Neolatinas na Universidade do México (México).

 

No período de 1948 a 1961 publicou os romances Quando os Cafezais Florescem e Estátua de Sal. Em 1957 recebeu o Prêmio Olavo Bilac de Poesia, pelo livro Poesia em 3 Tempos, concedido pela Academia Brasileira de Letras. Nos anos seguintes produziu literatura infantil em prosa e verso, além de peças teatrais infantis, tendo mais de 70 livros publicados. Sua extensa obra poética filia-se à terceira geração do Modernismo e inclui os premiados livros Geolírica (1966), Cantabile (1967), Amanhecência (1974) e Romanceiro da Abolição (1986).

Fonte: www.itaucultural.org.br 

 

 

“O Romanceiro do Aleijadinho ilustra bem o estádio atual do gênero [do Romanceiro]: não é uma narrativa em seu sentido próprio, ou seja, um relato de experiências, verdadeiras ou fictícias; nem é puro lirismo, isto é, condensada efusão de sentimentos. Constitui celebração poética de um grande gênio nacional, cuja afirmação foi pontilhada de vários lances heróicos.”  “ Misturam-se na composição de Stella Leonardos elementos históricos, aspectos legendários e iluminações míticas, consubstanciados em movimentos narrativos, jogos apologéticos e estados líricos”.                                                         FÁBIO LUCAS 

 

 

                  TEXTOS EM PORTUGUÊS  /  TEXTOS EN ESPAÑOL

Veja também>>> POÈMES EN FRANÇAIS


 

 

 

O ROMANCEIRO DO ALEIJADINHO

(seleção de poemas)

 

 

DO APRENDIZ DE ESCULTOR

 

Existe uma voz na pedra?

 

         Lá no alto daquela pedra

          mora um colomi de pedra

            chamado Itacolomi.

             O colomi, lá da pedra

               me fala: - Não queiras ouro.

                Menino, teu ouro é outro.

                  Escuta, Antônio Francisco,

                    tuas mãos querem lavrar.

                     Procura tornar mais que ouro

                       a pedra que te encontrar.

 

Existe voz na madeira?

 

         Lá do alto daquela igreja

          vive uma cruz de madeira,

           a mais alta que já vi.

            A cruz, lá do alto, me fala:

              — Escuta, Antônio Francisco,

                não te coube em Vila Rica

                  muita lenha. Coube lenho

                    e mãos que querem talhar.

                      Procura tornar madeiro

                        a madeira que te achar.

 

 

 

ESPELHOS

 

         ... "Sigamos, primeiro, as próprias indicações

            de Bretas: o Aleijadinho, diz-nos ele, sofreu

            complicações d'humor gallico com escorbuto".

 

                   Germain Bazin

 

É mancha de tinta

         ou pele manchada?

 

É poeira em camada

         ou pele que escama?

 

É pingo de roxo

         ou sangue pisado?

 

É raiva de um rosto

         ou rictus de máscara?

 

É imagem disforme

         ou espelho infamante?

 

É mais que grotesco:

         é face de drama.

É o trágico doendo:

         um monstro se olhando.

 

Abaixo o que espelha!

         Cristal, água, lâmina.  

 

 

QUASE MITO

 

— Quem veste esse poncho

e encobre a cabeça?

Que vivo? Que morto?

Que réu de sentença?

 

         —Nenhum pobre diabo.

 

— Debaixo das abas

do imenso chapéu

há o rosto de um diabo

oculto dos céus?

 

         De um monstro sagrado.

 

 

O MULATO MANUEL DA COSTA ATAÍDE

PINTA “PASSOS” DO ALEIJADINHO

 

“Na busca exata, Ataíde, Vermelho e Azul –

como o cônego o apelidara, em total

respeito ao talento explodido”...

João Felício dos Santos

 

 

                            Sol vermelho sutilíssimo,

                                      rompe sol os lás de azul.

 

                            Alvora em mestre Ataíde

                                      cântico vermelho-azul?

 

                            A paleta se ilumina

                                      neovermelha, noviazul?

 

                            Vermelhos toques sublimes.

                                      Tocante música azul.

 

                            E os Passos de Cristo brilham

                                      nos laivos vemelhoazuis.

 

 

                        OS VISIONADOS

 

                   Havia um vento vagando

                            pela Minas do Ouro antanha.

                  

                   Havia um vento vagando

                            sobre congonhas-do-campo.

 

                   Havia um vento soprando:

                            Aleijadinho, vem, anda!

 

                   Agora — fardo patético

                   largado num catre a um canto —

                   a Bíblia lhe cai das mãos

                   mais pesadas do que pedras.

 

                            A janela bate, aberta

                            — alguém no vento chamando? —

                            e o vento que vem penetra,

                            e na viração frenética

                            revira páginas santas.

 

                   Transido de frio e espanto

                   o Aleijadinho estremece:

                   há um latim que vocifera

                   de algum Testamento. O Velho?

 

                            Apóstrofes desencantam-se.

                            E maldições se exacerbam.

                            Velhos versículos cantam.

                            Livram-se letras e inscrevem

                            cartelas de imagens pétreas.

 

                   O de ante visão desvela-se?

 

                   Ecoa, nítido, o transe:

 

                            — De pedra! Serão de pedra.

                            Doze estátuas de Profetas.

                            Pedra tenra. Quase humana:

                            algo assim feito estas mãos

                            que foram virando pedra.

 

                   O vento, ouvindo, se amaina.

 

                            E eles vêm, eles vêm, os visionados.

 

                            De sarças inflamadas se ressarcem.

                            De verbo iluminado se afogueiam.

                            As barbas de sargaços e serpentes,

                            as falas de sarmento de uvas bravas,

                            as vozes de uivo amargo nas areias.

 

                            Eles vêm devagar. Visões sombrias.

 

                            Invisíveis ainda aos que os carregam

                            da pedreira azulada, eles vêm vindo.

 

                            E em blocos de esteatita se projetam.     

 

                            E anos vígeis esculpem-lhes vigílias.

 

                            E seus olhos de pedra vão se abrindo.

 

                            E seus lábios de pedra se descerram.

 

                            E seus rostos de pedra vitalizam-se.

 

                            E seus trajes de pedra se despregam.

 

                            E seus gestos de pedra se reavivam.

 

                            E nos corpos de pedra, menos pedra,

                            são vividos profetas que se inspiram.

 

                   Havia um vento chamando:

                   Aleijadinho! ... chamando.

 

                   E ei-lo que se ergue dos séculos

                   — nos Passos madeiroeternos —

                   da Minas do Ouro e montanhas.

 

                            Ei-lo nos doze Profetas

                            da pedra cantar eterno

                            põe o vento cismando

 

 

Extraídos de ROMANCEIRO DO ALEIJADINHO.  Belo Horizonte: Editora Itatiaia, 1984.  111 p.

 

 

De
LEONARDOS, Stella
Cancioneiro de Alcântara.  São Luis, MA: Edições AML,  1989.  48 p.  formato 12,5x20 cm.  Editado pela Academia Maranhense de Letras. Foto da autora na contracapa.  Col. A.M. (EA)

 

 

O CICERONE

 

— Deste alto solar de Alcântara,

 

— o mais alto da cidade,

anotem bem: três andares

e maneiras coloniais —

se sabe que é coisa antanha,

que pouca coisa se sabe.

 

Se sabe que o Chico Taipa

gostava muito de histórias,

e sempre se referia

a certo cavalo, enorme,

um tal cavalo de pau

com gente dentro, imagine.

Ou por outra: eram soldados

lá de umas guerras remotas,

num país desconhecido.

 

Pois não é que um belo dia

o português Chico Taipa,

proprietário, construtor

e de intenções orgulhosas,

conseguiu erguer do solo

este solar, meus senhores?

 

 

 

"A Pousada do Imperador é parte de um conjunto de sobrados coloniais pertencente aos antepassados de Sousândrade."

Monumentos históricos do Maranhão - SIOGE, 1971

 

CONTEMPLANDO A POUSADA

DO IMPERADOR

 

Se a noite cai sobre Alcântara

tudo revive o romance

de mestre Josué Montello.

 

Se o dia luz sobre Alcântara

perpassa o vulto romântico

do sempre vivo Sousândrade

por entre os sobrados velhos.

 

 

LEONARDOS, Stella.  Pedra no lago. Rio de janeiro: Livraria São José, 1956.  95 p.  12x19 cm.  “ Stella Leonardos “  Ex. bibl. Antonio Miranda

 

 

CASA DEMOLIDA          !

 

                              (À DICEA)

 

Ó casa onde cresci sonhando dia a dia,

Alguém te lembrará? Bem poucos com certeza.

Mas abro teus portões sorrindo de tristeza

£ subo teus degraus chorando de alegria.

 

Em ti nada mudou. Nem mudará jamais.

A vista para a praça, as salas e varandas,

O morro ajardinado, os ecos das cirandas;

 

As paredes que vejo e não se avistam mais.

 

Ó casa que se foi! Casa eterna que espelhas

Minha vida melhor e meus anos mais puros !

— Há heras de saudade envolvendo-te os muros

E limos de saudade esverdeando-te as telhas.

 

 

LEONARDOS, Stella.  Memorial da Casa da Torre. Por uma Noite Luarada.  Jaboatão: Editora Guararapes EGM, 2015.  36 p. ilus. col. Editor Edson Guedes de Morais. Tiragem limitada.  Ex. bibl. Antonio Miranda

 

Ver e-book:https://issuu.com/antoniomiranda/docs/stella_leonardos

 

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TEXTOS EN ESPAÑOL

 

STELLA LEONARDOS

 

Nació en Río de Janeiros, en 1923. Mujer de extraordinária y refinada sensibilidad, su obra está marcada por el juego de contrastes y por la valoración de las cosas invisibles. Es uno de los cinco nombres femininos más importantes de la poesia  brasileña de todos los tiempos. Su poesia no nos deja reducidos a ella misma, al contrario, nos propone otras tantas ideas y temas de pensamiento. Para Stella, escapar de la realidad supondría llegar a percibir un mundo que estuviese fuera del alcance de los senidos, un mundo situado al margen de la experiência  y de las intuiciones. A ella há correspondido la virtud de encontrar los caminos de la percepción para intuir esa realidad oculta detrás de las apariencias, esa realidad más real que la realidad aparent: la realidad poética.  “Cultiva la estilización del motivo telúrico. Ella se señala por su tono sencllo y límpido, com mucho de cantiga, así como por la netitud de su emoción”.    (Gastón Figueira, Poesía Brasileña Contemporánea, Montevideo, 1969).

Junto con la poetisa goiana Ieda Schmaltz,  recibió críticas elogiosas de L´Osservatore Romano por su contribución a la poesia em 1975, el Año Internacional de la Mujer. 

 

 

TRADUCCIÓN Y NOTA INTRODUCTORIA DE

ADOVALDO FERNANDES SAMPAIO

 

 

INÚTIL ESCAPAR

 

Inútil escapar. La presencia perdura.

Desde que siento el suelo,

                                     ya perdura

                                                        o ya piedra,

es tu huella lo que encuentro en ti mi base.

Y cuando te presiento,

                               el verdor es más tierno

y es la piedra más dura

                               um sensible permanecer.

 

Tú que haces saltar sangre de la roca más viva,

tú vienes pro los cauces de esas vetas y yo te amo:

¿En que siglo, amor, se funden nuestras almas?

¿Em

n qué tierra?

         ¿A través de qué mar? ¡Ah!, dime, ¿qué viejo cielo

lloró por nosotros, perdidos coágulos,

guiando em nuestro mundo azules imposibles?

¿Y desde cuándo se abrió el amor em nuestros ojos?

¿De qué abrojos y sal del mar nos agito?

 

Em mi es solo leño

                   y nave

                            y ala que sueña.

En todo lugar le encuentro y soy lo que tu cantas.

 

 

DESENGAÑO

 

Sé que muero, pronto muero.

¡Ah, pájaro soledad!

Muero de brazos abiertos

en alta perplejidad.

 

¿Quién me lego alturas vanas,

toda esta creduilidad

y estas penas de abandono

premiadas por la saudade?

 

¿Hasta cuándo esta agonia,

esta mano tan brutal

sangrando mi incauto cielo?

 

Nada hay que me deshiera,

Porque solo sé soñar

Y morir de realidad.

 

 

 

Extraído de la obra
VOCES FEMENINAS DE LA POESÍA BRASILEÑA
Goiânia: Editora Oriente, s.d.

Página republicada em maio de 2008

 

 

Dedicatória e autógrafo de STELLA LEONARDOS:




LB revista da literatura brasileira. 25  -  Direção: Aloysio Mendonça Sampaio. 
São Paulo, SP:  2002. 46 p;  14 x 21 cm.   Ex. doado pelo livreiro BRITO – Brasília- DF

 

           Á Henriqueta no seu cinquentenário

           “Certa madrugada fria,”
                       Henriqueta, minha amiga,
           ousei pensar-te em poesia.
                       Entre
           rôtas neblinas
                       vem tua lírica
                           — vestes brancas
                       cabelos soltos
            passo sigilo —
                              ver como nascem os lírios.

            Vem.
                   Tranquila se achega
            ao íntimo segredo
                    raiz da flor da morte.

            E colhe
                    o cântico de um lírio
                                                 amanhecente.
            
            Eis que hoje por outros poeto
                  que outros poetas se apresentam.

             Poetas somos. Todos nós.
                        Tangendo nossa violeta
             de emocionada seresta
                        em nosso enternecimento.

             Aqui vimos, Henriqueta,
                        ex-prisioneira da noite,
             Henriqueta ressurrecta.

             Não é que o menino poeta
                      veio sorrindo? Sorrindo.

             Em Minas Gerais madrinha Lua
                   sorri, não mais face lívida,
             assonando alegroviva
                   da clave de azul profundo.

             Por ti viemos, Henriqueta
                   tessitura de poemas,
             dama doce amiga nossa.

             Para louvar tua obra
                    louvando teu centenário.
             Cem vezes seja louvada
                    em cada um dos teus dias.

              Agora, guarda a saudade
                    florescida nesta loa.
              Alma Henriqueta Lisboa.
                    Altíssima Irmã Poesia.

 

                              Rio de Janeiro, julho de 2001

*

Página ampliada e republicada em outubro de 2023.

                      

 

 



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