CELINA DE HOLANDA
Celina de Holanda Cavalcanti de Albuquerque (Cabo de Santo Agostinho, 19 de junho de 1915 — Recife, 4 de julho de 1999) foi uma jornalista e poeta brasileira.
Publicou seus primeiros poemas no Jornal do Commercio e no Diário de Pernambuco. Criou em 1979 as Edições Pirata, ao lado de Jaci Bezerra e Alberto Cunha Melo.
Em 2017, foi homenageada com uma estátua na Praça José Sales Filho, na Avenida Beira Rio, no Recife.
VEJA TAMBÉM: Celina de Holanda em Francês
SAVARY, Olga, org. Carne viva. 1ª antologia brasileira de poemas eróticos. Rio de Janeiro: Editora Anima, 1984, 348 p. 14x21 cm. Capa: ilustração de Sérgio Ferro. Inclui 77 poetas ativos no final do século 20. Col. A.M.
a casa
O teto do mundo baixou
sob teu sol: me iluminavas.
E me cumpro cativa
entre os opostos
a existir sem viver
em teu cuidado
quente como o vinho
saboreado na língua
devagar,
onde a festa era a casa
e em tuas mãos, a chave.
quem amei era de aquário
Um novo medo
não os antigos, me toma
com seus húmus, seus recantos,
o corpo vago nas vagas
sem a força dos teus contrastes:
apoio de cordilheiras
doce repouso, acicate.
Havia as mãos,
bisturis tocando exatos,
pedra compondo em círculos
vertigens de amor e lagos.
Há travos demais no mar
neste amor de água salgadas
com o seu fogo sem ar.
Sem nome morrem as gramíneas
cujo nome não chamaste.
em torno de um retrato
“... se tu me dás
tenho com que pagar-te”
Leon Bloy
Embora dele ausente
estou neste retrato,
nesta porta
porta noutra sala,
em teu corpo, agora
noutro espaço:
por ela passei
de ouro e prata,
por ele me despojei
sem perder nada.
REVISTA DE POESIA E CRÍTICA Ano XVIII No. 18 Brasília – São Paulo – Recife — 1994.
Ex. doação do livreiro Brito – DF
Pintura sobre tela de SEURAT
PASSEIO NO PARQUE
(Óleo sobre tela, de Seurat)
Neste parque imutável
até hoje passeiam
estes homens de escuro
e estas frágeis mulheres
Até hoje as flores, os cristais
e as toalhas
são sem mácula
nas salas de esperar
o amigo, o amado
ou a chuva passar. Nada
de apocalipse
a terrível Besta e poços
insondáveis. Nada
a relembrar o abismo
que somos.
HOLANDA, Celina de. A mão extrema. São Paulo, Quiron; Recife, Prefeitura Municipal, 1976. XVI + 67 p.
Doação do livreiro Brito, Brasília.
O BRANCO
A luz incendiou o espelho avesso
receptivo e profundo, o verde avesso
que somos.
Eu me disponho. Quero estar onde estou.
Última espiral do que me atinge
extrema.
E se animem os meus ossos,
o mais profundo de mim, os ossos,
o branco despojado.
RÉPTIL E PÁSSARO
Um espelho e seus dois lados,
réptil e pássaro,
o que somos.
Mas eu sei do lagar
do seu labor de vinho
e de raio.
Ó, esse rio, espada
que vem e vai.
Para onde essas rotas de voo
se abrem e se apagam?
Que serventia de luz
tem esse horror a nosso lado?
O GRITO
A poderosa mão a nos reter
sob as águas e em cima
o dia. Suas cores, a manhã
deixaria nos meus dedos.
O extremo ramo azul e o júbilo
perdidos. A mão se opõe
a mão dos velhos ritos. E eram:
a nau, o pulo, o grito e o infinito.
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Página publicada em maio de 2023
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Página ampliada e republicada em fevereiro de 2023
Página publicada em junho de 2020
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