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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

POESIA GOIANA

 


LOURDES TEODORO

 

 

Nome poético de Maria de Lourdes Teodoro, natural de Formosa (GO), reside em Brasília desde 1959. Escreve e publica desde a adolescência, quando figurou com regularidade em jornais estudantis e no Correio Braziliense. Com Guido Heleno, Carlos Pontes, Reginaldo Fonteles, entre outros, publicou a Antologia de Alunos Escritores do Elefante Branco, em 1966. Incluída em antologias poéticas no Brasil, na Europa, na Índia e nos Estados Unidos, é autora de quatro livros de poemas, e de Modernisme Brésilien et Negritude Antillaise – Mário de Andrade e Aimé Césaire, (crítica literária), pela editora L´Harmattan (Paris/Montreal). Ativista contra o racismo esteve pessoalmente com Nelson Mandela quando de sua primeira visita ao Brasil. Participou de atividades de sensibilização, conscientização e produziu textos  sobre relações raciais no Brasil. Doutora em Literatura Comparada pela Universidade de Paris, Sorbonne, é Professora aposentada do Instituto de Artes da Universidade de Brasília, dedica-se atualmente à psicanálise: teoria e clínica. Fez vários estágios nessa área, particularmente no HUB, na clínica ANANKÊ e um ano de estudos teóricos na Universidade de Harvard- USA.

 

 

LOURDES TEODORO ; poèmes en français>>>>>>

 

 

 

à sombra dos embondeiros do recife V

 

toma da máscara

a forma exata,

veste tua real aparência,

medita.

deixa cair

a suposta essência,

sê trigo e coquelicot:

aceita a passagem gratuita

                   da brisa

dorme, que sonharei contigo.

 

 

De, Canções do mais belo pecado e poemas antigos, 2ª. edição, no prelo.

 

 

 à sombra dos embondeiros do recife VI

 

         carta sem destinatário.

 

não sou trezentos,

         tampouco tenho em mim todos os sonhos do mundo;

custa-me ajeitar os ombros,

         com todo esse peso das mãos de uma criança,

querendo eternamente ser em mim.

dancei na praça:

os meninos de rua

soltaram o corpo comigo,

súbito, sem loló ou crack,

viraram folha, docemente ao vento!

 

 

                  

De Canções do mais belo pecado e poemas antigos, 2ª. edição, no prelo.

 

 

à sombra dos embondeiros do recife VII

 

 

dançar é celebrar o corpo

         é render graças

dialogar com as coisas

é vê-las com os sentidos todos

nada  no meio do caminho.

o vento é o maior conhecedor do silêncio

                   o vento é dança.

alguém sonha comigo. sou água. sou vento.

 

 

 

De, Canções do mais belo pecado e poemas antigos, 2ª. edição, no prelo.

 

 

perscrutando teus poros

 

bêbadas manadas ciclópicas

- pégaso sem asas em pleno ar -

vai meu rosto buscando teu beijo

vai meu corpo te sonhando um mar.

 

por um frágil amor assim composto,

nessa imensidão em que te tornas,

trazes o vigor das coisas raras

tudo planejas com o rigor do gosto.

 

mas muito mais altos serpeiam os desejos

que de ti e de mim emanam deslembrados -

vida que renasce após serena chuva

a revolucionar a terra em mil harpejos.

 

 

De, Canções do mais belo pecado e poemas antigos, 2ª. edição, no prelo.

 

 

paisagem litorânea

 

os arranha-céus subiram aos morros,

                                para ver o mar

e os negros

                mudaram-se

                                para a avenida  Copacabana.

as usinas e as fábricas

               lançaram-se dos penhascos,

a ponte se dissolveu na bruma

                                e jangadas povoaram

                                a baía, inocentemente.

 

 

 

De Canções do mais belo pecado e poemas antigos, 2ª. edição, no prelo

 

 

o quintal

 

detrás dos bambuais

meninos tocavam flautas

atrás do trem elétrico

mulheres dançavam salmos

atrás de jangadas

peixes se salvavam de anzóis

atrás de navios

jangadas entoavam hinos

atrás de jangadas

   a boiada atravessava o rio

sob mangueiras, alimentos místicos

   nutriam a infância

atrás das bananeiras

clareiras criavam deuses

atrás dos rios

revoltavam-se os mares

sonhando correr igual

   da manhã

   a face do mundo era verde.

 

 

De Água-marinha ou tempo sem palavra, ed. Da autora, Brasília, 1978.

 

 

 

a derradeira utopia

 

à espera do ano dois mil

desviaram os rios.

 

à espera do ano dois mil

negaram seiva às árvores

para que o cansaço sobreviesse rápido

ao dorso dos peões ensolarados

e sedentos.

 

à espera do ano dois mil,

inventaram reservas

onde acumularam

todos os índios sem terra,

todo o sal da terra.

 

à espera do ano dois mil,

condicionaram o mundo

para que não concebesse mais

e distribuíram caridades amargas.

...

à espera do ano dois mil,

conceberam a guerra bacteriológica

e os pobres quedaram

sem acesso à medicina

denominada milagre,

tal sua maravilha e seu preço.

 

à espera do ano dois mil,

fixaram a última forma de progresso humano.

 

à espera do ano dois mil,

determinaram que a palavra branco

seria o equivalente

de limpo

de verdadeiro

de bom

de belo.

 

à espera do anos dois mil,

decretaram excepcionais

todos os que querem viver o presente

como se o ano dois mil não viesse

e criaram associações de amparo

aos miseráveis,

aos proscritos.

 

para fazer aceitar o mito do ano dois mil

fizeram crer no inevitável

das diferenças sociais.

 

à espera do ano dois mil,

desenterraram o medo

da irrealidade do futuro. 

 

Setembro, 1977

 

 

De Água-marinha ou tempo sem palavra, ed. Da autora, Brasília, 1978.

 

 

A transparência da espera

 

esse monstro diáfano

sobrevoando as águas

nesse mar acabrunhado e roto

e de cabelos brancos,

há milênios o esperamos

em vão e esperançosamente.

virá talvez cheio de exóticos e tóxicos perfumes

vestir de alegria bêbada

nossa impaciência envelhecida.

virá talvez com milhares de balões coloridos

e infindáveis bolhas de sabão

a sobrevoá-lo,

e pierrôs delicados e pálidos

tocando flautas doces

mimando graças leves,

seu único olho, verde no vértice da fronte,

virá o barco pleno de mãos cheias

das essencialidades dos tesouros

e renascerão os exilados sem caminho

renascerão os exílos dos já mortos

e habitaremos esse espaço largo

feito de irrealidades transparentes

redimidos da espera

e do vivido.

 

Setembro, 1977

 

 

De Água-marinha ou tempo sem palavra, ed. Da autora, Brasília, 1978.

 

 

O CORPO, O NADA.

 

a joão cabral de melo neto.

 

 

o segredo do tempo

 - a pedra -

a coragem do tempo

- a pedra -

a riqueza do tempo

-a pedra -

a frieza do tempo

- a pedra -

a erupção do tempo

- a pedra -

a construção do tempo

- a pedra -

o silêncio do corpo 

- a pedra -

o peso sobre o nada

- a pedra.

 

 

De Água-marinha ou tempo sem palavra, ed. Da autora, Brasília, 1978.

 

 

cristais, risos e alaridos

 

meu pai? foi buscar diamantes

para o colo  de minha mãe.

meu pai? foi buscar diamantes

para o café da manhã.

meu pai foi buscar diamantes

para o anel de formatura

                   das minhas irmãs.

 

meu foi foi buscar diamantes

para a festa de natal,

para o menino esperado,

para  o noivado a caminho,

pagar a dívida do açougue,

para dar à luz ao olhar de minha mãe:

sapato novo pra todo mundo.

que minha mãe acreditasse nele,

 

                   que sorrisse

                            amanhecesse!

a primeira caixa de pedras

preciosas que veio do garimpo

encheu a casa de risos, alaridos

e olhares brilhantes.

nesse dia, não me lembro de minha mãe.

                                                                 

Paris, Antony, 1982.

 

 

De Água-marinha ou tempo sem palavra, ed. Da autora, Brasília, 1978.

 

 

 

Hai kai

 

Na ponte de pedra

Ao brilho da íris

Dança luminoso arco-íris.

 

 

De poemas da bruxa do taiyo 127, Edição especial, da Autora, 2008

 

 

                                  

    LOURDES TEODORO - poèmes en français                                

TEODORO, LourdesPaysage en Attente.  Brasília: Edição da autora, 1995.07 p.  15,5x23 cm.   ISBN 85-900102-2-8  “ Lourdes Teodoro “  Ex. bibl. Antonio Miranda

                                 

petite misère matinale

 

petite fourmi est venue:

          c'était tard le soir,

          le pain encore doux.

 

               le matin,                    

Mireille est entrée pour le petit-dejeuner
          et a mangé la fourmio
          - grosse de 100 grammes de blé-.

 

 

ipê-roxo

 

vie, ancienne life:

paquet d'aiguilles

"made in Brazil"

la marque britannique

de l'enfance

la France baptise

d'un nom de ville aux

          miracles

les parents ont l'illusion

          de créer

 

souriez à la nouvelle née!

- il a grandi le miracle incommode

          du ventre de ma mère -

du blanc ici et là

fantômes illisibles sur un visage doux

né ailleurs   ,

sous l'arbre flamboyant

mas é o ipê-roxo

que reclama o cerrado.

mes racines tordues réclament des fleurs

 

un devenir plus rose.

 

 

onyx

 

je ressens déjà cette fatigue ancienne

née sur les ports frais-bâtis

et la mer s'évade en poursuite.

 

la nostalgie des paysages

ancrée dans ma gorge

relance à nulle part ailleurs

 

la chevauchée d'assauts-fouets

en cuir brut

m´a trop fait de cicatrices

sous le coup

et je devins laide.

 

je ne vous prendrai pas par la main:

les heures s'écoulent vite

et le présent prend anticipé

          le relent du passé.

 



CANDANGOIANOS, NA POÉTICA BRASILIENSE / organização José
Sóter.  Capa: Sobre o quadro Campo de Espinhos, do artista
Lemuel Gandara (escrito com tinta do Pequi). Projeto gráfico do
capista Potyguara Pereira Netto. Miolo: projeto gráfico e diagramação
de Alex Siva. Organizadores: Sóter, Augusto Niemar, Salomão Sousa.
Brasília, DF: SEMIM 2024.   116 p.  ISBN 978-85- 980743-6-4
No. 10 203
Exemplar biblioteca de Antonio Miranda, doação de Salomão Sousa.

 

        A Gênese

      
A ti dediquei os mais belos versos,
        nunca antes proferidos.
        Minha profana boca te entreguei, para ser
        depositária dos teus beijos.

        Tua alma resgatou a minha
        e trilham por caminhos marginados de flores.

         Habitei abismos:
         meu corpo agora é tributário do teu.

         Cicatrizaste as erosões do meu coração.

         No aconchego dos teus braços,
         a gênese e o êxtase.

         Ao renascer,
         ouço os sons do universo.
         Raia o crepúsculo multicor.
         Me vêm sonhos pretéritos.


         O exílio

         Moça, mira-me nos olhos,
         vê quanta tristeza habita meu olhar.

         Moça, pela última vez deita tua cabeça em meu
         peito
         e ouve meu coração em descompasso.

         Reverbera o timbre meigo de tua voz

         É a dor da despedida!

         Vejo tua pele despindo a minha
         e tu seguindo para o exílio.

         Imerso
         busco-me no reverso.

         A noite arrasta o seu manto.

         Solitário nas madrugadas vago pelos corredores
         da saudade.

          Surgem os rubros tons do amanhecer.

          Ouço os acordes do tempo.

          Sinto morrer,
          sem estar morto.


             Latim Vulgar

          
Esta língua que corretamente falar almejo.

            Navegou mares, oceanos e também o glorioso Tejo.

            Desbravou terras banhadas pelo Negro e Solimões.

            A língua que me navega é a mesma que navega

            Camões.



             Ventos de agosto

             Banham-me os rios Pajeú e Poti e o riacho de
             infância, que saciava minha sede e ainda
             hoje corre em minhas veias.

             Hoje suas diminutas águas tornaram-se verbos na
             boca do povo e refletem versos impregnados de
             saudades.

             O menino criou asas buscou novos horizontes.
             Ao retornar, os ventos de agosto removem a
             poeira do tempo.
             Tudo é silêncio!

              A casa margeada pelo rancho não está mais lá.
              A janela por onde o menino olhava admirado as
              plácidas água e revoada dos pássaros está
              tatuada em minha memória.    


*
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Página publicada em novembro de 2024.

 

 



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