LOURDES TEODORO ; poèmes en français>>>>>>
à sombra dos embondeiros do recife V
toma da máscara
a forma exata,
veste tua real aparência,
medita.
deixa cair
a suposta essência,
sê trigo e coquelicot:
aceita a passagem gratuita
da brisa
dorme, que sonharei contigo.
De, Canções do mais belo pecado e poemas antigos, 2ª. edição, no prelo.
à sombra dos embondeiros do recife VI
carta sem destinatário.
não sou trezentos,
tampouco tenho em mim todos os sonhos do mundo;
custa-me ajeitar os ombros,
com todo esse peso das mãos de uma criança,
querendo eternamente ser em mim.
dancei na praça:
os meninos de rua
soltaram o corpo comigo,
súbito, sem loló ou crack,
viraram folha, docemente ao vento!
De Canções do mais belo pecado e poemas antigos, 2ª. edição, no prelo.
à sombra dos embondeiros do recife VII
dançar é celebrar o corpo
é render graças
dialogar com as coisas
é vê-las com os sentidos todos
nada no meio do caminho.
o vento é o maior conhecedor do silêncio
o vento é dança.
alguém sonha comigo. sou água. sou vento.
De, Canções do mais belo pecado e poemas antigos, 2ª. edição, no prelo.
perscrutando teus poros
bêbadas manadas ciclópicas
- pégaso sem asas em pleno ar -
vai meu rosto buscando teu beijo
vai meu corpo te sonhando um mar.
por um frágil amor assim composto,
nessa imensidão em que te tornas,
trazes o vigor das coisas raras
tudo planejas com o rigor do gosto.
mas muito mais altos serpeiam os desejos
que de ti e de mim emanam deslembrados -
vida que renasce após serena chuva
a revolucionar a terra em mil harpejos.
De, Canções do mais belo pecado e poemas antigos, 2ª. edição, no prelo.
paisagem litorânea
os arranha-céus subiram aos morros,
para ver o mar
e os negros
mudaram-se
para a avenida Copacabana.
as usinas e as fábricas
lançaram-se dos penhascos,
a ponte se dissolveu na bruma
e jangadas povoaram
a baía, inocentemente.
De Canções do mais belo pecado e poemas antigos, 2ª. edição, no prelo
o quintal
detrás dos bambuais
meninos tocavam flautas
atrás do trem elétrico
mulheres dançavam salmos
atrás de jangadas
peixes se salvavam de anzóis
atrás de navios
jangadas entoavam hinos
atrás de jangadas
a boiada atravessava o rio
sob mangueiras, alimentos místicos
nutriam a infância
atrás das bananeiras
clareiras criavam deuses
atrás dos rios
revoltavam-se os mares
sonhando correr igual
da manhã
a face do mundo era verde.
De Água-marinha ou tempo sem palavra, ed. Da autora, Brasília, 1978.
a derradeira utopia
à espera do ano dois mil
desviaram os rios.
à espera do ano dois mil
negaram seiva às árvores
para que o cansaço sobreviesse rápido
ao dorso dos peões ensolarados
e sedentos.
à espera do ano dois mil,
inventaram reservas
onde acumularam
todos os índios sem terra,
todo o sal da terra.
à espera do ano dois mil,
condicionaram o mundo
para que não concebesse mais
e distribuíram caridades amargas.
...
à espera do ano dois mil,
conceberam a guerra bacteriológica
e os pobres quedaram
sem acesso à medicina
denominada milagre,
tal sua maravilha e seu preço.
à espera do ano dois mil,
fixaram a última forma de progresso humano.
à espera do ano dois mil,
determinaram que a palavra branco
seria o equivalente
de limpo
de verdadeiro
de bom
de belo.
à espera do anos dois mil,
decretaram excepcionais
todos os que querem viver o presente
como se o ano dois mil não viesse
e criaram associações de amparo
aos miseráveis,
aos proscritos.
para fazer aceitar o mito do ano dois mil
fizeram crer no inevitável
das diferenças sociais.
à espera do ano dois mil,
desenterraram o medo
da irrealidade do futuro.
Setembro, 1977
De Água-marinha ou tempo sem palavra, ed. Da autora, Brasília, 1978.
A transparência da espera
esse monstro diáfano
sobrevoando as águas
nesse mar acabrunhado e roto
e de cabelos brancos,
há milênios o esperamos
em vão e esperançosamente.
virá talvez cheio de exóticos e tóxicos perfumes
vestir de alegria bêbada
nossa impaciência envelhecida.
virá talvez com milhares de balões coloridos
e infindáveis bolhas de sabão
a sobrevoá-lo,
e pierrôs delicados e pálidos
tocando flautas doces
mimando graças leves,
seu único olho, verde no vértice da fronte,
virá o barco pleno de mãos cheias
das essencialidades dos tesouros
e renascerão os exilados sem caminho
renascerão os exílos dos já mortos
e habitaremos esse espaço largo
feito de irrealidades transparentes
redimidos da espera
e do vivido.
Setembro, 1977
De Água-marinha ou tempo sem palavra, ed. Da autora, Brasília, 1978.
O CORPO, O NADA.
a joão cabral de melo neto.
o segredo do tempo
- a pedra -
a coragem do tempo
- a pedra -
a riqueza do tempo
-a pedra -
a frieza do tempo
- a pedra -
a erupção do tempo
- a pedra -
a construção do tempo
- a pedra -
o silêncio do corpo
- a pedra -
o peso sobre o nada
- a pedra.
De Água-marinha ou tempo sem palavra, ed. Da autora, Brasília, 1978.
cristais, risos e alaridos
meu pai? foi buscar diamantes
para o colo de minha mãe.
meu pai? foi buscar diamantes
para o café da manhã.
meu pai foi buscar diamantes
para o anel de formatura
das minhas irmãs.
meu foi foi buscar diamantes
para a festa de natal,
para o menino esperado,
para o noivado a caminho,
pagar a dívida do açougue,
para dar à luz ao olhar de minha mãe:
sapato novo pra todo mundo.
que minha mãe acreditasse nele,
que sorrisse
amanhecesse!
a primeira caixa de pedras
preciosas que veio do garimpo
encheu a casa de risos, alaridos
e olhares brilhantes.
nesse dia, não me lembro de minha mãe.
Paris, Antony, 1982.
De Água-marinha ou tempo sem palavra, ed. Da autora, Brasília, 1978.
Hai kai
Na ponte de pedra
Ao brilho da íris
Dança luminoso arco-íris.
De poemas da bruxa do taiyo 127, Edição especial, da Autora, 2008
LOURDES TEODORO - poèmes en français
TEODORO, Lourdes. Paysage en Attente. Brasília: Edição da autora, 1995.07 p. 15,5x23 cm. ISBN 85-900102-2-8 “ Lourdes Teodoro “ Ex. bibl. Antonio Miranda
petite misère matinale
petite fourmi est venue:
c'était tard le soir,
le pain encore doux.
le matin,
Mireille est entrée pour le petit-dejeuner
et a mangé la fourmio
- grosse de 100 grammes de blé-.
ipê-roxo
vie, ancienne life:
paquet d'aiguilles
"made in Brazil"
la marque britannique
de l'enfance
la France baptise
d'un nom de ville aux
miracles
les parents ont l'illusion
de créer
souriez à la nouvelle née!
- il a grandi le miracle incommode
du ventre de ma mère -
du blanc ici et là
fantômes illisibles sur un visage doux
né ailleurs ,
sous l'arbre flamboyant
mas é o ipê-roxo
que reclama o cerrado.
mes racines tordues réclament des fleurs
un devenir plus rose.
onyx
je ressens déjà cette fatigue ancienne
née sur les ports frais-bâtis
et la mer s'évade en poursuite.
la nostalgie des paysages
ancrée dans ma gorge
relance à nulle part ailleurs
la chevauchée d'assauts-fouets
en cuir brut
m´a trop fait de cicatrices
sous le coup
et je devins laide.
je ne vous prendrai pas par la main:
les heures s'écoulent vite
et le présent prend anticipé
le relent du passé.
CANDANGOIANOS, NA POÉTICA BRASILIENSE / organização José
Sóter. Capa: Sobre o quadro Campo de Espinhos, do artista
Lemuel Gandara (escrito com tinta do Pequi). Projeto gráfico do
capista Potyguara Pereira Netto. Miolo: projeto gráfico e diagramação
de Alex Siva. Organizadores: Sóter, Augusto Niemar, Salomão Sousa.
Brasília, DF: SEMIM 2024. 116 p. ISBN 978-85- 980743-6-4
No. 10 203
Exemplar biblioteca de Antonio Miranda, doação de Salomão Sousa.
A Gênese
A ti dediquei os mais belos versos,
nunca antes proferidos.
Minha profana boca te entreguei, para ser
depositária dos teus beijos.
Tua alma resgatou a minha
e trilham por caminhos marginados de flores.
Habitei abismos:
meu corpo agora é tributário do teu.
Cicatrizaste as erosões do meu coração.
No aconchego dos teus braços,
a gênese e o êxtase.
Ao renascer,
ouço os sons do universo.
Raia o crepúsculo multicor.
Me vêm sonhos pretéritos.
O exílio
Moça, mira-me nos olhos,
vê quanta tristeza habita meu olhar.
Moça, pela última vez deita tua cabeça em meu
peito
e ouve meu coração em descompasso.
Reverbera o timbre meigo de tua voz
É a dor da despedida!
Vejo tua pele despindo a minha
e tu seguindo para o exílio.
Imerso
busco-me no reverso.
A noite arrasta o seu manto.
Solitário nas madrugadas vago pelos corredores
da saudade.
Surgem os rubros tons do amanhecer.
Ouço os acordes do tempo.
Sinto morrer,
sem estar morto.
Latim Vulgar
Esta língua que corretamente falar almejo.
Navegou mares, oceanos e também o glorioso Tejo.
Desbravou terras banhadas pelo Negro e Solimões.
A língua que me navega é a mesma que navega
Camões.
Ventos de agosto
Banham-me os rios Pajeú e Poti e o riacho de
infância, que saciava minha sede e ainda
hoje corre em minhas veias.
Hoje suas diminutas águas tornaram-se verbos na
boca do povo e refletem versos impregnados de
saudades.
O menino criou asas buscou novos horizontes.
Ao retornar, os ventos de agosto removem a
poeira do tempo.
Tudo é silêncio!
A casa margeada pelo rancho não está mais lá.
A janela por onde o menino olhava admirado as
plácidas água e revoada dos pássaros está
tatuada em minha memória.
*
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Página publicada em novembro de 2024.