Home
Sobre Antonio Miranda
Currículo Lattes
Grupo Renovación
Cuatro Tablas
Terra Brasilis
Em Destaque
Textos en Español
Xulio Formoso
Livro de Visitas
Colaboradores
Links Temáticos
Indique esta página
Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

POESIA GOIANA

 

 

Foto por William  Junio de Andrade
Blog do poeta:
http://jamessonbuarque.blogspot.com/

 

JAMESSON BUARQUE


 

Nasceu em Recife e radicou-se em Goiás. É docente-pesquisador da Faculdade de Letras da Universidade Federal de Goiás, da área de Teoria da Literatura, Teoria do Poema e Ensino de Literatura. É autor do livro Novíssimo testamento (CEGRAF/UFG, 2004), de outra troia (artepaubrasil, 2010) e Pluviário perpétuo (PUC/GO, 2011), todos de poesia. Comumente, aposta no poema longo e no poema-livro como base de sua poética, preocupado com as relações simultâneas dos intermeios históricos e geográficos do conhecimento e da vida social e da condição humana em solidão.

 

 

Veja também: MARTIM CERERÊ -    A POLIFONIA E FIGURAÇÃO DE UM ÉPICO DA MODERNIDADE E DA BRASILIDADE – por Jamesson Buarque - ENSAIOS

 

 

 

O dicionário aberto

 

Na mesma página

Pela mesma palavra

Dia após dia

Como um fóssil

A sílaba dental e aberta

Cantada longa

Pelo mesmo poeta

Verso após verso

Como um fóssil

A Lua centrada

Na mesma fotografia

Pelos mesmos olhos

Lâmpada após lâmpada

Como um fóssil

 

Nada disso é lembrança

É artesanato

Um sortilégio de memória

Ou monumento

Jamais o passado

 

 

 

Não tire férias

 

Provoque um feriado prolongado

Dentro das férias       Um intervalo

Isto de hiato               ou halo

Não conviva entre os conhecidos

Nem conviva entre quem novidade

Passe pelos estranhos tão estranho quanto

Um fantasma de carne e osso

Leve as madrugadas na cama

Fabricando sonhos em contos

Para repousar o senso

Abandone-se do caminho quatro vezes errado

Retorne para sua residência

Entre as páginas de outros hábitos

Não escreva aquela carta nem ouça

Canções daquele mesmo álbum

Aguarde em emulsão de álcool

Despeje ácido no que for desnecessário

E somente faça planos

Para antes do passado mais imediato

Ou ouse qualquer coisa de saltar

De abismo abaixo armando as asas

Mas somente consigo e quem lhe aprecie de fato

Para além de mais adiante

Depois descanse

 

 

CANÇÃO DE MALLARMÉ

 

História

A história sempre acaba em livro

Tudo sempre acaba em livro, Mallarmé:

Papiro palimpsesto casca de árvore

Lugar de talhar palavras

Gralhas e metáforas espalhadas pelo papel —

A história tem a idade de escrever

História

Em mais nada senão mais páginas

 

Aurora

De dedos rosados é uma palavra

Um cego a estribilhou na ponta da língua

Lésbia é outra palavra

Mil vezes e mais tantas vezes beijada

Catulo a cunhou no côncavo da boca

Fremindo a úvula em latim antes de Virgílio

Dido é outra palavra

E fundou um mundo —

Cartago morreu depois mas ficou em livro

 

Tudo sempre acaba em livro, Mallarmé:

Beatriz sabe disso

Seu nome é próprio para luz

Uma palavra acima do nono céu e clara

E claro:

Não posso pronunciar palavra a palavra

Cada palavra que me ocorre nos lábios

Mas posso um pouco mais

Posso Isabel e posso Leiria —

A invenção do mundo caravela em minha fala

 

Lusíada

Uma palavra ou menina

Parideira de mais palavras ou meninas no colo da língua —

Língua tem colo:

Fones brotando de óvulos

Uma fertilidade da história

A glória disso é parir mais e feminina desde o sono:

Paraguaçu deitada no desenho do lago —

“Jararaca vai te morder”

“Vai não” — diz um livro

 

Tudo sempre acaba em livro, Mallarmé:

Diotima Marília e Lívia

Pastoras de palavras e amor

São palavras

E somente como palavras se bastam

Os bastiões dos dias

Pela criação do verbo: sarça e carne

Ou a invenção da poesia —

Cristabel largada no vazio da floresta

A tantos passos do castelo de seu pai

E de pernas abertas

Cada metade de um livro para um lado

Ou dois prados ou dois bagos:

Bandas de laranja plantando semântica

 

Marabá

De olhos verdes e cabelo dourado

Uma palavra em formato de pomo:

Anajá —

Uiara que sereia meus passos

Até Cecília e seu silabário mágico

Mais palavras havia

E Dora e Hilda

E Anna cravada no coração de Rannar

De um lado a outro lado

A história sempre acaba em livro

 

Tudo sempre acaba em livro, Mallarmé:

Casca de árvore talhada à faca

O poema é sempre feminino —

Uma manifestação das Horas e das Graças

Madalena sorrindo no sorriso de Helena

De Jerusalém a Ílion ao resto do mundo

Palavra sempre tem formato de mulher

Por isso Deusa: minha vida mais cara

Por isso sempre palavra dá em mais palavras

Gestação e geração:

Terra livroteca casa ilha cidade —

Signos de Safo solfejando sílabas

Ou um golpe de fada suando em cima de um sapo,

Segundo um livro

 

Segundo um livro onde houver gente

Para cada macho há pelo menos sete mulheres

Todas aptas ao combate:

Uma combate com os lábios

Outra com a saia e outra com as sandálias

Outra com as pernas e outra com os braços

Uma combate com a cabeleira

E outra com rosas —

Sobretudo todas combatem com palavras

Por isso Deus é feminino:

Pairava sobre as águas fez a luz e se vestiu de sarça

Como antes de rijos

Demiurgos mártires santos meninos heróis e poetas

São sempre suaves —

Segundo Guevara: outro livro

 

Tudo sempre acaba em livro, Mallarmé:

Estão escritos na história

Péricles Felipe Alexandre e Augusto

Embora seu formato de palavra

Regravam a vida a sua vontade

Como os demais generais a gerarem:

Consentiam apenas seu nome —

O mínimo da pirâmide sempre esmagou a base:

Está escrito

Suserano vassalo colono

E clérigos no meio

Fazendo ponte para cobrar pedágio

De cima abaixo

O mais raso somente recebe necessidade

 

Um dia Joana, e Joana era inconsútil,

Se despiu da cabeleira de Circe

E se banhou com os porcos para ombrear varões —

Conta um livro que sua bainha era impenetrável

Sua espada nunca amolecia

E não usava escudo

Li que antes de mudar o mundo o desordenou

E morreu —

Ainda vejo em Chiquinha Arendt Lou Salomé e Aninha, a Coralina,

Seu feitio de sandálias agraçando a história

Num formato de cântico

E todo cântico tem formato de livro

 

Tudo sempre acaba em livro, Mallarmé:

Quando chega a idade e as dores nos ossos

Com o primeiro derrame do lado esquerdo

A história desenha um mito —

Entre os fósseis e a cadeira de balanço

A dentadura mergulha precipício abaixo

Para fecundar uma nova queda

E queda tem signo de história:

Dormem nessa hora os filhos em seu casulo ou cegueira

Mas ainda agüenta o tranco

A velha Hannan Arendt

E domina o silêncio

Mansa

Mais mansa do que criança

De sono solto

 

No último século vestia saias

Somente

Assinava nome de macho

Se trocou num par de calças

E escala até edifícios

Quando quer faz filhos

E ainda vive estupros latejando bigorna martelo e estribo

Ou tapa na cara ou signo da mal-falada

Segundo o prontuário de delegacias e cartórios:

Um corpo de livro

 

Tudo sempre acaba em livro, Mallarmé:

Era uma vez uma lua que se chamava Jaci

Se esqueceu do Sol

E foi se banhar nua nas ruas

Veio a polícia e lhe enquadrou num código —

Tudo, Jaci, acaba em livro

Inclusive são livros a jaula e o absurdo

Outra se chamava Aninha, a Coralina,

E também era uma vez

Conheceu o grito o silêncio a indiferença e o barulho

Ainda lhe restam as sandálias

O quintal com cheiro de mato de avó

E disputa com rio e igrejas roteiro turístico

 

Quando chega a idade e as dores nos ossos

Com o primeiro derrame do lado esquerdo

A história desenha um mito —

Vai haver atestado de óbito:

Daqui para lá para um filho

De lá para cá para o outro

E um registro em folha de livro:

Pedrinhas brotando em canteiros de terra

A hora certa da cadeira na rua

O cochilo na hora do filme

E o badalo do sino na igreja mais antiga

Lembrando que a vida pulsa em formato de sílaba

 

Tudo sempre acaba em livro, Mallarmé:

Não faz de conta que a história existe

Quando a idade chega

Até os pássaros sentem dor no cântico dos bicos

E os dicionários crescem nessa hora

Seu tamanho de livro na história

Ou arquipélago de palavras

Que pela semântica das bandas da laranja é a mesma coisa

Então se expira a lâmpada de um verbete

Ou se um verbete se fossiliza

Uma palavra inventa de usá-lo sem vestido

Como rapariga moça puta são ao contrário a mesma coisa:

Desígnio de livro

 

A história nasce galopando sobre chamas

Estende suas veias ilha ao mundo todo

Pela vagina sopra e espalha antigo fogo

Do mesmo fogo originário das palavras

 

O fogo queima, e disse Edmar: recusa corpo

Este axioma é quase exato e porque canta

Ala ardentias de fonemas trota e rubra

A vida e morte que rubrica todo um povo

 

Todos sabemos que a história não se apaga

Pétalas caem para fazer crescerem árvores

A mais e aléias a mais também até onde a carne

 

É cada golpe de uma fada sobre um sapo —

Longo fagote que estruge até o mais fundo

Do fim do mundo nas entranhas das idades

 

Conclamando o rosto dos homens em seus olhos

Toda palavra desenrola a cabeleira

Como a sereia que ao cantar domina o mundo

 

Tudo sempre acaba em livro, Mallarmé:

Depois de um soneto e um estrambote

A poesia cabe em tudo:

É filha das palavras e feminina

Como Dona Jaideth ou mainha

Ensinando-me ciranda e roda —

A dança é sempre fêmea e cabe em livro

Como a saia rodada de Deusa

Dançando em passo ou galope de sílabas

Para a beira do mar ou qualquer lugar

Transformando insânia em fome

O que era insânia arde em palavras

Agora e sempre no cerne ou vulva das ilhas

 

Ilha é livro: uma palavra

Falena feita de mulher forjando a terra

Eva Pandora Lilith Safo e mais beldades

Bem como Cléa e sua fome de fiéis

Por isso a história não desiste:

Mainha nos ouvindo disquinhos

Amarelo e azul e vermelho e verde

Histórias de fantasmas e mais folclore

E contos da saga dos Buarque —

Vovó Hilda escondida num lago

O cajado de ordem de Mãe Fana

E o sorriso de Ismênia num álbum:

Outro livro

 

Tudo sempre acaba em livro, Mallarmé:

A história de uma pessoa é a história do planeta

Inteiro e arde

Nasci do batuque de tambores e da transmissão

Digitalizada de dados —

Mulher em homem fazendo páginas:

Dona Isabel fez uma igreja e roseiras

Dom Dinis, as caravelas

Igreja roseira e caravela são mulheres

Inclusive é mulher a guerra

E a paz vem sempre no feminino

Em língua de elfo de libélula ou em português moderno —

O Cristo sabia disso

Por isso desposou Madalena para beata

Num madeiro

E crucificado

Segundo a Bíblia, este organismo feminino:

Outro livro

 

 

BUARQUE, JamessonMeditações.  Goiânia, GO: Martelo, 2015.   136 p.  (Coleção Cabeça de poeta, 01; série contemporânea).   14X22 cm.  ISBN 978-85-68693-04-9    Projeto gráfico e capa: Lucas Mariano. Ilustração : Patrícia Ferreira.  Capa e sobrecapa espacial com textos de poemas no reverso. Tiragem: 700 exs numerados.  “ Jamesson Buarque “  Ex. bibl. Antonio Miranda.

Este consegue o refinamento de uma poesia filosófica (diga-se igualmente meditativa) à vera filosofia experimentada por aqueles que se entregam efetivamente à existência do ser humano — a meditação  própria da paixão e da matéria. A consciência exacerbada do humano empurra nosso corpo num abismo de constante revelações, dialogadas com o prosaico, claro, mas revelações pungente sobre esse ser e estar num mundo tão volátil, tão constante.” MIGUEL JUBÉ

O mergulho existencial, leitmotiv da presente coleção de poemas, revela-se com brilho no poema “Autorretrato”, onde lemos estas linhas: “Existe um toco, torso / Transpõe pra o mesmo lugar, vago / É óbvio e irritante, tosco / Seus olhos sorriem mortos, opacos / em castanho seco e pesados”, com jogos de assonância, aliteração e paranomásias que unem confissão e poeticidade num único tecido estético.”  CLÁUDIO DANIEL

 

DE ARREPENDER-SE

 

Quem não se arrepende, dorme na inércia

resta em formato de rochedo ao mar

às ondas que o laceram lentamente

hora após hora enquanto passa o tempo

vive na certeza, esta paralisia

e não compreende por que passarelam passos

 

Somente de arrepender-se jamais se vive

vive-se de tentar de novo e novamente

de acertar depois de haver errado

de trocar os pratos sujos por nuvens

de descascar da pele o quê enferruja os ossos

e para tanto é preciso arriscar-se debaixo do sol

 

Quando for tarde, a vela terá murchado

desde a chama, na imobilidade da cera

sem jamais mover passo ao possível abismo

ou à possível estrada de paisagem a horizonte

como um livro que nunca será lido

e esta fome de voltar atrás quando já não é possível

 

 

DA PERDIÇÃO

 

Não há mais tempo de convocar os mortos, morreram

Não há mais tempo de aguardar resposta, faz silêncio

Depois do adeus, sabemos, aposentam-se os lenços

Não há por que esperar a próxima hora, Inês já é morta

Não há por que esperar aquele corpo, a derrota venceu

Depois do adeus, a expectativa habita depois da porta

 

 

AUTORRETRATO

 

Existe um toco, torso

Transpõe-se para o mesmo lugar, vago

E óbvio e irritante, tosco

Seus olhos sorriem mortos, opacos

em. castanho seco e pesados

Dorme em intervalos e cavalga-se. Sim, de Peixes em Touro,

                                                                     é um cavalo

Ainda não teve a filha, resta-lhe os livros

Não é ingénuo nem cínico, é irónico, quiçá obtuso, abismado

Sobrevive a insuficiências aos cortes, jamais parco

A cabeça é de ouriço com espinhos amputados, um pedregulho

Não fabrica distâncias, mas as provoca pelos ossos

quando não, emprega os lábios

ou furo na parede visto pelo outro lado

Parece jovem e passado, velho e desmedido

E sinistro de perna e braço, um ovo ao avesso

e quando sai, não passa do próprio quarto

como se avistasse adiante apenas um palmo
Sofre de preguiça, mas não para, e quando para, inverte o corpo

Evidente livro fácil, não se importa nem via pouco

Teima como se jogasse truco o tempo todo

embora desconheça este e outros jogos

Lê em posição de mocho, como um rinoceronte ladeando um tronco

Anda para aqui e para lá, de ida e volta, entre espasmos

jamais surtado nem doido, como quem pensa, embora micróbio

De resto, espera que o próximo ano dê certo

prepara-se para incessante inverno

e tardes de mais perdas entre os dedos

Ancora-se na desistência e move um encouraçado a sopro

Sobretudo, da medula e das veias até os pelos, incluindo os cílios

acredita no povo, toda gente que resiste de novo

Não sabe se tem arestas, mas se tem, não acumula pó nem
                                                                               outros restos

Acredita no amor, e para encontrá-lo

inventa lamentos debaixo do assoalho

Cúmplice das paredes, lembra-se dela pelo cheiro

dela, a que singrou no vento depois do último beijo

Talvez seja um copo, onde uma maré sobe e desce entre nervos

e, mais tarde, enquanto houver um ano que seja o próximo

garantirá despir-se de seus óculos quebrados e sem conserto

em formato de palimpsesto dele mesmo

Um rio dragado, um disco furado
e
xiste um toco, torso

 

 

 

BUARQUE, Jamesson. Novíssimo testamento.  Goiânia, G0: Editora UFG, 2004.         101 p.  13,5x19,5 cm.  Projeto gráfico e capa: Sonia Kalil Guamarães, zxgx ISBN 85-7274-245-X    Ex. bibl. Antonio Miranda

 

Em Novíssimo Testamento, Jamesson Buarque elabora sua tapeçaria de vozes, mitos e recriações. Ousada, sua tragicidade dialoga com a tradição e a contemporaneida, compondo um texto sobre o ser humano e o fazer poético.” MICHELINY VERUNSCHK

 

 

         5. Aparição da poesia

 

   5.1

         Este poema não é lírico
                   Nem o será
         Porque eu não é seu que falo
                   Como é da lira
         Sua spectativa de canto.
         Eu quero merecer do Lácio
                  A última flor
         Verso a verso com minha idade
                   De segurar fuzil
         Porque é principalmente bélico
                   Este poema
         De cantar minha palavra de poesia.

 

         Escrevo o poema com palavras
                   Apenas e uma a uma
         Quem lhe atualizar sentimento e/ou ideia
                   Conforme o apreço
         Deixarei às palavras essa leitura e a sua
                   A minha, outra
         Comunicar diferente novela
                   Que se dê epopeia.

 

         Minha palavra se assina assim
                   E não peço fortuna
         À crítica que me valha o bom gosto
                   De comportar riscos
         Ou enfrentar peculiaridades de estilo
                   Para meu absurdo
         Que de absurdidade faço-parte.

 

 

         5.2

 

         Ouço a palavra onde há um deus dormindo
                  Ai lira que me inflama
                   Ai mimos já esquecidos,
         É a palavra que há como um sortilégio
                   E o deus não desperta
                  E eu sou agonia.

 

                            Agora basta uma árvore cada folha
                                      Pedras colmadas de imaginação
                   O desespero de um sacerdote acordado,
                          Basta um ritmo para meu canto.

 

         Ouço e não há de ver o que é ouvir
                   Ai palavra de ritmia,
                  Musa de minha confiança
         Que o deus quer um credo para acordar.

 

                            Não havendo esterilidade
                            Ou bastando haver apenas
                            Haverá estro e sexo,
                            Alguma criação haverá de poesia

                                      Pela palavra: o verbo.

         5.3

 

         A última palavra que eu quero:
         Um caminho onde dormem minutos
         Outro lugar imaginação
         Como vales brotando num sonho
         De perceber semblantes em branco e preto.

 

         Chegando lá quero mergulhar num lago
         Onde o sexo aparece à última palavra
         Para manter aceso meus olhos
         Porque nunca precisam me iludir.

         Se houver uma floresta sorrindo para mim,
         Eu tenho minha casa,
         Preciso logo não dar ouvidos
         Para me manter sorrindo e seguir sonhando
         Onde o caminho já guarda épocas
         Como as canções nascem.

 

         Depois estou sozinho
         Mas ascese me preenche o peito
         E eu fico ideal para as cores dos espectros
         Agora rainbow onde há os vales
         A última palavra crispa e maquina
         A mim um santo apenas acordado.

 

         O que pretendo não me aparece ainda
         Mas sei que reside a meu lado
         Como anjos absolutos
         Sempre de égide armada e assexuados
         Ou veiculando setas intencionais.

         Cheguei: o lago é o sexo.
         Enxergo o que é meu credo novamente
         Enraizado em passeios públicos
         Porque há em meus olhos verdade.
                                                                 

 

***

 

BUARQUE, Jamesson. Cântico dos Cânticos. Notas introdutórias e tradução de Jamesson Buarque. Goiânia: Ateliê Tipográfico Cegraf/UFG, 2015.  46 p.  15x19 cm.    Capa: Janaynne Carvalho do Amaral.  Ex. bibl. Antonio Miranda.

 

“o Cântico dos Cânticos apresenta e louva  a relação amorosa entre uma mulher e um homem em ambientação pastoril segundo um envolvimentos embriagado em torno do amor, bem como um sonho, um tanto de perda, quando de desejo e de alcance”. “A leitura, de imediato — pela tradução adotada, que se apoia em marcar actantes (esposa e esposo) e um coro (mulheres de Israel, decerto do harém de Salomão) —, identifica uma forma dialogada que o moldo mais recorrente de ler é associativo ao dramático.” JAMESSON BUARQUE

 

(Uma seleção:)

 

        1

        Esposa

      2    Beija-me com os beijos

            de tua boca;
            porque melhor é   o teu amor

            do que o vinho.
       3   Suave é o aroma
               dos teus unguentos,
            como unguento derramado
               é o teu nome;
            por isso, as donzelas te amam.
      4    Leva-me após ti, apressemo-nos.
            O rei me introduziu
               nas suas recamaras.

Coro

 

        Em ti nos regozijaremos
               e nos alegraremos;
           do teu amor nos lembraremos,
               mais do que do vinho;
           não é sem razão que te amam.

 

Esposa

 

  5    Eu estou morena e formosa,
            ó filhas de Jerusalém,
            como as tendas de Quedar,
            como as cortinas de Salomão.

  6     Não olheis para o eu estar morena,
             porque o sol me queimou.

         Os filhos de minha mãe

           se indignaram contra mim

         e me puseram por guarda
                  de vinhas;

         a vinha, porém, que me pertence,
                  não a guardei.

   7    Dize-me, ó amado de minha alma:
             onde apascentas o teu rebanho,
             onde o fazes repousar

              pelo meio-dia,
             para que não ande eu vagando

         junto ao rebanho

              dos teus companheiros?

 

Esposo

 

    8    Se tu não o sabes, ó mais formosa

              entre as mulheres,
             sai-te pelas pisadas dos rebanhos
             e apascenta os teus cabritos

               junto às tendas dos pastores.

    9    Às éguas dos carros de Faraó
             te comparo, ó querida minha.

    10  Formosas são as tuas faces
                  entre os teus enfeites,

          o teu pescoço, com os colares.
      11   Enfeites de ouro te faremos,

              com incrustações de prata.

 

Esposa

 

   12     Enquanto o rei está assentado
                   à sua mesa, o meu nardo exala o seu perfume.

   13     O meu amado é para mim

                um saquitel de mirra,
               posto entre os meus seios.

   14     Como um racimo de flores de hena

                nas vinhas de En-Gedi,
               é para mim o meu amado.

 

Esposo

 

   15     Eis que és formosa,

               ó querida minha,        

                eis que és formosa;
                   os teus olhos são
                     como os das pombas.

 

Esposa

 

    16   Como és formoso, amado meu,
               como és amável!

           O nosso leito é de viçosas folhas,

    17   as traves da nossa casa  
                   são de cedro,
               e os seus caibros, de cipreste.


        

Obs. O texto completo são 8 Cantos.

 

 

 

 

BUARQUE, JamessonObservações. Goiânia, GO: Editora da Imprensa Universitária, 2017.   54 p.  Prefácio: Tarsila Couto de Brito.Arte final, tipografia e capa: José Vanderley e Paulo César e Silva.  ISBN 978-85-93380-17-4.  Ex. bibl. Antonio Miranda]

 

 

         MUNDO À VISTA

 

         Não poderia restar nesta hora
         apenas desespero e esta falta de dedos
         o temor da falta de respiração
         já na próxima hora, ou no mais tardar
         amanhã cedo, e isso se não ocorrer
         de súbito, num derrame durante o sono
         Não poderia restar logo agora
         quando o horizonte parece tão concreto
         o naufrágio dos sonhos não num mar
         num vácuo, onde não há agua nem ilha
         onde há música, poemas e dedos de prosa
         apenas em fagulhas de ruído branco
         Não poderia restar esta falta de mão
         a segurar com alguma segurança
         o bom senso de ouvir estrelas
         a chave de levar a todas as saídas
         o alvoroço de passaradas nas praças
         o tocar num serrote uma sonata

 

 

         DA LONJURA

 

         Há algo que irrita na distância
         a paisagem da proximidade
         e na proximidade o ponto de fuga
         a conduzir à esperança
         esta sombra de paisagem

 

 

         BREVE OBSERVAÇÃO
         SOBRE POR QUE SE ESCREVE

 

         Sob um ataque cardíaco, se a vida ainda insiste
         se faz diagnóstico; do contrário, atestado de óbito

 

 

 

 

***

 

ANTONIO MIRANDA lendo um poema “ Da distância” JAMESSON BUARQUE no Youtube gravado por Salomão Sousa:

https://www.facebook.com/salomao.sousa/posts/
10206530250254950?comment_id=10206530745987343

 

 

 

Imagem extraída da exposição "VARAL POESIA GOIANA 1917-2016" exposta durante do I COLÓQUIO DO POESIA GOIANA, na Universidade Federal de Goiás, de 13-14 de junho de 2017.

 

 

Página publicada em julho de 2011; página ampliada e republicada em junho de 2015. Ampliada em fevereiro de 2017; ampliada em junho de 2017; AMPLIADA em junho 2018.


 


 
Voltar para o Topo da Página Voltar para a Página de Goiás

 

 

 

 
 
 
Home Poetas de A a Z Indique este site Sobre A. Miranda Contato
counter create hit
Envie mensagem a webmaster@antoniomiranda.com.br sobre este site da Web.
Copyright © 2004 Antonio Miranda
 
Click aqui Click aqui Click aqui Click aqui Click aqui Click aqui Click aqui Click aqui Click aqui Click aqui Home Contato Página de música Click aqui para pesquisar