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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


 


 

GIL VICENTE
(1470?-1539?)

 

 

Dramaturgo e poeta português. Não há dados seguros acerca da sua biografia. Eventualmente terá nascido em Guimarães.

 

Como dramaturgo, conservam-se hoje 44 peças suas de vários gêneros. A circulação da sua obra fazia-se, em parte, através de folhetos impressos, em literatura de cordel, datando a primeira compilação das suas peças, a COMPILAÇAM DE TODALAS OBRAS DE GIL VICENTE (da responsabilidade de seu filho, Luís Vicente), de 1562.

 

Gil Vicente retrata a sociedade portuguesa do seu tempo, em todos os seus vícios e impulsos, num registo de valor incomensurável para o conhecimento da época. Do ponto de vista poético, é notável a sua capacidade de captar as mais diferentes tonalidades e registos de linguagem - a linguagem típica de cada grupo social, de cada atitude, em diálogos ou monólogos extremamente vivos que os definem exemplarmente. Consegue exprimir, em tom adequado, tanto as mais elevadas vivências espirituais, como o sofrimento dramático, a manha ou a inocência de certas personagens, ou ainda a força viva da natureza, em elementos que a personificam. Não sendo um inovador (recorre sobretudo à métrica tradicional), recolhe a vivacidade da linguagem coloquial na sua variedade e no seu poder sugestivo.

 

Da sua obra destacamos: Auto da Barca do Inferno, Auto da Feira, Auto da Índia, Farsa dos Almocreves, Quem tem Farelos?, Farsa de Inês Pereira, O Monólogo do Vaqueiro, Auto de Mofina Mendes, Comédia de Amadis de Gaula entre tantas outras.

 

Fonte:  Breve História da Literatura Portuguesa - Autores: Vida e Obra, Lisboa: Texto Editora, 1999.

 

Leia a resenha:

GIL VICENTE E O AUTO DA BARCA DO INFERNO – Resenha de Antonio Miranda -- ENSAIOS

 

 

 

 

TEXTO EN ESPAÑOL / TEXTO EM PORTUGUÊS

 

 

VILANCETES – IX

 

En el mes era de abril,

de mayo antes un día,

cuando lirios y rosas

muestran más su alegría;

en la noche más serena

que el cielo hacer podía,

cuando la hermosa infanta

Flérida ya se partía,

en la huerta de su padre

a los árboles decía:

“Quedaos, adiós, mis flores,

mi gloria que ser solía.

Voyme a tierras extranjeras,

pues ventura allá me guía.

Si mi padre me buscare,

que grande bien me quería,

digan que amor me lleva,

que no fué la culpa mía;

tal tema tomó conmigo,

que me venció su porfía.

¡Triste, no sé a dó vo,

ni nadie me lo decía!”

Allí habla don Duardos:

“No lloréis, mi alegría,

que en los reinos de Inglaterra

más claras agoas había,

y más hermosos jardines,

y vuesos, señora mía:

ternéis trescientas doncellas

de alta genelosía,

de plata son los palacios

para vuesa señoría;

de esmeraldas y jacintos,

de oro fino de Turquía,

con letreros esmaltados

que cuentan la vida mía;

cuentan los vivos colores

que me distes aquel día

cuando don Primaleón

fuertemente combatía:

señora, vos me matastes,

que yo a él no lo temía.”

Sus lágrimas consolaba

Flérida, que esto oía;

fuéronse a las galeras,

que don Duardos tenía:

cincoenta eran por cuenta,

todas van en compañía.

Al son de sus dulces remos

la princesa se adormía

en brazos de don Duardos,

que bien le pertenecía.

Sepan cuantos son nacidos

aquesta sentencia mía:

que contra la muerte y amor

nadie no tiene valía.

 

 

 

AGRAVOS DE COLOPÊNDIO

 

          Pois Amor o quis assi,
          que mal tanto me dura,
          não tardes triste ventura,
          que a dor não se doi de mi,
          e sem ti não tenho cura.

 

          Foges-me, sabendo certo
          que passo perigo marinho,
          e sem ti vou tão deserto
          que, quando cuido que acerto,
          vou mais fora de caminho.
          Porque tais carreiras sigo,
          e com  tal dita nasci
          nesta vida, em que não vivo,
          que eu cuido que estou comigo,
          e ando fora de mi.

 

          Quando falo, estou calado;
          quando estou, entonces ando;
          quando ando, estou quedado;
          quando durmo, estou acordado;
          quando acordo, estou sonhando;
          quando chamo, então respondo;
          quando choro, entonces rio;
          quando me queimo, hei frio;
          quando me mostro, me escondo;
          quando espero, desconfio.

 

          Não sei se sei o que digo;
          que cousa certa não acerto;
          se fujo do meu perigo,
          cada vez estou mais perto
          de ter mor guerra comigo.
          Prometem-me uns vãos cuidados
          mil mundo favorecidos,
          com que serão descansados;
          e eu acho-os todos mudados,
          em outros mundos perdidos.

 

          Já não ouso de cuidar,
          nem posso estar sem cuidado;
          mato-me por me matar,
          onde estou não posso estar
          sem estar desesperado.

          Parece-me quanto vejo
          tudo triste com rezão;
          cousas que não vêm nem vão
          essas são as que desejo,
          e todas penas me dão.

          Eu remédio não no espero,
          porque aquela, em que me fundo,
          para mi, que tanto a quero,
          tem o coração de Nero
          pera me tirar do mundo.

 

 

 

VICENTE, Gil. O Velho da Horta – Auto da Barca do Inferno — Farsa de Inês Pereira. Introdução e estabelecimento de texto: Segismundo Spina.  18ª. edição.   São Paulo: Editora Brasiliense, 1986.  119  p. 13,5x21,5 cm.  “ Gil Vicente “  Ex. bibl. Antonio Miranda

 

De
O VELHO DA HORTA:

 

        ALCOVITEIRA -—  Mas, antes, senhor, agora
                                   na velhice anda o amor:
                                   o de idade de amador
                                   por acaso se namora
                                   e na corte
                                  nenhum mancebo de sorte
                                   não ama como soía.
                                   Tudo vai em zombaria!
                                   Nunca morrem desta morte
                                   nenhum dia.

 

                                   E folgo ora de ver
                                   vossa mercê namorado,
                                   que o homem bem criado
                                   até (à) morte o há de ser,
                                   por direito,
                                   não por modo contrafeito,
                                   mas firme , sem ir atrás,
                                   que a todo homem perfeito
                                   mandou Deus no seu preceito:
                                   amarás.    

                         
 
            

De
AUTO DA BARCA DO INFERNO (1517)

 

Á barca, à barca segura,
guardar da barca perdida!
Á barca, Á barca da vida!

 

Senhores, que trabalhais
pela vida transitória,
memórias, por Deus, memória
deste temeroso cais!


À barca, à barca, mortais!
Porém na vida perdida
se perde a barca da vida.

 

Vigiai-vos, pecadores,
que depois da sepultura
neste rio está a ventura
de prazeres ou de dores!
À barca, à barca, senhores,
barca mui enobrecida,
à barca, à barca da vida!

 

 

 

 

 

TEXTOS EM PORTUGUÊS

Tradução de Anderson Braga Horta

 

 

VILANCETES – IX

 

Era ainda o mês de abril,

de maio antes um dia,

quando lírios e rosas

mostram mais sua alegria;

pela noite mais serena

que fazer o céu podia,

quando Flérida, a formosa

infanta, já se partia,

ela na horta do pai

para as árvores dizia:

“Ficai, adeus, minhas flores,

em que glória ver soía.

Vou-me a terras estrangeiras,

a que ventura me guia.

Se meu pai me for buscar,

que grande bem me queria,

digam-lhe que amor me leva,

e que eu sem culpa o seguia;

que tanto por mim porfiava

que venceu sua porfia.

Triste, não sei aonde vou,

e a mim ninguém o dizia!”

Eis que fala Dom Duardos:

“Não choreis, minha alegria,

que nos reinos de Inglaterra

mais claras águas havia,

e mais formosos jardins,

e vossos, senhora, um dia:

tereis trezentas donzelas

de alta genealogia,

de prata são os palácios

para vossa senhoria;

de esmeraldas e jacintos,

de ouro fino da Turquia,

com letreiros esmaltados

que minha vida à porfia

vão contando, e as vivas cores

que vós me destes no dia

em que com Primaleão

fortemente combatia:

senhora, vós me matastes,

que eu a ele não temia.”

Os seus prantos consolava

Flérida, que tudo ouvia;

foram-se então às galeras

que Dom Duardos havia:

por cinqüenta se contavam,

todas vão em companhia.

Ao som de seus doces remos

a princesa se adormia

nos braços de Dom Duardos,

que bem já lhe pertencia.

Saibam quantos são nascidos

que sentença eu lhes diria:

que contra a morte e o amor

não há quem tenha valia.                      

 

 

 

Extraídos de POETAS DO SÉCULO DE OURO ESPANHOL: POETAS DEL SIGLO DE ORO ESPANHOL / Seleção e tradução de Anderson Braga Horta; Fernando Mendes Vianna e José Jeronymo Rivera; estudo introdutório de Manuel Morillo Caballero.  Brasília: Thesaurus; Consejería de Educación y Ciência de la Embajada de España, 2000.  343 p.  (Coleção Orellana – Colección Orellana; 12) ISBN 85-7062-250-7

 



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