WILSON ROCHA
(1921-2005)
Nasceu em Cochabamba, Bolívia, em 1921, mas sua vida intelectual e literária acontece a partir de Salvador, Bahia, onde foi um dos fundadores da revista Caderno da Bahia, responsável por mudanças nas artes e na literatura da região.
“Um poeta autêntico”, afirma Roger Bastide (1951).
“Emociona ver a nossa atual poesia liberta de prevaricações e desvios madrigalescos na voz de Wilson Rocha, uma voz impregnada dos grandes mistérios da vida e da morte e que, por isso mesmo, surgiu para ressonâncias perenes”. Mauro Mota
TEXTOS EM PORTUGUÊS / TEXTOS EN ESPAÑOL
VEJA TAMBÉM: POEMAS ERÓTICOS
De
ROCHA, Wilson
De culto feminarum ( Os poemas da mulher).
Ilustrações Almandrade.
Salvador: Fundação Gregório de Mattos, 2008. 108 p
DA MULHER
comme L´arome D´une idée
Valéry
Longa e clara cabeleira
no flanco dos quadris,
chama secreta ressurgindo
no ritmo flexível do sexo.
ELEGIA
As cores cálidas de suas vestes
pesam na memória transfigurada,
no entanto a sua voz intocada
jaz soterrada no silêncio.
OS DIAS ARDENTES
Como a fértil harmonia da mulher
ou o inquietante aroma dos frutos
acariciados pela língua do vento
a lucidez é uma imagem nua
onde tudo sonha
onde tudo evola-se
e treme como a água
a escorrer sobre o umbigo
CANÇÃO PARA SÖREN KIERKEGAARD
A que paixão se destina
a água dos fontes?
E o sabor do fruto
dos altos montes?
Labirinto de sonho
que na flor perece.
Sonhos que o amor sonha
no coração que arrefece.
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De
A FORMA DO SILÊNCIO
(Poesia Reunida)
Rio de Janeiro: José Olympio Editora;
Salvador: Fundação Cultural da Bahia, 1986
CANÇÃO DA MENINA AFOGADA
Na sombra difusa,
na areia molhada,
alga ou papoula
na praia encontrada.
Na marinha quietude,
no silêncio da sereia,
jaz na praia
perdida na areia.
Na mortiça transparência
de alga adormecida,
sozinha, sozinha,
na praia esquecida.
DE PROFUNDIS
Onde a argila
resistiu a forma,
além dos abismos,
extintos os véus,
modulando
a origem das fontes,
os amantes mortos
hirtos de silêncio
se estendem
sob o sono das raízes.
IN EXTINTAN AQUIS PUELLAM
Criatura das águas possuída,
a juventude, o mar, a morte possuindo
em sábia e eterna castidade.
Ó vitória, fulgurante vitória,
de em juventude e mar permanecer.
E o haver vencido
esse esperar da morte
que a vida conduz.
Que sob a luz tudo se extingue,
que a vida em tudo se desfaz.
CANÇÃO PARA JOSÉ PANCETTI
Água serena,
azul profundo,
um barco navega
sem deixar o mundo.
Altos ventos,
ilhas além,
uma vela só,
sem ninguém.
CANÇÃO DA FLOR NA TARDE
A Maria Angela
Límpida transparência
no cristal do dia,
rútila flor,
segredo e harmonia.
Sonha o azul
e o vermelho arde,
rútila flor,
coração da tarde.
CANÇÃO DE AMOR À BAHIA
a Alice Soares
Os casarios da Bahia,
puras formas desnudadas,
suas pedras, suas portas barrocas,
ó distâncias prolongadas.
Recolhem uma luz conforme
suas velhas cores, suas grades,
e as igrejas com os seus santos.
Interiores, mistérios, saudades.
Intensa, como o passado,
a solidão aflora — grito mudo.
Ó contida soledade,
ó lento fim de tudo.
PRAIA
Entre o fim e o começo
a distância fluindo.
Uma envolvência azul
despe movimentos
brancos e tranqüilos.
Os dedos roçam de leve
matérias que se defrontam
em silêncio.
O vento passa sem memória
e há um único horizonte
que só o tempo atravessa.
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ROCHA, Wilson. De tempo soluto. Odes l(1952-1962). Lisboa: Círculo de Poesia; Livraria Morais Editora, 1963. 31 p. 15x20 cm. “Com um retrato do autor reproduzido de uma tela de Pancetti.” “ Wilson Rocha “ Ex. bibl. Antonio Miranda
SILENTIUM
A Edna Savaget
No ar longínquo da tarde
as flores sonham solidão.
Nas fontes, modelando o tempo,
em forma cristalina
a água flui.
Como as raízes mais secretas,
ou como os peixes errantes,
as folhas e as pedras
se enchem de esquecimento.
As sombras se alimentam
de silêncio
e a distância adormece
nos caminhos.
Longe, uma luz branda
envolve alguém
que reclina sua imagem
num gesto lento.
ROCHA, Wilson. Carmina convivalia. Recife, PE: Edições Pirata, 1980 11,5x17 cm. Ilustrações de Ismael Caldas. “ Wilson Rocha “ Ex. bibl. Antonio Miranda
MEMORABIBLIA
A voz antiga de Homero celebrava
as passadas lembranças, as memórias.
Em quanta cinza triste e sombra escura
o pobre destino humano se transforma.
De quanta liquidez se formam os tempos
e de quanto esquecimento os mortos obscuros.
Nos acontecimentos de Tróia, gloriosos,
quanta destruição contida na vitória.
E o terror das armas e a miséria
das mortes militares e das glórias.
TEXTOS EN ESPAÑOL
Traducción de Ofelia Cubillán (Venezuela)
LOS ENIGMAS
a Murilo Mendes
Entre soledades y objetos,
ropas y caricias,
gotean lentos,
fluyen sordos
los enigmas.
Atraviesan
la espesura amarga
de la noche.
Penetran el cierre
frío
de las piedras.
Caen
en el seno de la tierra,
en el seno hondo
y transformador
de la tierra.
CANCIÓN DE LA NIÑA AHOGADA
En la sombra difusa
En la arena mojada
Alga o Amapola
En la playa encontrada.
En la marina quietud
En el silencio de la sirena
Yace en la playa
Perdida en la arena.
En la turbia transparencia
De alga amoratada
Solita, solita,
En la playa olvidada.
DE PROFUNDIS
Donde la arcilla
resistió a la forma,
más allá de los abismos,
extinguidos los velos,
modulando
el origen de las fuentes,
los amantes muertos
rígidos de silencio
yacen
bajo el sueño de las raíces.
Página publicada em janeiro de 2009
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