EMBARCADO EM SECO
Embarcado,
emborcado
- embarcadiço
sediço no beco -,
no muro viço,
entre muros viço.
Quando seco,
o sol ameaça
abrir-me em túnel
sem saída.
Mas a vida
- ave de aço –
vara o funil.
E continuo
contínuo barco
no verso onde zarpo
e fico ao largo
- embora seco.
PEIXE-VOADOR
Alo-me, embora em remos
de bote – meu peixe
voador. Apesar de galé
com amarras em terra,
lá vou eu, aos pulos e tombos,
aquático bailarino maluco,
subindo, caindo, subindo,
funâmbulo peixe de circo,
fugindo em vão à função.
De tanto pulo, encalho
e na areia sucumbo
entre piche e refugos.
E não existe fuga.
Apodrecidas escamas
- ainda há pouco asas –
já lixo de urubu.
Engolido, sou devolvido ao ar.
POÉTICA
Nas quatro paredes do meu quarto
crucificado no crepúsculo
em trêmulos reflexos nos muros,
o mar sorri
um sorriso enigmático e oblíquo.
O MIGRANTE
Emigrante e imigrante de mim mesmo,
sem passaporte sigo nos mares e ares.
Não me atrapalha o mundo e seus lindes,
e cruzo qualquer pátria clandestino.
Limites impressos em códigos e mapas
não são fronteiras, não, para um poeta.
Inferno é o mundo máximo. O resto,
pegadas vãs – pó e pó, barro no barro.
Vou e volto dentro do eu-planeta,
ao sopro do poema – vento no velame
do barco da carne. O corpo voa!
Não me detém o mundo: suas alfândegas,
feitas de mofo, o vento as leva
- enquanto chego e parto a qualquer hora.
SETE AUTO-RETRATOS
I
Delicadas escamas
de finíssima platina
recobrem minha guelras
roxas.
Cota de malha de lua
nesta arena rubra.
II
Cada copa de árvore
é um balão verde
na mão de um morto
menino
- menino oculto
nas raízes.
III
A nuvem é meu talismã,
minha tatuagem,
minha única ruga,
minha fotografia azul
de tuareg.
IV
De cada veia cortada
jorram rosas,
rosas brancas, azuis, amarelas, malvas
- nunca rubras.
As rosas escarlates,
essas uivam ocultas
nas vísceras...
petisco do abutre.
V
Minha elegante roupa burocrática,
meu terno
é um vil disfarce medieval
de servo.
A gravata,
fútil corda de enforcado
fauno.
VI
O turbante é real:
Príncipe do Nepal
meditando nos píncaros
do Tibé
o vazio das trombetas,
o cadáver anatômico
dos cavalos e das bailarinas
o sepulcro de seda amarela
do vale no outono.
VII
Não fosse a ração de azul
o areal seria total,
total a sede
nestas andanças
nas areias e areias
do convívio.
Meu absinto é o sol.
SONATA CREPUSCULAR SEM VENTO
Olhando-se num espelho de prata,
o vento está parado. Sua face é halo.
Seu som, hálito do silêncio.
Tudo flutua, flauta em penumbra,
alta, alada, alva garça
que volta devagar à árvore
oculta na distância e na sombra.
Bóia na água, na terra e no ar
uma vaga lembrança violácea
e áurea, lenço de adeus do sol.
Na água plácida, um barco
parece levitar, peixe num aquário.
A GRANDE LUA
A luz não se acaba. Porque a lua
antrebrilha num crepúsculo sem nexo.
Será lua ou uma flauta que imobiliza
e apascenta a luz no céu carnal?
Até as águas salgadas hipnotiza.
Não rimo sua face de sacerdotisa
com vaticínio, nem paz, nem martírio.
O luar é um estátua de hidrargírio
e tem um olho de mitológico animal.
Zarpa, nave, passa a barra!
Maldição, maldição é a amarra!
Escuto os coros sacros do crepúsculo,
e não me apraz movimentar um músculo:
tenho medo da lua e sua garra.
O MARINHEIRO
Corpo.
O corpo ignoto.
Sempre novo.
O corpo é mar.
Navegante
e cartógrafo
avanço, descubro
e tomo posse
de um corpo
em nome
do meu corpo.
Recorto as costas,
os braços, as baías,
apalpo as praias.
Tudo anseia ver
a vela.
Todo corpo é mar,
é ar, é terra.
Viaja-lo.
Marujo,
viajar o corpo
é ofício,
é recreio.
Vê-lo,
amá-lo,
mapeá-lo
- esse o roteiro.
Corpo:
terramareamr!
Visto, amado, mapeado
o corpo,
levantar âncora!
Prossigo,
perseguindo
nas ondas do corpo
outro corpo,
o corpo.
PRAIA DE BÚZIOS
Dos búzios restam fantasmas que murmuram
no marulho da orla.
Era ainda mais mansa esta praia,
suave a linha d´água
no papel branco, areia lisa.
Era limpa.
Não havia ossos de sereias.
Nem caricaturas magras de biquíni.
Foi antes dos veranistas.
Foi antes mesmo da existência das traineiras.
Nesta praia só restaram relíquias
- pó dourado que se soltou das escamas
das deusas.
Mar,
rompe os restos dos quebrados búzios!
Para que haja silêncio.
ESTATUTO
Um severo estatuto
preside esta procura:
dizer o sol e o luto
em carne e ossatura.
Poluto ou impoluto,
água do poço ou da altura,
a flor do canto não dura
sem o caroço do fruto.
O HIPOGRIFO
Este é o animal da minha sina,
mais que Pégaso minha montaria:
cascos de vento, garras de agonia.
Seu bico recurvo me examina.
Em seu dorso nada me alivia.
Do Alto sua gula me desvia.
Seu galope na terra me alucina.
Este animal é toda a minha sina.
Ele me devora, ele me recria.
ANTES DE TEMPESTADE
O mar, uma lâmina fria.
Todos o pensavam manso,
todos o pensavam frio...
O mar, lâmina dura,
de aço.
O mar, num ácido escuro
se consumia.
O POETA
Movendo-se em vida submarina,
soletrando palavras submarinas,
o poeta – esqualo e esquadro –
lúcido e feroz, busca o auto-quadro.
Sua meta é o fundo. O mundo
é a morte sob mil formas. Por isso
ele próprio se transforma, insubmisso.
Nas gestações do retrato,
nenhum trato com assombrações,
nem pacto com neblinas.
Turvo por si, o núcleo
-submarino – quer antenas, tato
concreto. Nada de penas. Peixe,
cria barbatana e um corpo em feixe.
Para o mar
não lhe servem asas de voar.
Busca o íntimo fato. O adro claro
ofusca o cego respirar. Seu templo, gruta
segregada como concha, cresce como fruta
em torno da semente do seu faro
sem ar. A superfície é um luxo
e pode ser nefasto, se o bruxo
tardar no mergulho. O repasto geral
- a beleza, o calor e a luz do natural –
assassina, indiferente, seu orgulho.
Lúcido e feroz, seu dente mina
o corpo do que existe. Dói. Insiste.
Sem loucura. Corrói e se corrói
para não ruir:
reconstruir sempre a sua procura.
CREPÚSCULO
Andorinhas viram a parda luz
pelo avesso, num giro tão veloz
que reluz na tarde, fulcro em vôo.
Álacre, seu pio. Triste, minha voz
anoitecida
- gesto mudo que eu meço e não desfiro.
Aves, minha vida se reduz...
CANÇONETA
Somos o leito de um rio,
somo o leito do Tempo.
Um oceano já fomos?
Um oceano seremos?
Depois da morte, morremos?
Ai! Prefiro não ser mar,
rolar em pedras, chorar.
PESADELO
Mugen os bois de salsugem,
fuçando um arenoso estrume.
O vento, velha cadela,
uiva na estepe amarela.
Meu grito se corta no gume
de um ávido e ácido lume.
Como terra-a-dentro: viela,
rosto de um muro sem janela.
Não há socorro neste beco.
Morro semente
em solo seco.
PAISAGEM JUNTO AO MAR
O salitre se infiltra e medra
na pedra azeda, suada, sitiada
pelo salgado pêndulo do Mar.
Este aríete nunca se esfuma.
Não o abranda nenhuma prece,
nem alvas carícias de seda.
O suor da pedra é sua messe.
Na pedra a onda nidifica,
e o dente puro da espuma
na pedra fica. O tempo
dói sem pressa: eterno rói,
dia após dia, o elemento
humano e sua inútil penedia.
Até que a roca seja só
uma praia indefesa – pó.
OFÍCIO MANUAL
Percorrer teu corpo com as mãos
como se mãos fossem pés de criança correndo na relva,
como se mãos fossem pés de lavrador percorrendo o campo.
Percorrer teu corpo
como as asas das garças percorrem o céu,
como as nadadeiras dos peixes percorrem a água.
Percorrer teu corpo
com o olhar de uma criança percorrendo um brinquedo
antes de segurá-lo,
com a risada de uma criança segurando o brinquedo.
Percorrer teu corpo
como o olhar percorre o vinho ainda na videira
e apoja de sumo nossa boca.
Percorrer teu corpo
como um pomar carregado e um jardim florido,
colhendo flores e colhendo frutos.
Percorrer teu corpo
como um rio espalhando o humo na terra.
Extraído da antologia Marinheiro no Tempo. Brasília: Thesaurus, 1986. 280 p.
Extraído de:
2011 CALENDÁRIO poetas antologia
Jaboatão dos Guararapes, PE: Editora Guararapes EGM, 2010.
Editor: Edson Guedes de Morais
/ Caixa de cartão duro com 12 conjuntos de poemas, um para cada mês do ano. Os poetas incluídos pelo mês de seu aniversário. Inclui efígie e um poema de cada poeta, escolhidos entre os clássicos e os contemporâneos do Brasil, e alguns de Portugal. Produção artesanal.
VIANNA, Fernando Mendes. Poemas do antigo Egito. Rio de Janeiro: Ministério da Educação e Cultura, Serviço de Documentação, 1965. 54 p. 14x19,5 cm.
DÍSTICO INSCRITO NUMA BACIA
LAVA teu rosto na alegria e na saúde
enquanto gozares a felicidade.
DE UM HINO A OSIRIS, DEUS DOS MORTOS
Os milhões e milhões que vêm ao mundo
acabam perto de ti.
Aqueles que ainda estão no ventre materno
já têm o rosto voltado para ti.
Ninguém permanece na terra.
Vê, todos vêm a ti:
os grandes e os pequenos te pertencem.
Os que vivem na terra, todos, se apressam em direção a ti.
Tu és seu senhor, não há outro além de ti.
Todos os que sobem ou descem a corrente da existência breve,
no dia seguinte já estão diante de ti.
O que é e o que não é caminha atrás de ti.
(Fotos de Juvenildo Barbosa Moreira)
Poetas Fernando Mendes Vianna e Antonio Miranda. (Brasilia,set. 2005) |
FERNANDO MENDES VIANNA
Traduções de Manuel Moreno Jimeno y Ricardo González Vigil.
Extraídos de Marly de Oliveira – Fernando Mendes Vianna Poemas.
Introducción de Ricardo González Vigil. Lima: Centro de Estudos Brasileños, 1979.
EMBARCADO EN SECO
Emborcado,
trastrocado
- - marinero
- - sedicioso en el encierro-,
en el muro medro,
entre muros medro.
Cuando seco,
el sol amenaza
abrirme en túnel
sin salida.
Pero la vida
- - ave de acero –
perfora el embudo.
Y continúo
continuo barco
en el verso de donde zarpo
y quedo embarcado
- aunque en seco.
PEZ VOLADOR
Hálome, aunque con remos
de bote – mi pez
volador. A pesar de galeras
con amarras en tierra,
allá voy, dando saltos y tumbos,
acuático bailarín demente,
subiendo, cayendo, subiendo
volatinero pez de circo,
huyendo en vano de la función.
De tanto salto, encallo
y en la arena sucumbo
entre brea y desechos.
Y no hay escape.
Podridas escamas
- - hasta hace poco alas –
hoy carroña para gallinazos.
Tragado, soy devuelto al aire.
POÉTICA
En las cuatro paredes de mi cuarto
crucificado en el crepúsculo
entre trémulos reflejos en los muros,
el mar sonríe
una sonrisa enigmática y oblicua.
EL MIGRANTE
Emigrante e inmigrante de mi mismo,
sin pasaporte sigo en los mares y aires.
No me detiene el mundo ni sus lindes,
y cruzo cualquier patria clandestino
Límites impresos en códigos y mapas
no son fronteras, no, para un poeta.
Interior es el mundo máximo. Lo demás,
pisadas vanas -= polvo en el polvo, barro en el barro.
Voy y vuelvo dentro del yo-planeta,
al soplo del poema – viento en el velamen
del barco de la carne. ¡El cuerpo vuela!
No me detiene el mundo: sus aduanas,
hechas de moho, el viento se las lleva
- - mientras arribo y parto a cualquier hora.
SIETE AUTORRETRATOS
I
Delicadas escamas
de finísima platina
recubren mis branquias
violetas.
Cota de malla de luna
en esta arena rubra.
II
Cada copa de árbol
es un globo verde
en la mano de un muerto
infante
- - infante oculto
en las raíces.
III
La nube es mi talismán,
mi tatuaje,
mi única arruga,
mi fotografía azul
de tuareg.
IV
De cada cortada
manan rosas,
rosas blancas, azules, amarillas, malvas
- - nunca rubras.
Las rosas escarlatas,
éstas aúllan ocultas
en las vísceras…
manjar de buitre.
V
Mi elegante ropa burocrática,
mi terno
es un vil disfraz medieval
de siervo.
La corbata,
fútil cuerda de ahorcado
fauno.
VI
El turbante es real:
Príncipe de Nepal
meditando en la cumbres
del Tibet
el vacío de las trompetas,
el cadáver anatómico
de los caballos y las bailarinas,
el sepulcro de seda amarilla
del valle en el otoño.
VII
Si no fuese la ración de azul
el arenal sería total,
total la sed
en las andanzas
entre las arenas y arenas
de la convivencia.
Mi absinto es el sol.
SONATA CREPUSCULAR SIN VIENTO
Mirándose en un espejo de plata,
el viento está parado. Su rostro es halo.
Su sonido, hálito del silencio.
Todo fluctúa, flauta en la penumbra,
alta, alada, alba garza
que vuelve lentamente al árbol
oculta en la distancia y en la sombra.
Flota en el agua, en la tierra y en el aire
un vago recuerdo violáceo
y áureo, pañuelo de adiós del sol.
En el agua plácida, un barco
parece levitar, pez en un acuario.
LA LUNA GRANDE
La luz no se acaba. Porque la luna
antebrilla en un crepúsculo sin nexo.
¿Será la luna o una flauta que inmoviliza
y apacienta la luz en el cielo carnal?
Hasta las aguas saladas hipnotiza.
No rimo su rostro de sacerdotisa
con vaticinio, ni paz, ni martirio.
El claro de luna es una estatua de hidrargirio
y tiene un ojo de animal mitológico.
¡Zarpa, nave, ingresa a altamar!
!Maldición, maldición es la amarra!
Escucho los coros sagrados del crepúsculo,
y no me place mover un músculo:
tengo miedo de la luna y de su garra.
EL MARINERO
Cuerpo.
El cuerpo ignoto.
Siempre nuevo.
El cuerpo es mar.
Navegante
y cartógrafo
avanzo, descubro
y tomo posesión
de un cuerpo
en nombre
de mi cuerpo.
Bordeo las costas,
los brazos, las bahías,
palpo las playas.
Todo ansía ver
la vela.
Todo cuerpo es mar,
es aire, es tierra.
¡Viajarlo!
Marino,
viajar el cuerpo
es oficio,
es recreo.
Verlo,
amarlo,
recorrerlo
- - ése el derrotero.
Cuerpo:
¡tierrmaryaire!
Visto, amado, recorrido
el cuerpo,
¡levar anclas!
Prosigo,
persiguiendo
en las olas del cuerpo
otro cuerpo,
el cuerpo.
Traducciones de Manuel Moreno Jimeno y Ricardo González Vigil. Extraídos de Marly de Oliveira – Fernando Mendes Vianna Poemas. Introducción de Ricardo González Vigil Lima: Centro de Estudos Brasileños, 1979.
ESTATUTO
Un severo estatuto
determina esta tienta:
decir el sol y el luto
en carne y osamenta.
Poluto o impoluto,
agua de pozo o de altura,
la flor del canto no dura
si no tiene hueso el fruto.
EL HIPOGRIFO
Este es el animal de mi insignia,
más que Pégaso, mi montería:
cascos de viento, garras de agonía.
Su pico recurvo me examina.
En su dorso nada me alivia.
De lo Alto su gula me desvía.
Su galope en la tierra me alucina.
Este animal es mi única insignia,
él me devora, él me recría.
ANTES DE LA TEMPESTAD
El mar, una lámina fría.
Todos lo creían manso,
todos lo creían frío…
El mar, lámina dura,
de acero.
El mar, en ácido oscuro
se consumía.
EL POETA
Moviéndose en vida submarina,
deletreando palabras submarinas,
el poeta – escualo y escuadra –
lúcido y feroz, busca el autocuadro.
Su meta es lo profundo. El mundo
es muerte bajo mil formas. Por eso
él propio se transforma, insurrecto.
En las gestaciones del retrato,
ningún trato con el terror,
ni pacto con neblinas.
Turbio de por sí, el núcleo
- - submarino – precisa antenas, tacto
concreto. Nada de penas. Pez
cría aletas y un cuerpo en haz.
Para el mar
no le sirven las alas de volar.
Busca el íntimo hecho. El atrio claro
ofusca el ciego respirar. Su templo, gruta
segregada cual concha, crece como la fruta
en torno a la simiente de su faro
sin aire. La superficie es un lujo
y puede ser nefasto, si el brujo
tarda en hundirse. El pasto general
- - la belleza, el calor y la luz natural –
asesina su orgullo, indiferente.
Lúcido y feroz, su diente mina
el cuerpo de lo que existe. Duele. Insiste.
Sin locura. Corroe y se corroe
para no derruirse:
reconstruir siempre su búsqueda.
CREPÚSCULO
Las golondrinas vuelven la parda luz
del revés, en un giro tan veloz
que reluce en la tarde, fulcro en vuelo.
Alacre, su piar. Triste, mi voz
anochecida:
gesto mudo que agito y me despliego.
Aves, mi vida se reduce…
CANCIONCILLA
Somos el lecho de un río,
somos el lecho del Tiempo.
¿Un océano ya fuimos?
¿Un océano seremos?
Tras de la muerte, ¿morimos?
¡Ay! Prefiero no ser el mar,
rodar en piedras, llorar.
PESADILLA
Mugen los bueyes del lodo
hozando estiércol arenoso.
El viento, vieja perra,
aulla en la amarilla estepa.
Mi grito se corta en el filo
de un ávido y ácido brillo.
Corro tierra adentro: callejón,
rostro de un muro sin balcón.
No hallo socorro en tal calleja.
Muero simiente
en tierra seca.
PAISAJE JUNTO AL MAR
El salitre se infiltra y medra
en la piedra aceda, sudada, sitiada
por el salado péndulo del Mar.
Este ariete nunca se esfuma.
No lo ablanda ninguna súplica,
ni albas caricias de seda.
El sudor de la piedra es su siega.
En la piedra la onda nidifica,
y el diente puro de la espuma
en la piedra se queda. El Tiempo
duele sin prisa: eterno róe,
día tras día, el elemento
humano y su inútil roqueda.
Hasta que la roca sea sólo
una playa indefensa: polvo.
Traducciones de Ángel Crespo. Publicadas originalmente en la Revista de Cultura Brasileña, Tomo III, número 10, octubre 1964. Madrid, Embajada del Brasil.
OFICIO MANUAL
Recorrer tu cuerpo con las manos
cual si las manos fuese pies de niño corriendo por la grama,
cual si las manos fuesen pies de labrador recorriendo el campo.
Recorrer tu cuerpo
las mismas manos con que escribo un poema,
con las mismas manos que aseguran a mi hijo.
Recorrer tu cuerpo
con las mismas manos que plantan un árbol,
con las mismas manos que acarician una bestia.
Recorrer tu cuerpo
como la lengua de la yegua lamiendo la cría,
cual la lengua del toro lamiendo la vaca.
Recorrer tu cuerpo
como las alas de las garzas recorren el cielo,
como las aletas de los peces recorren el agua.
Recorrer tu cuerpo
cual la mirada de un niño recorre un salto antes de asegurarlo,
como la risa de un niño asegurando el salto.
Recorrer tu cuerpo
como el mirar recorre el vino aún en el viñedo
e hinche de zumo nuestra boca.
Recorrer tu cuerpo
cual un pomar cargado y un jardín florido,
cogiendo flores y cogiendo frutos.
Recorrer tu cuerpo
como un río dispersando el humus en la tierra.
Traducción de Jaime Tello.
Extraído de Cuatro siglos de poesía brasileña. Caracas: Centro Abreu e Lima de Estudios Brasileños; Instituto de Altos Estudios de América Latina- Universidad Simón Bolívar, 1983.
VIANNA, Fernando Mendes
Ah!
Zaragoza, España: El último parnaso, 1998. 125 p.
(Colección El último Parnaso, 18) formato “15,3x11 cm.
“Traducción a cuatro manos de Ferndo Mendes y Ângela Ibáñez”.
Desenho e projeto gráfico de Juan Fo. Nevado y Ana Torres.
Colección dirigida por Javier Tenias y Raúl Herrero “Claudio”,
tiragem limitada e circulação dirigida. ISBN 84-95049-07-4
POÉTICA DE LO COTIDIANO
EI dibujo distraído ai telefono,
el juguete a tiza en Ia acera,
las pintadas en el muro,
el corazón a cuchillo en el árbol,
el garabateo en Ia pizarra,
el nombre en el urinário,
en el banco, en el portal de Ia iglesia,
la estrella del tatuaje marítimo,
la hembra desnuda para siempre en Ia piel,
el juego de tres en el cuaderno de Ia escuela,
(mientras el maestro perorata
como un cura en un púlpito),
las palabrotas en Ia estatua ecuestre,
Y la lápida
sin ninguna inscripción
- epitafio, nombre de família, fechas
vacío total, metáfora cabal,
mano de mármol y adiós callado
a toda y cualquier palabra
y a cualquier faro en la mar.
MI PEGASO
¡Ave, alado caballo! Penipotente Pegaso,
relincho de mito en el pentagrama.
Sea tu falus el plenipotenciário
emisario de Ia fábula dei magma.
Fecunda tu casco la tierra árida
del cuerpo sin amor, el arenal vacío
de agua, de celo, de flor.
De tu patada en la piedra
medre en el muro de miedo y asco
el canto del surtidor que canta alto
el sémen, la savia, simiente cósmica.
Y tu ala sea la brasa, la casa,
el hogar, la lumbre, el vital palco
de la losa donde posas para un nuevo salto.
CAPITAL POEMS. Brazilian poets in Portuguese English and Spanish. Brasília: Thesaurus, 1989. 38 p.
Ex. doado pelo livreiro Brito (DF).
THE NAVIGATOR
Body,
the unknown body
always new,
the body is the sea.
Navigator
and cartographer
I go ahead, I discover
and take possession
of a body
in the name
of my body.
To board the coasts,
the arms, the bays,
to palp the beaches.
The sail
wants to sail all
everybody the sea.
All bodies are sea,
are air, are land.
Lets´sail!
Sailor,
to sail the body
is a craft,
is a play.
To see it,
to love it,
to map it
— this is the way.
Body:
earthseaair!
Seen, loved, mapped
the body,
let´s weigh anchor!
I go on
chasing
in the waves of the body
another body:
the body.
FERNANDO MENDES VIANNA – A Rosa Anfractuosa. Apresentação de Anderson Braga Horta. Brasília: Thesaurus, 2004. 152 p. ISBN 85-7062-451-4.
Exemplar doado por ALEX COJORIAN.
ARTE POÉTICA
Esta minha rosa anfractuosa
— túneis e labirintos em escaninho —
é igual à minha vida — aorta-ninho
em sangue, ao sol do cimo pétrea rosa.
Tem também avenidas e caminhos
claros, álacres alamedas, passarinhos,
Em meio ao escarninho escuro, é rósea
e rubra, chega jucunda e amorosa.
Ó pedra rendilhada e tenebrosa,
delicadas e dura pétala, cristal,
pedra-flor do Saara, tão bizarra,
mais areia que flor, uma ária-garra
de condor-canário, anjo tão animal,
meu coração, meu poema e meu sósia.
TUDO
Mudo
sou tudo.
Só
mudo
não sou vão:
sou somente
do sol,
sem desconsolo
no solo
inclemente
do dolo,
no pó
do chão
e na mente
do tolo
tão só.
ADÁGIO
Não por estóico artifício
prefiro o silêncio
ao grito.
O grito é devoluto
rio.
Bem sei, mesmo o silêncio
mais secreto
pode ser também
— como o grito —
vício
do lábio precito
e poluto.
Nas velas do silêncio
— sem além nem aquém,
sem alma nem âmago,
sem amém nem luta —
mas veias do vazio
flui a seiva sábia
do aflito sem luto.
O POETA E OS ELEMENTOS
A força do fogo
— tão forte força —
não queima
a dor! (Só a dor
cauteriza a dor).
A força da água
— tão forte força —
não lava
a dor! (Só a lágrima
pode polir o agravo).
A força do ar
— tão forte força —
não areja a dor,
não ala a pedra
de Sísifo. Só o sonho
de ser livre nos orça
e salva.
A força da seiva
— tão forte força —
não corre nas veias.
Só flui nas nervuras,
só flui na minha raiz
e não cura
a cicatriz.
ROL DO CORPO
O que tem um corpo?
Tem maravilhas:
baías, ondas, praias, ilhas.
O que tem um corpo?
Um corpo é azul?
Um corpo é de tule?
Um corpo tem luz?
Espinhas, calos, cáries, pus.
Porém o corpo, como seduz!
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Página ampliada e republicada em fevereiro de 2024.
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VEJA e LEIA outros poetas do DISTRITO FEDERAL em nosso Portal:
http://www.antoniomiranda.com.br/poesia_brasis/distrito_federal/distrito_federal.html
Página ampliada e republicada em dezembro de 2021
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