CARILDA OLIVER LABRA
A premiada poeta cubana Carilda Oliver Labra morreu nesta quarta-feira (29) em sua cidade natal, Matanzas, aos 96 anos, informou a imprensa oficial de Cuba.
A autora do célebre "Me desordeno, amor, me desordeno" estava em casa e seu corpo já foi cremado, de acordo com a TV estatal cubana, que não especificou a causa da morte da escritora, considerada uma das principais vozes femininas da literatura em Cuba.
Uma cerimônia de despedida deve acontecer na tarde desta quarta.
Até os últimos dias, Carilda se manteve ativa e lúcida, promovendo eventos no antigo casarão da família, onde foi feito o seu último registro em vídeo, quando recebeu uma homenagem do governo de Matanzas pelo seu aniversário de 96 anos, no dia 6 de julho.
Advogada, professora, desenhista e escultura, ela nunca escondeu que sua verdadeira paixão era a poesia.
O segundo de seus mais de 40 livros, "Al sur de mi garganta" (1949), a colocou definitivamente no mapa literário nacional e internacional. Publicado com verba própria, em tom descontraído e muito autobiográfico, o texto deixou transparecer uma forte personalidade que depois escandalizaria a conservadora sociedade cubana da época, que a premiou com o cobiçado Prêmio Nacional de Poesia um ano mais tarde.
Em 1957, Carilda escreveu o famoso poema "Canto a Fidel" e o enviou a Sierra Maestra. Após o triunfo da Revolução, em 1959, Carilda já era uma das poetisas cubanas mais proeminentes e uma das mais transgressoras.
Em 1998, recebeu o Prêmio Nacional de Literatura, o mais importante concedido a um escritor na ilha.
Casada várias vezes – seu último marido foi o também poeta Raidel Hernández Fernández, de 46 anos – e protagonista de diversos romances, como ela mesma relatava em seus versos, Carilda rompeu com as tradições e usou a poesia para defender o erotismo, a sensualidade, a feminilidade e a liberdade de escolha da mulher.
Veja também: CANTO A MARTÍ, por CARILDA OLIVER LABRA
TEXTOS EN ESPAÑOL - TEXTOS EM PORTUGUÊS
OLIVER LABRA, Carilda. Al sur de mi garganta. 2ª. edición. La Habana, Cuba: Editorial Letras Cubanas, 1990. ISBN 959-10-0088-X Ex. Biblioteca Nacional de Brasília, doação de Aricy Curvello.
ELEGÍA PARA DECIRME
Yo le recuerdo aquí: donde me duele
el color que le trajo a mi esperanza;
y le recuerdo aquí porque soy triste
y ya no puedo echarme entre sus lágrimas.
¿Qué corazón saldría de este insomnio
si yo supiera ser una muchacha;
si no me pareciera tanto a mis ojeras
ni a esta tarde de invierno, así doblada!
Pero me acuerdo aquí de que anda lejos
el que vivió a la vuelta de mi espalda.
Me acuerdo de su nombre perezoso
que casi no quería ser palabra.
Me acuerdo de su risa mal aberta
riñéndole .por dentro a la mirada,
y de su frente que crecía;
y de su voz inútil como el alba
y de un secreto que quedó inconcluso
aquel domingo en que me amó la nada.
¿Qué corazón saldría de este insomnio
si yo supiera ser uma muchacha!
Pero me duele aquí, donde me canso,
aquel hombre agobiado por crisálidas.
Pero me duele aquí, donde soy sola,
esta verdad metida entre dos alas.
Qué corazón saldria de este insomnio...
Pero soy todo el blanco que se acaba,
y no me porto bien con la alegría
por lo que traigo al sur de mi garganta.
PRONÓSTICO DEL GRIS
Algo me está subiendo, que llora desde el fondo:
hoy necessito oír el corazón adentro
para echárselo al perro que está naciendo solo,
y salvar a la llama convicta en la ceniza
y dar a los leprosos la carne que perdieron.
Decidme si no entonces:
¿que estoy haciendo aquí, rodeada de nadie,
acorralada al fin por un humo que ascende?
Decidme:
si no traigo una sonrisa, un gesto,
algo que se me caiga en la esquina del aire
y fabrique una cruz de amor sobre los muertos
¿adónde pongo ahora mi mano enternecida?
Decidme si estoy loca,
si me enfermo de alguna cosa que no se sabe:
porque prefiero ver desdoblada una cinta;
porque después del alba siento
que se vuelve de polvo el borde de la estrela,
y voy al cementerio si uma margarita,
y me paro delante de las palomas presas.
O no me digais nada:
que ninguna palabra me puede acompanhar.
ÚLTIMA ELEGÍA
Yo podría decir que estoy em primavera
bajo um aire oloroso a luz definitiva,
y podría tapar la mirada bisiesta
que se me está cayendo afuera de la vida;
y ser de flor, de lluvia, de mariposa buena,
semejante a este cielo cuidado por la brisa,
a la ignorancia simple con que quiere mi abuela,
o a la salud del alba, que es casi campesina.
Pero me estoy llorando el corazón que llevo,
frente al hombre que tiene un poco de mi frío.
Ya no puedo dormirme con párpados violentos:
él me espera despierto en la calle del vino.
Quizás debo acordarme de este color que tengo
y debo ser más tíbia que un rincón del olvido.
Le diré blandamente con mi voz de febrero:
Enséñame una llama que se apague distinto.
Y estaremos las noches que le falten al tempo
en el lugar humilde donde se acaba un trino:
él con la frente inútil que le puso el invierno,
y yo, como un adiós sujeto en el vacío
TEXTOS EM PORTUGUÊS
ELEGIA PARA DIZER-ME
Lembro-me dele aqui: onde me dói
a cor que trouxe-me-o à minha esperança;
e lembro-me dele aqui porque estou triste
e já não posso lançar-me entre suas lágrimas.
Que coração sairia desta insônia
se soubesse ser uma adolescente;
se não me parecesse tanto às minhas orelhas,
nem a esta tarde inverno, assim arqueada!
Mas eu me lembro aqui de que anda longe
o que viveu à volta de minha espalda.
Eu me lembro de seus nome preguiçoso
que quase não queria ser uma palavra.
Eu me lembro de seu sorriso mal aberto
contendo por dentro sua mirada,
e de sua fronte que crescia;
e de sua voz inútil como a alvorada
e de um segredo que restou inconcluso
naquele domingo em que me amou o nada.
Que coração sairia desta insônia
se eu soubesse ser uma adolescente!
Mas dói-me aqui, onde eu me canso,
aquele homem agoniado por crisálidas.
Mas dói-me aqui, onde estou só,
esta verdade metida entre duas asas.
Que coração sairia desta insônia...
Mas sou todo o branco que se extingue,
e não me comporto bem com a alegria
pelo que trago ao sul de minha garganta.
PROGNÓSTICO DO CINZA
Algo me está subindo, que chora desde adentro:
hoje necessito ouvir o coração lá dentro
para atirá-lo ao cão que está nascendo só,
e salvar a chama convicta na cinza
e dar aos leprosos a carne que perderam.
Diga-me então, se não:
que estou fazendo aqui, rodeada por ninguém,
encurralada afinal por uma fumaça que ascende?
Diga-me:
se não trago um sorriso, um gesto,
algo que me caia encima na esquina do ar
e fabrique uma cruz de amor sobre os mortos
aonde ponho agora minha mão enternecida?
Diga-me se estou louca,
se me enfermo de alguma coisa que não se sabe:
porque prefiro ver uma fita ;
porque depois da alvorada sinto
que o povo regressa às margens de uma estrela,
e vou ao cemitério sem uma margarida,
e paro diante das pombas presas.
Não me digas nada:
que nenhuma palavra consegue me acompanhar.
UMA ELEGIA
Eu poderia dizer que estou em primavera,
sob um ar oloroso à luz definitiva,
e poderia tampar o olhar bissexto
que está caindo fora de minha vida;
e ser de flor, de chuva, de mariposa boa,
semelhante a este céu cuidado pela brisa,
à ignorância simples de minha avó,
ou u à saúde do amanhecer, que é quase camponesa.
Mas estou chorando o coração que tenho,
diante do homem que tem um pouco do meu frio.
Já não posso dormir com pálpebras violentas:
ele me espera acordado n rua do vinho.
Talvez devo lembrar-me desta cor que tenho
e devo ser mais tíbia que um rincão do olvido.
Dir-lhe-ei brandamente com minha voz de fevereiro:
Ensina-me uma chama que se extinga diferente.
E estaremos as noites que faltem ao tempo
no lugar humilde onde se acaba um gorjeio:
ele com a frente inútil que deu-lhe o inverno,
e eu, como um adeus sujeito no vazio.
Página publicada em abril de 2017