Cartão postal antigo; bilhete  postal – old postcard – tarjeta postalantigua –  
                            Editor/publisher M.  OROZCO, Rio de Janeiro circa 1904)  | 
                         
                     
                     
                       
                         
                    TOBIAS  BARRETO 
                      (1839-1889) 
                        
                      TOBIAS  BARRETO de Menezes  - Nascido na villa de  Campos, Sergipe, a 7 de junho de 1839 e fallecido em Pernambuco a 26 de junho  de 1889. Lente da Academia do Recife. Jurista, philosopho, critico, orador e  poeta. 
                        
                      BIBIIOG.  — Dias e Noites, publicação posthuma  dirigida por Sylvio Romero. 
                        
                    Não sei! quem é que não sabe 
                      N´uma lagrima sentida 
                      Alliviar-se da vida, 
                      Que pesa no coração! 
                      
                       
                     (Obs. Conservamos a ortografia   original, tal como aparece no cartão). 
                       
                     Este exemplar  faz parte de   uma coleção de 16 “bilhetes postais” da coleção particular de Antonio Miranda   registrada no texto  Poesia em Cartão Postal Antigo. 
                      
                      
                      
                  IGNORABIMUS 
                    
                  Quanta  illusão !... O céo mostra-se esquivo 
                  E  surdo ao brado do universo inteiro...  
                  De  duvidas crueis prisioneiro,  
                  Tomba  por térra o pensai-nento altivo. 
                    
                  Dizem  que o Christo, o filho de Deus vivo,  
                  A  quem chamam tambem Deus verdadeiro,  
                  Veio  o mundo remir do captiveiro,  
                  E  eu vejo o mundo ainda tão captivo ! 
                    
                  Se  os reis são sempre os reis, se o povo ignavo  
                  Não  deixou de provar o duro freio 
                  Da  tyrannia, e da miseria o travo, 
                    
                  Se  é sempre o mesmo engodo e falso enleio,  
                  Se  o homem chora e continua escravo,  
                  De  que foi que Jesus salvar-nos veio ?... 
                    
                   
                  
                    
                  Extraído de SONETOS BRASILEIROS Século XVII – XX. Colletanea organisada por  Laudelino Freire.  Rio de Janeiro: F.  Briguiet & Cie., 1913 
                    
                    
                    
                  O  GÊNIO DA HUMANIDADE 
                    
                  Sou eu quem assiste as lutas 
                    Que dentro d´alma se dão; 
                    Quem sonda todas as grutas 
                    Profundas do coração. 
                    Quis ver dos céus o segredo: 
                    Rebelde, sobre um rochedo 
                    Cravado, fui Prometeu. 
                    Tive sede do infinito: 
                    Gênio feliz ou maldito, 
                    A Humanidade sou eu. 
                  Ergo o braço, aceno aos ares, 
                    E o céu se azulando vai; 
                    Estendo a mão sobre os mares, 
                    E os mares, dizem: — Passai! ...” 
                    Satisfazendo ao anelo 
                    Do bom, do grande e do belo, 
                    Todas as formas tomei: 
                    Com Homero fui poeta; 
                    Com Isaías, profeta; 
                    Com Alexandre, fui rei. 
                  Ouví-me: venho de longe, 
                    Sou guerreiro e sou pastor; 
                    As minhas barbas de monge 
                    Tem seis mil anos de dor. 
                    Entrei por todas as portas 
                    Das grandes cidades mortas, 
                    Aos bafos do meu corcel. 
                    E ainda sinto os ressábios 
                    Dos beijos que dei nos lábios 
                    Da prostituta Babel. 
                  E vi Pentápolis nua, 
                    Que não corava de mim, 
                    Dizendo ao sol: — “Eu sou tua, 
                    Beija-me... queima-me assim!” 
                    E dentro havia risadas 
                    De cinco irmãs abraçadas 
                    Em voluptuoso furor... 
  Ânsias de febre e loucura, 
                    Chiando em polpas de alvura, 
                    Lábios em brasas de amor!... 
                  Travei-me em lutas imensas. 
                    Por vezes, cansado e nu, 
                    Gritei ao céu: — “Em que pensas?” 
                    Ao mar: — “De que choras tu?” 
                    Caminho... e tudo o que faço 
                    Derramo sobre o regaço 
                    Da história, que é minha irmã. 
                    Chamam-me Byron ou Goethe, 
                    Na fronte do meu ginete 
                    Brilha a estrela da manhã. 
                  E no meu canto solene 
                    Vibra a ira do Senhor. 
                    Na vida, nesse perene 
                    Crepúsculo interior, 
                    O ímpio diz: — “Anoitece!” 
                    O justo diz: — “Amanhece!” 
                    Vão ambos na sua fé... 
                    E às tempestades que abalam 
                    As crenças d´alma, que estalam, 
                    Só eu resisto de pé!... 
                  De Deus ao sutil ouvido 
                    Eu sou como que um tropel, 
                    E a natureza um ruído 
                    Das abelhas com seu mel, 
                    Das flores com seu orvalho, 
                    Dos moços com seu trabalho 
                    De santa e nobre ambição, 
                    De pensamentos que voam, 
                    De gritos d´alma que ecoam 
                    No fundo do coração!... 
                    
                  1866 
                    
                  De: Dias e Noites. Rio de Janeiro: Industrial — Editora, 1881. 
                   
                   
                    
                  MARIA 
                    
                  Nome que as almas sacia, 
                    Que adoça os lábios da flor, 
                    Mística, eterna harmonia 
                    Dos querubins do Senhor... 
                  Grande, profundo mistério 
                    Das crenças da nova lei; 
                    Visão que ao som do saltério 
                    Cantava o profeta rei... 
                  Aroma que o céu aberto 
                    Por toda parte expandiu; 
                    Voz de Deus, que perto, perto, 
                    Miquéias de longe ouviu. 
                  Inspiração de Isaías, 
                    Que disse a Jerusalém: 
  — Levanta-te, as melodias 
                    Dos anjos caindo veem... 
                  De tudo nada existia, 
                    O caos ponderava a sós; 
                    E disse Deus: — Ó Maria! 
                    E tudo ouviu esta voz. 
                    
                  1863 
                    
                    
                  O  CORAÇÃO 
                     
                    O coração também é  um metafísico: 
                      Estremece por formas invisíveis, 
                      Anda a sonha uns mundos encantados, 
                      E a querer umas coisas impossíveis... 
                    
                  1884 
                   
                   
                  De: Dias e Noites. Rio de Janeiro: Industrial — Editora, 1881. 
                    
                    
  
                    
                  
                  [ BARRETO,  Tobias ]  Dias e noites.  Rio de Janeiro: Edição do Governo do Estado  de Sergipe, 1925.   312  p. (Obras Completas I Poesias)  Impresso no Rio de Janeiro na Officina  gráphica de Paulo, Pongetti &Cia. Onde aparece como Tobias Barretto.    18x25,5 cm.   Ex. bibl. Antonio Miranda 
                    
                    
                  XXXIV 
                    
                  A ESCRAVIDÃO 
                    
                  Se Deus   é quem deixa o mundo 
                    Sob o peso que o opprime, 
                    Se elle consente este crime, 
                    Que se chama a escravidão, 
                   
                    Para fazer homens livres, 
                    Para arracal-os de abysmo, 
                    Existe um patriotismo 
                    Maior que a religião. 
                    
                  Se não lhe importa o escravo 
                    Que a seus pés queixas deponha, 
                    Cobrindo assim de vergonha 
                    A face dos anjos seus, 
                   
                    Em seu delírio inefável, 
                    Praticando a caridade, 
                    Nesta hora a mocidade 
                    Corrige o erro de Deus!... 
                    
                  (1868) 
                    
                    
                    
                  XXXIII 
                    
                  A'... 
                    
                  Do beijo que tu me deste, 
                    Primeiro beijo de amor, 
                    Toda tremula e convulsa, 
                    Cheio de mimo e candor, 
                    
                  Nasceu esta f'licidade 
                    Que me enleva e me extasia, 
                    Que outr'ora de longe em longe, 
                    Sómente em sonhoseu via... 
                    
                  O orvalho do céo cahido 
                    Em floreo seio acha abrigo; 
                    Minh'alma dorme na concha 
                    Cheirosa de teu embigo... 
                    
                  (1884) 
                   
                   
                   
                   
                  
                    Desanimo  
                   
                                                   Em nossa época abatida,  exhausta, 
                            Pobre  de sonhos, época de prosa, 
                            De  pedra e ferro, em que ninguem mais fala 
                            Nos  risos d´alva, no frescor da rosa; 
                          Nesta phase do seculo, em que as artes 
          Já  não servem de norma ou de medida 
          Para  tomar as dimensões de um povo, 
          E  calcular-lhe os impetos da vida; 
                          Morta no céo a luz da poesia, 
          Morta  no peito a flor do sentimento, 
          Não  se toleram mais idolatrias, 
          Nem  mesmo a idolatria do talento... 
                          Faz medo vir ainda em horas doces 
          Sentar-se  a sós á borda do oceano, 
          E  ante o golfão da immensidade 
          Pensar  no abysmo do destino humano. 
                          Faz medo  assim tambem perante o merito 
          Vir  curvar-se contricto e reverante, 
          Porque  aqui, como alli, vem espreitar-nos 
          A  risada da critica descrente... 
                          Não importa.  No altar d´alma escondido, 
          Que  os interesses deixam impolúto, 
          Pela  mão da justiça conduzido, 
          Vento  humilde pagar-te o meu tributo. 
                          Um tributo ao artista, que na gruta 
          Santa,  harmoniosa de seu peito encobre 
          Todo  o thesouro de um caracter firme, 
          De  um grande coração, de uma alma nobre. 
                          Tu vaes partir; que o nume que te  inspira, 
          Sob  as azas da gloria dê-te abrigo! 
          Tu,  que, além d´arte do cantar esplendido, 
          Sabes  a arte tambem de ser amigo... 
                          (1884) 
                             
                          
                   
                          Guerra  do Paraguay  
                    
                          SE nós insultados fomos, 
          Agora  que o norte vae, 
          Há  de sentir o que somos 
          A  gente do Paraguay. 
          Se  nessa guerra em que entramos 
          Pelo  direito luctamos 
          Por  ser o nosso ideal, 
          No  coração de Solano 
          O  sabre pernambucano 
          Vae mostrar p´ra quanto val. 
                          Um dias  foste o verdugo 
          Que  o teu sólo viu nascer, 
          Julgando  facil ao jugo 
          Dominar-nos  e vencer; 
          Um  dia, ateiando a guerra, 
          Pisaste  a brasilea terra, 
          Calcando  o nosso pendão... 
          Mas  n´hora amarga que passa, 
          Has  de ver a nossa raça 
          Reagir  de armas na mão. 
                          Patrícios! O drama é sério!... 
          Junto  ao throno erguei! 
          Nós  mesmos somos o império! 
          Nós  mesmos somos o rei! 
          Não  pensemos no monarca! 
          Um  homem que os passos marca, 
          Vale  o povo varonil, 
          Pois  agora, o insulto feito, 
          Vae  se ver que em nosso peito 
          Vibra  a honra do Brasil. 
                   
                     
                     BARRETTO, Tobias. Obras Completas I. POESIAS. Dias e  Noites.  [Aracaju;:  Edição do Estado de Sergipe - ECE, 1925.   212 p. 16,5x23,5 cm.  Obra  composta e impressa pela Empreza Graphica Editora de Paulo, Pongetti & C.,  no Rio de Janeiro.   
                    
                    
                           Desanimo  
           
          Em nossa época abatida,  exhausta, 
          Pobre  de sonhos, época de prosa, 
          De  pedra e ferro, em que ninguem mais fala 
          Nos  risos d´alva, no frescor da rosa; 
                          Nesta phase do seculo, em que as artes 
          Já  não servem de norma ou de medida 
          Para  tomar as dimensões de um povo, 
          E  calcular-lhe os impetos da vida; 
                          Morta no céo a luz da poesia, 
          Morta  no peito a flor do sentimento, 
          Não  se toleram mais idolatrias, 
          Nem  mesmo a idolatria do talento... 
                          Faz medo vir ainda em horas doces 
          Sentar-se  a sós á borda do oceano, 
          E  ante o golfão da immensidade 
          Pensar  no abysmo do destino humano. 
                          Faz medo  assim tambem perante o merito 
          Vir  curvar-se contricto e reverante, 
          Porque  aqui, como alli, vem espreitar-nos 
          A  risada da critica descrente... 
                          Não importa.  No altar d´alma escondido, 
          Que  os interesses deixam impolúto, 
          Pela  mão da justiça conduzido, 
          Vento  humilde pagar-te o meu tributo. 
                          Um tributo ao artista, que na gruta 
          Santa,  harmoniosa de seu peito encobre 
          Todo  o thesouro de um caracter firme, 
          De  um grande coração, de uma alma nobre. 
                          Tu vaes partir; que o nume que te  inspira, 
          Sob  as azas da gloria dê-te abrigo! 
          Tu,  que, além d´arte do cantar esplendido, 
          Sabes  a arte tambem de ser amigo... 
                    
                          (1884) 
                   
                             
                          A  Escravidão 
                    
                          SE Deus é quem deixa o mundo 
          Sob  o peso que o oprime, 
          Se  ella consente esse crime, 
          Que  se chama a escravidão, 
          Para  fazer homens livres, 
          Para  arrancal-os do abysmo, 
          Existe  um patriotismo  
          Maior  que a religião. 
                          Se não lhe  importa o escravo 
          Que  a seus pés queixas deponha, 
          Cobrindo  assim de vergonha 
          A  face dos anjos seus, 
          Em  seu delírio inefável, 
          Praticando  a caridade, 
          Nesta  hora a mocidade 
          Corrige  o erro de Deus!... 
                    
                            
                          Guerra  do Paraguay  
                    
                          SE nós insultados fomos, 
          Agora  que o norte vae, 
          Há  de sentir o que somos 
          A  gente do Paraguay. 
          Se  nessa guerra em que entramos 
          Pelo  direito luctamos 
          Por  ser o nosso ideal, 
          No  coração de Solano 
          O  sabre pernambucano 
          Vae mostrar p´ra quanto val. 
                          Um dias  foste o verdugo 
          Que  o teu sólo viu nascer, 
          Julgando  facil ao jugo 
          Dominar-nos  e vencer; 
          Um  dia, ateiando a guerra, 
          Pisaste  a brasilea terra, 
          Calcando  o nosso pendão... 
          Mas  n´hora amarga que passa, 
          Has  de ver a nossa raça 
          Reagir  de armas na mão. 
                          Patrícios! O drama é sério!... 
          Junto  ao throno erguei! 
          Nós  mesmos somos o império! 
          Nós  mesmos somos o rei! 
          Não  pensemos no monarca! 
          Um  homem que os passos marca, 
          Vale  o povo varonil, 
          Pois  agora, o insulto feito, 
          Vae  se ver que em nosso peito 
          Vibra  a honra do Brasil. 
   
    
                  
                   
                  HADAD, Jamil Almansur, org.   História poética do Brasil. Seleção  e introdução de  Jamil Almansur Hadad.  Linóleos de Livrio Abramo, Manuel Martins e  Claudio         Abramo.  São Paulo: Editorial Letras Brasileiras Ltda,  1943.  443 p. ilus. p&b  “História do Brasil narrada pelos poetas.   
                  HISTORIA DO BRASIL – POEMAS  
                    
                  SEGUNDO REINADO 
                    
                  GUERRA  CONTRA ROSAS 
                    
                  CAPITULAÇÃO DE MONTEVIDEU 
                    
                  Juntemos  as almas gratas 
                    De colegas e de irmãos; 
                    O vento que acorda as matas 
                    Nos toma os livros das mãos; 
                    AD vida é uma leitura, 
                    E quando a espada fulgura, 
                    Quando se sente bater 
                    No peito heroica pancada 
                    Deixa-se a folha dobrada 
                    Enquanto se vai morrer... 
   
                    Não permitamos que falem 
                    Campas ilustres por nós; 
                    São grande, mas já não valem 
                    Fantasmas, sombras de avós. 
                    Se vós cobria de flagícios, 
                    Ociosos, nobres, patrícios, 
                    Diz Mario, se nada obrais, 
                    Que importam avoengos brios, 
                    Caducos, mansos e frios, 
                    Raios que não prestam mais? 
   
                    Que leio em vossa alma inquieta? 
                    Queda de Montevideu: 
                    Tombaste, diz o profeta, 
                    E o raio agita a coma, 
                    Irrita-se um pouco e toma 
                    O peso do Paraguai; 
                    Dá de escarnio uma risada, 
                    Cerra o punho e a sua espada 
                    Desembainha-se e vai... 
   
                    Já das vítrias que correm 
                    Nitrem os rubros corcéis, 
                    Os fortes avançam, morrem; 
                    Erguem-se espectros cruéis! 
                    Levam dos gládios terríveis, 
                    Rúbidos, quentes, flexíveis, 
                    Como línguas de leões; 
                    Gritam, a morte se assusta, 
                    Voa tonta e barafusta 
                    Nas asas dos pavilhões!  
   
                    E tinem os músculos de aço 
                    Do brasileiro valor; 
                    O Herói alevanta o braço, 
                    Clamando: esperai, Senhor! 
                    Tudo nosso, nada alheio!... 
                    A sorte vã neste meio 
                    Não ponha o seu pé fatal: 
                    Tendo os auxílios divinos, 
                    Chamar-nos-ão de mofinos!... 
                    Senhor, sêde imparcial! 
   
                    Bem como os rios valentes, 
                    Que arrojam-se além da foz, 
                    Distintos, independentes 
                    Das água do mar feroz, 
                    Desses que a pátria defendem, 
                    E os sacrifícios se rendem, 
                  Guardando  os direitos seus, 
                    O vulto impetuoso e forte 
                    Avista-se além da morte, 
                    Não se confunde com Deus... 
   
                    Esses, que alargam os peitos 
                    E as mãos para sustentar 
                    Vastos planos, altos feitos, 
                    E a fama enorme empolgar, 
                    Da altura precipitados, 
                    Rolam nos céus abraçados 
                    Com suas grandes ações, 
                    Deixando impressos os dedos 
                    Nos poemas, nos rochedos, 
                    Nos bronzes, nos corações! 
                    
                         (DIAS  E NOITES — Imprensa Industrial 
                    Editora  – Rio de Janeiro, 1881) 
                  * 
                    
                  Página  ampliada em outubro de 2021 
                   
   
  
                  Página publicada em junho de 2009; ampliada em maio de 2017.                      |