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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 
 

ENTREVISTA COM ANTONIO MIRANDA 

 

por ANA PAULA ARENDT
 

Arendt. Querido Poeta, é uma satisfação imensa homenageá-lo nesta segunda edição da Revista Itapuan e dar a conhecer ao público francófono a sua inestimável contribuição à poesia brasileira e ibero-americana. Começo perguntando sobre como foi sua infância e como e quando você descobriu seu gosto pela poesia e pelo Teatro.
 

Antonio Miranda.

Eu nasci no Maranhão e meu pai "tomou um Ita no Norte e veio pro Rio morar", em 1949. A viagem foi longa, com estadas nos portos e caminhadas por Fortaleza e Recife, e aquele mar inteiro, todo o tempo... Eu já estava inclinado para a poesia, desde as primeiras leituras na escola, incluindo os versos da Canção do Exílio — "Minha terra tem palmeiras onde canta o sabiá",  de Gonçalves Dias.  Rabisquei alguns versos e afirmei minha vocação, desde os nove anos de idade...
 

Arendt. Antonio, você me contou de suas peripécias na Venezuela, na década de 1960, muito superficialmente. Em primeiro lugar, porque escolheu exilar-se naquele país? E o que levou a antecipar uma visão que culminou no ano seguinte com os anos de chumbo do AI-5?
 

Antonio Miranda

Eu fui para a Venezuela em 1966, fugindo da ditadura militar, com medo de reações por meus poemas de "protesto", alguns escritos e publicados em revista da esquerda argentina, durante o período em que vivi em Buenos Aires, graças a um prêmio de viagem que ganhara em concurso promovido pela Embaixada argentina e o Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, no ano de 1962. Em 1966 eu era estudante nos porões da Biblioteca Nacional do Rio e li que a embaixada venezuelana estava oferecendo bolsas de estudos. Comentei com a minha mãe, alegando que eu já dominava um pouco a língua castelhana, que tinha muitos poemas na língua cervantina... Ela ironizou dizendo que eu sonhava demais... Tomei um ônibus e desci na Avenida Rio Branco e no caminho para a BN uma pessoa me perguntou, em espanhol,  onde era a casa de câmbio mais próxima. E disse: "Venga comigo, es más adelante..." Depois ele quis ir comigo até a Biblioteca Nacional e foi conversar com o diretor da instituição; eu fui para a sala de aula. Pouco depois fui chamado... Ele me ofereceu uma bolsa de estudos para a Universidad Central de Venezuela (UCV).  Tratava-se nada mais do que o Decano da Faculdade Humanidades....
 

Arendt. E o passaporte venezuelano? Você foi tão celebrado e bem-recebido que me contou ter ganhado direitos de cidadania venezuelana. Conte-me como você formou o grupo Rajatabla, quais foram os primeiros países que acolheram a peça "Tu País está feliz" e como foi a recepção do público. Por que apenas em 1979 foi publicado esse livro no Brasil, e como obteve esse êxito? Como era a coreografia?
 

Antonio Miranda.

Devemos recordar a insurreição da juventude em todo o mundo em 1968. Eu acompanhava e lia Herbert Marcuse sobre aquela rebeldia...Naquele clima eu escrevi os poemas de Tu País está Feliz, e  publicamos uma edição mimeografada dos textos e até organizamos um festival de música e poesia de protesto na UCV. Em 1969. Disseram que o público iria me vaiar por causa da ironia do poema... Pelo contrário, foi uma aclamação e fomos convidados para repetir a leitura em Mérida. Daí partimos para a montagem da peça no Ateneo de Caracas, em fevereiro de 1970, com músicas de Xulio Formoso e direção teatral de Carlos Giménez, início do Grupo Rajatabla... A  proposta era de montar um espetáculo "poético-musical" dramático. Dois diretores locais recusaram participar, alegando que a reação com poesia não funcionaria... Mas o argentino Carlos Giménez, um gênio, achou viável e fez uma montagem considerada transformadora e até revolucionária ... O espetáculo percorreu muitas cidades venezuelanas, foi aclamado em quase vinte países da região e até na Europa e ganhamos os festivais de teatro de Manizales (Colômbia) e de Puerto Rico. Eu não podia usar o passaporte brasileiro para ir a San Juan receber o prêmio... A embaixada dos Estados Unidos queria que eu fosse ao Rio de Janeiro solicitar o visto diplomático... Mas uma amiga conseguiu que o governo da Venezuela me outorgasse um passaporte diplomático venezuelano provisório para representar o país na cerimônia... Existem muitas versões e remontagens, inclusive no Peru — com o grupo Cuatro Tablas —, com discos gravados e edições impressas dos poemas...(Uma delas pode ser acessada pelo Youtube: https://www.youtube.com/watch?time_continue=3&v=-_X_Zy_-Ors

No Brasil era impossível a montagem naquele momento... Até tentamos... Só foi possível publicar o livro no final da década de 70, depois de seis edições venezuelanas... Uma versão teatral brasileira foi feita por crianças, mais recentemente. Achei ousado montar um texto tão controvertido com crianças, mas funcionou!!! (Ver: https://www.youtube.com)
 

Arendt.  Essa peça é uma coleção de canções poéticas cheias das mais lindas assertivas. Quem canta é você ou é o ser humano? Você busca alcançar o outro nos seus apelos e descrições. Por que você se importa com o outro, Antonio, quando tantos poetas tomados como exemplos inspiradores se encerraram em si mesmos? Como lhe tocou ser um poeta que busca demonstrar que o outro é digno de ser buscado, que experiências revestiram essa tarefa e responsabilidade de sua devida importância? Qual seu trecho favorito de Tu País está feliz?
 

Antonio Miranda.

Eu sou o outro, sendo eu mesmo...Eu me ouço quando escrevo, tento viver nesta outridade...
 

Arendt. Você conta que tentaram te enjaular e te padronizar, Antonio. Você não reagiu passivamente. Assim nos contam os versos "Para que o riso seja um libelo. /Para que o aplauso seja um rechaço. /Para que o silêncio não seja indiferença »... Veio então a liberdade. Foi a poesia que nos trouxe a um horizonte sem moldes? Soubemos aproveitar a liberdade? Pode a poesia dar lições à política, quando a política tenta dar lições à poesia?

Antonio Miranda.

A poesia é uma forma de liberdade, para quem não se escraviza às suas formas fossilizadas... É possível experimentar tudo, e até inovar... No século 21 experimentamos uma etapa criativa sem "ismos", híbrida, valendo-se de combinação com outras artes e ciências... E até a animaverbivocovisualidade... ânima no sentido de poiesis e de movimento... combinando com teatro, música, pintura, performances, multiculturalmente, e até coletivamente... Poesia hipertextual, visual, holográfica, ou até experimentar formais textuais de forma indutiva, pedagógica, política, sem cair na mesmice, na imitação, no dogmatismo e no preconceito...
 

Arendt. Algumas pessoas falam que hoje temos uma onda conservadora no Brasil e no mundo. O Fernando Pessoa, arriscando um pouco de filosofia escolar, dizia que "os conservadores são aqueles que desejam e pretendem que o progresso político ou financeiro da nação se faça por alteração social produzida dentro de moldes políticos e sociais dessa nação". Ele arrisca também que os "os reaccionários pretendem estupidamente conservar não só todos os moldes sociais e instituídos, mas a vida social inalterável sempre nesses moldes; os radicais devotam idiotamente um desprezo completo desses moldes na sua noção de progresso". A seu ver há hoje extremos na política que extrapolaram para a sociedade, para a forma como as pessoas se relacionam umas com as outras? Como fica a poesia meio a uníssonos sobre o que é belo e sobre o que é bom?

Antonio Miranda.

Minha juventude foi marcada por tais questionamentos, em certo sentido, intransponíveis... "Duas forças te pressionam /dois mundos te dividem / duas vozes te encurralaram / e tu te negas / tu te omites / os problemas deste mundo não são teus."  / "Tu não protestas ou não podes." (...) A poesia ainda é uma das dimensões para aproximar estes extremos fora dos convencionalismos, mas considerando as interpretações nos moldes de Popper, das "conjecturas e refutações". Ainda bem que não aceitamos as verdades absolutas, mas queremos um diálogo construtivo, criativo — poiesis—  transcendente. Respondo com esta letra de uma canção que trabalhamos com Xulio Formoso para "Tu país está feliz" (https://www.youtube.com)

CONDICIONADOS: Condicionados / dirigidos / manipulados / conduzidos / como rebanhos dormidos /como roscas, pregos, rochas / ajustados / pressionados / divididos / numa ordem que há muito tempo / não tem mais sentido. (bis) // Vamos indiferentes caminhando / vamos calados aguentando / vamos e vamos e vamos / e vamos ficando / golpeados / preteridos / enganados / conformados / E nos vamos consumindo / e nos vamos enganando / apodrecendo e sonhando /resignados / condicionados / dirigidos / perdidos / alienados. // E vamos e vamos / e vamos trabalhando / e vamos e vamos / avaros consumindo / e vamos e vamos /  e vamos e vamos / ficando /  ficando  / ficando  / ficando / ficando.
 

Arendt. Lembra quando participamos daquele Encontro de 5 poetas em uma não-esquina de Brasília na Biblioteca Nacional? Foi um momento tenso em Brasília. E estávamos fazendo e gravando poesia. A poesia tem uma função social, ainda que não se defina por essa função? Ela é uma necessidade

Antonio Miranda. 

Foi um esforço extraordinário, que certamente impactou positivamente o público que frequentava a BNB quando eu ainda era o diretor. E depois eu publiquei no nosso Portal, para o público que ainda estiver interessado naquela memorável experiência.
www.antoniomiranda.com.br

 

Arendt. Não quero pensar nas possibilidades tristes do futuro. Mas como ficaremos sem você, daqui uns 50 anos? Como iremos encontrar os poetas e as novas gerações de poetas no mundo ibero-americano? Você treinou um substituto? Eu queria que um poeta brasileiro [reservadamente: Daniel Guilarducci], que também é bibliotecário, se envolvesse mais no seu trabalho, mas estou há mais de 6 meses cobrando dele que escrevesse um artigo a seu respeito e nada ainda. Depois do lançamento do livro dele, mais recente, deu a notícia de que estava em depressão e em licença médica. Faz parte da vida poética, suponho. Mas há uma equipe em uma Universidade para administrar seu legado e sua memória, com alguém de back-up, Antonio, para você seguir vivo pra sempre? Falo sério. O poder público já designou alguém que ame você e seu trabalho, como nós todos, para lhe acompanhar permanentemente, para apoiar Elmira e Juvenildo concretamente? Como as pessoas apaixonadas por poesia podem contribuir e estar mais próximas de você?
 

Antonio Miranda.

Não me preocupo muito com o reconhecimento... Nosso portal  — www.antoniomiranda.com.br — está há quinze divulgando a poesia ibero-americana e portuguesa de Portugal e África e os grandes poetas da humanidade... São mais de 5.000 autores /*em 2027, quando esta entrevista aconteceu; em dezembro de 2020 já ultrapassamos 7.300 poetas.../, em português, espanhol e em outras línguas, além de música, vídeos, entrevistas, ensaios, e-books... Trabalho mais traduzindo e divulgando outros poetas de minha admiração, de todos os estilos. Eu já publiquei mais de 40 títulos com meus poemas. Já defenderam várias dissertações, teses acadêmicas e estudos em revistas físicas e digitais. E viajo muito para participar em festivais, seminários e debates, a maioria em dezenas de países estrangeiros por causa da presença do Portal... Que fazer com o repositório? Ele já está integralmente incorporado ao Google. Quando alguém abre a página para fazer uma consulta, em poucos segundos aparece uma linha em branco para pesquisa no Google apenas no Portal... E está também no WHO´S AMUNG.US que informa o que estão pesquisando, por quanto tempo, de que cidade e país e produz mapas das visitas, e até informa se está usando computador fixo ou celular... E tenho muitos colaboradores que enviam material pronto para publicação, tradução... Eu pensei em deixar tudo para a biblioteca digital da Biblioteca Nacional de Brasília mas até hoje este projeto não se consolidou.
 

Arendt. Antonio, me fale de seus novos projetos. Da sua poesia filosófica, da sua filosofia poética. Como você próprio vê a sua veia e a sua verve? Quantos pseudônimos você tem?

Estou trabalhando em vários projetos... Um deles é a produção de "Tercetos filosóficos, poéticos e científicos... Haicais e tercetos."  Eu faço intertextualização dos filósofos, poetas e cientistas de minha preferência: Nietzsche, Foucault, os pré-socráticos, Heidegger, Kant, Kaváfis, etc. Transformo um parágrafo inteiro em um terceto... Coautoria... e também invento. Já compus centenas e parece uma tarefa interminável, mas não impossível. Tenho dois heterônimos: Da Nirham Eros, desde o final da década de 60 do século passado, a partir de minhas experimentações verbivocovisuais; e o Barão de Pindaré Júnior, para difundir poesia mais sarcástica, humorística, e até de crítica social mais exacerbada. Todos têm página próprias em nosso Portal...
 

Antonio Miranda.
 

Arendt. Bom, esta é apenas mais uma homenagem dentre tantas, Antonio. Mas o que mais você gostaria de falar sobre poesia, sobre teatro, sobre suas fases, sobre sua vida dedicada a esse ofício, sobre a sua identidade, sobre o que ganhou com isso, o que perdeu com isso...? Qual é o seu balanço até o momento.

Antonio Miranda.

Nunca me considero realizado. Mas também não costumo refazer o que escrevo... Cada fase tem seu momento e razão de ser. Eu sou um leitor que me vejo em outras dimensões, com muita autocrítica, sempre insatisfeito. Não faço planos... Como Picasso respondeu sobre a própria criatividade, "eu não busco, eu encontro"... o tempo todo, superando-me.
 

Arendt. E o cinema? Vamos filmar Exosfera? Quais versos seus você escolheria para ler num curta-metragem sobre poesia.

Antonio Miranda.

Estou sempre à disposição. Por certo, estão fazendo um filme sobre a minha trajetória de vida na arte e na literatura, com recursos do governo de Goiás. E acabam de me enviar um canção composta pelo poeta e músico Rubenio Marcelo, com a letra de meu poema "Amanhã", já disponível no Youtube: https://www.youtube.com/watch?v=LM2r28Hw6qY  

 

AMANHÃ

 

Qual o significado de

amanhã?

ave malsã?

borborema,

maracanã?

 

Quem sabe o tempo

estanca

estica

e fica como está

agora e já!

 

Afinal,

por que final?

 

Por que amanhã

se é sempre hoje

se é sempre um dia

e outro dia

e nada mais.

 

Amanhã é jamais!

 

E mais e mais!

 

(MIRANDA, 2004) p. 94-5)

 

Arendt. E qual sua mensagem para os poetas que estão surgindo e começando uma vida de dedicação à poesia agora. Onde buscar inspiração, quando falte?  

Antonio Miranda.

Estamos no século 21, na era da hipermodernidade, além dos "ismos" que nos isolavam em grupos de confronto... Agora experimentamos todo tipo de mestiçagem na criação artística, a hibridização de todos os recursos, que eu intitulo de Av3. A "animaverbivocovisualidade", entendendo ânima no sentido de alma (criatividade) e animação tecnológica. Numa dimensão arte-ciência, ou seja, combinando o hipertextual com a performance... E até em forma coletiva! Acabo de publicar um livro sobre o tema, resgatando as propostas das vanguardas e as possibilidades da inteligência artificial... Está disponível na web:

www.amazon.com 

 

Arendt. Muito obrigada, Antonio, pelo privilégio de entrevistá-lo.

Brasília, 2017


 

 

 
 
 
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