Coordination de ARICY CURVELLO
MARIA DE LOURDES HORTAS
Nasceu em Portugal (São Vicente da Beira) e vive no Brasil, em Recife, desde 1930. Publicou os livros de poesia AROMAS DA INFÂNCIA (Lisboa, 1965), FIO DE LÃ (Recife, 1979), GIESTAS (Recife, 1980) e FLAUTA E GESTO (Recife, 1983).
SILÍCIOS DO SILÊNCIO
Engrenagens de existir
gestos que são ruídos
estiletes a arranhar por dentro
quem afina as cordas dos sentidos
violinos da solidão:
copo que se pousa
torneira que se abre
fósforo que se risca
pancadas que batem, secas
no poço vazio da noite
e ficam a vibrar nos tímpanos das paredes.
Também os passos
pé ante pé
no chão de alguém sozinho
abrem sulcos nos caminhos da casa
como se arassem campos.
Silentes silícios do silêncio
chicotadas
sons que ecoam e pairam
como se à noite um remo as águas
de escuro rio cortasse...
SILICIUM DU SILENCE
Engrenages de l´existence
gestes telles de rumeurs
que des stylets tranchent en dedans
qu`affinent les cordes sensibles
violons de la solitude.
Tasse que l`on pose
robinet qui s´ouvre
phoshore que s´élimine,
coups frappant, secs, dans un puits
de la nuit et réussissant à vibrer
dans les tympans des murs.
Aussi les démarches, à pas le loup,
dans l´espace de quelque esseulé,
ouvrent des sillons dans les chemins de la maison
comme se labourent les champs.
Silencieux silicium du silence
fouettant les sons qui résonnent et planent
comme si à la nuit une rame
fendait les eaux d´un rivière obscur.
[ Tradução ao Francês por Jean-Paul Mestas. Publicado na revista francesa LIEUX D`ÊTRE, número 14 - Hiver 1992/1993
Sede social: 17 rue de Paris- 59700 Marcq en Barouel ]
SAVARY, Olga, org. Carne viva. 1ª antologia brasileira de poemas eróticos. Rio de Janeiro: Editora Anima, 1984, 348 p. 14x21 cm. Capa: ilustração de Sérgio Ferro. Inclui 77 poetas ativos no final do século 20. Ex. bibl. Antonio Miranda
Sussurros
I
O orvalho desta rosa
encarnada
que sou
quando me desfolhas
e enlangueces
é a única certeza
que te dou
do prazer
que em mim teces.
II
Se estou morta quando me lavas, fonte,
a morte sempre em vida me converte:
é a minha alma que se põe de joelhos
quando em silêncio o teu corpo a veste.
III
Aurora só me acontece
quando ao acordar contigo
seja sábado ou segunda
sempre há lua e é domingo.
Áurea hora que se tece
quando ao acordar contigo
o levante se entumesce
e põe meu corpo fremente
igual a um campo de trigo.
REVISTA DE POESIA E CRÍTICA Ano XVIII No. 18 Brasília – São Paulo – Recife — 1994.
Ex. doação do livreiro Brito – DF
EPÍLOGO
Que haverá de urgente
diante do repouso
destas muralhas em ruínas
séculos e séculos
de silêncio indiferente
sobre a certeza do pó
de vidas
que pisamos?
*
Página atualizada e republicada em fevereiro de 2023
Página ampliada e republicada em junho de 2020
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