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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 
POESIA MUNDIAL EM PORTUGUÊS

 

(Image: Rex Features)

 

TED HUGHES

 

 

Edward James Hughes, mais conhecido como Ted Hughes (West Yorkshire, 17 de agosto de 1930 - Londres, 28 de outubro de 1998) foi um poeta e escritor de livros infantis britânico, comummente considerado pela crítica como um dos melhores poetas de sua geração. Foi casado e teve dois filhos com a romancista e poetisa Sylvia Plath.

 

 

 

POESIA SEMPRE  - Ano 6 – Número 9  - Rio de Janeiro - Março 1998. Fundação BIBLIOTECA NACIONAL – Departamento Nacional do Livro -  Ministério da Cultura.  Editor Geral: Antonio Carlos Secchin.  Ex. bibl. Antonio Miranda

 

 

 

The Thought-fox

 

I imagine this midnight moment’s forest:

Something else is alive

Beside the clock’s loneliness

And this blank page where my fingers move.

 

Through the window I see no star:
         Something more near
         Though deeper within darkness
         Is entering the loneliness:

 

Cold, delicately as the dark snow,

A fox’s nose touches twig, leaf;

Two eyes serve a movement, that now
         And again now, and now, and now

 

Sets neat prints into the snow
         Between trees, and warily a lame
         Shadow lags by stump and in hollow
         Of a body that is bold to come

 

Across clearings, an eye,

A widening deepening greenness
         Brilliantly, concentratedly,

Coming about its own business

Till, with a sudden sharp hot stink of fox
         It enters the dark hole of the head.

The window is starless still; the clock ticks, T
         he page is printed.

 

 

 

A raposa

 

Imagino a floresta desta meia-noite;

Alguma coisa a mais está viva
Além da solidão do relógio

E da página branca por onde passam meus
          dedos.

Pela janela não vejo nenhuma estrela:

Algo mais próximo,

Embora mais profundamente mergulhado    
         na penumbra,
Penetra a solidão:

Frio, delicadamente como a neve escura,

Um nariz de raposa toca em folhas, gravetos;

Dois olhos criam movimentos que agora
E agora novamente e agora e agora

Imprimem contra a neve marcas nítidas
Entre as árvores e, prudentemente, uma imperfeita
Sombra se arrasta pelo tronco
         e no vazio
De um corpo decidido a chegar.

Desbastando tudo, um olho,

Verdor que se alarga e se aprofunda
Brilhante e concentradamente
Bordejando o assunto que o ocupa,

Com um cheiro súbito, agudo e quente de
         raposa
Adentra a escuridão vazia da cabeça.
A janela continua sem estrelas; o relógio
         trabalha.
A página está impressa.

 

               Tradução de Jorge Wanderley

 

 

 

Fifth Bedtime Story

 

Once upon a time there was a person
         Almost a person

Somehow he could not quite see
         Somehow he could not quite hear
         He could not quite think
         Somehow his body, for instance,

Was intermittent.

He could see the bread he cut

He could see the letters of words he read

He could see the wrinkles on handskin he looked at

Or one eye of a person

Or an ear, or a foot or the other foot

But somehow he could not quite see

Nevertheless the Grand Canyon spread wide open

Like a surgical operation for him

But somehow he had only half a face there

And somehow his legs were missing at the time

And though somebody was talking he could not hear

Though luckily his camera worked OK

The sea-bed lifted its privacy

And showed its most hidden fish thing

He stared he groped to feel

But his hands were silly hooves just at the crucial moment

And though his eyes worked

Half his head was jellyfish, nothing could connect

And the photographs were blurred

A great battleship broke in two with a boom

As if to welcome his glance

 

An earthquake shook the city onto its people

Just before he got there

With his rubber eye his clockwork ear

And the most beautiful girls

Laid their faces on his pillow, staring him out,

But somehow he was a tar-baby

Somehow somebody was pouring his brains into a bottle

Somehow he was already too late

And was a pile of pieces under a blanket

Somehow his eyes were in the wrong way round

He laughed he whispered but somehow he could not hear

He gripped and clawed but somehow his fingers would not
                   catch

And when the sea-monster surfaced and stared at the rowboat

Somehow his eyes failed to click

And when he saw the man’s head cleft with a hatchet

Somehow staring blank swallowed his whole face

Just at the crucial moment

Then disgorged it again whole

As if nothing had happened.

So he just went and ate what he could

And saw what he could and did what he could

Then sat down to write his autobiography

 

But somehow his arms had become just bits of wood
         Somehow his guts were an old watch-chain
         Somehow his feet were two old postcards
         Somehow his head was a broken window-pane
          ‘I give up,’ he said. He gave up.

 

Creation had failed again.

 

 

 

 

Quinta história para a hora da cama

 

 Era uma vez uma pessoa
         Quase uma pessoa
         Que não podia ver direito
         Não ouvia direito

Nem conseguia, por alguma razão, pensar direito.

Por alguma razão seu corpo, por exemplo,

Era intermitente.

Ele podia ver o pão que cortava
         Ou ver as letras das palavras que lia
         Ou ver a pele da mão cheia de rugas que olhava
         Ou ver um olho ou uma orelha de alguém
         Ou um pé ou um outro.

Mas não podia, por alguma razão, ver totalmente.

Todo estendido para ele o Grande Canyon se abria
         Como uma operação cirúrgica
         Mas por alguma razão ele só tinha lá meio rosto
         E na hora, por alguma razão, ficou sem pernas.

Conquanto houvesse alguém falando ele não conseguia
                   escutar,
         Só por sorte sua câmara funcionou a contento.

A privacidade do mar se ergueu do leito
         E mostrou-lhe as coisas mais piscosas e ocultas.

Para senti-las pelo tato ele olhou
         Mas suas mãos, bem no momento crucial, viraram cascos  
         Absurdos e, embora seus olhos funcionassem,

Metade da cabeça era água-viva, nada se conectava,

E as fotografias saíram com borrões.

Um grande vaso de guerra partiu-se em dois num estrondo
         Como que para saudar sua mirada.
        

Um terremoto, ao abalar a cidade, se adentrou nas pessoas

Pouco antes de ele chegar até lá

Com seu olho de borracha, sua orelha mecânica,

E as garotas mais bonitas deitaram O rosto no seu travesseiro a
                   espiá-lo.

Mas sendo ele, por alguma razão, um bebê-nauta,

Por alguma razão alguém vertia seus miolos na mamadeira,

De certa maneira ele já estava muito atrasado
         E era uma pilha de partes sob um cobertor.

Com os olhos, por alguma razão, na direção errada
         Ele ria e assoviava mas não conseguia escutar,

Ele estendia as garras e apertava e seus dedos e por alguma razão
                   nada retinham.
         Quando o monstro do mar subiu à tona e atentou para o bote,

Por alguma razão seus olhos fracassaram no clique.

Quando ele viu a cabeça do homem rachada a machadinha,

Por alguma razão pôs-se a engolir seu rosto, o olhar apático e fixo
         Bem no momento crucial,

E depois vomitou-o por inteiro
         Como se nada tivesse acontecido.

Assim, apenas indo, ele comeu o que pôde
         Ele viu o que pôde, ele fez o que pôde
         Antes de sentar-se a escrever sua autobiografia.

 

Mas seus braços, por alguma razão, tinham virado meros gravetos

Por alguma razão suas tripas eram uma velha corrente de relógio
         Por alguma razão seus pés eram dois velhos cartões-postais
         Por alguma razão sua cabeça era uma vidraça quebrada.

Ele disse. “Desisto.” E desistiu.

 

A criação tinha falhado outra vez.

 

Tradução de Leonardo Fróes

 

 

 

Theology

 

 

No, the serpent did not
Seduce Eve to the apple.
All that’s simply
Corruption of the facts.

 

Adam ate the apple.

Eve ate Adam.

The serpent ate Eve.

This is the dark intestine.

 

The serpent, meanwhile,
Sleeps his meal off in Paradise
Smiling to hear
God’s querulous calling.

 

 

 

Teologia

 

Não, a serpente não
         Seduziu Eva com a maçã.
         Tudo isso é simplesmente
         Corrupção dos fatos.

 

Adão comeu a maçã.

Eva comeu Adão.

A serpente comeu Eva.
         São as trevas do intestino.

 

A serpente, entrementes,

Dorme digerindo no Paraíso —
         Sorrindo para ouvir
         O chamado rabugento de Deus.

 

            Tradução de Leonardo Fróes

 

 

 

Página publicada em fevereiro de 2018


 

 

 
 
 
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