POESIA MUNDIAL EM PORTUGUÊS
Imagem do busto e fragmento da biografia
extraídos da Wikipedia.
NICOLAS BOILEAU
Nicolas Boileau-Despréaux (Paris, 1 de novembro de 1636 — Paris, 13 de março de 1711) foi um crítico e poeta francês.
Publicou seu primeiro volume de sátiras em 1666. Foi apresentado na corte, em 1669, após a publicação de seu Discurso sobre a sátira.
FRAGMENTO FINAL
do primeiro canto da Arte Poética
(Tradução do Conde de Ericeira)]
De alguns génios os tristes pensamentos
Embaraçados sempre em nuvens densas,
Não podem da razão nos luzimentos
Desbaratar as fúnebres ofensas:
Cuidai, se de escrever tendes intentos,
Dando à ideia as luzes mais intensas,
Que o que puro ou confuso se concebe,
Mais claro ou mais escuro se percebe.
E sobretudo não caiais no abismo
De adulterar do idioma o ser sagrado,
Nunca admitais pomposo barbarismo
Inda na melodia disfarçado:
De que serve um soberbo solecismo?
Que vai um termo próprio e viciado?
Enfim é o poeta mais divino
Sem pureza da língua autor indino.
Cuidai com ordem, e escrevei sem pressa,
Não presumais de rápida loucura;
Um estilo, que corre, e nunca cessa,
Pouco do entendimento a força apura:
Mais do que uma torrente, que se apressa
A inundar a campanha áspera e dura
Estimo um rio, que na branda areia
Vagaroso entre as flores se passeia.
Lento vos apressai, mas neste espaço
Não desmaieis por não achar conceito,
Vinte vezes aplique à obra o braço
A forja de que foi discreto efeito:
Puli-a sem cessar, sem embaraço,
E tornai-a a pulir não satisfeito,
Dai-lhe talvez aumentos primorosos,
E riscai, que estes versos são gloriosos.1
Não se estima um poema, que reparte
Acertos com mil erros desluzidos;
Hão-de ser sempre iguais em toda parte
Os extremos ao meio dirigidos;
Firmam um todo as obras de mais arte
De partes diferentes aos, ouvidos;
E assim nunca o discurso perca o fio
Buscando longe um culto desvario.
Temeis aos vossos pública censura?
Sede a vós mesmo crítico severo;
A ignorância admirada não murmura,
Mas buscai confidente o mais sincero:
Num amigo a verdade é mais segura,
Dos vossos erros inimigo austero,
Humilhando de autor louca vaidade
Distinguindo a lisonja da verdade.
Crede mais os conselhos que os louvores,
Que algum mostra que aplaude e satiriza;
Vede um adulador com que clamores
Em êxtases os versos soleniza:
Tudo é divino, tudo são primores,
Nada o ofende, tudo o suaviza,
Enternecido chora, alegre salta,
E com vãos elogios vos exalta.
Oh que a verdade ignora fingimentos,
E um sábio amigo, duro, rigoroso,
Não dispensa os mais leves pensamentos,
Com vossos erros nunca foi piedoso:
Ele coloca os «versos mais violentos
Da ênfase ambiciosa cuidadoso,
Na frase, na gramática repara,
No equívoco duvida, o termo aclara.
Assim um verdadeiro amigo fala,
Mas intratável vós em recompensa,
Quereis dar tom à obra, apadrinhá-la,
Interessado na suposta ofensa:
Se uma baixa expressão vos assinala,
Para que passe lhe pedis licença;
Isto é frio (vos diz), oh! que é notável;
Isto é mau. .. oh! senhor, que é admirável.
Em se não desdizer vive empenhado
O néscio autor em contumácia fera,
E um verso não consente ver riscado,
Como se nele um título perdera:
A quem encontra, afirma confiado,
Que tem nos versos mando soberano,
E lhe prende a atenção com este engano.
Depois de os recitar muito contente
Logo um simples encontra a que os refira,
Que um néscio autor no século presente
Sempre encontra outro néscio que o admira:
Na nobreza e no vulgo juntamente
Tem parciais a ignorância, em que respira,
E sempre louva (a sátira é constante)
Ao ignorante algum mais ignorante.
FRÓES, Heitor P. Meus poemas dos Outros. Traduções e versões. Bahia, 1952. 312 p. Ex. bibl. Antonio Miranda
TEXTS EM FRANÇAIS
I
POUR METTRE AU BAS D´UNE MÉCHANTE
GRAVURE QU´ON A FAITE DE MOI
Du célèbre Boileau tu vois ici l´image.
Quoi! c´est là, dirás-tu, ce critique achevé!
D´où vient le noir chagrin qu´on lit sur son visage?
C´est de se voir si mal grave.
II
A PERRAULT
Ton oncle, dis-tu, l´assassin,
M´a guéri d´une maladie:
La prouve qu´il ne fut jamais mon medicin,
C´est sque je suis encoare en vie.
III
A UNE DEMOISELLE
Pensant à notre mariage
NOus nous trompions três-lourdement:
Vous me coyiez fort opulent,
Et je vous croyais sage.
IV
SUR GILES BOILEAU, MON FRÉRE AîNé
AVEC LEQUEL JE M´ÉTAIS BROUILLE
De mon frère, il est vrai, les écrits sont vantés;
Il a cent belles qualités:
Mais il n´a point pour moi d´affection sincère.
En lui je trouve un excelente auteur,
Un poète agréable, un très bom orateur:
Mais je n´y trouve point de frère.
V
SUR UNE SATIRE TRÈS-MAUVAISE QUE
L´ABBÉ COTIN AVAIT FAITE, E QU´IL
FAISAIT COURIR SOU MONS NOM
En vain par mille et mille outrages
Mês ennemis, dan leurs ouvrages,
Ont cru me rendre affreux aux yeux de l´univers.
Cotin, pour décrier mon style,
A pris un chemin plus facile:
C´est de m´attribuer ses vers.
VI
CONTRE LE MÊME
À quoi bon tant d´efforts, de larmes et de cris,
Cotin, pour faire ôter ton nom de mês ouvrages?
Si tu veux du public éviter les outrages,
Fais effacer ton nom de tes propes écrits.
VII
PARODIE DE QUELQUES VERS DE LA CHAPELLE
Tout gran ivrogne deu Marais
Fait des vers que l´on lit guère;
Il les croit pourtant bien faits;
Et quando il cherche à les mieux faire,
Il les fait encor plus mauvais.
VIII
IMITÉE D´UNE EPIGRAMME DE MARTIAL
Paul, ce grand médecin, l´effroi de son quartier
Qui causa plus de maux que la peste et la guerre,
Est curé maintenant, et met les gens en terre;
Il n´a poiate changé de métier.
IX
CONTRE BOYER ET LA CHAPELLE
J´approuve que chez vous, messieurs, on examine
Quid u pompeux Corneille, ou de tendre Racine
Excita dans Paris plus d´applaudissements:
Mais je voudrais qu´on cherchât tout d´un temps
(La question n´est pas moins belle)
Quid u fade Boyer ou de sec La Chapelle
Excita plus de sifflements.
TEXTO EM PORTUGUÊS
Tradução de Heitor P. Fróes
I
LEGENDA PARA UMA GRAVURA MAL EXECUTADA
Do célebre Boileau eis a imagem; contudo
Estranhareis: É esse o crítico afamado?
Qual a razão de estar tão triste e carrancudo?
É que jamais se viu... tão mal gravado!
II
A PERRAULT
Teu tio — um matador que há por aí —
Um dia, ao que dizes, me curou.
Para provar que nunca me tratou
Basta ver que eu... inda não morri!
III
A UMA JOVEM
O nosso projetado casamento
Bem creio que ia ser dupla loucura,
Pois que você julga-me opulento
E eu a julgava pura!
IV
SOBRE UM IRMÃO MEU, MAISI IDOSO, COM
O QUAL ME HAVIA INCOMPATIBILIZADO
As obras de meu mano são gravadas;
Virtudes êle as tem, aprimoradas,
Mas não mostra por mim ter afeição;
Encontro nele um excelente autor,
Um bom poeta, um ótimo orador;
Mas não acho... um irmão!
VI
CONTRA O MESMO
Para que tantas queixas, lágrimas e gritos,
Só porque te citei, Cotin, nas minhas glosas?!
Se queres evitar mais alusões jocosas
Apaga o nome teu... dos teus próprios escritos!
VII
PARÓDIA DE UMA QUINTILHA DE LA CHAPELLE
Borrachos de Marias, sem ter leitores,
Julgam que fazem versos tentadores...
Nesse labor inutilmente imersos,
Mas tanto mais se esmeram tais senhores
Quão piores lhes vão saindo os versos!
VIII
IMITAÇÃO DE UM EPIGRAMA DE MARCIAL
Paulo — o grande esculápio ... horror do quarteirão —
Fez pior do que a guerra e os mortos todos juntos;
Depois... tornou-se Cura, e despacha defuntos;
Portanto, não mudou de profissão!
IX
CONTRA BOYER E LA CHAPELLE
Concordo, meus Senhores, que tratem de apurar
Se o vaidoso Corneille ou o lírico Racine
Em Paris conquistou mais louros na jornada;
Mas um outro problema a quisera eu decifrar,
Por mais que a solução me assuste e me amofine:
Dentre o chato Boyer e o seco La Chapelle
Qual deles recebeu ... mais forte pateada!
*
VEJA e LEIA outros poetas do mundo em nosso Portal:
http://www.antoniomiranda.com.br/poesiamundialportugues/poesiamundialportugues.html
Página ampliada e republicada em junho de 2022
Página publicada em julho de 2020 |