Meditações noturnas sobre a divina majestade por ocasião da aurora boreal
Oculta seu rosto o dia;
desce a noite fantasmal;
sombras pela serrania;
já dormiu o astro real;
abre-se o abismo sem fundo;
quantas estrelas no fundo!
2
Grão de areia sobre o mar,
nas geleiras fogaréu,
pluma que se vê passar
como poalha no céu.
Eis o que sou nessa altura,
que me abrasa e me tortura.
3
Lá, dizem as lumineiras,
há mundos em profusão,
mais de mil sóis as fogueiras,
e seus povos são legião.
E para a glória eternal
sua força é toda igual.
4
Onde a tua lei, Natura?
Alba além do setentrião!
Habita o sol, porventura,
lá onde nasce Aquilão?
Fogo frio nos envia e da noite faz o dia.
5
Homens de vista atrevida,
descobristes plenamente
as profundas leis da vida,
que rege o menor dos entes
como todos os planetas,
dizei, quanto nos inquieta?
6
Quem, de noite, o raio inflama?
Quem tira o fogo da terra?
Que relâmpagos, que chama
dos torrões o céu descerra?
Por que gélido vapor
dá vida a invernal fulgor?
7
Passam as ondas e a bruma
Ou Febo raios envia
pelo ar, e não ressuma?
Ou arde a montanha fria?
Ou se acalma o doce vento
e o mar beija o firmamento?
8
Eis a sombra e o profundo,
que recai nos circundantes.
Dizei, pois, se é grande o mundo?
Que guardam astros distantes?
Os viventes conheceis?
Do Criador, que sabeis?
Tradução de Marco Lucchesi