POESIA MUNDIAL EM PORTUGUÊS
Página enviada por
SALOMÃO SOUSA
Foto: da wikipedia.
LOUISE GLUK
Prêmio Nobel de Literatura 2020
Louise Elisabeth Glück ( /ɡlɪk/; Nova Iorque, 22 de abril de 1943) é uma poetisa e ensaísta estadunidense. Ela ganhou muitos prêmios literários importantes nos Estados Unidos, incluindo a Medalha Nacional de Humanidades, o Prêmio Pulitzer, o Prêmio Nacional do Livro, o Prêmio National Book Critics Circle Award e o Prêmio Bollingen, entre outros.
Biografia: fragmento de
https://pt.wikipedia.org/wiki/Louise_Gl%C3%BCck
TEXTS IN ENGLISH – TEXTOS EM PORTUGUÊS
LULLABY
Time to rest now; you have had
enough excitement for the time being.
Twilight, then early evening. Fireflies
in the room, flickering here and there, here and there,
and summer’s deep sweetness filling the open window.
Don’t think of these things anymore.
Listen to my breathing, your own breathing
like the fireflies, each small breath
a flare in which the world appears.
I’ve sung to you long enough in the summer night.
I’ll win you over in the end; the world can’t give you
this sustained vision.
You must be taught to love me.
Human beings must be taught to love
silence and darkness.
MIRROR IMAGEM
Tonight I saw myself in the dark window as
the image of my father, whose life
was spent like this,
thinking of death, to the exclusion
of other sensual matters,
so in the end that life
was easy to give up, since
it contained nothing: even
my mother’s voice couldn’t make him
change or turn back
as he believed
that once you can’t love another human being
you have no place in the world.
MIDSAUMMER
On nights like this we used to swim in the quarry,
the boys making up games requiring them to tear off the
girls’ clothes
and the girls cooperating, because they had new bodies since
last summer
and they wanted to exhibit them, the brave ones
leaping off the high rocks—bodies crowding the water.
The nights were humid, still. The stone was cool and wet,
marble for graveyards, for buildings that we never saw,
buildings in cities far away.
On cloudy nights, you were blind. Those nights the rocks were
dangerous,
but in another way it was all dangerous, that was what we
were after.
The summer started. Then the boys and girls began to pair off
but always there were a few left at the end—sometimes
they’d keep watch,
sometimes they’d pretend to go off with each other like the
rest,
but what could they do there, in the woods? No one wanted to
be them.
But they’d show up anyway, as though some night their luck
would change,
fate would be a different fate.
At the beginning and at the end, though, we were all together.
After the evening chores, after the smaller children were in
bed,
then we were free. Nobody said anything, but we knew the
nights we’d meet
and the nights we wouldn’t. Once or twice, at the end of
summer,
we could see a baby was going to come out of all that kissing.
And for those two, it was terrible, as terrible as being alone.
The game was over. We’d sit on the rocks smoking cigarettes,
worrying about the ones who weren’t there.
And then finally walk home through the fields,
because there was always work the next day.
And the next day, we were kids again, sitting on the front
steps in the morning,
eating a peach. Just that, but it seemed an honor to have a
mouth.
And then going to work, which meant helping out in the
fields.
One boy worked for an old lady, building shelves.
The house was very old, maybe built when the mountain was
built.
And then the day faded. We were dreaming, waiting for night.
Standing at the front door at twilight, watching the shadows
lengthen.
And a voice in the kitchen was always complaining about the
heat,
wanting the heat to break.
Then the heat broke, the night was clear.
And you thought of the boy or girl you’d be meeting later.
And you thought of walking into the woods and lying down,
practicing all those things you were learning in the water.
And though sometimes you couldn’t see the person you were
with,
there was no substitute for that person.
The summer night glowed; in the field, fireflies were glinting.
And for those who understood such things, the stars were
sending messages:
You will leave the village where you were born
and in another country you’ll become very rich, very
powerful,
but always you will mourn something you left behind, even
though
you can’t say what it was,
and eventually you will return to seek it.
TEXTOS EM PORTUGUÊS
Tradução de
PIERO EYBEN
Piero Eyben é poeta, professor de Teoria da Literatura na Universidade de Brasília, traduziu Jacques Derrida (https://revistacult.uol.com.br/home/tag/jacques-derrida), James Joyce, Jean-Luc Nancy, Safaa Fathy. Publicou os livros de poesia ocos (Lumme editor), voo de rapina, Trilogia de perdas (Editora Horizonte), Algum olhar apesar (7Letras), Filete de sangue, A galope, Loa contínua e Nome próprio (C14, casa de edição).
Piero Eyben traduz Louise Glück
Curadoria Patrícia Lavelle 13 de outubro de 2020 :
CANÇÃO DE NINAR
Hora de descansar agora; você teve
excitação bastante por hora.
Crepúsculo, então início da noite. Vagalumes
na sala, piscando aqui e ali, aqui e ali,
e a doçura profunda do verão enchendo a janela aberta.
Não pense mais nessas coisas.
Ouça minha respiração, sua própria respiração
como os vagalumes, cada breve respiração
uma erupção em que o mundo aparece.
Cantei bastante para você numa noite de verão.
Vou te conquistar no final; o mundo não pode te dar
esta visão contínua.
Você deve ser ensinado a me amar.
Os seres humanos devem ser ensinados a amar
silêncio e escuridão.
(de “The wild íris”)
IMAGEM ESPELHADA
Esta noite me vi na janela escura como
a imagem do meu pai, cuja vida
foi gasta assim,
pensando na morte, com a exclusão
de outros assuntos sensuais,
então, ao fim, aquela vida
foi fácil desistir, uma vez que
não continha nada: mesmo
a voz da minha mãe não conseguiu fazê-lo
mudar ou voltar atrás
como ele acreditava
que uma vez que você não pode amar outro ser humano
você não tem lugar no mundo.
(de “Ararat”)
SOLSTÍCIO DE VERÃO
Em noites como esta costumávamos nadar na pedreira,
os meninos inventando jogos que os obrigam a arrancar as
roupas das meninas
e as meninas cooperando, porque elas tinham novos corpos
desde o verão passado
e elas queriam exibi-los, os bravos
pulando das rochas altas – corpos aglomerando-se na água.
As noites eram úmidas, paradas. A pedra era fria e molhada,
mármore para cemitérios, para prédios que nunca vimos,
prédios em cidades distantes.
Em noites nubladas, você fica cego. Naquelas noites, as rochas
eram perigosas,
mas, por outro lado, tudo era perigoso, era isso que
queríamos.
O verão começou. Então meninos e meninas começaram a
formar pares
mas sempre havia alguns sobrando no final – às vezes eles
ficavam vigiando,
às vezes eles fingiam sair juntos como o resto,
mas o que eles poderiam fazer lá, no bosque? Ninguém queria
ser eles.
Mas eles apareceriam de qualquer maneira, como se alguma
noite sua sorte fosse mudar,
o destino seria um destino diferente.
No início e no fim, contudo, estávamos todos juntos.
Depois das tarefas noturnas, depois que as crianças menores
estavam na cama,
então estávamos livres. Ninguém disse nada, mas sabíamos as
noites em que nos encontraríamos
e as noites que não. Uma ou duas vezes, no final do verão,
podíamos ver que um bebê ia sair de todo aquele beijo.
E para aqueles dois, foi terrível, tão terrível quanto estar só.
O jogo acabou. Sentávamos nas rochas fumando cigarros,
preocupando-se com aqueles que não estavam lá.
E então, finalmente, caminhar para casa pelos campos,
porque sempre havia trabalho no dia seguinte.
E no dia seguinte, éramos crianças de novo, sentados nos
degraus da frente de manhã,
comendo um pêssego. Só isso, mas parecia uma honra ter uma
boca.
E depois ir para o trabalho, o que significava ajudar no campo.
Um menino trabalhava para uma senhora, construindo
prateleiras.
A casa era muito velha, talvez construída quando a montanha
foi construída.
E então o dia desvaneceu. Estávamos sonhando, esperando a
noite.
Parados na porta da frente no crepúsculo, observando as
sombras se alongarem.
E uma voz na cozinha sempre reclamando do calor,
querendo que o calor parasse.
Então o calor acabou, a noite ficou clara.
E você pensou no menino ou na menina que conheceria mais
tarde.
E você pensou em entrar no bosque e se deitar,
praticando todas aquelas coisas que você tinha aprendido na
água.
E embora às vezes você não pudesse ver a pessoa com quem
estava,
não havia substituto para essa pessoa.
A noite de verão brilhava; no campo, vagalumes cintilavam.
E para aqueles que entendiam dessas coisas, as estrelas
enviavam mensagens:
Você vai deixar o vilarejo onde nasceu
e em outro lugar você se tornará muito rico, muito poderoso,
mas sempre você lamentará algo que deixou para trás, mesmo
que você não consiga dizer o que foi,
e eventualmente você voltará para buscá-lo.
(de “A village life”)
A VESTIMENTA
Minha alma secou.
Como uma alma lançada ao fogo, mas não completamente,
não para aniquilação. Ressecada,
continuou. Frágil,
não da solidão, mas da desconfiança,
o rescaldo da violência.
Espírito, convidado a deixar o corpo,
a ficar exposto por um momento,
tremendo, como antes
sua apresentação ao divino –
espírito atraído da solidão
pela promessa da graça,
como você vai acreditar novamente
no amor de outro ser?
Minha alma murcha e encolhida.
O corpo converte-se por si enorme vestimenta.
E quando a esperança voltou para mim
era inteiramente outra esperança.
(de “Vita Nova”)
Página publicada em outubro de 2020
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