POESIA MUNDIAL EM PORTUGUÊS
LEA GOLDBERG
Lea Goldberg, (em hebraico: לאה גולדברג, Königsberg, 29 de maio de 1911 — Jerusalém, 15 de janeiro de 1970) foi uma tradutora e escritora israelense.
Nascida numa família de judeus lituanos em Königsberg (actual Kaliningrado, Rússia, então Alemanha), Goldberg estudou na universidade de Kaunas (Lituânia), Berlim e Universidade de Bonn, especializando-se em filosofia e línguas semíticas, uma disciplina em que foi doutora em 1933 na Universidade de Bonn, com uma tese sobre o dialeto samaritano. Terminou seus estudos e retornou à Lituânia, onde ensinou literatura em Raseiniai.
Emigrou ao Mandato Britânico da Palestina em 1935, onde foi membro do grupo Yahdav dos poetas Abraão Shlonsky e Nathan Alterman.
No ano seguinte, sua mãe foi para a Palestina e as duas estabeleceram-se em Tel Aviv, no 15 da rua Arnon. Lea Goldberg trabalhou como consultora literária de Habima, o teatro nacional, e como editora de publicações para Hapoalim Sifriat( "Biblioteca dos trabalhadores"). Em 1954, começa a ministrar cursos de literatura na Universidade Hebraica de
Jerusalém e, desde 1963, dirigiu o departamento de literatura comparada.
Morreu de câncer aos 58 anos.
Fonte da biografia e foto: wikipedia
Extraído de
POESIA SEMPRE – Ano 5 – Número 8 – Junho 1997. Revista semestral de poesia. Rio de Janeiro: Fundação Biblioteca Nacional, Ministério da Cultura, Departamento Nacional de Livro. Editor Geral: Antonio Carlos Secchin. Ex. bibl. Antonio Miranda.
Nas montanhas de Jerusalém
A
Estou colocada como uma pedra entre aquelas cordilheiras,
na relva alaranjada, crestada e queimada de verão,
indiferente e silenciosa.
Um céu pálido toca a rocha.
De onde terá vindo para cá uma borboleta de asas amarelas?
Uma pedra dentre pedras — eu não sei
quão antiga é minha vida
e quem ainda virá
e me enxotará com um pé
e eu rolarei pela encosta.
Talvez seja a beleza congelada parta sempre.
Talvez seja
a eternidade que caminha vagarosamente.
Talvez seja
o sonho da morte
e do amor único.
Estou colocada como uma pedra entre estas cordilheiras,
entre espinho e cardo,
frente ao caminho que desliza para a cidade.
Virá o vento que tudo abençoa
acariciar as copas do pinheiro
e as pedras mudas.
B
Todas as coisas que estão
fora do amor
vêm a mim agora —
esta paisagem e a sabedoria que à velhice
pertence, a qual deseja viver
mais um ano, mais um ano,
mais uma geração, duas gerações, três,
mais uma eternidade.
Fazer brotar espinhos sem fim,
acalentar pedras mortas
como crianças no berço antes de dormir.
Calar lembrança antigas,
mais uma, mais duas, mais três...
Oh, quão grande é o desejo de viver
para aqueles que irão morrer.
Quão terrível é o desejo
e quão vazio.
Ser, ser
mais um ano, mais um ano,
mais uma geração, duas gerações, três,
mais uma eternidade.
C
Como pôde o pássaro feliz vagar
até estas montanhas?
Em sua garganta há cantigas de amor,
seu pequeno coração estremece com o júbilo do amor,
ainda haverá filhotes em seu ninho,
um cântico de amor, o voo de suas asas.
E de repente
das alturas celestes
revelou-se diante dele
uma desolação apedrejada.
Salvai-o,
salvai-o,
para que seus olhos não vejam
a agonia de todos os amores,
as tumbas de todo o júbilo.
Na altura
azul,
do canto de amor solitário,
ele pende
e não alcança
esta morte
que está à sua frente.
D
Como poderá um pássaro solitário
sustentar o céu inteiro
sobre asas
fracas
por sobre a desolação?
Ele é grande e azul,
pousado em suas asas
se sustenta pela força de seu cântico.
Assim carregou meu coração seu amor,
o amor que era grande e azul,
e superior a todas as alturas,
sobre a desolação
e os escombros do desmoronamento
e os abismos do sofrimento.
Até que se calou o cântico de meu coração
e sua força se esgotou
tornou-se como uma pedra
e caiu.
O meu amor ferido, mudo.
Como um pássaro solitário poderá
carregar o céu inteiro?
Tradução de Eliana Rosa Langer
Para o retrato de mamãe
Tua foto é tão tranquila. Estás diferente:
um pouco orgulhosa e perplexa por seres minha mãe.
Acompanhas com um lágrima e com um sorriso indulgente
e jamais perguntas: “Quem?”.
Não te surpreendias nem te zangavas quando eu
chegava a ti diariamente e dizia: “Dá!”
Trouxeste-me tudo com tuas próprias mãos
só porque eu sou eu.
E mais do que eu, tu hoje me lembras
da mágoa de minha infância;
tua alma já então tinha decifrado:
quando vier a ti a filha crescida,
trará a angústia da tristeza que amadureceu.
Sim. Virei oprimida e não perguntarei por ti.
Não chorarei em teu colo, não sussurrarei “Mamãe.”
Saberás
Este que me abandonou, foi-me mais caro que tu
e não me perguntarás “Quem?”
Tradução de Nancy Rozenchan
Página publicada em março de 2018
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