Muralhas
                             Sem preocupação, sem dó, e sem pudor
                      grandes  muralhas altas ao meu redor me levantaram.
                             E  agora aqui sentado perco a esperança.
                      Domina  o meu pensamento este negro Fados
                             Porque  eu tinha muita coisa a fazer lá fora.
                      Ah,  quando erguiam-se as muralhas, como que eu não o sentisse.
                             Mas  nunca ouvi um som, ruído dos pedreiros,
                      insensivelmente  me fecharam fora deste mundo.
                     
                             As almas dos velhos
                             Dentro dos corpos velhos, desgastados
                      ficam  sentadas, as almas dos idosos.
                      Quão  tristes, desoladas são as pobres
                      E  como são enfadadas com a vida que elas levam.
                      estas  contraditórias, confusas —
                      dentro  das velhas peles enrugadas.
                     
                             Candelabro
                             Num quarto oco e coto, quatro paredes  só,
                      cobertas  todas com os panos verde puro, 
                      inflama  um candelabro belo em plena orgia
                      e  dentro cada chama sua arde intensa
                      a  comoção dita anormal, um anormal desejo.
                             Dentro  do quarto singular que arde iluminado
                      com  este fogo flâmeo do belo candelabro,
                      não  é luz corriqueira que emana da sua alma.
                      Por  corpos que não são bem arrojados
                      não  é propício o fervor deste hedonismos.
                     
                             Introspecção
                             Anos de juventude e hedonismo —
                      como  clareia agora o seu sentido.
                             Que  arrependimentos tolos e vazios...
                             Mas  neste tempo não chequei a ver o seu sentido.
                             Na  relaxada vida de um jovem
                      formavam-se  da minha poesia os voos,,
                      delineava-se  a fronteira da minha arte.
                             Por  isto os arrependimentos não duravam.
                      E  decisões de conter-me, de mudar-me
                      permaneciam  ao máximo duas semanas.
                     
                             Emiliano Monái, Alexandrino
                      628-655 após Cristo
                             Com logos, fisionomia e maneiras
                      farei  uma excelsa armadura
                      e  enfrentarei assim as vis pessoas
                      sem  medo ou fraqueza.
                             Desejarão  prejudicar-me. Mas não saberá
                      ninguém  daqueles que se aproximarão,
                      onde  tenho feridas, vulneráveis membros,
                      debaixo  das mentiras que me cobrirão.
                             Dizeres  gabadores de Emilianós Monái.
                      Será  que ele jamais fez a armadura assim?
                      Em  todo caso não a vestiu muito tempo.
                      Com  vinte e sete anos em Sikelía morreu.
                     
                             Veio pra ler —
                             Veio pra ler, e são abertos
                      dois,  três livros de historiadores e poetas.
                      Mas  quando leu mais ou menos dez minutos,
                      abandonou-os.  Agora no sofá
                      adormeceu.  Entregue todo aos livros —
                      mas  ele tem vinte três anos, e é tão belo
                      e  hoje à tarde o eros apalpou-o
                      na  sua carne ideal, nos seus lábios.
                      Na  carne que é de imácula beleza
                      passou  todo o calor do erotismo
                      sem  o ridículo pudor pela forma do gozo... 
                     (Poesia homoerótica – homossexual
                     
                    
                    KAVÁFIS, Konstantinos. 60 poemas. Seleção e tradução  Trajano Vieira.  Cotia, SP: Ateliê  Editorial, 2007.  159 p. 14 x 21 cm.   Projeto  gráfico e capa TOMÁS Martins. Edição bilíngue Português – Grego. ISBN  978-85-7480-362-3   Ex. bibl. Antonio Miranda.     
                    “Esta  coletânea  (...) busca oferecer ao leitor  de língua português algo da sutileza coloquial do autor grego. Normalmente, o  poeta é vertido em nossa língua de maneira prosaica, e tanto os efeitos de sua  ironia quanto a caracterização requintada dos personagens que figuram em seus  textos ficam obscurecidos pela dicção desatenta ao estilo original.”
                     
                             AS JANELAS
                            No escuro do habitáculo eu  passo
                      a  depressão dos dias e meus passos
                      buscam  janelas. Quando abrir-se uma
                      delas, peço ao fulgor que me  consuma.
                      Mas  janela não há, ou não consigo
                      vê-la.  Que fique ausente, a sós, consigo!
                      Talvez  a luz tão-só renove a dor.
                      Quem  sabe a nova que ela irá me impor?
                            
                      DESEJOS
                            Feito os corpos que morrem  juvenis e belos,
                      chorados  à clausura de um mausoléu magno,
                      com  pétalas à testas, com jasmim nos pés,
                      assim  transcorrem os desejos que abortam,
                      alheios  à voluta de uma noite única,
                      ao  rútilo clarão do se amanhecer.
                     
                            FUI 
                            Não me retive. Abri-me  inteiro e fui.
                      À  voluptuosidade, real às vezes,
                      concretizada  às vezes em meu cérebro,
                      fui,  no luzidio pleno de uma noite.
                      Goles  de vinhos encorpados, como sói ser
                      com  quem desteme o prazeroso.
                     
                     
                    /Mais 57 poemas de Kaváfis no livro,  disponível em livrarias físicas e virtuais.../        
                     
                    
                     KAVÁFIS, K.   Poemas de K. Kaváfis.   Trad. Isis B. da Fonseca.  São  Paulo: Odysseus Editora, 2006.    406  p.   14 x 21 cm.  ISBN S85-88023-79-2   Ex. bibl. Antonio Miranda
                     
                    ΤΕΙΧΗ
                     
                     
                    Χωρίς  περίσκεψιν, χωρίς λύπην, χωρίς αιδώ 
                      μεγάλα x"* υψηλά τριγύρω μου Εκτισαν τείχη.
                     
                    Καί  κάθομαι και άπελπίζομαι τώρα εδώ. "Αλλο δεν σκέπτομαι: τον νουν μου τρώγει  αυτή ή τύχη*
                     
                    διότι  πράγματα πολλά Εξω νά κάμω εϊχον. 
                      *Α δταν Εκτιζαν τά τείχη πώς νά μην προσέξω.
                     
                    Αλλά  δέν άκουσα ποτέ κρότον κτιστών ή ήχον. 
                      Ανεπαισθήτως μ' Εκλεισαν άπό τόν κόσμον Εξω.
                     
                    [1897]
                     
                     
                    1.  MURALHAS
                     
                     
                    Sem  consideração, sem piedade, sem pudor,
                    grandes  e altas muralhas em torno de mim construíram.
                     
                    E  agora estou aqui e me desespero.
                    Outra  coisa não penso: este destino devora meu espírito;
                     
                    porque  muitas coisas lá fora eu tinha que fazer.
                    Ah!  quando construíam as muralhas, como não dei atenção?
                     
                    Entretanto,  jamais ouvi batidas ou rumores de pedreiros. Imperceptivelmente, encerraram-me  fora do mundo.
                     
                     
                     
                    ΕΠΙΘΥΜΙΕΣ 
                     
                    Σαν  σώματα ώραία νεκρών πού δεν έγέρασαν 
                      καί τακλεισαν, μέ δάκρυα, σέ μαυσωλείο λαμπρό,
                      μέ ρόδα στο κεφάλι καί στά πόδια γιασεμιά — 
                      ετσ"* ή έπιθυμίες μοιάζουν πού έπέρασαν 
                      χωρίς νά εκπληρωθούν χωρίς ν' άξιωθεί καμιά
                      της ηδονής μιά νύχτα, ή Ινα πρωί της  φεγγερό.
                     
                    [1904]         
                             
                     
                    16.  DESEJOS
                     
                    Como  belos corpos de mortos que não envelheceram
                    e  foram encerrados, com lágrimas, em magnífico mausoléu,
                    com  rosas na cabeça e jasmins nos pés —
                    assim  se lhes assemelham os desejos que passaram
                    sem  se realizar, sem que nenhum
                    alcançasse  uma noite de prazer, ou sua manhã luminosa. 
                     
                    
                    KAVÁFIS, Konstantinos.   Poemas.  Seleção, estudo crítico, notas e tradução  direta do grego por José Paulo Paes.    Rio de Janeiro:  Nova Fronteira,  1982.    190 p. (Coleção Poiesis)   Ex.  bibl. Antonio Miranda
                     
                     
                    CANDELABRO
                     
                    Quarto  pequeno, vazio, quatro paredes somente, 
                      com um tecido de cor verde recamadas; 
                      a iluminá-lo todo, um candelabro refulgente; 
                      ardendo em cada chama sua, se pressente 
                      uma volúpia mórbida, um ímpeto lascivo.
                     
                    O  quarto minúsculo se abrasa no calor
                    do  candelabro de luzes extremadas;
                    nada  há de banal nessas luzes, nem se deve supor
                    que  seja feito para corpos tímidos o ardor
                    desse  prazer tão vivo.
                     
                     
                     
                    O SOL DA TARDE
                     
                    Este  quarto, este quarto eu o conheço bem. 
                      Agora está alugado, assim como o vizinho, 
                      para fins comerciais: a casa toda ocupam 
                      escritórios de câmbio e vendas, companhias.
                     
                    Ah  este quarto, como me é familiar.
                     
                    Ali,  ao lado da porta, ficava o divã
                    com  um tapete turco à sua frente;
                    na  estante perto, dois vasos amarelos.
                    À  direita, não, defronte, um armário de espelho.
                    Bem  no centro, a mesa onde escrevia
                    e  as três grandes cadeiras de palha.
                    Debaixo  da janela estava o leito
                    onde  tantas vezes nos amamos.
                     
                    Pobres  móveis, hão de ainda existir nalgum lugar.
                     
                    Debaixo  da janela estava o leito;
                    o  sol da tarde lhe chegava até a metade.
                     
                    Foi  de tarde, às quatro horas, que nós dois nos despedimos por uma semana só. . .  uma semana, 
                    ai de mim, que se fez eternidade.
                     
                     
                     
                    
                    KAVÁFIS, K.   ΚΡΥΜΜΕΝΑ.  Segredos.    Trad. M. Sulis, M. Jolkesky, A. Nocolacópulos.  1ª. edição – 2ª tiragem (de 50 exemplares,  ex. n. 01.  Desterro, SC:    Edições Nephelibata, 2009.  86 p.   Ex. bBibl. Antonio Miranda
                     
                    ο ΣΕΠΤΕΜΒΡΗΣ ΤΟΥ 1903 
                     
                    Τουλάχιστον  μέ πλάνες άς γελιούμαι τώρα
                      την άδεια την ζωή μου νά μή νιώθω.
                     
                    Και  ήμουνα τόσες φορές τόσο κοντά. 
                      Και πώς παρέλυσα, και πώς δείλιασα* 
                      γιατί νά μείνω μέ κλειστά τά χείλη* 
                      και μέσα μου νά κλαίει ή άδεια μου ζωή, 
                      καινά μαυροφορούν οί επιθυμίες μου.
                     
                    Τόσες  φορές τόσο κοντά νά είμαι 
                      στά μάτια, και στά χείλη τά ερωτικά, 
                      στ' ονειρεμένο, τό άγαπημένο σώμα. 
                      Τόσες φορές τόσο κοντά νά είμαι.
                     
                             [1904]
                     
                    SETEMBRO  DE 1903
                     
                    Que  ao menos com ilusões eu me engane agora; 
                      para não sentir minha vida vazia.
                     
                    E  estive tantas vezes tão perto.
                    E  como me paralisei, e como me acovardei;
                    por  que ficar com os lábios fechados;
                    e  minha vida vazia a chorar dentro de mim,
                    e  meus desejos a vestirem-se de preto.
                     
                    Estar  tantas vezes tão perto 
                      dos olhos, e dos lábios eróticos, 
                      do sonhado, amado corpo. 
                      Estar tantas vezes tão perto.
                     
                    [1904]
                     
                     
                     
                    ΣΤΟ ΘΕΑΤΡΟ
                     
                     
                    Βαρέθηκα  να βλέπω την σκηνή,
                    και  σήκωσα τα μάτια μου στά θεωρεία.
                    Και  μέσα σ' ένα θεωρείο είδα σένα
                    με  τήν παράξενη έμορφιά σου, και τά διεφθαρμένα νιάτα.
                    Κι  άμέσως γύρισαν στον νοΰ μου πίσω
                    όσα  με είπανε τό άπόγευμα γιά σένα,
                    κ'  ή σκέψις και τό σώμα μου συγκινηθήκαν.
                    Κ'  ένώ έκοίταζα γοητευμένος
                    τήν  κουρασμένη σου έμορφιά, τά κουρασμένα νιάτα,
                      τό ντύσιμο σου τό έκλεκτικό, σε φανταζόμουν και σε είκόνιζα, καθώς μέ είπανε τό  άπόγευμα γιά σένα.
                     
                    
                       [1904]
                       
                       
                      
                        NO TEATRO
                         
                        Cansei-me de  olhar a cena,
                        e levantei  meus olhos aos camarotes.
                        E em um  camarote vi a ti
                        com tua  beleza estranha, e a juventude depravada.
                        E de  imediato voltou a minha mente
                        tudo o que  me disseram à tarde de ti,
                        e meu corpo e  mente emocionaram-se.
                        E enquanto  olhava encantado
                        tua beleza  cansada, a juventude cansada,
                        teu vestir  seleto,
                        imaginava-te  e delineava-te
                        como me  disseram à tarde de ti.
                      
                      [1904]
                       
                    
                     
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Página publicada em junho de 2018; ampliada e republicada em agosto de 2018. Ampliada em setembro de 2018.