| POESIA MUNDIAL EM PORTUGUÊS 
 
 JEAN-CLAUDE RENARD   Jean-Claude Renard ( 22 de abril de  1922 - 19 de novembro de 2002 ) é um prolífico poeta e escritor francês nascido  em Toulon . Seu trabalho, imbuído de mistério e espiritualidade, lhe valeu o  Grande Prêmio de Poesia da Académie Française em 1988 e, em 1991 , o Prêmio  Goncourt para Poesia e o Grande Prêmio de Poesia da SGDL ( Société pessoas  literárias ). Ele foi um dos colaboradores das Editions du Seuil e das Éditions  Casterman     Ele  também é o autor de vários ensaios. Ele entrou no mundo da poesia publicando  Juan em 1945, um primeiro livro (1945 : Juan )que marca todo o seu trabalho.   TEXTS EN FRANÇAIS –  TEXTOS EM PORTUGUÊS    Extraído de   POESIA SEMPRE – Revista Semestral de Poesia.  ANO 3 – NÚMERO 5 –  FEVEREIRO 1995.  Rio de Janeiro: Fundação  Biblioteca Nacional, Ministério da Cultura, Departamento Nacional do Livro,  1995.   Ex. bibl. Antonio Miranda                       La braise et la rivière   Devant ce bois si beau, Ce chemin de fougères, de genêts et de sable
 Où tout à l'heure encore le feuillage tremblait du
 broutement  d'un cerf,
 Où maintenant, au ras des grandes  bûches sèches,l'air  vibre de pollens, d'insectes, de résines
 Et là-bas, derrière moi, j'entends un enfant rire, Je demande à nouveau, sans espérer savoir, si c'est
 le  désir seul qui parle avec lui-même et qui s'invente
 un  don
 Ou quelqu'un d'autre en lui qui se parle à soi-même Ou l'un et l'autre ensemble, mais par quelle distance
 unis  et séparés, parlant la même langue à travers le
 silence
 Ou si nulle parole ne peut être  échangée entre ailleurs et ici Ou bien s'il n'y a rien que le hasard terrible de vivre et de mourir — Et ce langage vide qui ne sait pas s'il parle mais doit  pourtant sans cesse refuser de se taire
 Et sans cesse à la fois accepter  et nier l'angoisse dunéant
 Pour tenter jusqu'au bout de  traverser l'absence?     A brasa e  o rio   Diante  deste bosque tão belo, O caminho de avencas, de giestas e de areia
 Onde ainda há pouco a folhagem tremia com o pastar de um
 cervo, Onde  agora, ao rés dos grandes tocos ressequidos, o ar vibra  de pólens, de insetos e resinas E  além, atrás de mim, ouço um riso de criança, Pergunto novamente, sem esperar saber, se é apenas o
 desejo  que fala a sós e se atribui um dom Ou  se é alguém que nele esteja a falar consigo mesmo Ou um e outro juntos, mas por essa distância
 unidos  e separados, falando a mesma língua através do silêncio Ou  se nenhuma palavra pode ser trocada entre o além e o aqui Ou  ainda se não há nada a não ser esse terrível acaso do viver e do morrer —  E essa linguagem vazia que não sabe se fala mas que deve no entanto se recusar  sempre a calar E  sempre aceitar e negar ao mesmo tempo a angústia do nada Para  tentar até o fim atravessar a ausência?             Tradução de Ivo Barroso       Incantation du monde     Comme  d'une odeur de pomme et de menthe le sacre du sang fume sur le pain.
   Tout  le poumon cosmique dilaté dans la respiration de la gloire.
   O  que les vieilles vases de la mort tombent de mes os sous le vent marin!
   La  laine de Dieu a le goût des feuilles et des fontaines — et la vigne y pousse.
   je  mûrirai l'or, entre les cerfs blancs, pour qu'en moi l'été retrouve ses cassis.
         Encantamento do mundo     Qual  se um odor de mentas e maçãsa sagração do sangue envolve o pão.
   Todo  o pulmão do cosmo se dilata nessa respiração de sua glória.
   Ah  que esses velhos cálices da mortesob o vento do mar dos ossos caiam-me!
   A  lã de Deus tem o sabor das folhas e dessas fontes — onde brota a vinha.
   Farei  maduro o ouro, entre os cervos brancos: que ache o verão em mim os seus cassis.
     Tradução  de Ivo Barroso         Avec les oiseaux rouges    Que le matin s'élève au seuil de la maison  commeune hache blanche,
 Un soc entre les tuiles! Au bas des oliviers, dans la plaine du  fleuve, Une main ira prendre le bois et les galets  qui briseront les vitres.
 Le verre en me blessant éveillera des armes  fécondeset royales.
 Je ferai mon offrande. Je brûlerai la paille des bêtes hébétées,  les graisses Je sortirai du sang.
 J'aurai de l'air dans l'âme — de l'eau vive,  de l'or. Le vent des hautes neiges lavera les cavernes,
 Chassera des forêts les fourrures funèbres.
 Les ramiers seront minces comme un sarment taillé.
 J'ouvrirai dans la peur, j'ouvrirai dans la mort
 Une grange habitable aux oeufs de la lumière.
 Il y aura des femmes sur les pierres désertes pour
 inaugurer l'herbe, Le visage du dieu.
 Que les îles s'avancent parmi les raisins  frais et traversent mes os comme l'alcool et l'iode!
 Les genèses sont neuves.
 Ce coutre dans mes champs les désengorgera  desfossiles du soir
 Pour que chaque fureur tutélaire et fertile
 me consacre un secret.
 Le petit mur de terre dont je franchis la crête Marque le lieu qui joint les frontières  aiguës. Le silence avoisine une rumeur d'abeilles. Une profusion d'abricots et d'amandes se  forme dansle vide
 A mesure qu'en lui je marche et me dévêts. Je sens que si je touche de mes épaules nues  le soleil déposé sur les tables rocheuses
 Une source acérée va jaillir de leurs  failles comme un lait de glaçons.
 Je m'y purifierai avec les oiseaux rouges. Ce pays est si beau que le feu qui l'aère y  nomme  un autre feu. Un feu comme un oursin pour que plus rien ne  dorme. Un feu comme une alliance et une  ressemblance. Un feu comme un bonheur. Je m'approche des pins un instant disparus  qui renaissent plus jeunes.
 Le regard transmué se charge de présences. Une parole exacte est maintenant possible où  je célébrerai le présage accompli,
 La tendre transparence acquise au poids des  choses. La campagne m'éclaire de son autre versant. Je descends par le lit d'un sentier qui  verdit. En moi et hors de moi Le langage sacré fait commencer la mer.       Com os pássaros vermelhos    Que se erga a manhã dos umbrais da casa como uma acha branca,
 A charrua entre as telhas! Sob os olivais, na planura do rio, A mão irá colher os paus e as pedras que partirão vidraças.
 O vidro ao me ferir despertará reais armas fecundas.
 Farei minha oferenda. Queimarei a palha dos animais obtusos, as  enxúndias da noite.
 Narinas de sal estriparão as portas. Sairei do sangue.
 Terei o ar em minha alma — a água pura, o  ouro. O vento das altas geleiras lavará as cavernas,
 Expulsará das florestas os fúnebres pelames.
 As pombas-rolas serão esguias como um sarmento podado.
 Abrirei para o medo, abrirei para a morte
 Uma granja habitável pelos ovos da luz.
 Onde haverá mulheres sobre as pedras desertas para
 inaugurar a erva,
 A face do deus.
 Que as ilhas avancem entre as uvas verdes e  atravessem meus ossos como o álcool e o iodo!
 As géneses são novas.
 Essa charrua em meus campos os desobstruirá  dos fósseis do crepúsculo
 Para  que cada furor tutelar e fértil me consagre umsegredo.
 O  pequeno muro de terra cuja crista transponho Marca  o lugar em que se juntam as fronteiras agudas. O  silêncio confina um zumbido de abelhas. Uma  profusão de abricós e de amêndoas se forma no vazio À  medida em que nele caminho e me despojo. Sinto  que se tocar com os ombros nus o sol que se pôs nas mesetas rochosas
 Uma  fonte acerada irá jorrar das fendas como um leite de flocos.
 Nele  me purificarei com os pássaros vermelhos. A região é tão bela que o fogo que a areja nomeia
 um outro fogo.
 Um  fogo como um ouriço para que nada mais durma. Um fogo como uma aliança e uma  semelhança. Um  fogo como uma ventura. Acerco-me  dos pinheiros que por um instante desapareceram para surgirem mais novos.
 O olhar transmudado se agrava de  presenças. Uma  palavra exata é agora possível onde celebrarei o presságio perfeito,
 A  tenra transparência adquirida à custa das coisas. De  sua outra vertente o campo me ilumina. Desço  pelo leito de um sendeiro que se enflora. Em  mim e fora de mim A  sagrada linguagem dá início ao mar.     Tradução de Ivo Barroso       Página  publicada em janeiro de 2018 
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