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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 
POESIA MUNDIAL EM PORTUGUÊS

GIÁNNIS RITSOS

(1909 - 1990)

 

Yannis Ritsos foi um poeta grego, nascido em Monovassiá, a 1° de maio de 1909. Seu livro Epitaphios foi queimado publicamente pela ditadura de Ioannis Metaxas. Em 1948, com o início de outra ditadura militar na Grécia, Yiannis Ritsos é preso, passando pelos campos de Limnos e o terrível Makronisos, onde escreve seus Diarios do exílio.

 

RITSOS, Giánnis.  Grecidade. Desterro, SC: Seleções Nephelibata, 2008.  45 p.  Bilingue  Grego e Português.  Tradução: Miguel Sulis, Marcelo Jolkesky, Apóstolo Niclaacópulos.  Tiragem: 50 exs. Ex. bibl. Antonio Miranda

 

O leitor não familiarizado com a obra de Ritsos pode, com essa traduço, começar a desfiar a imensa trama de sua obra poética em um dos pon¬tos principais. Afinal, Ritsos é mais conhecido do grande público grego como o poeta da Grecidade. O termo designa não só o conjunto da nação, a felicidade ou infelicidade de ser grego, mas também o helenismo em sua diacronia, o caminho que atravessa o vasto território da memória da Grécia. E os que anseiam conhecer algo dessa Grécia, não catalogada nas agências de turismo, não registrada nos clássicos, mais profúnda, mais mística, podem encontrá-la plena na obra de Ritsos e especialmente em Grecidade. R. M. Sullis

 

                IV

Embrenharam-se madrugada adentro com o desdém do homem

         que tem fome,
nos seus olhos inertes coalhara uma estrela,
nos seus ombros carregavam o verão ferido.

 

Por aqui passou o exército com os estandartes colados ao corpo
com a teimosia mordida entre seus dentes como uma pera verde, com a areia da lua dentro das suas botas grossas
com o cisco da noite colado nas suas narinas e nos seus ouvidos.

 

De árvore em árvore, de pedra em pedra atravessaram o mundo, com um travesseiro de espinhos atravessaram o sono.
Traziam a vida como um rio nas suas mãos secas.

 

A cada passo ganhavam um palmo de céu — para cedê-lo.
Em cima das guaritas empederniam-se como as árvores   
         chamuscadas,

e quando dançavam na praça, dentro das casas tremiam os tetos
e ressoavam os cristais nas prateleiras.

 

Ah, que canção balançou os picos das montanhas —

entre seus joelhos seguravam a pequena tigela da lua e ceavam,

e espremiam o ai do fundo dos seus corações

como se espremessem um piolho entre suas unhas grossas.

 

Quem te trará agora o pão quente no meio da noite para

         alimentares os sonhos?
Quem ficará na sombra da oliveira fazendo companhia à cigarra,

para que não silencie a cigarra,
agora que a cal do meio-dia pinta todos os lados do curral do
         horizonte
apagando seus grandes nomes viris?

 

Esta terra que recendia nas alvoradas,

a terra que era deles e nossa — sangue deles — como cheirava a  
         terra —

e agora como nossas vinhas trancaram suas portas,
como minguou a luz nos telhados e nas árvores —
quem diria que uns se encontram debaixo da terra
e os outros presos?

 

O sol te acena bom-dia com tantas folhas,
o céu brilhando com tantos estandartes,
e uns presos e outros debaixo da terra.

 

Cala-te, a qualquer momento soarão os sinos.
Esta terra é deles e nossa.
Debaixo da terra, nas suas mãos cruzadas
         morrem,

aguardam para soarem a ressurreição. Esta terra
é deles e nossa — ninguém nos pode tomá-la.

 

 

 

VI

 

Assim com o sol contra o peito no mar que caleia o lado oposto do
dia, conta em dobro e tresdobro o trancar e a tortura da sede,
conta do começo a velha ferida,

e o coração tosta na brasa como as cebolas vaticiotas em frente
          às portas.

 

Enquanto vão mais suas mãos se parecem com a terra,
enquanto vão mais seus olhos se parecem com o céu.

 

Esvaziou-se a talha de azeite. Pouca borra no fundo. E o rato morto. Esvaziou-se a coragem da mãe com a jarra de barro e a cisterna.
As gengivas do deserto tornam-se amargas com a pólvora.

 

Onde haveria azeite agora para o candil de Santa Bárbara,
onde haveria hortelã para turibular o ícone dourado da tarde,
onde haveria um bocado de pão para a noite mendiga tocar sua
         serenata na lira.

 

No castelo do alto da ilha as íigueiras-da-barbaria e os asfódelos
         tornaram-se fantasmas.
A terra escavada pela canhonada e pelos túmulos,
o Comando demolido boceja remendado com céu. Não há mais

nenhum lugar

para outros mortos. Não há lugar para a tristeza ficar e trançar
          seus cabelos.

 

Casas queimadas que observam com olhos arrancados o mar
         marmoreado e as balas cravadas nas paredes

como as facas nas costelas do Santo que amarraram no cipreste.

 

O dia todo os mortos se aquecem de costas ao sol,

e somente quando anoitece os soldados rastejam o ventre sobre
         as pedras esfumaçadas,
procuram com as narinas o ar sem morte,
procuram os sapatos da lua mascando um pedaço de sola,

batem com os punhos na rocha, talvez rebente o olho-d'água,
mas do outro lado a parede é oca

e ouvem novamente a batida do projétil com muitos giros caindo
         no mar

e ouvem mais uma vez o berro dos feridos em frente ao portão.


Para onde ir? Teu irmão te chama.

A noite formada por todos os lados pelas sombras de barcos
         estrangeiros.
Os caminhos fechados com barricadas.
Somente para as montanhas ainda há caminhos.
E eles mandam os barcos à merda e mordem as línguas
para ouvir sua dor que não se tornou osso.

 

Em cima das seteiras os capitães mortos guardam eretos a fortaleza; debaixo das suas roupas se dissolve sua carne. Hei, irmão, não
         cansaste?

 

Brotou a bala dentro do teu coração,

cinco jacintos despontaram sob os braços da rocha seca.

a cada respiração o olor lê o conto de fadas — não te lembras?

a cada dentada o ferimento te conta a vida,

a camomila brotada na imundice da unha do dedão do teu pé

te conta a beleza do mundo.

 

Pegas a mão. É tua. Úmida pela salinidade.

E teu o mar. Enquanto arrancas o cabelo da cabeça do silêncio

goteja amargo o leite da figueira. Onde quer que estejas o céu te vê.

 

A estrela-d'alva enrola tua alma nos seus dedos como um cigarro,

para que fumes tua alma deitado de costas,

molhando tua mão esquerda no céu estrelado

e o rifle colado na tua mão direita como tua noiva,

para lembrares que o céu nunca te esqueceu

quando tirares do bolso interno sua velha carta

desdobrando a lua com dedos queimados lerás brio e glória.

 

Mais tarde subirás na guarita mais alta da tua ilha
e usando uma estrela como munição atirarás ao vento acima dos muros e mastros

acima das montanhas que se curvam como soldados feridos
e só assim gritarás para que os fantasmas se escondam na coberta
         da sombra —

 

Atirarás em cheio no seio do céu para encontrares o sinal azul
como se encontrasses sobre a camisa
o mamilo da mulher que amanhã amamentará teu filho como se encontrasses depois de anos o trinco do portão da casa

          dos teus pais.

 

 

Página publicada em dezembro de 2017


 

 

 
 
 
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