POESIA MUNDIAL EM PORTUGUÊS
DAN PAGUIS
Dan Pagis (16 de outubro de 1930 - 29 de julho de 1986) foi um poeta israelense , palestrante e sobrevivente do Holocausto .
Dan Pagis nasceu em Rădăuţi , Bukovina na Romênia e preso como uma criança em um campo de concentração na Ucrânia . Ele escapou em 1944 e imigrou para Israel em 1946.
Pagis obteve seu doutorado na Universidade Hebraica de Jerusalém, onde mais tarde ensinou literatura medieval hebraica . Seu primeiro livro de poesia publicado foi Sheon ha-Tsel ("The Shadow Clock") em 1959. Em 1970, ele publicou uma obra importante intitulada Gilgul - que pode ser traduzida como "Revolução, ciclo, transformação, metamorfose, metempsicose, "etc. Outros poemas incluem:" Escrito no lápis no carro ferroviário selado "," Testemunho ", Europa, Late," Autobiografia "e" Rascunho de um acordo de reparações ". Pagis conhecia muitas línguas e traduzia vários trabalhos da literatura.
Pagis morreu de câncer em Israel em 29 de julho de 1986.
Seu poema mais amplamente citado é "Escrito no lápis no carro ferroviário selado".
Fonte da biografia e da foto: wikipedia
Obs. Existe um registro do nome do autor diferenciado na revista — PAGUIS —da que aparece na internet — PAGIS, considerando que o nome original, em hebreu, foi transliterado.
Extraído de
POESIA SEMPRE – Ano 5 – Número 8 – Junho 1997. Revista semestral de poesia. Rio de Janeiro: Fundação Biblioteca Nacional, Ministério da Cultura, Departamento Nacional de Livro. Editor Geral: Antonio Carlos Secchin. Ex. bibl. Antonio Miranda.
Pegadas
Do céu aos céus do céu, dos céus do céu à névoa.
YANAI
Forçado
tive uma continuidade nesta nuvem: inquieta, cinza,
tentando esquecer no horizonte, o horizonte recua
As batidas dos dentes do
granizo duro:
grãos refugiados foram impelidos agilmente
para sua destruição
em outro setor
nuvens ainda não identificadas.
Holofotes que erigiram
grandes cruzes de luz para a vítima.
Descarregamento de vagões.
Depois voam as letras,
depois das letras voadoras apressa-se
a lama, apagando, cobrindo por algum tempo
é verdade, fui um erro, fui esquecido
no vagão selado, meu corpo
na vida eterna. Amarrado.
Eis o bolso em que descobri pão,
migalhas doces, todas do mesmo mundo
talvez haja aqui uma janela, se não lhe for difícil,
procure al lado daquele corpo, talvez seja possível
abrir um pouco.
Isto me lembra, perdão, a anedota sobre
os dois judeus no trem, eles viajavam para
diga mais algo, fale.
Será que poderei passar adiante do meu corpo?
*
Do céu aos céus do céu, dos céus do céu à névoa
longos comboios de fumaça
os novos serafins que ainda não entenderam,
esperançosos vagam na liberdade vazia
desconfiados como sempre: como aproveitar
este vácuo repentino, talvez seja de valia
a dupla cidadania, o velho passaporte,
talvez a nuvem? O que há de novo numa nuvem,
também aqui certamente
se aceita suborno. E cá entre nós: as maiores
ainda estão bem escondidas, costuradas
entre solas,
mas os sapatos foram empilhados lá embaixo:
um grande público boquiaberto
comboios de fumaça. Às vezes
alguém se desliga,
me reconhece por algum motivo, me chama pelo nome.
Eu finjo simpatia, tento lembrar:
quem mais
quem
sem nenhum direito de lembrar, eu lembro
de um homem gritando no canto do aposento, baionetas
que se ergueram para cumprir nele a sua função
sem nenhum direito de lembrar. O que mais
houve? Já não tenho medo
que direi
sem ligação alguma:
houve um coração azul de tanto inverno
e uma lamparina redonda, azul, de bom coração.
Mas o querosene desaparece com o sangue, a chama bruxuleia...
Certo, antes que eu esqueça:
a chuva atravessou clandestinamente uma fronteira, atravessei
com ela,
em rotas de recuo proibidas, com esperança proibida,
e nós dois passamos à beira das covas.
Talvez agora eu
procure naquela chuva o fio escarlate
onde começar?
Não sei sequer perguntar.
Em minha boca misturam-se línguas demais. Mas
sobre este cruzamento de ventos,
muito diligente, mergulho todo
nas regras da linguística celestial e aprendo
conjugações, verbos, substantivos
de silêncios.
Quem autorizou a zombar?
O que há acima de você, você sabe.
Você pretendia perguntar
sobre o que há dentro, sobre o que há abismalmente
além de você.
Como foi que você não viu?
Pois eu não sabia que estava vivo.
Dos céus do céu à nevoa apressaram
anjos, por vezes algum deles lançou
um olhar para trás, me viu, deu de ombros
continuou além do meu corpo.
Congelado e rompido, coagulado,
cicatrizado,
sufocado, entortado
Se me for decretado ir embora daqui,
tentarei descer degrau a degrau,
seguro em todos com cuidado.
Mas não fim para esta escada e já
não há tempo, apenas ainda poderei cair
para dentro do mundo
e em meu caminho de volta
assim me insinuam meus olhos:
você esteve, o que mais queria ver?
Feche-nos e veja:
você é a escuridão, você é o sinal.
Assim me diz minha garganta:
se você ainda está vivo, abra-me, eu
devo louvar.
Assim me seguiram minhas mãos
e minha cabeça virada me é fiel:
estou caindo caindo
do céu aos céus do céu aos céus do céu à névoa
Então mundo.
O cinza está reconciliado no azul.
No portão de nuvem já há uma inocência doce de azul celeste,
talvez esverdeada. Já um cochilo.
Céus se renovam, testam suas asas,
escapam de mim em debandada. Não me espanto mais.
No portão de nuvem rompe-se para mim
o lago
vazio vazio puro de reflexos
Veja ali,
naquele convexo azul, na beira do ar,
vivi outrora. Frágil foi minha janela.
Talvez hajam restado de mim
apenas pequenos planadores que não amadureceram:
ainda se repetem em ainda-nuvem, planando
recortando o momento
(não lembrar agora, não lembrar)
E antes que eu chegue
(e agora estender até o fim, estender)
já desperto, estendido até as pontas de minha asas,
forçado adivinho que logo mais,
dentro, preso em esperanças, bruxuleia
este planeta Terra,
cicatrizado de pegadas.
Tradução de Anat Slomka
Escrito a lápis no vagão selado
Aqui neste transporte
eu sou Eva
com Abel meu filho
se vocês virem meu filho mais velho
Caim filho de Adão
digam a ele que eu
Tradução de Nancy Rozenchan
Página publicada em março de 2018
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