POESIA MUNDIAL EM PORTUGUÊS
Foto e biografia: wikipedia
CHARLES SIMIC
Charles Simic ( sérvio : Душан "Чарлс" Симић [dǔʃan tʃârls sǐːmitɕ] , nascido em Dušan Simić , 9 de maio de 1938) é poeta sérvio-americano e foi editor da Revista de Paris . Ele recebeu o Prêmio Pulitzer de Poesia em 1990 para The World Does not End e foi finalista do Prêmio Pulitzer em 1986 para Selected Poems, 1963-1983 e em 1987 para Unending Blues.
Extraído de
POESIA SEMPRE – Revista Semestral de Poesia – Ano 2 Número 3 – Rio de Janeiro Fevereiro 1994 - Fundação Biblioteca Nacional. ISSN 0104-0626 Ex. bibl. Antonio Miranda
Eyes fastened with pins
How much death works,
No one knows what a long
Day he puts in. The little
Wife always alone
Ironing death's laundry.
The beautiful daughters
Setting death's supper table.
The neighbors playing
Pinochle in the backyard
Or just sitting on the steps
Drinking beer. Death,
Meanwhile, in a strange
Part of town looking for
Someone with a bad cough,
But the address somehow wrong,
Even death can't figure it out
Among all the locked doors...
And the rain beginning to fall.
Long windy night ahead.
Death with not even a newspaper
To cover his head, not even
A dime to call the one pining away,
Undressing slowly, sleepily,
And stretching naked
On death's side of the bed.
Olhos fechados com alfinetes
Por mais que a morte trabalhe,
Ninguém sabe o que um longo
Dia nos apresenta. A viuvinha
Sempre só que passa a roupa
Na lavanderia da morte.
As belas filhas
Que servem a ceia da morte.
Os vizinhos que jogam
Pinocle ao fundo do quintal
Ou sentam-se nos degraus da escada
A beber cerveja. Enquanto isso
A morte, num estranho
Recanto da cidade, olha
Para alguém que tosse sem cessar,
Mas o endereço de algum modo errado
Impede que a morte o identifique
Por entre todas as portas que contempla...
E a chuva começa a cair.
Uma longa noite tempestuosa pela frente.
A morte não tem sequer um jornal
Para cobrir a cabeça, sequer uma moeda
Para telefonar a quem alfinetou ao longe,
E que se despe lenta e sonolentamente,
Estendendo o corpo desnudo
Ao lado do leito da morte.
Tradução de Ivan Junqueira
Great infirmiities
Everyone has only one leg.
So difficult to get around.
So difficult to climb the stairs
Without a cane or a crutch to our name.
And only one arm. Impossible contortions
Just to embrace the one you love,
To cut the bread on the table,
To put a coat on in a hurry.
I should mention that we are almost blind.
And a little deaf in both ears.
Perilous to be on the street
Among the congregations of the afflicted.
With only a few steps committed to memory.
Meekly we let ourselves be diverted
In the endless twilight —
Blind seeing-eye dogs on our leashes.
An immense stillness everywhere
With the trees always bare,
The raindrops coming down only halfway,
Coming so close and giving up.
Grandes enfermidades
Todos têm uma perna.
É tão difícil evitar ou subir
Os degraus da escada, sem bengala
Ou muleta que nos sustente o nome.
E também só um braço. Impossíveis contorsões
Para enlaçar a quem se ama,
Cortar o pão sobre a mesa,
Vestir um casaco às pressas.
Eu diria que somos quase cegos,
E algo surdos de ambos os ouvidos.
É perigoso andar nas ruas
Entre congregações de aflitos.
Com apenas alguns degraus destinados à memória.
Docilmente nos deixamos dispersar
No crepúsculo sem fim: cães
De olhos vazios em nossas correntes.
Uma imensa quietude em toda parte
Com as árvores sempre nuas,
Os pingos da chuva a cair só pela metade,
A cair tão próximos e tão desamparados.
Tradução de Ivan Junqueira
Country fair
for Hayden Carruth
If you didn't see the six-legged dog,
It doesn't matter.
We did and he mostly lay in the corner.
As for the extra legs,
One got used to them quickly
And thought of other things.
Like, what a cold, dark night
To be out at the fair.
Then the keeper threw a stick
And the dog went after it
On four legs, the other two flapping behind,
Which made one girl shriek with laughter.
She was drunk and so was the man
Who kept kissing her neck.
The dog got the stick and looked back at us.
And that was the whole show.
Quermesse rural
A Hayden Carruth
Se você não viu o cão de seis pernas.
Não importa.
Nós o vimos: ele descansa quase sempre ao canto.
Quanto às pernas sobressalentes.
Qualquer um logo se acostuma a elas
E cogita de outras coisas.
Do mesmo modo que uma fria e escura noite
Se estende para além da quermesse.
Então o guarda arremessou uma vareta
E o cão correu em seu encalço
Sob quatro pernas, as outras duas se agitando atrás,
O que levou uma garota a dar uma risada.
Ela estava bêbada, assim como o homem
Que a beijava no pescoço.
O cão abocanhou a vareta e olhou para trás em nossa direção. E nisso consistia todo o espetáculo.
Tradução de Ivan Junqueira
BARATARIA Revista de Poesia. Ano 7 Número Doble 14 - 15. Buenos Aires: Fondo Cultura BA, Junio 2005. ISSN 1668-1460
Ex. bibl. de Antonio Miranda
[tradução Maria Negroni]
CLAROSCURO
(La encajera, Jan Vermeer de Delft)
La aplicación de las manos
De los dedos
La concentrada inclinación de la cabeza
El sometimiento
Una tarea tan minuciosa
Como obsesiva
El aprendizaje de la sumisión
y del silencio
Madre, yo no quiero hacer encaje
No quiero los bolillos
No quiero la pesarosa saga
No quiero ser mujer.
TEXTO EM PORTUGUÊS
Tradução de ANTONIO MIRANDA
CLAROESCURO
(A Rendeira, Jan Vermeer de Delft)
A utilização das mãos
Dos dedos
A concentrada inclinação da cabeça
A submissão
Uma tarefa tão minuciosa
Como obsessiva
A aprendizagem da sujeição
e do silêncio
Mãe, eu não quero fazer renda
Não quero o pão francês
No quero a penosa saga
Não quero ser mulher.
*
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Página publicada em fevereiro de 2023
Página publicada em dezembro de 2017
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