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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

POESIA MUNDIAL EM PORTUGUÊS

LUDOVICO ARIOSTO

 

 

Ludovico Ariosto (Reggio Emilia, 8 de setembro de 1474 — Ferrara, 6 de julho de 1533) foi um poeta italiano.

Filho de um membro do tribunal de Ferrara, estudou direito, abandonando a carreira para dedicar-se à poesia. Estudou os poetas latinos e a composição de seus versos. Foi protegido do nobre Hipólito d'Este e, posteriormente, de Afonso d'Este.

 

A obra de Ariosto é vasta: Poesias líricas latinas (1493/1503), Sátiras, peças de teatro, etc. Sua obra mais famosa é o poema Orlando Furioso, que seria a continuação de uma obra anterior de Matteo Maria Boiardo intitulada Orlando enamorado.

O poema, composto de 46 cantos em sua versão final, alcançou grande sucesso, por ocasião de sua publicação. Nele, o poeta ridiculariza a nobreza feudal em decadência, ao mesmo tempo que prenuncia o novo homem da Renascença.

 

Além do seus aspectos sociais, a obra consegue unir um enredo fantástico a uma versificação harmoniosa.

 

Orlando Furioso foi traduzido em quase todas as línguas e no próprio século XVI foram feitas mais de sessenta edições do poema. Narra uma série de episódios que derivam de épicos, romances e poesia heróica da Idade Média e início do Renascimento, destacando-se três histórias nucleares à volta das quais as outras se formam: o amor de Orlando por Angelica - a de maior importância; a guerra entre cristãos (liderados por Carlos Magno) e mouros (liderados por Agramante) perto de Paris - que constitui o cenário épico para toda a narrativa; e o amor entre Rogério e Bradamante - uma cortesia literária em honra da família Este, que se supõe descendente daquelas duas personagens.

 

Aristo ainda deixou o poema inacabado Rinaldo Ardito.

 

Biografia: /pt.wikipedia.org

 

        

                De


Orlando Furioso

 

 

EPISÓDIO DO ENCONTRO DE ANGÉLICA
COM SACRIPANTE

 

Muito não vai Rinaldo, que ali vê
Pular-lhe diante o seu corcel feroz:
Pára, Baiado meu, não movas pés,
Que o ficar-me sem ti é dano atroz.
Mas não volta o corcel, surdo lhe é;
Ao contrário, mais safa-se veloz;
Rinaldo o vai seguindo, e de ira estala;
Mas sigamos Angélica que abala.

 

Foge por selvas hórridas, escuras,
Por sítios ermos, desertos, selvagens:
O mexer que sentia nas verduras,
E das árvores várias nas folhagens,
Lhe fizera, com súbitas tremuras,
Achar de cá, de lá estranhas viagens;
Qualquer sombra que em monte ou vale via,
Ter às costas Rinaldo ela temia;

 

Qual pequenina gama ou cabritinha,

Que da moita natal entre o silvado

A garganta da mãe já visto tinha

Serrar do pardo e abrir-lhe o peito e o lado,

De bosque em bosque do cruel lestinha,

Foge, treme de medo e de cuidado;

A cada estrepe, que passando toca,

Da iníqua fera já se crê na boca.

 

Nesse dia, na noite, e meio dia
Depois, sem saber onde andou vagando;
Num bosque enfim chegou, que florescia,
E o vai a fresca aragem meneando;
Tenra e nova ali sempre erva crescia,
Por dois rios que o cercam murmurando,
E dava um doce de se ouvir concento,
Em seixinhos quebrando, o correr lento.

 

Ali lhe parecendo estar segura,
E de Rinaldo milhas mil distante,
Cansada do caminho e da quentura,
Resolve repousar algum instante:
Entre as flores se apeia, e na pastura
Deixa ir sem freio o palafrém, que errante
Vai andando ao redor dessa onda clara,
Que de erva fresca as margens esmaltara.

 

Eis perto um belo céspede ali vê

De espinho em flor e de vermelhas rosas,

Que se espelha no rio que corre ao pé,

Livre do sol entre árvores umbrosas,

Tão vazio no meio pra que dê

Fresco aposento em sombras mais selvosas;

E cos ramos a folha em modo é mista,

Que ali não entra sol nem menor vista.

 

Tenras ervinhas ali formam leito,

Que chama a descansar quem se apresenta;

Mete-se nele a bela dama, e a jeito

Ali estende o corpo e se adormenta.

Mas muito assim não fica, e com efeito

Pisadas de quem vem co' ouvido atenta;

Ergue-se queda, e junto do ribeiro

Vê que armado chegara um cavaleiro.

Se ele é amigo ou imigo não conhece:
Esperança, temor lhe o peito abala;
E espera o fim de um caso tal como esse;
Nem um suspiro só no ar estala.
Do rio o cavaleiro à margem desce,
E sobre um braço a face encosta; e cala
Tão a dentro de um grande pensamento,
Que parece um calhau sem sentimento. 

Pensoso e cabisbaixo mais de uma hora
'Steve, Senhor, esse varão gemente.
Depois com tom aflito e de quem chora,
Começa a se queixar tão docemente,
Que enternecera as pedras sem demora,
E um cruel tigre tornara clemente.
Suspirando chorava, e quase feito
Um rio estava o rosto, um Etna o peito.
 

Pensamento, dizia, que gela e arde
Meu peito, e és pai da dor que sempre o rala,
Que hei-de fazer, pois que cheguei já tarde,
E outrem co fruto já nas mãos abala?
Só palavras eu tive e algum esguarde,
E outrem com rica preia se regala.
Se disso me não toca flor nem fruto,
Por que hei-de o coração cobrir de luto? 

A virgenzinha é semelhante à rosa,
Que em jardim belo em a natal espinha
Enquanto só se fica e cautelosa,
Nem gado nem pastor se lhe avizinha;
A aura suave, a alva rociosa,
A água, a terra, tudo a acarinha:

Jovens belos e moças namoradas,
Gostam ter seio e fronte dela ornadas.
 

Mas logo que do ramo em que nasceu
E do seu cepo verde é removida,
Perde a graça e a beleza, e já do céu
E dos mortais não é favorecida:
Virgem que a flor em que há-de o zelo seu
Pôr mais que em belos olhos e na vida,
Deixa colher, o apreço, que tinha antes,
Perde no coração de outros amantes.
 

Vil seja aos mais e só por esse amada,
Ao qual tanto de si deu larga cópia,
Ali! fortuna cruel e arrenegada!
Os mais triunfam, morro eu de inópia.
Pois nela a gratidão pode ser nada?
E largar posso a minha vida própria?
Ah! quero antes morrer do que ter vida,
Se mais não hei-de amar minha querida.
 

Se me pergunta alguém quem é o gemente,
Que verte assim no rio pranto abundante,
Direi: é o rei da circassiana gente,
O de dor trabalhado Sacripante.
Direi também que do seu mal ingente
Primeira e única causa é o ser amante;
É mais um dos amantes dessa bela;
E bem reconhecido foi por ela.
 

Té onde cai o sol por seu amor
Viera desde o cabo do Oriente;
Pois soube em Índia, com acerba dor,
Que ela seguira Orlando no Poente:
Soube em França depois que o imperador
A tinha separado da outra gente,
E prometido em prémio a quem no dia
Aos lírios de ouro mais ajudaria.
 

Tinha estado no campo, e vira aquela
Derrota que o rei Carlos já tivera.
Buscou vestígios de Angélica bela,
Nem dar com eles inda ele pudera.
Eis a triste notícia que o flagela
Com paixão amorosa, e o dilacera,
E o leva a se queixar, coisas dizendo,
Que o sol, de dó, não possa ir-se movendo.

 

Enquanto assim ele se aflige e queixa,

E faz dos olhos seus tépida fonte,

E estas e mais palavras sair deixa,

Que não julgo preciso que eu as conte;

Sua sorte feliz quer que esta queixa

Aos ouvidos de Angélica lá monte;

E assim numa hora e num instante vede

O que em mil anos ou jamais sucede.

 

Com mui grande atenção a bela dama
Ao pranto, às expressões, ao modo atende
Desse, que sempre sem descanso a ama,
Nem é a primeira vez que isso ela entende;
Mas dura e fria mais que coluna, est'ama
Dele, por dó, seu coração não rende,
Como quem desdenhosa a todos seja
E não ache quem dela digno seja.

 

Contudo o achar-se só nesse silvado,

Lembra-lhe de tomar este por guia;

Que, quem tem água às barbas, obstinado

Em não gritar socorro assaz seria.

Se este ensejo lhe escapa, em outro lado

Escolta tão fiel não acharia.

Pois, por mil provas, conhecera ela antes

Tal rei o mais fiel dos seus amantes.

 

Mas nem por isso pensa do tormento,
Que o gasta, aliviar a quem a ama,
Nem compensar passado detrimento
Co prazer que um amante mais reclama.
Mas só algum engano ou fingimento,
Para o ter na esperança, ela urde e trama:
Pra dele se servir quanto precisa,
E após voltar à dura e altiva guisa.
 

Fora do escuro céspede tapado
Faz de si bela e repentina mostra,
Qual de antro umbroso ou de bosque cerrado
Diana em cena ou Vénus se nos mostra.
E diz saindo: fica sossegado;
Minha honra ampare o céu de quem a prostra,
E não sofra que em tudo sem razão
Tenhas de mim tão falsa opinião. 

Jamais com tanto gáudio e estupor tanto
Os olhos levantou para o seu nado,
Mãe que morto o lastimara em pranto
Sem ele ouvindo o exército voltado,
Com quanto o mouro alto prazer, com quanto
Pasmo, a alta presença e o delicado
Modo, e o decerto angélico semblante
Vê de repente aparecer-lhe diante. 

Cheio de doce e de amoroso efeito,
À sua dama ou deusa ele correu,
A qual o colo cum abraço estreito
Prendeu-lhe, o que na terra em que nasceu
Do Catai reino não houvera feito;
Companheiro na pátria, o aborreceu.
Logo nela revive uma esperança
De rever cedo a sua rica estança.
 

Ela conta lhe dá inteiramente
Desde quando ele foi, por mandos seus,
Auxílios implorar no Oriente
Do rei dos Sericanos Nabateus:
Como Orlando a livrou frequentemente
Da morte, da desonra e ruins boléus;
E que a flor virginal salva trouxera,
Qual do ventre materno ela a tivera.
Verdade era talvez, porém incrível,
Pra quem do siso seu fosse senhor;
Mas logo a ele pareceu possível,
Que laborava em erro inda maior.
O que se vê amor torna invisível,
E o invisível nos faz ver amor.
Isso se acreditou; que o desgraçado
crer o que ele quer é costumado.

 

 

                   …Tradução: Pedro Garcez Ghirardi ?


 

 

 
 
 
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