CAETANO VELOSO – GILBERTO GIL
“(...) o tropicalismo significou a consolidação da poesia concreta como parte do repertório da música de massa e da cultura letrada, mas também marcou o início de sua desintegração como movimento orgânico (fato que se comprova, ademais, na produção poética desses anos), porque o tropicalismo foi, entre outras coisas, um movimento de crítica paródica e, complementarmente, o sinal de que a cultura de massa desestabilizava tanto as culturas populares como as culturas de elite ou de alto repertório. Um bom exemplo disso é a canção “Batmacumba”, de Caetano Veloso e Gilberto Gil, incluída em “Tropicália ou Panis et Circensis”:
BATMACUMBA
batmacumbaieiê batmacumbaobá
batmacumbaieiê batmacumbao
batmacumbaieiê batmacumba
batmacumbaieiê batmacum
batmacumbaieiê batman
batmacumbaieiê bat
batmacumbaieiê ba
batmacumbaieiê
batmacumbaie
batmacumba
batmacum
batman
bat
ba
bat
batman
batmacum
batmacumba
batmacumbaieiê
batmacumbaieiê ba
batmacumbaieiê bat
batmacumbaieiê batman
batmacumbaieiê batmacum
batmacumbaieiê batmacumba
batmacumbaieiê batmacumbao
batmacumbaieiê batmacumbaobá
A mistura sincrética de “Batman”, “ieiê” e “macumba” (o Brasil como
“macumba para turistas”, segundo Oswald de Andrade) resume-se em uma espécie de grito tribal (“bá”) que pode ser interpretado como “um reduto “bá”, que guarda o nome africano do pai-de-santo do ritual do candomblé, ou uma das onomatopéias usadas nas canções de rock, cujo sentido reside, sobretudo, em expressar uma sensação corporal, de canto e movimento físico (uma das palavras formadas é “bat”, pronunciada “bate”, que significa bater no sentido de agredir, mas também no sentido de tocar um tambor ou um instrumento musical de percussão). Se não fosse pela musicalização percussiva popular e pelo repertório do mass media e religioso a que se refere, “Batmacumba” poderia ser um poema concreto. Mas não o é: a letra da canção recupera a espacialidade concreta como mais um relíquia, em um clima festivo que a desvincula de toda eficácia programática.”
“A versão corresponde a uma transcrição criativa de Augusto de Campos e, desde então, “Batmacumba” tem sido impressa dessa forma.”
Texto extraído da obra “POESIA CONCRETA BRASILEIRA – As vanguardas na encruzilhada modernista”, tese de doutorado de GONZALO AGUILAR, publicada em formato de livro pela EDUSP (São Paulo, 2005).
ISBN 85-314-0779-6
Página publicada em março de 2008
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