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ALMADA NEGREIROS
(1893-1970)

 

TRÊS POEMAS VISUAIS

Os três caligramas a seguir foram divulgados recentemente por E.M. de Melo Castro que atribui a eles títulos para facilitar sua identificação. Explica que “o caligrama é um poema visual figurativo, cujo texto se refere de algum modo à figuração, existindo entre texto e figuração alguma relação de tipo icônico”.

 

 

Texto de E. M. de Melo e Castro:

 

(...)

 

Os três textos figurativo-espadais de Almada Negreiros, agora descobertos e mostrados ao público, pela primeira vez, nesta exposição, dada a sua comprovada autenticidade e, sendo datados de 1920, devem portanto ser considerados, pelos critérios da época, como Caligramas. Assim, o seu estudo deverá ser comparativo em relação aos caligramas de Apollinaire e de outros cultores parisienses desse tipo de poemas, como Pierre Albert-Birot, para se avaliar da sua originalidade e diferenças. Assim como em relação a alguns outros grafismos, já conhecidos, do poeta português Mário de Sá-Carneiro, ao Autorretrato létrico do próprio Almada, de 1948, e a alguns quadros de Amadeu de Sousa Cardoso, incluindo formações tétricas e palavras.

 

De Sá-Carneiro são conhecidos os grafismos que fazem parte do poema Manucure, de 1915, e um bilhete postal com caligrafia espacial, enviado de Paris a Fernando Pessoa em 1914. Outros talvez existirão. Mas é precisamente o bilhete postal que vai ser o suporte e o formato que Almada Negreiros usa para realizar caligraficamente as três realizações visuais que agora nos surpreendem e encantam.

 

Imagens e textos dos poemas transcritos respeitando a ortografia original:

 

AMAZONA

 

AMAZONA: não há nada que me faça pensar mais longe do que uma menina em maillot cor de rosa em cima de um cavalo branco / fazia-me grande curiosidade a vida dela / como será a vida quotidiana d'uma amazona? / não havia ninguém que não estivesse contente / o cavallo branco do rei / a música grande como um regimento a cavallo / tudo era alegria e grande vontade de viver / o maillot cor de rosa / o cavallo / a rapariga / não se podia desejar melhor / às vezes era preciso não haver música por causa de ser difficif (difícil?) / havia muita gente que vinha todos os dias / as senhoras fechavam os olhos quando era o salto mortal / já se conhecia o cavallo onde ella trabalhava melhor do que nos outros / uma vez falhou-lhe um pé e toda a gente fez oh! Horror /

 

Amazona: A primeira impressão visual é a elegância, o movimento e o "charme" que emana do conjunto mulher-cavalo, desenhados impecavelmente numa caligrafia pequena e muito regular, em letras maiúsculas.

Este tema, da representação de animais através de caligrafia, remete-nos para uma tradição de "tecnofanhias" clássicas em grego, latim, árabe e até sânscrito e em ideogramas orientais, de cavalos, tigres e touros, aves, minotauros, dragões e répteis. Este fato em nada diminui a originalidade deste caligrama de Almada, porque ela reside na qualidade do desenho e no fato de ser escrita em português em 1920.

 

 

PIQUENIQUE

 

PIQUENIQUE: tinha estado muita gente nos mesmos dois logares como nós dois hoje alli sósinhos por causa um do outro / bebemos juntos / havia dois lugares por toda a parte / nós já fomos trez / foi um domingo / grande sede/ ela escreveu na areia j. / falíamos do passado / olhámos um para o outro / as arvores estavam cheias de saúde / talvez triste / tudo parecia der sido feito para nós / tudo o que ella trazia vestido tinha sido por gostar de mim / nunva houve um dia tão feliz como este hoje / um coração é maior do que um homem / dentro do coração tudo é grande muito grande / não tinha pena de ter morrido n'aquele dia / não falles de mim falia só de ti que tu só é que vives / tudo o que ella dizia tinha graça de ter sido dito por ella / já escolhi aquela que há-de ser minha um dia para sempre nunca o céu esteva tão claro /

 

Piquenique: O desenho mostra-nos uma cena, construída com texto escrito, onde existem vários objetos, sendo este aspecto cenográfico muito raro no universo das "tecnofanhias" de todos os tempos e línguas. Esta cena representa talvez um recanto de um jardim onde existem uma mesa, duas cadeiras, uma garrafa, um copo e uma árvore. O copo e a garrafa são figuras comuns nas "tecnofanhias" desde a antiguidade, mas a mesa e as cadeiras, não! Por seu lado, a árvore é, muito originalmente, construída com fragmentos de texto caligrafado enrolado em espirais. São ao todo sete espirais de texto, seis enroladas de fora pata dentro e uma de dentro para fora. O tronco e os ramos são linhas curvas  de texto. Esta estrutura da árvore ê, a meu ver, absolutamente original e só encontra dois Antecedentes longínquos, que são considerados como as raízes arqueológicas da poesia visual. São eles o famoso "Disco de Festos", encontrado em Creta em 1908 e provavelmente datado do século XVII a.c., e o "Ovo" de Símias de Rodes, do século IV a.c.

 

ÁRVORE

 

ÁRVORE: o sol deitado no campo ao lado do regato tranquilo / elegante como uma árvore d'abril / à sombra da larangeira / repouso / a brisa do mar / manhã cedinho / passeio a pé / verde esmeralda / as andorinhas contentes /verde azeitona / romance illustrado / o fresco da praia / lindo dia de verão / onze horas / a merenda / NORTE / SUL / ESTE / OESTE

 

Árvore: O tema da árvore em representações gráficas remonta inevitavelmente à "Arvore da vida" de origem indiana e tantas vezes representada em tapeçarias e em bordados, como por exemplo nas chamadas colchas de Castelo Branco.

No entanto, em poesia visual a "Arvore da vida" não é um tema frequente e este poema visual de Almada apresenta alguma complexidade. Tal como nos outros dois poemas já referidos, a construção gráfica é feita acima de um linha de texto que lhes serve de base. Mas neste caso o poema tem uma formação circular abaixo dessa linha de terra, nascendo o tronco desse círculo que diz: "à sombra da larangeira repouso" (sic). O tronco. Esse, diz: "elegante como uma árvore d'abril". Os ramos são formados por linhas de texto encimados por curvas e círculos abertos de texto. O conjunto é de fato, de uma inexcedível elegância...

Mas a complexidade, e talvez o maior interesse desta original "Árvore da vida", reside no fato de todo este conjunto ser enquadrado pelos quatro pontos cardeais escritos em letras maiúsculas também, mas de tamanho notavelmente maior; NORTE em cima; SUL embaixo; OESTE à esquerda; ESTE à direita, constituindo uma esquemática rosa dos ventos. Esta árvore que nasce debaixo da terra, onde se lê a palavra REPOUSO, insere-se vertical e elegantemente num espaço geograficamente demarcado, que é um espaço feliz e talvez eufórico, se atendermos ao que se diz nos ramos da árvore. Certamente um espaço idílico.

Mas o que torna este poema verdadeiramente interessante é o fato dele já não ser um caligrama, como os outros dois, mas sim, constituir-se como um verdadeiro ideograma, fato este que resulta da sobreposição das duas estruturas significativas diferentes, a árvore da vida e a rosa dos ventos, que se fundem numa só estrutura sígnica nova e diferente de cada uma delas. O clima idílico, embora enraizado no repouso, está exposto aos quatros ventos e a todas as variações das suas direções e dos seus soprares. Trata-se realmente de um poema ideogramático complexo, organizado como os ideogramas orientais, por justaposição, tal como foram estudados por Fenollosa, no final do século XIX, na escrita chinesa, e posteriormente desenvolvidos por Ezra Pound e por Haroldo de Campos, este já na segunda metade do século XX, em língua portuguesa.

Este poema de Almada Negreiros, datado de 1920, e no seu aparente esquematismo, arrisca-se a ser o primeiro poema visual ideogramático da língua portuguesa. Ideogramático no sentido contemporâneo e rigoroso que atualmente se dá ao conceito de ideograma.

 

 

CONCLUSÃO

 

Deste primeiro estudo analítico, embora incompleto, poderemos concluir que a descoberta destes três poemas visuais da Almada Negreiros é um fato cultural importante tanto para uma iconografia de Almada como para o conhecimento da evolução poetográfica em língua portuguesa. Podemos certamente dizer que somos agora mais ricos!

 

E interessante observar que sendo a poesia visual, nos seus hoje múltiplos pendores e categorias, um jovem género artístico, misto de escrita e representação gráfica e pictoral, Almada Negreiros, sendo numa só pessoa, artista plástico e escritor de génio polivalente, unha todas as condições para ser também um extraordinário poeta visual.

Aliás, o painel COMEÇAR pode ser interpretado como um enorme e complexo poema visual. Mas isso é outro assunto que não cabe nesta apresentação.

Os originais destes três poemas visuais inéditos que tenho agora o prazer e a honra de apresentar ao público pertencem à família do Maestro Ivo Cruz por estarem incluídos na correspondência de sua Mulher que, em solteira, fazia parte de um grupo de jovens com quem Almada Negreiros se correspondia, desde 1915, tendo sido enviados de Paris e datados, pelo autor de "Paris 26 mars 20". Essa correspondência, até hoje inédita, está sendo estudada por Maria José Almada Negreiros e será incluída numa nova biografia de Almada a publicar pela Fundação Gulbenkian.

O conhecimento destes poemas foi-me facultado pelo Arquiteto José de Almada Negreiros através da Crítica Maria João Fernandes que comigo contataram para realizar esta apresentação. Para eles o meu agradecimento.  (CASTRO, p. 23-29)

 

Extraídos de
CASTRO, E. M. de Melo e.  Poética do ciborgue – antologia de textos sobre tecnopoiesis.  Rio de Janeiro: Confraria do Vento, 2014.  196 p.  15x23 cm.  ISBN 978-85-60676-72-9 .” E. M. de Melo e Castro “  Ex. na bibl. Antonio Miranda

 


 

 

 
 
 
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