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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Poema de ANTONIO MIRANDA

Ilustração de Campos Biscardi

 

A

Sexo um arco-íris, todas as cores, todas nuanças todas
     Posições, contorções, inversões, convulsões, todas.
         Pois o sexo cresce e entumece, desvanece.
             Acontece, E no que é, deixa de ser. Prazer
                 ou não. Senão, pois não. Objeto, feto.
                     Marasmo e orgasmo. Ponto de união
                         extrema-unção.

                           É pau, é pão
                             é o fim-da-picada

                               é a força avassaladora da
                               vossoroca
                             é o furor invasor da pororoca
                           é a fortaleza
                         ou dureza da mandioca

                      é vergasta, é chibata
                    masoquista, vulgata,
                  perfurata

               quando a suvela, a manivela
               quando o ferrolho, o estolho
                   quando a maçaneta
                      — quase disse punheta!
                       que, definitivamente, não
                         rima com buceta
                           chupeta
                              eu diria acosso
                                você, talvez, osso, pescoço

                                Certo: existem palavrões
                                que são palavras banais
                                martirizadas
                               transvertidas de sentido

                            como existem palavras outras
                           — protuberância, óbulo, óvulo
                         introspecção, arrocho...

                     palavras anormais, demais
                   além do próprio sentido
                 transcendentes, melhor:
              venais.

 

De: PER VER SOS, 2003, p. 53-54.

 

O título, de certa forma, é o oposto da forma utilizada nos vinte e cinco poemas intitulados de PER VER SOS.  Enquanto a estrutura formal destes é composta de versos que fazem um percurso circular para a esquerda, os dezoito de Reversos são justamente o inverso, a circularidade é para a direita. Conforme Elga Pérez-Laborde (2003, p. 91) mencionou, o autor “esperpentiza a arquitetura textual dos modernistas com poemas grávidos para a esquerda e para a direita”. Enquanto Reversos apresentam uma discussão mais erotizada, de cunho íntimo e interpessoal; aqueles com o título de PER VER SOS possuem uma arguição mais social, dialogando com ideias trabalhadas por poetas do cânone brasileiro e internacional. Muitos dos poemas de REVERSOS rompem com a logicidade frasal, com linearidade do discurso através da linguagem caleidoscópica, isto é, fractal, num processo mais aberto de criação literária e bem provocante ao leitor. Ao dialogarmos com Antonio Miranda pelo correio eletrônico, em 12 de março de 2014, sobre a criação deste poema, ele nos declarou:

Eu “ouço” meus poemas, mesmo quando não são lidos... lembre-se  de que eu fazia poesia para teatro. Neste caso, o poema não pode ser tão lógico-discursivo, tão linear... deve perseguir o raciocínio, mas também a intuição e a atenção do leitor, que precisa defrontar com elementos de persuasão, de agressividade, de confrontação, de sedução, dependendo da situação proposta no poema, para gerar a poesia.

O autor compõe intencionado em captar toda a atenção do leitor e, para isso, o poeta não exaure ideias e técnicas de produção poéticas a fim de atingir suas metas. A ausência lógico-discursiva pontuada condiz com a natureza fractal de Reversos A.  Este poema encadeia palavras, isto é legissignos,  e signos proposicionais, ou seja, dicissignos, para erigir a ideia, não necessariamente com a lineraridade discursiva própria da poesia tradicional, são termos e expressões que remetem, metaforicamente e com toda a diversidade estilística, à ideia central que é absorvida pelos recursos da poesia moderna. Aprofundemo-nos na leitura deste poema para percebermos o que emana destes versos. A linguagem ousada e algumas palavras associadas à natureza de termos de baixo calão designam bem o universo da antipoesia. Da mesma forma, como a ausência de pontuação em algumas estrofes exploram a oralidade bem propícia deste gênero. As rimas internas e sequenciadas deste texto intensificam a sonoridade de cada verso e as palavras enumeradas dão um volume à imagem gerada pela ideia do poema. A quantidade de sílabas poéticas ora maiores ora menores sugere um ritmo alternado, mas sempre crescente estabelecendo uma confluência com a mensagem poética.

A primeira estrofe é introduzida por duas figuras icônicas contidas na mesma proposição sígnica “Sexo um arco-íris”. A possibilidade de incluirmos o verbo ser conjugado na terceira pessoa do presente do indicativo entre os dois primeiros signos da sentença levar-nos-ia a captarmos a presença da elipse, que é sempre marcada pela ausência subentendia de uma ou mais de uma palavra. A percepção deste vocábulo estabelecendo uma comparação entre os elementos desenvolve a iconicidade metafórica e qão sugestiva e plural é a ideia construída de sexo. A imagem do arco-íris não apenas se associa à condição cromática, mas também à sua dimensão grandiosa e circular. Esta se aproxima da estrutura formal do poema e aquela das proporções emocionais geradas pelo ato sexual. O segundo verso exemplifica este estado da amplitude através de uma gradação crescente “posições, contorções, inversões, convulsões”. São signos que dialogam com a gravura que acompanha o poema logo no final do texto. Corpos que se contorcem em posições diversas gerando o prazer sexual. A voz poética sugere esse ápice como também o relaxamento após o ato. Isso vem registrado através da gradação decrescente e, ao mesmo tempo, da figura sintática do assíndoto em “o sexo cresce e entumece, desvanece. Acontece.” Existe uma isotopia de erotismo no poema assaz provocante. A união das palavras designativas desta ação termina gerando a imagem do ato na percepção do intérprete. O signo “todas” intensifica essa ideia com as estruturas “todas cores, todas as nuança, todas posições”. A recorrência deste termo reforça sua condição indexical uma vez que sinaliza os signos que este pronome aponta. Da mesma forma, a repetição do referido pronome desenvolve uma figura icônica, a anáfora.

Contudo, a isotopia que capta esse universo erotizado é confrontada com a a natureza dos contrapontos essenciais ao estilo esperpêntico, como “E no que é, deixa de ser”, “Prazer ou não.” “Objeto, feto”, “Marasmo e orgasmo.”, “Ponto de união”, “extrema-unção”. Poderíamos afirmar que isso seria a isotopia do estilo mirandiano, uma vez que o próprio poeta assume-se como um oxímoro, o que mantém, consoante Elga Pérez-Laborde (2003, p. 91), sempre viva sua capacidade de jogar com os contrários, ou melhor, com as contradições. As paranomásias materializadas nas rimas internas geram uma sonoridade constante que interage com as percepções sensoriais da visão, vomo as cores do arco-íris, e do tato como a extrema-unção. São os diálogos intersemióticos provocando a interpretação do leitor. Verificamos quão contraditório é interligar este universo erótico ao sétimo é último sacramento da Igreja Católica — a extrema-unção. Semanticamente, são contextos que não se aproxima.

Logo após, na segunda, terceira e quarta estâncias, segue-se uma sequência de proposições sígnicas que, por iconicidade metafória, lembram o ato da penetração. Há versos inclusive que se associam imageticamente ao órgão genital masculino. Vejamos quão eroticamente sugestivas são as linhas “É pau, é pão”, “é o fim-da-picada”, “é a força avassaladora da”, “vossoroca”, “é o furor invasor da pororoca”, “é a fortaleza”, “ou a dureza da mandioca”, “é vergasta, é chibata”, “masoquista, vulgata”, “perfurata”. Há toda uma simbolicidade que gera uma iconicidade e isso vai edificando a plasticidade do texto a qual se harmoniza com a mensagem proferida. A voz poética não cessa de elencar signos verbais que anatomicamente se reportem à natureza fálica: “quando a suvela, a manivela”, “quando o ferrolho, o estolho”, “quando a maçaneta”, “— quase disse punheta!”. Percebemos que suvela é um objeto utilizado na perfuração docouro o que é remissivo analogicamente ao ato de penetração e o término do período pelo vocábulo “punheta” associa todos os signos elencados nesta estrofe à genitália masculina. E quando o eu enunciador assevera que esse vocábulo “definitivamente”, “absolutamente, não”, “rima com buceta”, “chupeta”, além de essas palavras rimarem, aproximam-se pelo contexto erótico. “Punheta” e “chupeta” são expressões de baixo calão que se reportam à masturbação. A primeira de forma individual e a segunda através do ato da felação. “Buceta” e “punheta” associam-se ao órgão genital feminino e masculino, respectivamente. É a natureza da antipoesia que se consolida através dos contrapontos, a negação é o reverso da asserção.
 

O poeta dá sequência à enumeração das palavras, intensificando assim a simbolicidade que vai proporcionando a isotopia do erotismo no texto com um vocabulário forte e isso vai principalmente consolidando a linguagem caleidoscópica, fractal, utilizada pelo poeta. Ao indagarmo-lo se palavras como “suvela”, “perfurata”, “acosso” eram neologismo, sobre o que seria “vossoroca” e se o verso “É pau, é pão” intertextetualizaria com o ritmo musical de Antonio Carlos Jobim, ele declarou-se novamente, pelo correio eletrônico, explicando:

          Suvela não é neologismo. Vem de minha memória rural, pois era usada na perfuração do couro... Perfurata existe no uso internacional, de origem latina, e não vejo problema em usá-la, como poderia ter uso “perforata”...Vossoroca é um tipo de erosão profunda... usada no sentido de deslizamento ou destruição de solos. Eu morava no Rio e via muitas nas viagens ao interior. Trabalhei na Embrapa e era um tema recorrente. Mas não me refiro estritamente ao fenômeno natural, uso mais no sentido metafórico e onomatopeico, pois a palavra é forte, contundente... Também apelo para “acosso” no sentido de assédio, afrontamento, de ação violenta. Não é neologismo, mas nunca me preocupo com a etimologia, fico mais no som, no impacto vocal, no efeito que cria no texto... Sem dúvida, “É pau, é pão...” é para lembrar o ritmo da música do Jobim. Tudo isso se encaixa na eufonia de Reversos... ou em seu contrário, na ruptura da harmonia do verso... Fractal é realmente o conceito na construção dos poemas...

O poeta não deixaria de finalizar este seu texto empregando novamente termos fortes e incisivos fechando ciclicamente o caleidoscópio verbal com iconicidades metafóricas como “existem palavrões”, que “são  palavras banais”, “maritirizadas”, “transvertidas de sentido”, e paranomásias propriamente ditas como “óbulo”, “óvulo”. Porém, os melhores termos são aqueles que se reportam à natureza perversa e erotizada do poema: “palavras anormais, demais”, “além do próprio sentido”, “transcententes, melhor:”, “venais”. Conclui-se a mensagem do poema não se afastando da isotopia de erotismo e da organicidade fractal, mas, sobretudo, das distorções esperpênticas que identificam o eu poético.

In: DIAS JUNIOR, Valter Gomes. A poesia de Antonio Miranda e suas intersemioses. João Pessoa, PB: Universidade Federal da Paraíba, Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes, Departamento de Pós-graduação em Letras, 2014.  268 p. Tese de doutorado defendida com Louvor.

PÉREZ-LABORDE, Elga.  “Reflexões paratextuais”.  In: MIRANDA, Antonio.  Per ver sos. Brasília: Editora Thesaurus, 2003.  p.  91-92


 

 

 

 
 
 
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