NO HOSPITAL
Poema de Antonio Miranda
Já passaram por aqui
em desfile
médicos, enfermeiras, técnicos,
nutricionistas, fisioterapeutas,
pessoal da limpeza, eletricistas.
Só faltou a turma do pagodão da Aruc
e do street dance porque não estava na hora deles.
Até um palhaço errou de porta e apareceu.
Ah, e a senhora da Pastoral.
Todos sorrindo como num parque de diversões.
Fizeram as mesmas perguntas, as mesmas anotações,
tiraram sangue, injetaram soro,
me viram por instrumentos.
Já disse o meu nome dez vezes.
Um enfermeiro queria chupar o dedão do meu pé.
A comida sem sal, sem sol.
O médico mostrou o meu pênis para seus alunos.
Olharam no vídeo.
Ficaram satisfeitos, tiraram fotos
e tomaram notas nos cadernos e laptops. Um sucesso!
Meteram uma sonda pelo anus
e aplaudiram emocionados,
as imagens em tempo real
e um pouco de sangue coroou a aula-show.
Faltaram apenas os autógrafos.
Lavaram as mãos com álcool gel
e saíram em fila mais sábios do que nunca.
Evitei fazer caretas.
O médico mostrara que os procedimentos funcionam
e logo
me abandonaram
no escuro do quarto
e me deram uma pastilha para a hipertensão.
Relaxei e dormi.
Diante de mim as pedras
de minha vesícula
num vidro
e nenhum sonho.
Não dou o nome do tranquilizante
porque esta paz é intransferível.
Boa noite.
Brasília, 31/05/2010
COMENTÁRIO
Antonio,
Impressionante tua vocação imaginária. Tua voz poética não cala nem quando estás em crise nem com anestesia. Humor negro e irreverência total até o fim da vigília e o trance para o sonho, que sem dúvida deve produzir mais poemas. Choras e cantas poemas, sonhador de brigas, contras e desgostos, seguro que também de medos e devaneios. Esse deve ser teu credo e também tua salvação! Amigo um abraço e espero te ver logo com a mesma energia de sempre.
Elga Pérez-Laborde. Brasília, quinta-feira, 3 de junho de 2010 19:51:15