MORTOS-VIVOS
Poema de Antonio Miranda
Se é para fazer a vontade
dos deuses, deixa que ela morra
de câncer, que os filhos morram
sem vacina e injeção.
Se é para fazer a vontade
da deusa Natura,
que se morra de fartura,
morte prematura — no ventre
da terra, sem regadio.
Se é para fazer a vontade
do rei, que se morra na guerra
e se enforque, e se enterrem
vivos os inimigos, e se construam
castelos e fortalezas, e fossos.
Se é para fazer a vontade
do juiz, que se enterrem, castrados,
os pecadores, que morram antes
de pecarem, que morram antes
do nascimento e do sofrimento.
Que se morra de viver
e não haja mais, nesta terra,
quem viva de morrer
— mortos-vivos, natimortos,
vívidos, vividos, tortos, idos.
Chácara Irecê, Goiás, 24-11.2008
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