HILÉIA AMAZÔNICA
Poema de Antonio Miranda
Fotos de Juvenildo Barbosa Moreira
“Para vê-la deve renunciar-se
ao propósito de descortiná-la”. EUCLIDES DA CUNHA
I
Céus exacerbados e águas abusivas
numa enormidade desumana.
Horizontes indefinidos, repetitivos
numa perspectiva infinita
mesmada
de mares interiores, vegetais
no discurso monótono das águas
no estrépito uniforme das aves
nas bátegas de chuvas copiosas.
Mares sobre mares diluvianos
terras sobre mares aterrados
de mares e terras em movimento
formando e derruindo ilhas, margens
degredando as vertentes, correntes
corroendo barrancos e aplainando
construindo e reconstruindo
na sedimentação pantanosa
e transfigurando
numa esculturação sediciosa.
Transportando desde os Andes
ao Atlântico e à África
o continente diluído
na direção das Guianas
por fluxos e refluxos e influxos
dos caudais extintos.
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II
Sedimentos, detritos, correntezas
contornos imprecisos, indecisos
de ilhas cambiantes, degradantes
desmoronamentos
refazendo a sua rota líquida
volúvel, por meandros e igapós
inundados, represados
transbordamentos.
Nem a pororoca estanca
e menos reconquista
a força contida, vencida do rio
na batalha final, impossível
mas previsível
com o mar-oceano.
Depositando-se extra-territorialmente
em praias estrangeiras, além mar
na costa leste americana
em outro hemisfério
na “imigração telúrica”
-tese euclidiana:
“um território em marcha,
mudando-se pelos tempos adiante”.
III
O homem errante, nômade
como o rio provisório e ermo
como o pássaro arribante.
Na fervura equatorial de seus humores
a umidade oxida e degrada
inexoravelmente
e excita as flores e os animais
na luxúria promíscua
de seus afrodisíacos
odores.
Antonio Miranda no encontro das águas dos rios Solimões e Negro que formam o Rio Amazonas. |
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