MOTIVO
Poema de Antonio Miranda
Chuva
cheiro quente da terra,
sol
pousando nas poças de agora.
Chuvas de Recife
sol ardente em Jequié
brilham olhos choram
na criança sem pão
pisando poças da agora.
Reflete a poça um céu injusto e mau
céu dos homens que esperam
prometem e esperam
a salvação divina:
sola dos pés inseguros
espraia a poça a criança.
Porque a fome é de graça
no Nordeste,
seja ela uma oferta divina
ou imposta pelos homens.
Porque racham os pés
como racha a terra
à ausência de chuvas:
quando a morte é contingência
o latifúndio assa os ossos
do colono e cerca
com eles sua propriedade.
Para o nordestino
a morte é prioritária
vem mesmo domingo
e nunca falha:
vem subnutrindo.
Recife, 02.02.1963
Ilustração gerada por IA, por
Nildo Moreira, em 2025.
|