JANE RIBEIRO LISBÔA
Nasceu em Aracaju em 30 de setembro de 1950. Fez o mestrado na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro e inicia sua carreira docente na Universidade Federal de Sergipe.
Livro de poesia: Além do Vitral (1994).
FULô
Fulô é mulher moderna
trabalha por todo o dia.
De manhã cozinha e varre
a casa do seu Sinhô.
Bela Fulô! Bela Fulô!
De tarde cultiva um ócio
lava, passa, faz a ceia.
À noite perfuma a roupa
e é toda do Sinhô.
Bela Fulô! Bela Fulô!
Fulô deu de encrencar
abandonou o tricô
matriculou-se no inglês
aborreceu o Sinhô.
Essa Fulô! Essa Fulô!
Aderiu aos congelados
contratou uma diarista
inventou de estudar
no horário do Sinhô.
Ah, Fulô! Ah, Fulô!
Fulô é mulher moderna
já tem o grau de doutor
trabalha por todo o dia
e despediu o Sinhô.
Ah, Fulô! Ah, Fulô!
ROSÁLIA
Quando Rosália enlouqueceu,
Ninguém quis acreditar...
Via um José no céu,
Via um José no mar.
No sonho em que se perdeu,
Ninguém a pôde salvar...
Queria o José do céu,
Queria o José do mar.
Até que um dia os dois
Se fundiram no luar...
E Rosália encabulada,
Foi vestir o penhoar.
ESPONSAIS
Ama o poeta devagar.
Saboreia o sumo no ardor da sede.
Ronda o raso, o rio, vertentes.
Ama o poeta o vagar da língua
ao explorar o céu antes da boca
ao degustar estrelas
antes do céu.
Da afoiteza da juventude
não lhe restam travos nem travas.
Tem a certeza do corpo único
par e ímpar
aberto em gomos e gumes
mais secretos.
O poeta olha-o e olha devagar
cada curva, cada fresta
que explorou no sonho
e já não precisa sonhar.
Aprendeu com tantos a indefinição das rotas
o cio das correntes, o esgarçar dos ventos...
Curva-se aragem sobre a terra quente.
Ama o poeta devagar
(tão devagarmente!)
o texto reclinado nos lençóis da mente!
Na seda pele, palmo a palma,
adensa o denso
até fazê-lo concha na própria mão.
Ama o poeta elastecer o instante.
Na plenitude do gozo sobrevoa o ninho
gemendo harpas e cítaras devagarinho.
Página publicada em janeiro de 2020
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