SIDNEY DE PAULA OLIVEIRA
Sidney é paulistano (de São Paulo, Brasil). Advogado, formado pela
Faculdade de Direito da Universidade MacKenzie em 1996. É também Coordenador da Comissão de Direitos Humanos da 181ª. Subsecção da Ordem dos Advogados do Brasil
CADERNOS NEGROS. Volume 23. Poemas Afro-Brasileiros. Organizadores: Esmeralda Ribeiro e Márcio Barbosa. Capa: Foto J.C. Santos. São Paulo: Quilombhoje, 2000. 120 p. 14 x 21 cm.
ISBN 85-87138-02-2 Inclui os poetas: Cristiane Sobral, Cuti, Elivelto Corrêa, Esmeralda Ribeiro, Fausto Antonio, Jamu Minka. Jonatas Conceição, José Carlos Limeira, Landé Onewale, Sidney de Paula Oliveira e Therezinha Tadeu.
Ex. bibl. Antonio Miranda.
NO PAÍS DO FUTEBOL TEM MUITO CRACK
“ontem à noite eu o vi
na beira do asfalto
tragando a morte
soprando a vida pro alto”.
(Brown – Racionais MV´s)
Zoza, de bola, um craque
Bate, joga, chuta. Bola dentro
Zoza de cola ao crack
Apanha, reluta. Bola fora
Zoza último baque
Não mais gols
Não mais ataques
Zoza craque... crack
Último cardíaco ataque
Viaja sempre, viajou...
O óbvio — o óbito
Zoza foi a céu
Em terra — enterro...
SÍNTESE
Ouvi tambores
Temores venci
Ignorei rumores
Dores absorvi
Superei rancores
Dissabores relevei
Digeri amargores
Calores irradiei
Entoei clamores
Amores exaltei
Degustei sabores
Censores assimilei
Combati feitores
Valores descobri
Presenciei horrores
Ardores pressenti
Tomado por sonhos avassaladores
Em negro sintetizei todas as cores
EXALTAÇÃO À NEGRA MULHER GUERREIRA
exalto quem sempre se rebelou contra a servidão
de modo sutil ou hostil repeliu a humilhação
quem foi violada em sua integridade
e não se deixou macular
soluçou, engoliu em seco
permitindo à sua prole aqui estar
carregou altiva o peso do fardo
de por vezes ter em seu ventre
— mas maternalmente acolher — filhos bastardos
quem fez do seu corpo trincheira
amotinou-se em cortiços, cozinhas
sozinha ou em fileiras
exalto quem com dificuldades
concebeu, gerou, amamentou
desprezada e abandonada
por seus entes zelou
quem mais sofre em virtude de gênero e raça
ainda tem chagas doloridas, abertas
mesmo se livrando da mordaça
exalto a rebelião
contra a hipocrisia de seus pares
que têm discurso engajado, ideológico,
mas são machistas e sexistas
violentos na intimidade de seus lares
exalto a negra manhã tarde noite madrugada
que sempre acolheu e entendeu
pais filhos parceiros embriagados
sacrifício: quádrupla jornada
exalto o trabalho e o sangue derramado
o pranto e o encanto: lágrimas distintas
o suor estampado na pele retinta
quem é solícita sem ser submissa
quem hoje cobra, exige, clama por justiça
quem é depositária do legado africano
um ser a quem foi negado
a básica condição de humano
exalto a mulher mãe irmã avó negra forte guerreira
por ter sobrevivido e suportado
superado sem vacilar, sem dar bandeira
Página publicada em abril de 2020
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