SÉRGIO LIMA
Nascido na cidade de Pirassununga, SP, em 1939 é poeta, ensaísta e artista plástico. Militante da subversão e da afirmação do surrealismo, participou do Grupo Surrealista de Paris a convite de André Breton, permanecendo na capital francesa nos anos de 1961 a 1962.
Fundador do Grupo Surrealista de São Paulo em sua primeira aparição (1965-1969), e da segunda (1991-1999), a partir de 2005 passa a reunir-se mensalmente com integrantes do extinto grupo deCollage e com ativistas independentes do surrealismo, vindo então a formar o que hoje consolida-se como o Grupo Surrealista de São Paulo em sua terceira aparição.
Foi editor da Revista surrealista Phala, em 1967 e o é da Quimera que Passa, publicação do atual Grupo Surrealista de São Paulo.
Obra poética: Amare. Edição Massao Ohno. SãoPaulo, 1963; A festa (deitada). Edições Quíron. São Paulo, 1976; A alta licenciosidade. Edição do Autor. São Paulo, 1985.
Aluvião Rei. & etc Editores. Lisboa, 1992.
POEMAS ESCOLHIDOS DE SÉRGIO LIMA
De
MARTINS, Floriano. O começo da busca; o Surrealismo na poesia da América Latina. São Paulo: Escrituras, 2001. 287 p. (Col. Ensaios
Transversais, 13)
A anunciação de fogo
você é a anunciação sua pessoa carrega urna
aura que me envolve em um prazer infinito
você é a anunciação seu corpo produz em
meu cérebro pensamentos chamejantes meus
olhos congestionados fecham-se doloridos
seu leito de origem é a cachoeira congelada que
resplandece em todos seus estiletes noturnamente
você se levanta da crisálida subterrânea de algas
em brasa aparecendo na extremidade do lago
de seu corpo-fogo em meia obscuridade esguicham
cintilações você avança arrastando sua longa
capa inflamável
e dança na superfície de vidro a cada salto
suas pegadas transformam-se em fogueiras
perenes
adianto-me febril ataco as muralhas de vidro do
castelo incendiado com mil lanças de diamante
seus cabelos incendiários são inquebráveis à noite
seu corpo está completamente em brasa
seu perfil fosforescente aproxima-se e se esgueirando
tenta embutir as mamibras em minhas
espáduas que (ficaram extremamente sensíveis
após a extração das duas asas de farta
penugem) contraem-se produzindo um longo
arrepio
em uma alcova completamente negra você entra
com seu véu de sangue terei finalmente seus
aquáticos lábios de rainha
você traz a anunciação de fogo ao vê-la entro em
transe e experimento o delírio do amor sublime
Despatalada
as sombras das bananeiras
curvavam o meu ser de pensamentos
moles como as mais vermelhas
manhãs cacheadas de lábios
abertos e entreabertos
ao meu redor
enquanto te despias e caías
acompanhando a queda fatal
de tuas roupas despregadas
nos meus olhos
de noite
de tempestade
e atrás de ti vinham as feras de esmaltes
silenciosamente ondulantes em teu brasão louro
que se denunciavam nos teus pulsos régios
aprisionados por tuas unhas
curvas, querida
e os teus seios pousavam em minha cabeça
enquanto as tuas coxas davam a volta
vindo se deitar em minhas costas de iguano de cristal
o meu rosto e a antiguidade do assento
das profecias sagradas
e as plumagens alisadas pelos teus próprios lábios
pálidos
as tuas olheiras belas belas
inesquecíveis como a suave textura oleosa e mágica
da larga folha de bananeira das sombras
Eu sou
seios de açúcar, seios de sal
seios de cacau
as redes sórdidas e os véus rasgados
franjas dilaceradas suor fumo
que se unem formando
os dedos negros do ex-voto
Macau
bambual os delírios
La vénus en laine
a grande tecedora de fios
de lãs do entardecer
de lãs dos corpos
da lãs das margens
das lãs trazidas pelos ventos e pelos céus
das lãs das ovelhas perdidas
das lãs das flores de algodão abertas
das lãs das pubes e das axilas
das lãs dos montes e dos céus
das lãs tecidas e macias
em suas pernas arredondadas
e que se juntam
em uma lã mais escura e bordada à mão
a grande tecedora de lãs
que fia o seu olhar de mel
Página publicada em dezembro de 2010 |