ROLANDO ROQUE DA SILVA
SILVA, Rolando Roque da. A Ilha. Ilustrações de Virginia Artigas. São Paulo: Editora “Jornal dos Livros”, 1957. 45 p. 21x28 cm. Col. A.M. (LA)
“Visto por esse ângulo, o poema A ILHA, de Rolando Roque da Silva, é, antes de tudo, um poema alicerçado num grande tema. O poeta não canta uma ilha qualquer, perdida num horizonte de brumas e de sonhos. Nem descreve uma ilha idílica como as que incendiavam a imaginação dos antigos
navegantes, ou uma ilha falsa como a que deu a Sancho a ilusão do poder. Em seu poema Rolando Roque da Silva conta poeticamente a história de Fernando de Noronha, dessa ilha «nunca assaz infortunada» que, através dos séculos, foi sucessivamente couto de piratas, simples porto de refresco e escala, quartel e fortaleza, lugar de degredo, presídio político, base aérea, mas, infortunada ou feliz, foi sempre sempre parte integrante do imenso território que nós brasileiros fundimos em pátria e nação.” (...)
“No canto VI — Clamor — a poesia de Rolando Roque da Silva ressoa em uníssono com milhões de vozes de indignação e revolta. Nesse canto a cadência do verso se acelera e o seu tom se alteia ao influxo dos protestos que partem de todos os recantos do pais. O poeta tem ouvido para ouvi-los. E' o simples murmúrio no começo que logo irá transformar-se em avalancha. E' o coro que unifica o que estava desunido. E' o clamor que deterá o inimigo e o lançará de novo ao mar, como fizemos aos flibusteiros de antanho, como fizemos ao invasor holandês. Ao atingir as estrofes finais, o poema, pela força de seu conteúdo, transforma-se num brado de luta.”
ARTUR NEVES
-VI-
CLAMOR
NÃO é clamor no começo.
Talvez apenas murmúrio,
cauteloso, meio vago,
mas vem dos quatro quadrantes,
gira na Rosa dos Ventos,
pouco a pouco se avoluma,
ganha as fábricas e as ruas,
ganha os morros e as casernas,
ganha as praças das cidades,
ganha as praias, ganha os campos,
os barcos surtos nos portos
e os que seguem no mar alto, '
ganha os vales, ganha os rios,
ganha as vilas sonolentas
despertando-as da modorra;
ganha os mortos, ganha os vivos,
funde o passado ao presente;
e unificando o protesto
une o que está desunido,
dá sentido ao que não tinha.
Já clamor tonitruante,
ganha os povos, ganha o mundo.
Clamor? Direi — avalancha.
Detida a força de Creso,
ganha a Ilha para os homens,
ganha os homens para a vida
. -VII -
PERORAÇÃO
SERÁS um dia a Ilha afortunada.
Longe estarão as horas que te afligem.
O Amor se anunciará nos teus redutos.
Os peixes voltarão à sua origem
e às mesas de onde estavam exilados.
Os teus canhões, afeitos ao silêncio,
se aquietarão em sonhos de ferrugem.
Recolherás os náufragos e os barcos
ao sossego dos teus ancoradouros.
Os séculos inglórios que se apaguem.
Unicamente os mitos sobrevivam
para entreter os hóspedes insones
nos teus serões de vagas e de ventos.
Paz nos confins em que te- encontras, Ilha!
Paz no universo a que pertences, Ilha!
Página publicada em outubro de 2013
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