PAULO EIRÓ
Paulo Emilio de Sales Chagas Eiró (Santo Amaro, 15 de abril de 1836 — 27 de junho de 1871) foi um poeta e dramaturgo brasileiro.[1]
Nasceu em 1836 e faleceu em 1871, sendo um prodígio para sua época. Algumas fontes reporta que Eiró, assim como muitos poetas do século XIX tinha uma musa inspiradora, um amor escondido e impossível. Amou sua prima desde pequeno e a teve como musa. Filho de um professor apelidado de “Chico Doce” também tomou apreço pela profissão já aos dezenove anos e construiu um teatrinho para a vizinhança santamarense. Eram concorridos os papéis para suas peças cômicas onde também atuou. Das tantas tentativas em impressionar sua musa, nada adiantou, pois ao voltar de uma de suas longas e exaustivas viagens pelos estados brasileiros vizinhos, presencia sem querer a celebração de casamento da musa platônica. A partir desse fato, foi que Paulo sucumbiu à falta de lucidez e sua sanidade já não lhe servia como amiga. Nesse período em que procura saídas para sua dor, tenta cursar Direito na Faculdade São Francisco, recebe até certo reconhecimento pela beleza de seus versos, mas abandona o curso devido a problemas de saúde. Tenta ainda o seminário, mas era um ser curioso, dotado de questionamentos humanos e libertários. Sendo assim, um dos padres ordena que queime grande parte de sua maior riqueza, as poesias revolucionárias. O escritor Henrique L. Alves acrescenta: “O poeta viveu perseguido pelo desleixo, mergulhado no esquecimento, tanto em vida quanto na morte".
Fonte: wikipedia
As crises tornaram-se frequentes e em 1866 a família o internou no Hospício dos Alienados, onde veio a falecer.
FATALIDADE
Que vista! O sangue se afervora e escalda!
Por que impulso fatal fui hoje à Igreja ?
Quer meu destino que, ao entrar, lá veja
Noiva gentil de cândida grinalda.
Nos olhos sem iguais, cor de esmeralda,
Lume de estrelas, plácido lampeja:
Seu branco seio de ventura arqueja;
Louros cabelos rolam-lhe da espalda.
Hora de perdição! Sim adorei-a;
Não tive horror, não tive sequer medo
De cobiçar uma mulher alheia.
Unem as mãos; o órgão reboa ledo;
Em alvas espirais, o incenso ondeia...
E eu só, longe do altar, choro em segredo!
PIRILAMPO
Pirilampo vagabundo,
Almenara do verão,
És como a chama encoberta
De um sensível coração:
Às vezes, do horror das trevas
Rompe súbito clarão.
Se na guaxima orvalhada
Reluzes, pequeno inseto,
Se, cortando manso os ares,
Te dependuras de um teto,
Quem a teu medroso brilho
Consagra um pouco de afeto?
Mas, se a noite fosse clara,
De que valia teu dote?
Não foste acaso criado
Para ser aéreo archote?
Deixa, pois, que o fogo humilde
Do seio da noite brote!
Silêncio também, mancebo,
Que tens da lira o condão!
Sufoca a febre insensata
Que te lavra o coração.
Quanto mais profunda a noite,
Maior será teu clarão.
O SOBRADO
Do céu à luz decadente
Contemplai esse sobrado
Que na face do presente
Lança o escárnio do passado:
Seu vulto negro ali está,
Nas trevas nódoa mais densa
Como sacrílega ofensa
Em alma perdida já.
Ei-lo! É no térreo degredo
Moço poeta a cismar,
Imóvel, como o penedo
Que escuta as vozes do mar.
Ei-lo aí! Dilacerado
Livro que o aquilão abriu,
E os segredos do passado
Aos meus olhos descobriu.
Esse teto quantos sonhos
Não abrigou de ventura!
Ai! quantos votos risonhos
Hoje o vento inda murmura!
Tristeza aqui não sentis?
Nestas lôbregas paredes
Tocante história não ledes
De alguma época feliz?
Apagou-lhe os caracteres
O tempo no andar veloz,
Imagem desses prazeres
Que deixam remorso após.
Passaste, oh quadra de amores,
Como o fumo em espiral,
E, perdendo tuas flores,
Secaste, pobre rosal.
Como em uma alma abatida
Por paterna maldição,
No que foi templo de vida
Hoje impera a solidão.
Aqui, a lira inquieta
Furta-se aos cantos de amor,
Embarga a voz do poeta
Um acréscimo de dor.
O homem sonha monumentos
E só ruínas semeia,
Para pousada dos ventos;
Como os palácios de areia
Dos seus brincos infantis,
Mal divisa o que apetece,
Que tudo se desvanece…
Feliz quem amou! Feliz!
VINGANÇA
Desejaste, infeliz, que fosse a terra
Leilão em que apreçasses teu pudor;
Preferiste a opulência a um nome puro,
E requebros a amor.
Fizeste muito bem! Corre, ali passa
O mundo, vai pedir-lhe um grão de incenso;
Sorrindo, abre-lhe as mãos, delas arranca
Salário que não venço.
Punir-te saberei! Alma como… outras,
Crês talvez que, importuno, vou seguir
Teus passos, e da ofensa, do desprezo
O fel retribuir.
O bardo não se vinga por tal modo,
Nem te quer ao teu ídolo arrancar.
Adeus! Que a tua sombra jamais venha
Meu coração tentar.
Não me quiseste partilhar a vida,
Pois vai-te, vende a tua mocidade:
Sozinho morrerei, mas de meus louros
Não terás a metade.
Íntima voz que imperiosa brada
Não é voz fraudulenta e transitória;
Não! Nem sempre hás de tu, minha alma, embalde
Suspirar pela glória.
O futuro entrelaça-me a coroa
Que cinge do poeta a fronte ardente,
Palma que a morte, respeitando, torna
Mais verde e florescente.
Morra tua lembrança! Que meu canto
Não diga o que meu coração não diz,
Nem se veja o teu nome a par dos nomes
De Laura e Beatriz.
Esquecimento, eterno esquecimento
Te corroa a existência amargurada!
No mundo o vilipêndio, e, no jazigo,
Poeira desprezada.
Página publicada em novembro de 2016
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