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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Foto: http://colinaspaulo.blogspot.com.br/

 

 

 

PAULO COLINA

 

poeta, escritor, teatrólogo, tradutor e militante

 

 

Nasceu a 9 de março de 1950, em Colina (SP). Publicou Fogo Cruzado (Contos), Edições Populares (SP), 1980; Plano de Voo (Poesia), Roswitha Kempf /Editores, São Paulo, 1984. Traduziu, com Masuo Yamaki, Tankas, de Takuboku Ishikawa, Roswitha Kempf/Editores, São Paulo, 1985 (1ª. Edição), 1986 (2ª. Edição). Participou das coletâneas Cadernos Negros 2 (Contos) e 3 (Poesia), Edição dos Autores, São Paulo, 1979 e 1980. Organizou e participou de Axé — Antologia Contemporânea da Poesia Negra Brasileira, Global Editora, São Paulo, 1982.  Prêmio APCA — Associação Paulista de Críticos de Artes — de literatura: Melhor Livro de Poesia do Ano. Em teatro, tem inédito Entre Dentes (Drama para negros em um ato). Foi diretor da União Brasileira de Escritores.

 

 

FORJA

 

entre uma calmaria

          e outra

do mar de nossas peles

me bastaria amor cantar o fogo

que somos na nascente

          de suas coxas

 

mas há essa dor de outros tempos

e corpos

essa rosa dos ventos sem norte

na memória sitiada da noite

 

embora o gesto possa ser

no mais todo ternura

o poema continua um quilombo

          no coração

 

 

 

PLENITUDE

 

embora só

vagueio tranquilo

senhor de todas as tormentas

enquanto saboreio teu batom

 

 

 

CORPO A CORPO

 

a vida é uma horda bárbara

de sentimentos

 

as noites tentam desde o princípio

          de tudo

a derrubada de estigmas primários

 

o cotidiano tem sempre à mão

um repertório de sambas e blues

 

o papel branco vive me jogando

desafios na cara

 

ser marginal todavia

só interessa à paixão

 

bastaria ao poema apenas

a cor da minha pele?

 

 

FRONTEIRAS

 

sei das fronteiras

          que a mim traçaram

desconheço contudo qualquer porta

que a noite não pede licença

que a pele é surda

          e grita

 

sei da solidão que pudessem

          os fracos

sempre a mim legariam

e paciente tocaio afetos

          no momento desatento

 

ignorar porém quisera

que um beijo igualmente dilacera

que um beijo igualmente dói

 

****

 

(De:  Plano de voo, 1984):

 

 

       IMAGENS

 

       Agora, eu
não deveria estar aqui
plantando ante a agonia
de meu saber sombra e carne
tentando
mágico frustrado
retirar dum corpo meu ser inteiro.

Eu
não deveria tentar
aqui, agora,
montar o interminável
quebra-cabeças
que sou.
Lágrimas sempre atrapalham.

      

 

 

 

 

       PEQUENA BALADA INSURGENTE

Não há temores:   
há o temor,
o medo puro e simples de que no amanhã
(o tal sem rédeas, sem fuso horário)
essas palavras incendiadas
em meio à madrugada,
essas palavras amordaçadas
a força de covardes ameaças postadas,
de placas impunes que cantam pneus
em meio à madrugada,
essas palavras amordaçadas
a força de covardes ameaças postadas,
de placas impunes que cantam pneus
em meio dia
(cheio de compromissos, como sempre)
ou a tarde
(tão cansada!)
invadem, anômalas,
comandadas por um súcia de merda,
nossas janelas
ou lacrem nossas portas
ao raia da incerteza.

Não há rancor nem ódio:
há esse clamor surdo
que rebenta em meu coração,
face a tantas bocas subterrâneas,
face a tanto cuidar de telenovelas,
samba e futebol.
Até quando nossos filhos poderão
continuar a soltar pipas,
a rolar juntos,
todos juntos,
na terra, cimento
na grama, na lama,
brincando de serem irmãos?

Não há rancor nem ódio:
há apenas esse clamor surdo
que rebenta em meu coração
ante nossas mãos inúteis
que sustentam essa alegoria
crua
de senzala favela e sarjeta.

Há meia-lua, meia-dose,
meia-hora, meio-fio,
não meia foda.

A se decidir.
Há que se decidir, senhores,
pois mesmo entre as noturnas sombras
desse imenso véu,
as asas negras de meu nariz
continuarão insistindo em ganhar
o espaço aberto dos céus.


 

 

 

Página publicada em setembro de 2014


 

 

 
 
 
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