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ORLANDO PAROLINI
(1936-1991)
Dramaturgo e Poeta, em Jaú, Estado de São Paulo, Brasil, em 28 de setembro de 1929 e morreu em 21 de agosto de 1992. Formado em Letras Clássicas pela Universidade de São Paulo – USP.
Estreou como poeta em 1963 como O gerifalto, e em 1979 publicou O gerifalto primus et secundus. Em 1988 lançou (1936-1991) Vênus no telhado.
POESIA.BR 1960. Org. Sérgio Cohn. Rio de Janeiro: Beco do Azougue, 2012. 150 p. 13,5 x 17,5 cm. Capa: Tiago Gonçalves., ISBN 978-85- 7920-113-4 Caixa contendo 10 Livros de uma antologia de poesia brasileira. Ex. bibl. Antonio Miranda.
Poemas do pequeno assassino
1
se fora pássaro
a arma pousando em tua mão
já não sabemos
pequeno filho deste silêncio
agora os retrozes do teu enredo
se enovelam
e nós o golpe aguardamos
na submissão da hora
— vem, anjo, com teus punhais
de sol e sal e fogo
os olhos nos apague com brilhantes
o crime nos perdoe
de sangue derramar
e não compreendermos
a inocência do teu gesto
2
inconclusa
a flor de teu silêncio
em nós se manifesta podridão
— onde o corpo repousar, amigo,
cicatrizar os golpes de outros tempos
já não chegados?
perdida perdidamente
por não sabermos um grito sufocar
— anjo, nos aniquilaste
3
príncipe
fel esponja aço lâmina cravada
na carne o cerne
alma devorada
quem de ferro lágrimas colheu
agora sempre
no retrato ao lado
sorrirá contigo
purpúreo infante de desejar-se
ah, punhal de plumas
em nós queimando
punhal de gelo
em nós ferindo
sete golpes coração aberto
irreversíveis
as mão pousando
em teu semblante
4
(temos fé no veneno — Rimbaud)
degolados
sob as rodas do velocípede
pueril ancestral
a fronte repousamos
doce amargo sono
nas asas suportarás
para o final momento
de a profundeza descermos
em teu seguir-te
rebanho oculto imemorial
— pequeno pai
a arma esqueça por enquanto
fatal o golpe
não dilacere esta visão
de contemplar-te
veneno após veneno
5 ( 13/5/1063)
de sangue
sangue e sangue
em ti nos diluímos
punhal de trevas
em nós matando
escuridão de luz
faca
aço pássaro imperial
sobre a cabeça
permanecem
de nossos filhos
as tuas asas
de sol de sal
não temos lágrimas
para o rasgar-se
própria lâmina
cego o olho
quebrado o braço
de muletas
rumo à perdição
e nos conduzes,
criança
embora o tempo
retardado
a memória esmague
do momento
6 (9/1/1964)
na mão a arma de revólver ou faca
simples vil metal de bronze
ou brasa
dilacerando
— se não souberas, Príncipe,
se não sentiras
se não mataras
se apagar não foras
com tuas luvas
de argamassa o corpo
entenderíamos
náufragos de agora
de ontem fomos o esperado
e regressaste
na face a cicatriz de um golpe
recusado
7 (11/1/1964)
ao pranto caminharemos
porque não tarda
o mesmo gesto de esquecer
outrora
— ó anjo
do mal do bem
o sacrifício de cantar
gregoriano canto chão deste murmúrio
nós suportamos
e lágrimas se não choradas
quando em fogo se abriram flores
que apenas eram tuas mãos
mas desprezamos o instante amável
de o crime aceitar
e regressaste levando a noite
no revólver
anunciado sangue nas malhas do pulôver
8 (12/1/1964)
tu sempre em regressando
caminho inútil fim
de pedras amordaçado
em nós permanecendo
do que fora ontem,
agora desconhecemos
se grito ou voz
nas taças recolheram
de bronze repousando
— todo anjo é terrível —
e não soubemos a carne oferecer
ao teu aceno
olhos cegando nos conduziste
ao impossível
9 (14/1/1964)
porque na sala escura
desabrochando em flores revelando
os gestos desconhecemos do desejar-se
nos abandonaste
amargas solitudes
nada resta
é nos propício por enquanto
esperar do lado oposto surgir
sol de cataclismas nos redimindo
que mero grito nós sabemos ser em vão
e prosseguimos este esforço do rastro encontrar
por ti não outorgando
— criança, envelhecemos
mata-nos agora
aos pés de cristais areias movediças
nos arrojamos
olhos ofertando para o cegar-se
na memória reinarás
do que fomos
não compreendemos
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No livro aparece um segundo poema do autor — A perdição —
que recomendamos para quem adquirir o livro.
Página publicada em abril de 2020
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