GUILHERME ZARVOS
(São Paulo, 13 de Março de 1957) é escritor, poeta, produtor cultural, professor, cientista social e economista. É figura central e aglutinadora da poesia carioca desde 1990 através, principalmente, de sua atuação no evento CEP 20.000 (Centro de Experimentação Poética), por onde escoou, desde então, grande parte da produção artística do Rio de Janeiro.
Doutor em Letras pela PUC - RJ, publicou os livros Beijo na Poeira em 1990, Nacos de Carne, Ensaio de Povo Novo, Mais Tragédia Burguesa, Morrer e Zombar. Dirigiu a coleção "Século XXI", série de livretos de poesia lançada pelo CEP 20.000, o inventário CEP 20.000 - Dez Anos, o CD CEP 20.000, lançado pela revista Trip, e ainda a coletânea
CEPensamento.
Participa ativamente do movimento cultural e poético brasileiro, tendo levado o evento CEP 20.000 da Zona Sul do Rio de Janeiro para Fortaleza, Ouro Preto, São Gonçalo, Rocinha, e Buenos Aires, entre outros. Ao lado do poeta Chacal, é o fundador do CEP 20.000, fixado no Espaço Cultural Sérgio Porto, no Rio de Janeiro. O evento nasceu de outro evento criado por ele mesmo, chamado Terças Feiras Poéticas, que reuniu nomes como Ferreira Gullar, João Cabral de Mello Neto e Heloisa Buarque de Holanda. Pelo evento já passaram nomes como Michel Melamed, Jorge Mautner, Caetano, Viviane Mosé, Ericsson Pires, Pedro Rocha, Guilherme Levi, Márcio-André, Mano Melo, Rod Britto, Vitor Paiva, Tavinho Paes, André Dahmer, Boato, Planet Hemp, Bê Negão, Pedro Luís, Bianca Ramoneda, entre outros. Fonte: Wikipedia
De
Guilherme Zarvos
GUILHERME ZARVOS / POR RENATO REZENDE
Rio de Janeiro: EdUERJ, 2010; 80 P
(Coleção Ciranda de Poesia) ISBN 978-85-7511-186-4
Pra lá dos 70
Envelhecendo com dignidade, convivendo com as
Doenças, seja a diabete, que deixa minhas pernas
Negras, o coração de mudanças de ritmo e de
[humor,
O pulmão com água. Envelhecendo e esperando a
Morte. Sem revolta. Comendo de tudo. Tudo é
Proibido. Sonhando com viagens que não posso
Executar. O médico manda exames, às vezes os
Faço, às vezes nem envio de volta: ficam no armário
Canetas, relógios, fotos da família, contas já pagas e
Várias pílulas, todas as cores, chego a tomar 17 ou
Mais por dia. Se estou com raiva não olho a
Prescrição. Esqueço. O que mais pode me acontecer
Morrer? Já nem sei o que é isto. Estou tão próximo
Da morte que ela já nem existe. Estou dentro do
Enlace da morte. Eu quero é que se foda. Desculpem-[me.
Envelheço com dignidade.
Morrer, 2002
Thomaz, o irlandês ou As you like it
Lua cheia que é hóstia
me perdoe porque apanhei
de me agachar no chão protegendo
a cabeça e meu pai com os punhos
cerrados golpeava-me gritando que
eu nunca seria nada e que ser
viado é punição de Deus e
aos dez anos eu já não chorava
mas doía tudo nessas sessões que
se não eram mensais pouco
mais se alargavam. E minha
mãe nunca estava presente e quando
retomava enquanto me passava
algum remédio dizia que desta
vez ele havia exagerado e que
eu exagerava no choro e eu não
estava chorando. Já sabia aos 10 que era
diferente, e os garotos mais velhos me
enrabavam dizendo que eu parecia
uma mulher. Me compravam até
algum presente, mas na frente dos
amigos, nem me olhavam, já que eu
parecia uma mulher e na cama en-
quanto me enrabavam repetiam que
eu parecia uma mulher. Todos eles
estão casados, e filhos, no máximo
me dão oi e querem esquecer que algum
dia me acharam parecido com uma mulher.
Thomaz tem raiva de seu nome de apóstolo, fuma aos dez, se
droga aos 12, cadeia aos 15 anos aos 18 hospital aos 20 sai de
Nova York, deixa para trás seus amigos pirados, a roupa punk das
centenas de brigas e só carrega a mágoa de que ainda se
acha parecido com uma mulher. Thomaz é o mais duro dos
rapazes de sua área. É um terror com a faca na mão.
Thomaz em São Francisco tem vida de puto. Vive do
que recebe em favores. Se for necessário troca suas roupas
de punk e veste-se de mulher. Thomaz tem 22 anos e
está perto da morte. Thomaz se injeta.
Mais tragédia burguesa, 1998.
TEXTOS EN ESPAÑOL - TEXTOS EM PORTUGUÊS
6 POETAS DE ARGENTINA & 6 POETAS DE BRASIL. Selección y prólogo; Teresa Arijón y Camila Do Valle. Traducción: Teresa Arijón. Buenos Aires: Bajo La Luna: 2011. 192 p. 20x13 cm. Incluye los poetas: (Argentina) Mariano Blatt, Oswaldo Bossi, Cucurto, Javier Foiguet, Alejandro Rubio, José Villa/ (Brasil) Edimilson, Eduardo Jorge, Guilherme Zarvos, Renato Rezende, Ricardo Aleixo, Sérgio Bazar David. ISBN 978-987-9107-88-8. Ex. bibl. Antonio Miranda
VERDE
Si muero mañana que se salve la poesía o que me salve la poesía y no estaré muerto mañana. Mi voz y las letras -el preciso encaje de las palabras- que dan sentido y, en la búsqueda, el encuentro de lo que es estético ético de lo que es síntoma. No vagué por este mundo loco sin ton ni son, aunque es bueno vagabundear. Vagabundeé. Si sobre la mesa mantel de cáñamo y vaso dejé vagar pensamientos y
olor y sabor: cómo me gustas. Y busqué ayudar a otros vagabundos, en precisión mayor que la mía, porque en la camaradería hay retorno. Soy de un grupo de simiente vándala, de derramante corazón. Asumido vagabundo. Siento que me haces falta. Y allá se van años y gente de todas las vidas. Vi vender a peso de oro copeques sin valor. Me dejaron atrás con una sonrisa vaga. Era ventaja. Viendo la sonrisa vaga de quien vendía. No soy víctima. Y cada cosa con su sentido: amo ser humano que se aventura... con todo viene ahora el cansancio del vago, ventrílocuos, vociferación. Ya siento sueño en la
mitad del camino. Este teatro lo vi ayer. Y no es que valga apenas lo versado. Pero la vejez va llegando y despacio cedo al vigor del viento. Continúo amando lo que es verde—verte voy yIendo a ver.
VERDE
Se eu morrer amanhã que se salve a poesia ou que me salve a poesia e não estarei morto amanhã. Minha voz e as letras - como é preciso o encaixe das palavras — que dão sentido e, na busca, o encontro do que é estético ético do que é sintonia. Não vaguei neste mundo besta à toa, se bem que é bom vadiar. Vadiei. Se lia volta da mesa toalha de cânhamo e vaso deixei vagar pensamentos e cheiro e sabor: como gosto de você. E procurei ajudar outros vadios, em precisão maior que a minha, pois há retorno na camaradagem. Sou de um grupo de semente vândala, de esparramante coração. Assumido vagabundo. Sinto falta de você. E lá se vão anos agente de todas as vidas. Vi venderem a peso de ouro copeques sem valor. Fui passado para trás com um sorriso vago. Era vantagem. Vendo o sorriso vago de quem vendia. Não sou vítima. E cada disso com sentido: eu amo ser humano que se aventura—contudo vem agora canseira do vago, ventrílocos, vociferação. Já sinto sono no meio da volta. Este teatro eu vi ontem. E não que valha apenas o versado. Mas vai chegando a velhice e devagar cedo ao vigor do vento. Continuo amando o que é
verde...ver-te vou indo ver.
AMARILLO
El amor del que habla Zarvoleta Amor de poeta
Encarcelado en el Pinel En su histeria
Tiraron a mi amor en la enfermería
Atrancaron la puerta
Los cabellos amarillos de mi poeta estaban sin brillo
Mi caballero cercado por lúmpenes
Tan pobres tan pobres
Él había olvidado lo que era la enfermería del Pinel
La mejor institución Pública para los insanos
Ellos los denominan pacientes mentales
La familia los quiere allá en el cuadrado del demo
País de bastardos que tratan a mi poeta y sus colegas
De cuarto como materia en detrito
Bendigo a todos los humanos que fueron encerrados por perturbar
La paz. ¿Cómo anda, vecino?
AMARELO
O amor de que/ala Zarvoleta Amor ao poeta
Encarcerado no Pinel Na sua histeria
jogaram meu amor na enfermagem
Trancaram a porta
Os cabelos amarelos do meu poeta estavam sem brilho
Meu cavalheiro cercado por lumpens
Tão pobres tão pobres
Ele tinha esquecido do que era a enfermaria do Pinel
A melhor instituição Pública para os insanos
Eles denominam de sofredores mentais
A família os quer lá no quadrado do demo
País de bastardos tratando meu poeta e seus colegas
De quarto como matéria em detrito
Abençoo todos os humanos que foram trancafiados por perturbar
A paz. Como vai seu vizinho?
Página publicada em julho de 2011, ampliada e republicada em outubro de 2014.
|