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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 
 

EDUARDO RUIZ

 

RUIZ, Eduardo.  Violenta.   São Paulo: Quatro Cantos, 2012.  286 p.  14x22.5 cm.  Prefácio: José Possi Neto.   ISBN 978-85-65850-01-8    Ex. bibl. Antonio Miranda

 

"Considero Eduardo Ruiz um escritor da estirpe de Gean Genet, as personagens do submundo lhe fascinam, suas imagens são sobretudo noturnas, carregadas de mistério e fantasia delirantes", escreve Possi. "Descende assim também de Rimbaud e de todos os poetas malditos."

 

        SEM SANTO

        Hoje ninguém mais
        Tem o poder
        Da dor na minha pele
        Não existe mais ar com pânico no meu bairro

        A cura é exercício de heró9s
        A falta de medo é um dom
        Para os deuses
        O perdão é para o homem
        Além deles dois

        Hoje ando sem medo pela rua
        Cruzo tua porta
        Com perdão redobrado e respeito

        Hoje a tua porta
        É um altar sem santo
        Ali está
        Sagrada mas vazia
        E quando nela surge o santo
        Em mim acontece o mais milagroso dos infiéis

 

        DEITA COM OS COLIBRIS

        Deita com os colibris, meu amor
        E deixa que eles te tragam aqui
        Ao meu lençol almiscarado
        Para que eu possa dar na tua boca
        Os grãos do cacho de corações
        Que por ti frutifiquei

        Deixa comigo no cascalho
        Que minhas abelhas enceraram com meu suco
        E ali dorme depois da reza
        Que te escreverei nos lábios
        E ali como da minha seiva
        E desrespeita minha pele

        Deita com teus braços abertos
        Que cantarei para tua aprendizagem de voo
        E quando tua sombra nublar lá do alto
        Meus ossos aqui em baixo se abrirão
        E passarás a morar dentro desse cercado

        E eu engolirei teu nome
        Puxado da tua língua
        Para que não te esqueças dele
        E não me abandones
        Quando bocas impuras
        Chamarem por tão belo poema
        Que é o teu contorno

 

        A RECLUSÃO DAS PALAVRAS

        Tenho falado muito pouco
        Com os vizinhos
        Com os parentes
        Com as paredes
        Tenho medo
        Que num relance pergunte de ti
        E a morte volta a me esmiuçar
        Com suas patas fortes

        Não que falar de ti estrangule-me a garganta
        É meu espírito só que não suportaria
        É meu coração que pede clemência
        Sou eu mesma me limpando da loucura

        Ah!
        Eu falaria de ti até o fim dos meus ossos
        Sobre essa cadeira
        Eu louvaria tua descrição
        A cada andarilho
        Que passeia por esse planeta

        Mas tenho fechado a porta
        Desligado as frestas
        Por onde poderiam passar papéis
        Com questões sobre tua ausência

        Não sabem nada de ti
        Tanto quanto eu também não sei
        E perguntam
        Olham
        Sugerem

        E eu rezo aos gritos
        Não para fazê-los parar
        Mas sim para saber
        Aonde foste naquela noite
        Na qual nunca mis achei um sol
        Para apartá-la de mim

        Batem a porta
        Pobres!
        Não desconfiam que não estou
        Fiquei presa naquela noite

 

        ADULTA

        A constatação do fim
        Vem de repente
        Num vazio de noite de quinta-feira
        Onde se assistia à televisão juntos
        E a sala agora está desligada

        A constatação arranha
        A mesa posta só para um

        Tira inúmeras vezes do gancho
        O telefone mudo

        Não encontra nenhum recado
        De paradeiro no espelho

        A constatação é tão adulta
        E eu sou tão embrião

 

        PRETO VELHO

        Se Deus é  pai amantíssimo de Jesus
        Ele abraçou o filho por trás
        Na hora da sua morte

        Então
        Vendo Cristo crucificado
        Eu me ajoelho
        Por aquela árvore morta
        Que serviu de cruz

        Ela
        Por lógica
        É Deus
        E se Deus é planta
        E eu escravo do oxigênio
        Fotossínteses me aliviam mais
        Do que  carne espancada
        E orações espinhosas

 

        QUE OUTRO SER PODE ESTAR TÃO PRÓXIMO DA LUZ?

        Vão nos tirando o tempo
        Mas quem precisa dele
        Quando as linhas caridosas em nossas mãos
        Alisa a pele do pai, do vizinho, do cão, do mar?

        Para nos reproduzirmos passamos pelo prazer
        Que outro ser pode estar tão próximo da luz
?

Vão-nos tirando tudo

E nós

Lindos que somos

Respondemos com o milagre

Da fabricação da água nos olhos

 

 

 

CAIXA DE BRINQUEDOS

 

Tem uma vontade de Paraíso

Nas algas dos meus nervos

Tem um gigante de zero ano

Perdido na caixa de brinquedos

Cuidando da minha velhice

 

 

 

Página publicada em outubro de 2017

 

 

 
 
 
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