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AGUINALDO JOSÉ GONÇALVES
Nasceu em Buritama – SP, em 1949.
Livre-docência pela UNESP (1997). Doutorado em Letras (Teoria Literária e Literatura Comparada), pela Universidade de São Paulo (1988). Graduação em Letras, pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras São José do Rio Preto/ SP (1972). É poeta, escritor crítico de arte, teórico na área da Literatura e outros sistemas. Publica em áreas diversas da Literatura, com ênfase na Intersemiótica, nas relações homológicas entre palavra e imagem. Professor titular da UNESP e da PUC Goiás, atuando nos cursos de Mestrado e Doutorado em ambas instituições. Palestrante e conferencista nacional e internacional de temas abrangentes: literaturas e artes, entre outros.
GONÇALVES, Aguinaldo José. Nove degraus para o esquecimento. Ilustrações: Efigênia Helu, Geraldo Matos, Sebastião Rodrigues (capa). Cotia, SP: Ateliê Editorial, 2017. 139 p Capa dura ilus. col. Apreseentação (na contracapa): Susana Busato N. 978-85-7480-761-4 Ex. bibl. Antonio Miranda
tempo selvagem destilador de limalhas
(indivisas)
Deixam nossos gestos e nossos olhos congelados de dor
como se delas fôssemos escravos para a eternidade
em vida sempre em corpo morto detido no caixão
continuassem mais temerosas que o estado inerte
mais temerosas pelo estado inerte
ali prostrado sem qualquer juízo
ali penetrante mais que a fôrma da morte coroável
mais que um jasmim deposto em formas murchas no vaso de pedra
sabão
tempo selvagem
*
Sombras vãs nestas vãs paragens dos dias
Em cachos mornos de cerúleo traço
Recompõe na analogia a ilusão do tempo
E decompõe no sonho a dimensão do mito.
Mesmo na imagem crespa da cor e do perfume
Mesmo no recomeço deste tato e deste sentimento
Antigo. Mesmo assim as sensações disformes
Se amalgamam no extremo; no princípio inerte.
*
pela identidade me desfaço
e nela reconheço meus pedaços
em cascas sobre cascas espalhadas
ou, em folhas recolhidas
em forma de repolho
olho pelas frestas e me vasculho
enveredo às vezes por atalhos
risco-me das ramas e dos espinhos
e atravesso os trechos mais tortuosos
com a esperança da clareira em noite alta
depois de desfolhar as folhas
e pisar sobre as cascas que se soltam
fico olhando para tentar ver o que me resta
do simulacro de mim
dessa sensação de pulsar
em alguma instância do si-mesmo
algo de mim. Mas o estar-aqui estando ali
finca estaca. E eu fico assim. Quase absoluto.
Página publicada em dezembro de 2018
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