ABEL VALINI
Nasceu em Franco da Rocha, São Paulo. Licenciado em História pela USP.
VALINI, Abel. Infinito pessoal. Capa: gravura de Guilherme de Faria. São Paulo: Massao Ohno, 1984. s.p. formato 13,5x21 cm.
PRETO E BRANCO (fragmento)
I
Pela rua, ladeira abaixo desciam pessoas.
Ela não descia a ladeira, exceto quando ia a
uma festa, ou quando pegava o ônïbus ou trem
para ir ao centro. Davam para contar nos dedos
de uma mão — sempre pensava ela caída na tris-
teza do sossego. — Mas, às vezes, saía de casa para
comprar pão, leite ou alguma coisa qualquer a
duas casas dali.
Ele também vivia descendo a ladeira abaixo.
Por ela mesma subia gente acima.
Ela só subia quando do centro voltava, ou de
alguma festa acompanhada pelos pais. — Foram
poucas, pensava, enquanto a lembrança esmaga-
va-a. — Ou quando voltava com as compras, que
fizera a duas casas dali.
Ele também, como qualquer um outro, e não
ele, subia a ladeira.
Alguém morava na ladeira. Alguém entrava à
esquerda, à direita de uma perpendicular, mas só
lá, quase no fim.
A sua casa ficava no começo da ladeira.
A casa dele ficava na ladeira, quase metade
depois da metade, quase metade antes do fim.
Não eram suas a ladeira e as casas.
(...)
VALINI, Abel. Juntos. 2ª edição. São Paulo: Massao Ohno Editor, 1983. s.p. 14x21 cm. “ Abel Valini “ Ex. Bibl. Antonio Miranda
Infinitivo Pessoal
Chegar das ruas andantes,
pegar a chave da porta
e num gesto abri-la.
Pedir licença para entrar,
sabendo que não há ninguém.
Sentir o vapor da casa adentro,
como se fosse uma pessoa.
Ver em cada móvel sentado
a expressão de um rosto,
cada uma diferente,
como se tivesse a atitude do momento.
Reconhecer os cantos dos cômodos,
vendo a colaboração de um ao outro
para sustentar o teto,
e num acordo mútuo
não se esquecessem do chão.
Sentar-se na cama,
como se houvesse alguém dormindo,
um claro suspiro de bom sono
e perfeita eternidade.
Calar-se em sinal de aprovação
e beber do copo o leite,
que acalentará o estômago.
Perceber que o pulmão
caiu em exaustão,
diante das pontas do cinzeiro.
VALINI, Abel. Diamante de vidro. São Paulo, SP: Massao Ohno, 1984. s.p. 14x21 cm. Capa: pastel de Darel Valença. “ Abel Valini “ Ex. bibl. Antonio Miranda
"Um conto moderno revitalizado! Uma abordagem poética, penetrante, angustiante, marca-passada, compassada, telegráfica, caótica, amorosa, real, das relações humanas!"
(fragmentos)
(a violino da Anderson)
arranhando
(as palmas)
na minha cabeça
(marimba)
no meu coração
(teclados)
na minha vida
(sempre)
no quarto
(sempre)
no espelho
(sempre)
nos olhos
(ao mesmo tempo)
no corpo
(sem parar)
tudo
(sempre)
secara
(sempre)
minha árvore
(sempre)
vida
(sempre)
morte
(ao mesmo tempo)
Eu
(sem parar)
tudo!
Paro agora a num
e, em mim, a música!
... para ficar sem palavras
na voz e na mente!
E,... eu queria isso. . .
Página publicada em junho de 2015
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