MÁRCIO DE LIMA DANTAS
Possui graduação em Letras pela Universidade Federal do Piauí (1992) , mestrado em Estudos da Linguagem pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (1995) e doutorado em Estudos da Linguagem pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2006) . Assistente II da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Tem experiência na área de Letras , com ênfase em Literatura Portuguesa. Atuando principalmente nos seguintes temas: Literatura Brasileira, Poesia, Imaginário, Crítica literária.
DANTAS, Márcio de Lima. O sétimo livro de elegias. Natal, RN: Impressão
Gráfica Moura Ramos, 2006. 52 p. 18x27 cm. (Coleção Letras Natalenses) Ilustrações Jota Medeiros. Intervenção sobe xilogravura original tirada na prensa de Sérvulo Esmeraldo, em Fortaleza, CE, 08 de dezembro de 2001. Apoio Fundação Cultural Capitania das Artes. Livro de arte gráfica. Col. A. (EE)
IV - Dos insensatos estas naus
Dos insensatos estas naus, para sempre atados, nunca em porfias, mas de deliberada bonança por regatos sob, escondidos sóis secretos (lunar era o íntimo, bastando o engano aos outros).
Resguardando, em grandes arcas de madeiras de lei,
os segredos fincados nos torneios sintéticos de caprichosas
vírgulas, e oração principal nunca dita,
terceirizando a primeira pessoa em vorazes máscaras alheias,
em falsos autorretratos de poetas, músicos e pintores mortos.
Cativo nas malhas das palavras tecidas de propósito,
fuga tecida em inúmeras albas,
saltando uma ou outra para resolver papéis do cotidiano,
distraindo-se no metro em pálidos sorrisos,
encantando-se pela fonética das conversas,
ludibriando interlocutores com acenos afirmativos da cabeça.
E assim o foi até agora, também o será sempre,
nunca os convexos cumes empíricos graduando o exato número
do adjetivo, assanhando as águas tranquilas,
conseguidas por meio do áspero ofício
de domar as fronteiras
entre uma e outra.
Eis minha tarefa:
vergar a gratuita primeira,
na bigorna plena de labaredas, queimando as mãos,
para depois discorrer sobre as feridas.
XVI - Do que ou como era
Do que ou como era,
ninguém me avisou.
Ninguém apontou o lugar no qual o lodo
acumulara seu verde intenso, surpreendendo-me em cada
queda.
As notícias chegaram tarde. Cartas se extraviaram pelos caminhos.
Recados foram esquecidos.
Hiatos erguiam-se como deuses zoomórficos,
estrugindo ironias, distribuindo atrapalhes.
Oráculos consultados, perante meu desespero,
diziam de enganos a mentiras, apontavam errados aceiros a seguir.
Andando a esmo, estranhamente deparei-me
com adagas nas mãos e palavras com crostas de carvão incandescente sob proposital terna cinza.
Ó ira dos meus dias! Ó cólera não escolhida!
O que fiz dos frutos servidos capciosamente
nas salvas do destino?
Seria interessante, então, justificar-me,
outorgando aos provérbios àquilo que se achegou sem prévio aviso?
Ah, mas assim seria demais,
onde estaria eu, em que labirinto robustos muros,
erguidos sem prumo, impediriam o encontro com o elmo e o escudo,
artifícios de antemão sucumbidos diante de indiferente granito?
Sei não, o que verbalizar do que sei, mas não alcanço:
fruto sumarento no alto do arbusto, inalcançável devido à fragilidade dos galhos.
DANTAS, Márcio de Lima. Daimon: poesias. Natal, RN: Sol Negro / Offset, 2018. 100 p. ilus. Orelha do livro por Theo G. Alves. Desenhos: Nivaldete Ferreira. Foto da capa: Alain Pham. Projeto gráfico: Márcio Simões. ISBN 978-85-5508-179-8 Ex. bibl. Antonio Miranda
ATLÂNTIDA
Submersa em léguas de água
salgada, Atlântida preserva
suas colunas, pórticos, pátios
do que fora um dia uma ilha,
povoada por muitas cidades,
ricas em ferro, cobre e ouro.
Submersa em nosso imaginário,
queda-se em silêncio, e emerge
quando de uma necessidade,
uma falha, um hiato, uma vontade
de quimera e suposta perfeição
(o que menos interessa é se existiu)
10.11.2013
VINHO
Não te iludas com o encarnado
do vinho, que a transparência da taça
permite entrever.
Lembras dos ensinamentos de Dionísio,
da poda e da madureza exata dos frutos.
Tudo que é terminado
resguarda uma memória de trabalhos,
revezes e aparências.
ESTÁTUA
Olhos fixos em um ponto inexistente,
a estátua firma a razão que subjaz
a toda obra de arte verdadeira:
habitar aquele ponto sem espaço nem tempo.
Página publicada em fevereiro de 2012
Página ampliada e republicada em fevereiro de 2019
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