GILBERTO AVELINO
(1928-2002)
Gilberto Edinor Cabral Avelino nasceu em Açu, Rio Grande do Norte, Brasil, no dia 9 de julho de 1928.
Membro da Academia Norte-Rio-Grandense de Letras, do Instituto Histórico e Geográfico do RN, e da Academia de Letras e Artes do Nordeste Brasileiro. Advogado.
Livros publicados: O moinho e o Vento (Fundação José Augusto, Natal); O navegador e o Sextante, 1980; Noturnos, 1981; Os Pontos Cardeais, 1982; Elegia do Mar Aceso em Lua, 1982; O Vento Leste, 1986; Além das Salinas, 1990; e As Marés e a Ilha.
A ILHA E A LENDA
Aos ventos da foz do rio Açu erguida,
e tendo o nome do seu sesmeiro
Manuel Gonçalves, resistia a ilha —
flor sangrando em meio às marés
altas de sizígia. O mar vinha em espumas
de fogo, e levava, em velozes carrosséis,
pedaço por pedaço do seu chão salgado,
e ante o qual, por amplo tempo, brando
cantara. Luminosas cicatrizes refloresciam
na carne dos seus pacíficos moradores
(pescadores e salineiros). E lhes doía
a última visão - sol em sossego do poente,
que se apagava das casas e pequenas ruas,
onde ressoavam ainda os seus longos passos.
O mar, incandescendo-se de azuis,
a ilha escondeu entre ondas
ardentes e porões abissais que construíra.
Em noites de lua de agosto, quando
o mar reveste-se de brancos algodoais,
os pescadores escutam cantos de sino
que vêm da capelinha insepulta,
e identificam a voz -tão leve, bela e pura,
da Virgem da Conceição falando às águas.
(De Os pontos cardeais - 1982)
BALADA AO HOMEM DO CAMPO
A enxada ao ombro
leva,
e vai
adentrando-se na mata,
de onde se acende ainda
o cheiro das queimadas.
0 sol
eleva-se
e amorna-lhe
a morena pele.
Os pés — indomáveis
arados,
vencem os troncos,
espinhos,
ramas
e as areias.
— Areias guardando
fundas marcas - em círculos
vigorosos,
de preás,
tatus
e de raposas
nos cios.
Os olhos — lavados
das manhãs,
alongam-se sobre as vazantes,
onde em viço
esplendem o milho,
feijão, os jerimuns,
batatas e as melancias,
e luzem melões amarelos.
Deliciam-se o homem
e o fruto,
ante o chão que se incandesce.
O alimento
à sombra das oiticicas,
enquanto a tarde
faz o aboio dos ventos,
trazendo
o cheiro
em floração
de juremas e velames.
Gira
a enxada,
que canta nas areias,
levando
a seiva
às plantas que amadurecem.
A volta
ao descansar da tarde.
A casa.
Acercam o homem
a alegria e o sono.
(Do livro As marés e a ilha- 1995)
Página publicada em fevereiro de 2020
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