COSME LEMOS
(1904-1981)
Cosme Corsino Lemos nasceu em Martins, Rio Grande do Norte, Brasil, no dia 4 de fevereiro de 1904.
Declamava seus poemas durante sua vida boêmia, mas não chegou a publicar um livro. Faleceu no dia 2 de novembro de 1981, na cidade de Natal.
CAMPO DE JORDÃO
4 de fevereiro, o meu aniversário...
Há tempos fui ao céu, vi Campos de Jordão.
A Serra toda em flor e em cima um santuário,
Altar-mor do Brasil! Jesus me dando a mão!
Perfumes. Chuvas, flores, vinho... Campanário
Na voz–amor de um sino e em minha alma do Sermão
Da montanha... chorei a lembrar o Calvário
Da natureza nua e pobre do meu chão.
Meu Nordeste querido, és a pedreira quente,
Mas é chão do Brasil também a tua gente
Sente, em Campo Jordão, o orgulho brasileiro.
O vinho de Caná bebi na serra azul
E ali era meu e teu e nosso sul,
Nosso lar, nosso céu, nosso País inteiro.
N O R D E S T E
Gosto do meu "Nordeste" o alísio carinhoso,
Que beija, que refresca e afaga meu sertão
E que, as vezes parece um fauno buliçoso,
A rir e a gargalhar nas noites de verão.
Vezes outras se torna um moleque enxerido
Levantando os vestidos das moças bonitas,
A bailar, a rodar, a soprar atrevido,
Virando e desatando os seus laços de fitas.
Mas é vento gentil, meu risonho nordeste,
Que para bem amar se torna viração
Que não mata a lavoura e nem semeia a peste,
Que não traz tempestade e não tem furacão.
Meu Nordeste taful, meu Nordeste plebeu,
Tu não és vento nobre dos deuses do Olimpo;
Não és filho de Astreu, de Tefeu ou Perseu
Mas és filho daqui, do meu Nordeste limpo
E dos serenos céus azuis do Novo Mundo.
Virgílio não te ouviu, nem te cantou Homero,
Não te prendeu Eolo, o Deus, no seu profundo
Abismo de Cavernas e do desespero.
Nunca serviste a Apolo, a Ceres ou a Diana,
E não tiveste templo e nem foste adorado;
Jamais ouviste prece ateniense ou romana
Nem teu nomé também por Juno foi lembrado
Mas adoras o sol, a lua, o firmamento,
Terra e céus tropicais se unem no teu beijo
E a vida do sertão ao som do teu arpejo,
Acorda e canta e vibra de contentamento.
Rolem na terra os ventos maus ou generosos,
O siroco, simum, o mistral ou minuano,
O pampeiro, o burana, o metei, ou o solano;
Soprem brisas, monções; vendavais procelosos;
Cortem frios o Fohn, o crivet, ou o bora;
Nenhum é como tu nenhum tem teu semblante,
Tuas asas sutis e as tuas mãos de aurora.
És cavaleiro alado em vôo sussurrante.
Cavaleiro do amor nas noites de luar
Carregando o perfume e as flores das juremas
E acordando os desejos das virgens-moemas —
Cujos seios rebentam no anseiode amar.
ANUÁRIO DE POETAS DO BRASIL. 2º. VOLUME. Organização de Aparício Fernandes. Capa de Ney Damasceno. Rio de Janeiro: Folha Carioca Editora Ltda., 1977. 496 p.
Ex. bibl. Antonio Miranda.
ABRAÇO FRATERNO
No álbum de Maria Olimpia
Vais partir, minha filha, em tua mão eleita
brilha o anel que te deu, no altar, o teu esposo.
Realizaste, enfim, o sonho mais formoso
da tua vida de menina e moça. Aceita
o abraço que te dou de alma satisfeita,
por te ver apoiada ao braço, carinhoso,
daquele em cujo lar hás de cumprir o honroso
dever de esposa e mãe. Deus te faça perfeita
cumpridora fiel desse dever sagrado.
E para que teu lar seja feliz e honrado,
eu te dou de presente quatro talismãs;
quatro exemplos de amor serenos e constantes,
quatro vultos de mães e esposas vigilantes:
— a tua nobre mãe e tuas três irmãs.
TROVAS
Nos lábios de uma morena
que gosta de namorar
há pétalas de açucena
num anseio de beijar.
*
Nome de mãe é tão santo,
que a gente diz numa prece;
e ao dizê-lo, como encanto,
toda dor desaparece.
*
Quem tem fome tem desejo
de receber nutrição.
— Na abundância de teu beijo,
dá-me, por Deus, o teu pão!
*
Minha mãe, quando rezava,
nos olhos trazia o brilho
de uma santa que rezava:
Deus te proteja, meu filho!
GOLPE FATAL
Ao Grande Amigo Walter
João Maria foi nobre e forte em tudo,
adorava a Rejane com anelo
e os filhos para ele, sobretudo,
cada qual era o mais sublime e belo.
Preparava na vida o seu castelo,
gigante no trabalho e amando o estudo,
mas Atropos, a Parca do cutelo,
cortou-lhe a vida com um golpe rude.
João Maurício e João Carlos, belos filhos,
sob as mãos de Rejane, com seus brilhos
de esposa e mãe, excelsa, eis sua grei.
Mas todos vencerão com fé e glórias
e encontrarão, no amor, sua vitórias,
pelos braços de Walter Wanderley.
NOTA: João Maria de Lima, genro do escritor
Walter Wanderley, advogado, diretor da Compax
S.A., morto no dia 9-10-1976, em desastre de
automóvel, quando voltava das sua atividades
profissionais.
PRECE
Senhor! Eu não te peço os bens terrenos,
nem as glórias do céu que não mereço.
Dá-me, eu te peço, ó Deus, dias serenos,
mitiga esta ansiedade que padeço.
Senhor! Se já não tens ventos amenos,
que soprem minha vida, eu te agradeço
a morte que me deres como preço
dos meus pecados que não são pequenos.
Mas arma-me, Senhor, para que eu vença,
dá-me fé, quero a luz da tua crença,
arranca-me este medo do suplício.
Tira de mim o pranto, a covardia,
faze-me Homem, homem que sorria,
aos golpes da tortura e do cilício.
Página ampliada e republicada em abril de 2021.
Página publicada em fevereiro de 2020
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