Foto: Mauricio Oliveira

NELI GERMANO

Neli Germano é natural de Torres-RS e reside em Porto Alegre. Atua na gestão do Arquivo Geral do Sistema FIERGS há mais de vinte anos. Cursou Letras e Serviço Social pela ULBRA em Canoas-RS. Participou de seis antologias - entre elas o CD Confraria de Poetas, Editora Alcance/RS (1998) - e teve poemas publicados em jornais alternativos de cultura. Selecionada no Concurso Poemas no Ônibus (1999/2000) pela Secretaria Municipal de Cultura de Porto Alegre - Cia. Carris Porto-Alegrense e ATP. Desde 2012, tem seus poemas publicados na revista Gente de Palavra. Participa ativamente em saraus e tem diversos poemas na Internet. Em 2014 fez parte da Exposição Poesia Ilustrada no Festival AEDO, juntamente com Mariah de Olivieri. O catálogo desta exposição está disponível no site aedo.art.br.

GERMANO, Neli.  Casa de infância.  Porto Alegre, RS:  Gente de Palabra Microeditora, 2014.  76 p.  15x21 cm.  (Coleção Caderno de Poemas)  ISBN 978-85-67780-08-5   “Neli Germano” Ex. bibl. Antonio Miranda

XLIX

Achava a coisa mais linda:
usar batom, ruge
e lápiz para fazer pinta.

LVI

Fosse madrugada, fosse dia, lá ia ele, aparelho de
injeção

sempre limpinho, álcool e algodão:

meu pai ou "o padre", apelido por ter sido

seminarista.

Tempo de chuva ou ensolarado, estava sempre pronto.

Morasse perto ou longe, conhecesse o doente ou
não, não importava.

Atendia sem cobrar. Nunca deixou ninguém na mão.
Meu pai por muito tempo foi o único aplicador
de injeção na vila.

Era bom ser a filha de um pai que aplicava injeção. 

LVII

revisito o velho baú

                    encontro meu vestido de batizado

                    um vira-xale bordado em rococó

                    carretéis, botões, um dedal

                    um par de sapatos da noiva, minha mãe

                    trancelim colorido enovelado num sabugo

                    contas de rosário (lágrimas de Nossa

                    Senhora)

                    ladainha de todos os santos e novena
                    pra Santa Rita

missal e uns santinhos
pérolas embrulhadas em papel de seda
figura de dois moribundos:
a alma de um sendo levada pelo diabo
a outra, por um simpático anjo da guarda

          procuro vestígios de uma terra distante

Página publicada em junho de 2016